Discurso durante a 212ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Considerações sobre a Medida Provisória 440, de 2008. Reflexão sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal - STF com relação à fidelidade partidária que manteve a resolução do Tribunal Superior Eleitoral - TSE. Premência da discussão da reforma política. Análise dos vinte anos da atual Constituição Federal.

Autor
Renato Casagrande (PSB - Partido Socialista Brasileiro/ES)
Nome completo: José Renato Casagrande
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. REFORMA POLITICA. HOMENAGEM.:
  • Considerações sobre a Medida Provisória 440, de 2008. Reflexão sobre a decisão do Supremo Tribunal Federal - STF com relação à fidelidade partidária que manteve a resolução do Tribunal Superior Eleitoral - TSE. Premência da discussão da reforma política. Análise dos vinte anos da atual Constituição Federal.
Aparteantes
Inácio Arruda, José Nery, Marcelo Crivella.
Publicação
Publicação no DSF de 13/11/2008 - Página 45081
Assunto
Outros > ADMINISTRAÇÃO PUBLICA. REFORMA POLITICA. HOMENAGEM.
Indexação
  • COMENTARIO, DEBATE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REORGANIZAÇÃO, CARREIRA, SERVIDOR, REAJUSTE, SALARIO, OCORRENCIA, JUSTIÇA, LOBBY, INCLUSÃO, CATEGORIA, NECESSIDADE, ATUAÇÃO, AUMENTO, GASTOS PUBLICOS.
  • COMENTARIO, DECISÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CONFIRMAÇÃO, RESOLUÇÃO, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE), FIDELIDADE PARTIDARIA, OPINIÃO, ORADOR, USURPAÇÃO, FUNÇÃO LEGISLATIVA, MOTIVO, OMISSÃO, CONGRESSO NACIONAL, REFORMA POLITICA, POLEMICA, ASSUNTO, REPUDIO, PROPOSTA, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEFINIÇÃO, PRAZO, TROCA, PARTIDO POLITICO, DEFESA, PRIORIDADE, DEBATE, REGULAMENTAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, PROCESSO, EXPULSÃO.
  • REGISTRO, ANAIS DO SENADO, PRONUNCIAMENTO, AUTORIA, ORADOR, HOMENAGEM, ANIVERSARIO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, ESPECIFICAÇÃO, ELOGIO, PROMOÇÃO, EVOLUÇÃO, LEGISLAÇÃO, MEIO AMBIENTE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente.

Srs. Senadores, Senhoras e Senhores. primeiro, farei um registro com relação à Medida Provisória que estávamos debatendo até o presente momento, a MP nº 440, que reorganiza e reajusta salários de diversas carreiras dos servidores. Há uma demanda enorme sobre o relator, sobre todos nós, demandas justas.

O relator, até o presente momento, não acatou nenhuma dessas demandas, nenhum desses pedidos. Existem diversas demandas, e sabemos que cada demanda tem uma conseqüência, um aumento de despesa.

Trata-se de uma medida provisória importante, mas, como o próprio relator disse, a partir de 2011, haverá uma repercussão de quase R$21 bilhões por ano com essa Medida Provisória. O orçamento não deve crescer no mesmo ritmo do aumento de despesa; as despesas de custeio, de pessoal e de investimento têm de caber no orçamento. Se você gasta mais com pessoal e com custeio, vai ter de gastar menos com investimento. Então, é fundamental que todos nós saibamos o que estamos votando e que a sociedade tenha a clareza daquilo que o Congresso está aprovando.

É tradição deste Congresso aprovar as medidas de melhoria dos salários dos servidores, porque os servidores ficaram, de fato, muito tempo sem melhoria de salário, especialmente os servidores do Poder Executivo. Então, a tendência é votar e aprovar a medida provisória, mas todas as informações, naturalmente, precisam ser prestadas à sociedade brasileira.

Outro registro, Sr. Presidente, que faço neste momento é com relação à decisão do Supremo Tribunal Federal. V. Exª acompanhou, à tarde, que o Supremo Tribunal Federal indeferiu, não considerou a ação direta de inconstitucionalidade que o PSC impetrou naquela Corte com relação à fidelidade partidária decidida pelo Tribunal Superior Eleitoral. Manteve a resolução do TSE, manteve a fidelidade partidária.

Naturalmente, com relação ao mérito, concordo com o TSE e com o Supremo Tribunal Federal. Precisamos ter a fidelidade partidária. Por outro lado, entendo que o TSE exorbitou. Não é sua função legislar sobre esse assunto, mas ele o fez. Houve um excesso nessa resolução do Tribunal Superior Eleitoral, mas quando um Poder não ocupa o seu local e não exerce a sua função, ele acaba sendo, de alguma forma, substituído pela ação de outro Poder.

A vida é mais ou menos assim: o Congresso não regulamentou, não conseguiu avançar com relação à reforma política, o TSE “legislou” e o Supremo confirmou e ainda cobrou do Congresso. Vale a decisão do TSE até uma nova decisão ou até uma decisão do Congresso Nacional. Então, mais do que nunca, o Congresso precisa agilizar uma decisão sobre esse ponto da fidelidade partidária, que considero fundamental, e sobre outros pontos da reforma política.

Propus uma comissão mista da Câmara e do Senado para discutir a reforma política. O Congresso não quis aprovar, não aprovou esse requerimento. Não conseguimos dar seqüência ao debate da reforma política. Agora, estamos vendo uma discussão com relação a uma janela que buscam abrir para que haja a possibilidade da troca de partido.

Não vou manifestar uma opinião definitiva, mas tenho muitas restrições a esse tipo de janela, de abertura, de possibilidade. Nós, parlamentares com mandato, não podemos ficar submissos à ditadura de um partido. Mas, ao mesmo tempo, temos que regulamentar para que possamos saber, para que a sociedade saiba, para que os partidos saibam quais são as condições, os critérios e o ambiente que possibilitam a um parlamentar pleitear sua saída de um partido e quais as condições de perda de mandato.

Acho que essas questões são fundamentais e nós não podemos apenas dar um prazo, estabelecer um período para que o parlamentar troque de partido, porque ele vai ser fiel três anos e pouco e vai ser infiel durante um mês.

Então, acho que esse é um debate que vamos fazer, mas não absorvo bem esse tipo de proposta que a Câmara dos Deputados está debatendo, que muita gente debate.

É importante reconhecermos, é importante sabermos que as reformas políticas feitas no Brasil, as alterações na legislação partidária, eleitoral, política sempre vieram para atender ou para manter, mudar para permanecer tudo igual. Quando se criaram os Senadores biônicos, quando se estabeleceu a verticalização, quando se estabeleceram os 5% da cláusula de barreira, quando se estabeleceu a reeleição, antes de Fernando Henrique Cardoso, depois se estabeleceu que não podia haver imagem externa no programa eleitoral... Então, as medidas sempre vêm para manter uma situação, vêm mudar para manter tudo igual. Então, tenho sempre um pé atrás com relação a algumas propostas para resolver casos específicos.

Eu quero debater o tema. Não o estou rejeitando, mas tenho muitas restrições em relação a ele.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Senador Casagrande...

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - O Senador Nery quer um aparte. Eu o concedo, mesmo sabendo que o Regimento não permite.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - V. Exª está falando como Líder?

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Como Líder.

O Sr. José Nery (PSOL - PA) - Então, se o Presidente permitir, serei muito breve. Quero dizer a V. Exª que, nessa questão da reforma política, em um aspecto especial que V. Exª menciona, o da fidelidade partidária, a meu ver, não pode haver transigência com o tipo de proposta que, na verdade, tenta solapar o que a própria legislação já determina, interpretada pelo TSE e reafirmada nos termos que conhecemos hoje. Essa necessidade de reforma política, nos vários aspectos que ela engloba, seja no financiamento público ou na proposta do fim da reeleição, além de outros aspectos fundamentais, só ocorrerá, Senador Casagrande e Senador Inácio Arruda, se houver uma ampla mobilização social que congregue diversos segmentos da sociedade, para que o Congresso faça um debate, para que haja uma participação mais viva da sociedade, para mudar procedimentos e costumes políticos que estão tão arraigados na nossa história e que são responsáveis por colocar a política num patamar muito inferior, como conhecemos hoje. Portanto, revalorizar a política significa fazer a reforma que nos dê condições para que a representação seja cada vez mais legítima, reafirmar o princípio absolutamente igualitário e democrático no acesso ao processo da disputa, como deve ser o financiamento público.

Portanto, Portanto, quero concordar com V. Exª quanto à urgência e a necessidade de reforma política, dita como mãe de todas as reformas, mas que não há disposição concreta para realizá-la. E em relação ao tema da fidelidade partidária, acho uma excrescência a proposta que está sendo construída e já manifestando o apoio por alguns partidos de que se permita uma brecha na lei, para que se possa permitir a troca de partido, o que, em obediência ao princípio da fidelidade partidária, já é consagrado na legislação e assim interpretado pelo Tribunal Superior Eleitoral. Congratulo-me com V. Exª pelo pronunciamento e manifesto o desejo, inclusive, de contar com essa mobilização que pretendemos. Acho necessário e importante ir aos Estados, debater nas universidades, nas escolas, com os trabalhadores, o PSB sob a sua liderança. É muito importante estarmos juntos na grande campanha popular pela reforma política que verdadeiramente interesse ao povo brasileiro. Parabéns a V. Exª. Muito obrigado.

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Muito obrigado, Senador José Nery.

O tema da fidelidade, conforme o TSE decidiu, tem que ser complementado. Ele é insuficiente. Não trata da questão da expulsão. Hoje, a melhor maneira de um parlamentar trocar de partido é provocar o partido, ser expulso, porque, quando ele é expulso, aí ele pode ir para qualquer partido. Não se trata da questão da expulsão.

Portanto, a resolução do TSE é uma resolução incompleta. Por isso, nós precisamos, para aprovar aqui nossa regulamentação, tratar de todos esses temas.

A outra questão é que a reforma política não é uma matéria fácil. Se fosse fácil, já teria sido votada pelas duas Casas. Muita gente concorda, muita gente não concorda com o voto em lista, não apenas nós do Parlamento, mas a sociedade. Quem está nos acompanhando sabe que é um assunto polêmico.

Financiamento público de campanha também é polêmico. Os temas são polêmicos. Os temas da reforma política são polêmicos, mas temos que enfrentá-los. E uma reforma não se faz em um ato, é um processo. Temos que discutir reforma todos os anos, para que possamos ir aperfeiçoando nosso sistema político eleitoral, partidário. Acho que esse é o caminho que temos com relação a esse assunto.

Então, deixo minha posição com relação ao tema da reforma política e especialmente com relação ao tema da fidelidade partidária e com relação ao tema da famosa janela que querem abrir, que não vejo com bons olhos.

O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Senador Casagrande, V. Exª me permite um aparte?

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Pois não, Senador.

O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - O tema é realmente, como V. Exª disse, extremamente conflitante nas suas concepções e argumentos. Agora, V. Exª sabe que vivemos em uma República. Quando se fala em república, fala-se em representação. Quando se pensa em representação, pensa-se em partido. Quando se pensa em partido, pensa-se em voto. Senador, é duro constatar, mas é mais duro ainda proclamar que o voto no Brasil hoje é uma instituição corrompida, corrompida pelo poder econômico, pela mídia, por uma imprensa facciosa, sistemática, que pega o cidadão de bem desprevenido, à frente de um televisor ou sentado lendo um jornal, uma dona-de-casa, um homem do povo, achando que ali encontra sua informação, quando por trás há interesses escusos. E essas coisas precisamos ver aqui no Congresso. E mais: uma reforma política que traga legitimidade ao processo eleitoral precisa ver também a questão dos institutos de pesquisa. Meu Deus do céu, os escândalos se sucedem! Não é possível que a matemática, que Descartes, lá no século XIII ou XIV, se não me engano - Senador Mão Santa, me corrija -, queria que fosse a primazia das ciências; depois, Comte achou que devia ser a Sociologia. Mas Descartes defendeu que fosse a Matemática. Não é possível que ela tenha se desatualizado, na época do computador, dos cálculos imediatos. E os erros dos institutos de pesquisa espantam, no Brasil inteiro, ao sabor dos interesses. V. Exª, com toda a razão, se debruça sobre um tema que hoje desmoraliza a vida pública no Brasil. O processo eleitoral precisa ser revisto. Não podemos permitir mais que o poder econômico faça um curral eleitoral. Para concluir, Senador Renato Casagrande, não quero aqui trazer qualquer tipo de embaçamento ao brilhantismo do seu pronunciamento; é uma colaboração desvaliosa, porém sincera, modesta, porém desinteressada. V. Exª me permita dizer que, na minha terra, no Rio de Janeiro, nós amarguramos muito porque o tráfico de drogas quer transformar poder econômico em poder político e elege candidatos. As milícias, uma caricatura de liberdade para o povo das favelas, também quer transformar poder econômico, dinheiro que eles arrecadam na ilegalidade, na extorsão ao povo, em poder político, elegendo deputados e vereadores. Mas a mídia - é tão ilegítimo! - a mídia também quer transformar poder social, poder econômico em poder político, transformando o caminho correto e legítimo em que o povo decide livremente o seu futuro e o seu destino num pleito escoimado do entulho de mentiras que são levantadas na ocasião do processo eleitoral. Então, acho que isso também deveríamos debater, porque afronta e avilta todos nós. Obrigado, Senador.

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Obrigado a V. Exª, Senador Marcelo Crivella...

O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Sr. Presidente...

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - V. Exª acabou de participar de uma eleição e está com os defeitos e as virtudes do processo à flor da pele. Concordo com muitas das colocações de V. Exª, por exemplo, a questão dos institutos de pesquisa. Acho que, quinze dias antes das eleições, não deveríamos ter mais publicação de pesquisa, poderíamos ter somente pesquisa para consumo interno, para avaliação de campanha, porque a pesquisa acaba sendo um instrumento de campanha. E há muitos institutos.

Então, temos mudanças importantes a serem feitas. Se não conseguirmos fazer todas, temos que fazer algumas. A questão do valor de campanha, do poder econômico na campanha, é uma questão emergencial, e acho que só se resolve com financiamento público de campanha. Não há outro caminho para isso ser resolvido, porque se pode aí colocar o Ministério Público e entidades para fiscalizar o tamanho das campanhas, para ver se a campanha está ficando mais cara do que o candidato está recebendo de dinheiro.

E é um debate que temos que fazer com a sociedade, porque a sociedade acha que fica mais caro financiar com dinheiro público. Na verdade, fica mais barato financiar, com exclusividade, as campanhas com recurso público, para que não haja essa interferência direta do poder econômico - qualquer que seja o poder econômico, de qualquer segmento - sobre o resultado eleitoral.

Ouço com prazer o Senador Inácio Arruda.

O Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - Caro Senador Casagrande - com a permissão do Sr. Presidente -, esse é o debate mais importante, mais significativo, e o maior diálogo que podemos fazer com o povo brasileiro. É preciso esclarecer essas questões todas do processo político e eleitoral do Brasil, essa força brutalizadora do poder econômico nas eleições. Cada vez elas ficam mais caras, mesmo depois de terem sido tirados os shows, as placas de outdoor...

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Os brindes.

Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - ...os brindes, eles entram por outras vias.

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Entram pelo pessoal, pela contratação de pessoal.

Sr. Inácio Arruda (Bloco/PCdoB - CE) - O exército de pessoas que é preciso contratar para se fazer uma eleição no Brasil, o custo do Programa Eleitoral Gratuito, que não é gratuito; o Estado paga todos os canais de televisão, não é assim, Senador Crivella? Todos são remunerados pelo espaço que é ocupado com a propaganda eleitoral partidária. Todos são pagos. Além de serem pagos, os requintes de produção exigem um financiamento elevadíssimo para a produção dos programas eleitorais. O problema da reforma política, portanto, exige um debate muito aceso. É muito significativo que possamos fazer isso no Senado por meio de um canal público, que é a TV Senado, e que possamos ocupar mais espaço na Câmara fazendo esse debate, porque também é um canal público. Precisamos ocupar TVs públicas em um debate sincero com aqueles que têm compromisso com a Nação, com o povo brasileiro. O que se quer hoje de uma reforma política? Muitos vão bradar por ela. Mas que reforma política? Uma reforma política para retroagir às conquistas constitucionais de 1988, da Constituição Cidadã, tão festejada em seus 20 anos de existência e que permitiu, inclusive, a existência do meu Partido, que era proscrito, não tinha espaço, não tinha meios de se pronunciar, de falar? É uma reforma que garante o que V. Exª levanta, com muita propriedade, ou seja, o financiamento público de campanha, que fortaleça os partidos, casando financiamento público com lista partidária? E disse bem V. Exª, seria muitíssimo mais barato o financiamento público do que o financiamento privado e de travessa, porque uma parte do financiamento não pode ser publicada. Se pudesse ser publicada, mostraria o verdadeiro valor de muitas campanhas que aparecem milionárias aos olhos do povo, mas que, na contabilidade da campanha, parece uma eleição de Vereador, embora se trate de governo de Estado ou da Presidência da República, mostrando um gasto menor do que o de um Vereador. Às vezes, uma campanha milionária, se compararmos entre os Senadores, os que não podiam gastar nada têm gastos superiores às campanhas milionárias. São coisas absurdas que vêm do vício da campanha de financiamento exclusivamente privado, como ocorre no Brasil. Então, é preciso casar financiamento público com voto em lista para fortalecer os partidos políticos no Brasil sem receio. Agora, é essa a reforma que querem ou é a reforma do voto distrital, com o discurso falseado de que no distrito as pessoas ficam conhecendo melhor o Senador ou o Deputado? Ou, então, a do voto distrital misto, com essa mesma falseação de realidade, porque ali haveria um controle político maior, como se não fosse também a prevalência do poder econômico no voto majoritário, que é o voto de distrito? É um voto majoritário. É como se a gente elegesse, em cada distrito, um Senador, porque só vai ser escolhido um em cada distrito. Então, é uma forma de se restringir ainda mais o espaço dos segmentos populares, as representações sociais. Então, nós temos que estar muito atentos, sabendo da dificuldade que é levantar esse debate no meio da população, principalmente num país que ainda está em desenvolvimento, com uma população muito pobre, que está preocupada com coisas muito concretas da sua vida, quer resolver o problema do abastecimento de água, quer resolver o problema do saneamento, quer resolver o problema das escolas dos filhos, quer resolver o sistema de saúde, e não está tendo a preocupação ou não pode ter a preocupação de se envolver num debate que significa o fortalecimento da democracia brasileira, para aumentar a participação da sociedade, desses segmentos populares que formam a maioria do povo, mas que têm o controle da minoria, porque a mídia brasileira está na mão de uma minoria. E a mídia é muito democrática, é muito acessível, mas, como dizia Noam Chomsky, um americano, ela tem dono. A mídia tem dono. E têm dono os jornais, que são absolutamente privados, 100%, tanto que, nos Estados Unidos, agora, é assim: cada jornal já se posiciona eleitoralmente, já diz qual é o seu candidato, porque acaba com a hipocrisia. Já decide quem é seu candidato, ou do Partido Republicano, ou do Partido Verde, ou do Partido Democrata., e já resolve o assunto. Mas existe um outro fator: televisão e rádio não são apenas instituições privadas; são concessões públicas. Então, não podem ter uma posição partidária. Seja o mais poderoso veículo de comunicação, ele é uma concessão pública. Então, é uma aberração o que se faz no Brasil na indução do voto da população brasileira pela mídia, principalmente a televisão e o rádio. E os crimes que são cometidos quando levantam, muitas vezes, falsas denúncias, falsos projetos e os atribuem a um candidato, e o massacram publicamente. Isso tem sido feito de forma abusiva. E muitos, alguns até Senadores da República, que controlam veículos de comunicação fazem isso abertamente em seus Estados e depois vêm requerer reforma democrática, liberdade de expressão etc, aqui no Senado e também na Câmara dos Deputados. Eu acho que é um debate de grande profundidade. Eu estou na expectativa da hora precisa de envolvermos o povo nesse debate, de chamar a sociedade, chamar a academia, chamar os universitários, chamar os estudantes brasileiros, para exigir a reforma democrática que aprofunde a democracia e não que vá retroagir. E tirar os tribunais disso. Eu acho que, no Brasil, tribunal nem deveria estar envolvido em eleição. Acho que talvez tivéssemos até que acabar com o TSE e com os TREs. Quer dizer, quem tem de fazer eleição são os partidos; é o acordo dos partidos que realizam a eleição no sistema democrático. Agora, nós temos uma justiça que interfere sistematicamente no processo eleitoral brasileiro, abusivamente no processo eleitoral brasileiro, passando a legislar. E passa a legislar por quê? Porque nós não temos um acordo no Congresso Nacional, e não é fácil realizá-lo, porque precisaria, para se fazer uma reforma mais democrática no Brasil, de uma mudança institucional no quadro político brasileiro muito grande. Não é o que está ocorrendo. Eu fico olhando para o Senado da República e para a Câmara dos Deputados e fico sempre preocupado a cada proposta de reforma política, porque a minha preocupação é retroagir, é haver um retrocesso democrático a cada medida que é adotada. Eu fiz um amplo debate sobre isso na Comissão de Justiça sobre a tal cláusula de barreira, a aplicação desses instrumentos no Brasil. Eles não têm caráter democrático; são antidemocráticos. Então, precisamos aprofundar é a democracia, e não restringi-la. O povo americano está fazendo essa tentativa nos Estados Unidos, vindo um pouco de baixo, empurrando um negro para presidir os Estados Unidos, para ver se amplia a democracia no país mais rico, mais poderoso, o maior império de todos os tempos na face da terra. Aqui no Brasil, temos que, em conjunto - V. Exª, o Senador Crivella, o PMDB, que tem um história democrática em nosso País - estar atentos e não permitir qualquer retrocesso na legislação, tomado por nós, pelo Congresso Nacional. Abuso dos tribunais., às vezes vemos, mas ficamos impotentes para resolver, porque não legislamos. Mas é o cuidado de não legislarmos, ou seja, naquela ânsia de não deixar o tribunal legislar, vamos nós legislar no sentido de retroagir. Acho que temos de fazer um bom debate. Parabenizo V. Exª por ter levantado esse importante tema na sessão do Senado Federal.

O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Muito obrigado, Senador Inácio Arruda. Para concluir esse tema, quero dizer que o Senado deveria talvez ter uma comissão, não diria permanente, mas por um período dilatado, sem o tempo de dois ou três meses, mas que pudesse pegar todas as propostas que estão tramitando. O Governo tem uma proposta em consulta pública, para que pudéssemos tentar avançar. Essa matéria é uma matéria subjetiva, há outros assuntos que acabam pressionando o Congresso e a sociedade para que sejam resolvidos. E sempre se vai deixando para depois, porque já há uma norma vigente. Essa norma está “regulamentando” o processo político, o processo eleitoral, a organização partidária. Então, se já existe uma norma vigente, não precisamos alterar. Quando houver um momento mais adequado nos faremos as mudanças.

Então, acho que deveríamos dar prioridade ao tema. Não que ele seja um tema exclusivo, mas dar prioridade porque é um tema do aperfeiçoamento institucional. Para falar sobre isso - não tive oportunidade na semana passada, quando houve uma sessão solene comemorando os 20 anos da promulgação da nossa Constituição -, quero deixar registrado o pronunciamento, fazendo uma análise dos vinte anos da nossa Constituição Cidadã de 1988. Diversos Parlamentares participaram como constituintes. Eu faço uma reflexão da importância da Constituição, especialmente em alguns setores e em algumas áreas. Nessa questão da reforma política e da área tributária, acho que temos de avançar muito ainda no aperfeiçoamento constitucional, na distribuição de tributos, na consolidação de uma federação, com mais autonomia aos Estados e aos Municípios. Na questão institucional, temos de avançar muito no aperfeiçoamento constitucional.

Todavia, registro aqui o avanço que tivemos na área ambiental, um avanço importante. A Constituição tratou do tema ambiental e o colocou como tema atual, com base constitucional. Por meio dessa base constitucional, tivemos diversas propostas e hoje uma legislação, um arcabouço legal que regulamenta a área ambiental, ainda que com muitos problemas. Agora mesmo, vivenciamos uma dificuldade: e não conseguimos implementar a resolução do Conama, porque a Petrobras e as indústrias automobilísticas conquistaram novo prazo para que pudessem limpar o óleo diesel do enxofre.

Então, temos dificuldades ainda; países avançados já têm um diesel muito mais limpo que o nosso. Infelizmente, há avanços que ainda precisamos conquistar, mas, sem sombra de dúvida, quero reconhecer que, na área ambiental, a Constituição promoveu um avanço significativo.

Deixo registrado, então, nos Anais da Casa este pronunciamento.

Sr. Presidente, agradeço a V. Exª pela oportunidade.

Um abraço.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR RENATO CASAGRANDE

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O SR. RENATO CASAGRANDE (PSB - ES Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs Senadoras, Srs Senadores,o nosso país passou por transformações profundas na política, na economia e na esfera social nos últimos 20 anos. Todas as mudanças, todavia, têm um traço em comum: foram realizadas dentro dos parâmetros estabelecidos na Constituição Federal promulgada no dia cinco de outubro de 1988 e que este ano está completando 20 anos de vigência.

Para o professor José Afonso da Silva, uma Constituição que foca os direitos fundamentais, como instrumento de proteção desses mesmos direitos.

Nesse período a Carta Magna sofreu 54 emendas, indicando a necessidade de mudanças que possibilitassem ao Brasil acompanhar a dinâmica dos movimentos políticos e econômicos pelo mundo. E revelou ainda enorme capacidade de se adaptar ao desenvolvimento e às conquistas sócio-econômicas processadas no nosso país.

Um título em especial me motiva a vir a esta tribuna e, conseqüentemente, a própria democracia. Refiro-me ao Título Oitavo, da Ordem Social, que no seu Capítulo seis, Artigo 225, trata do Meio Ambiente.

O referido dispositivo mostra como o constituinte de 88 teve uma visão equilibrada de um tema que se revelaria, 20 anos depois, tópico obrigatório nas agendas de governos e parlamentos pelo mundo a fora.

Diz o Caput do Artigo 225: “todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para presentes e futuras gerações”.

Não poderia ser diferente, tanto no plano nacional quando no internacional, a vigência do princípio da responsabilidade de todos, porque se está tratando de vida; da vida do planeta, da fauna e da flora, das nossas vidas e das futuras gerações.

Nesse aspecto sobressai a importância dos organismos internacionais e dos governos nacionais ao tratarem aspectos do meio ambiente, predominantemente do ponto de vista legal e não apenas moral.

Sr. Presidente,desde que aqui cheguei, há seis anos, tenho trabalhado as questões ambientais no Parlamento, inicialmente como deputado federal e agora completando o meu segundo ano de mandato como senador.

Foi assim durante todo o ano de 2007 e neste ano de 2008 na Comissão Mista de Mudanças Climáticas. Tem sido assim na Comissão de Meio Ambiente e nos embates nas demais comissões e no plenário, sempre que vem ao centro das discussões questões como desmatamento da Amazônia e dos demais biomas, a busca por energia e combustíveis renováveis e questões afeitas aos centros urbanos, como poluição, lixo, entre outros problemas surgidos na maioria das nossas cidades em decorrência da falta de planejamento urbano.

O tema do meio ambiente entrou para valer na agenda mundial no início do ano passado quando o IPCC, órgão das Nações Unidas, divulgou uma série de relatórios com previsões catastróficas sobre o futuro do planeta, em decorrência do efeito estufa. Desde então a ONU vem recomendando aos governos a adoção de políticas públicas de execução de curto, médio e longo prazo que amenizem os efeitos do aquecimento global e assegurem o desenvolvimento sustentado de suas economias.

As Nações Unidas chamaram a atenção de todos os governos, sobretudo dos mais ricos, que, por seu alto padrão de industrialização, são neste momento os vilões do Planeta, concorrendo diretamente para a destruição dos biomas e da degradação da qualidade de vida de todo o mundo, mas penalizando imediatamente os países pobres e num médio tempo os emergentes e os ricos.

Temos, ainda, muito a fazer na questão ambiental. O desmatamento ainda é um problema sério em nosso país, mesmo considerando os esforços do Governo para a sua redução. A expansão da fronteira agrícola é outra grave preocupação, já que é necessário que o crescimento econômico não se realize penalizando a preservação ambiental. Recentemente o CONAMA não foi capaz de fazer cumprir a resolução 315, que previa a utilização exclusiva do diesel S-50, em janeiro de 2009.

A indústria automobilística e a petrolífera foram as principais beneficiadas com o fato. Acontecimentos como esse são graves e dão aos cidadãos a idéia de que os poderosos conseguem se furtar de cumprir os esforços de preservação ambiental e de diminuição de emissão de gases de efeito estufa.  

Sr. Presidente,o cientista político José Alfredo Baracho Júnior entende que “os principais institutos consagrados no Artigo 225 da Constituição brasileira já faziam parte do nosso ordenamento jurídico antes da sua promulgação”. Mas ressalta que “estes institutos ganharam maior estabilidade, decorrente do princípio da supremacia da norma constitucional e do caráter rígido da Constituição brasileira”.

Em uma perspectiva mais ampla, muitos entendem que a Constituição é demasiadamente analítica, discorrendo detalhadamente sobre temas que não seriam propriamente constitucionais. Não penso que a Carta Magna seja, nesse particular, defeituosa. Ela é analítica e minuciosa em razão de um período histórico de transição de um regime ditatorial para outro democrático.

Havia forte demanda social por consagrar direitos e conformações institucionais relacionadas com certas ideologias na Constituição. Assim, na Carta Magna estão presentes muitos temas que, do ponto de vista ortodoxo, não deveriam estar ali constando. Entendo que isso é um fato positivo, pois permitiu a diversos grupos sociais terem suas demandas reconhecidas de forma definitiva na Lei Maior, o que trouxe pacificação e estabilidade política, com efeitos simbólicos e práticos diretos na governabilidade e na consolidação da democracia.

A Constituição precisa, entretanto, ainda ser mais firmemente regulamentada. Os direitos sociais ainda carecem de concretização. A redução das desigualdades sociais e regionais ainda é um desafio a ser vencido.

Temos de garantir condições de dignidade mínima dos cidadãos, temos de assegurar o crescimento econômico com distribuição de renda e oportunidades, bem como garantir um sistema de previdência justo e economicamente viável para nossos idosos. Tudo isso é um grande desafio que nos convida a abraçar a Constituição como ponto de partida para as transformações sociais necessárias para que o Brasil se torne uma sociedade realmente justa e solidária. 

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/11/2008 - Página 45081