Discurso durante a 220ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Protesto contra critérios utilizados pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça na concessão de indenizações milionárias aos supostos perseguidos políticos. Resultados da reunião da FAO - Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, realizado na cidade de Roma.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. POLITICA AGRICOLA.:
  • Protesto contra critérios utilizados pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça na concessão de indenizações milionárias aos supostos perseguidos políticos. Resultados da reunião da FAO - Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, realizado na cidade de Roma.
Publicação
Publicação no DSF de 22/11/2008 - Página 47050
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. POLITICA AGRICOLA.
Indexação
  • PROTESTO, CRITERIOS, COMISSÃO, ANISTIA, MINISTERIO DA JUSTIÇA (MJ), SUPERIORIDADE, INDENIZAÇÃO, VITIMA, PERSEGUIÇÃO, NATUREZA POLITICA, PERIODO, DITADURA, REGIME MILITAR, QUESTIONAMENTO, ATUAÇÃO, MEMBROS, GUERRILHA, AUSENCIA, DEFESA, DEMOCRACIA, APRESENTAÇÃO, DADOS, INJUSTIÇA, FAVORECIMENTO, REGISTRO, REPRESENTAÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), PEDIDO, REVISÃO, COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, EPOCA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ).
  • REGISTRO, REUNIÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A ALIMENTAÇÃO E AGRICULTURA (FAO), RECONHECIMENTO, PAIS INDUSTRIALIZADO, RESPONSABILIDADE, FOME, MUNDO, APOIO, PLANO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), COMENTARIO, AUMENTO, PREÇO, ALIMENTOS, MOTIVO, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, ELOGIO, DISCURSO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ESPECIFICAÇÃO, DEBATE, PROTECIONISMO, PRIMEIRO MUNDO, POLEMICA, UTILIZAÇÃO, ALCOOL, MATRIZ ENERGETICA, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS CARBONICO.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, no ano passado, ocupei esta tribuna para protestar contra os critérios, no mínimo discutíveis, utilizados pela Comissão de Anistia do Ministério da Justiça para conceder indenizações milionárias a supostos perseguidos políticos. Na ocasião, eu me referi especificamente ao caso do ex-capitão do Exército Carlos Lamarca, que desertou da corporação, roubou armas e participou de assassinatos, entre os quais o do tenente Alberto Mendes Júnior, que teve o crânio destruído a coronhadas por sua ordem.

Lamarca não escondia que sua luta não era pelo restabelecimento da democracia no Brasil, e, sim, pela troca de um regime totalitário por outro ainda pior. No comando de movimentos guerrilheiros como a Vanguarda Popular Revolucionária, Var-Palmares e Movimento Revolucionário 8 de Outubro, sua fonte de inspiração eram ditaduras comunistas como a que até hoje mantém o povo cubano na miséria.

Desertor, ladrão e assassino, Lamarca foi premiado com promoção póstuma ao posto de coronel do Exército, com vencimentos equivalentes aos de general de brigada, mais de R$11 mil mensais. Sua família também ganhou uma indenização de mais de R$900 mil, pelo efeito retroativo da decisão.

Essa foi uma das muitas decisões controversas da Comissão de Anistia. No final de 2006, ela concedeu indenização para uma integrante da própria Comissão de Anistia. Por decisão dos conselheiros, a arquiteta Beatriz Bargieri foi beneficiada com uma pensão vitalícia no valor de R$7.099,00, por ter sofrido perseguição política durante a ditadura militar. No mesmo dia, o processo do marido dela também foi deferido.

A revista Época, em reportagem intitulada “Anistia S.A.”, publicada na edição de 16 de junho, aponta casos semelhantes ao de Lamarca e diz que a lei das indenizações aos perseguidos pela ditadura “criou favoritos, consolidou desigualdades e já custou R$6, 4 bilhões aos cofres públicos”.

Essas indenizações milionárias atraíram a atenção do Tribunal de Contas da União. Em sua edição de quarta-feira (2 de julho), o jornal O Globo noticia que o Procurador-Adjunto do Ministério Público no TCU, Marinus Marsico, entrou com uma representação pedindo que o Tribunal reveja as indenizações com prestações mensais, permanentes e continuadas.

O Procurador argumenta que cabe ao TCU avaliar os cálculos e a concessão dos benefícios, comparáveis a uma pensão ou aposentadoria. O anistiado, diz ele, aufere os mesmos direitos e vantagens que o servidor público aposentado, e qualquer aposentadoria ou pensão passa pelo TCU.

De acordo com o Procurador, a análise dos processos pela Comissão de Anistia está entregue a terceirizados ou estagiários, já que ela tem apenas cinco funcionários públicos entre seus integrantes. É ele quem indaga: “Como entregar a análise de questões que afetam o patrimônio público a estagiários? Eles não têm direitos e garantias legais para trabalhar com isenção na defesa do patrimônio público”.

O Brasil é provavelmente o único, entre os países que conviveram com regimes ditatoriais, a transformar o acerto de contas com o passado numa indústria bilionária que beneficia um grupo restrito de privilegiados e comete injustiças flagrantes.

Jornalistas que não deixaram de trabalhar um só dia, ou que sofreram perdas financeiras mínimas durante os anos do regime militar, são premiados com indenizações de mais de R$1 milhão e pensões de até R$19 mil por mês. Já a viúva do jornalista Vladimir Herzog, torturado e morto em 1975, em São Paulo, recebeu R$100 mil de indenização em 1996. A viúva do operário Manoel Fiel Filho, outro que foi torturado até a morte, ganhou R$190 mil de indenização e uma pensão de seis salários mínimos.

Outro beneficiado, Diógenes Oliveira, ganhou uma indenização retroativa de R$400 mil e pensão mensal vitalícia de mais de R$1.600,00 depois de alegar que tinha perdido o emprego na estatal de energia elétrica do Rio Grande do Sul devido à “perseguição política”. Isso apesar de a empresa ter enviado um ofício à Comissão de Anistia desmentindo a alegação e informando que ele fora demitido por justa causa, devido a abandono de emprego.

Diógenes participou de vários atos terroristas, entre os quais o atentado contra o consulado dos Estados Unidos em São Paulo, em que Orlando Lovecchio teve uma das pernas amputada. Lovecchio ainda teve de provar que não tinha responsabilidade no atentado, e hoje recebe do governo R$571,00 por mês.

Não parece haver interesse em fazer justiça, e, sim, em favorecer quem dispõe de prestígio e influência suficientes para ser reconhecido como “vítima” e ganhar o prêmio de uma pensão vitalícia, isenta de Imposto de Renda. Levantamento publicado por Época ilustra a diferença entre as reparações aos perseguidos políticos no Chile, Argentina e Brasil. O primeiro gastou, até 2007, US$2,5 bilhões em benefícios concedidos a 100 mil pessoas. A Argentina, US$3 bilhões em benefícios para 15 mil pessoas. O Brasil, até 2008, US$4 bilhões em benefícios para 7 mil e 500 pessoas.

Tem razão o Procurador do Ministério Público ao questionar a validade das indenizações milionárias. Como diz a reportagem de Época, a democracia não fica mais sólida porque o Estado abre o cofre e permite às vítimas de um regime autoritário uma vingança financeira pelo que aconteceu décadas atrás. A democracia se fortalece pelo respeito a direitos e obrigações, pela solidez das instituições, pela seriedade no trato dos recursos públicos. Já a indústria das indenizações, uma verdadeira ação entre amigos, é um desrespeito ao povo brasileiro e aos valores democráticos.

O segundo assunto que trago à tribuna, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é que terminou há poucos dias, em Roma, a reunião da FAO, a Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação, que contou com a presença de vários líderes mundiais. Embora tenham sido poucos os resultados concretos do encontro, os países ricos, como França e Espanha, admitiram sua parcela de culpa pela fome que hoje constitui uma ameaça concreta para 850 milhões de pessoas e declararam seu apoio ao plano de ação lançado pela ONU para resolver a crise.

A França, por exemplo, anunciou investimentos de 1 bilhão de euros na África, durante os próximos 5 anos, e a Espanha pretende colocar à disposição das Nações Unidas 500 milhões de euros para serem aplicados em projetos que amenizem a crise alimentar nos países mais afetados.

Tudo indica que a era da comida barata chegou ao fim. De 2006 até hoje, os preços de todas as commodities agrícolas subiram em média 60%. O preço do arroz aumentou 250%, o do trigo 122%, o do milho e da soja 155%. As previsões para o futuro não são otimistas. A ONU, o FMI e muitos especialistas acreditam que os preços sofrerão oscilações durante algum tempo e depois se estabilizarão em níveis altos durante um período que pode variar entre 5 anos e uma década.

Acertou o Presidente Lula em seu discurso na reunião da FAO ao apontar uma série de fatores que contribuem para a inflação dos alimentos. Eles incluem a alta do petróleo, as mudanças cambiais, a especulação nos mercados financeiros, o aumento do consumo nos países em desenvolvimento e as quedas nos estoques mundiais. Incluído no rol dos culpados, há outro fator, não menos importante: as políticas protecionistas dos países ricos.

Virou moda entre as nações desenvolvidas culpar os biocombustíveis pela escassez de comida no mundo. A ONU teve o bom senso de substituir seu Relator Especial para o Direito ao Alimento, depois que este classificou a produção de biocombustíveis de “crime contra a humanidade”. Foram-se os delírios do Sr. Jean Ziegler, mas o lobby do petróleo na Europa permanece ativo contra o etanol brasileiro.

Além disso, o sucessor do Sr. Ziegler já anunciou que vai insistir com a União Européia para que abandone a meta de utilizar o etanol em 10% de sua frota de automóveis até 2020. É parte de uma estratégia energética para reduzir a dependência do petróleo e reduzir as emissões de dióxido de carbono.

Essa meta, entretanto, passou a sofrer ataques, inclusive de Ministros europeus. Alega-se que novas tecnologias de produção de petróleo permitiriam reduzir as emissões desse gás de efeitos nocivos sem recorrer ao etanol.

Ninguém sabe dizer quais são essas novas tecnologias, tão vagas quanto a perspectiva de que um dia possamos ter carros movidos a água. O fato é que a pressão contra a meta da União Européia ignora, convenientemente, que a expansão do uso de etanol pode ser atingida com o emprego de combustível importado, não com a produção local.

Utilizar as já escassas terras cultiváveis da Europa para o cultivo de fontes de etanol sem dúvida contribuiria para a alta nos preços dos alimentos. Mas se os países da União Européia abrissem seus mercados para o etanol brasileiro, eliminando barreiras injustificadas, estariam não só ajudando nosso país a gerar emprego e renda, como também abrindo perspectivas para outras nações em desenvolvimento, que passariam a se interessar pela produção de etanol.

É preocupante que uma retórica protecionista esteja ganhando força não só na Europa, mas também nos Estados Unidos. Ela torna mais distante a perspectiva de uma redução nas emissões de carbono e dificulta a redução da dependência dos combustíveis fósseis. Estamos cansados de saber que o protecionismo não leva a lugar algum, só ao agravamento de desigualdades. É o que acontecerá, se os países ricos persistirem no erro de fecharem seus mercados.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/11/2008 - Página 47050