Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 25/11/2008
Discurso durante a 222ª Sessão Especial, no Senado Federal
Celebração do centenário de morte de Machado de Assis.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Celebração do centenário de morte de Machado de Assis.
- Publicação
- Publicação no DSF de 26/11/2008 - Página 47636
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, CENTENARIO, MORTE, MACHADO DE ASSIS, ESCRITOR, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), FUNDADOR, ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL), ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, LITERATURA, BRASIL, MUNDO, REGISTRO, BIOGRAFIA, DIFICULDADE, CLASSE SOCIAL, LEITURA, OBRA ARTISTICA.
- COMENTARIO, INICIATIVA, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), DISPONIBILIDADE, OBRA LITERARIA, INTERNET.
- LEITURA, CARTA, AUTORIA, CIDADÃO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), MEDICO, POETA, ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, MACHADO DE ASSIS, ESCRITOR, APRESENTAÇÃO, OBRA ARTISTICA, HOMENAGEM, CENTENARIO, MORTE.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Exmº Sr. Senador Marco Maciel, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL) e de quem tão boa foi a iniciativa de promovermos hoje esta homenagem aos cem anos da morte de Machado de Assis; caro Deputado Federal Osmar Serraglio, 1º Secretário do Congresso Nacional; Srª Ana Cláudia Costa Badra, Coordenadora da Comissão Ano Cultural Arthur da Távola; Srªs Embaixatrizes de Cabo Verde e da Dinamarca; Srs. Embaixadores, Membros do Corpo Diplomático; Professor Antonio José Barbosa, Consultor Legislativo; senhoras e senhores, imortal, conforme o mestre Aurélio Buarque de Holanda afirma, quer dizer “que não morre; eterno, imorredouro”. A nós humanos, a imortalidade está nas obras que deixamos e nas ações que praticamos. Ao tratarmos das ações do amor e do coração, alcançamos aquilo que é sublime a toda a humanidade, deixando um legado para as gerações futuras. Esse é o caso de Joaquim Maria Machado de Assis, romancista, contista, poeta e teatrólogo, considerado um dos mais importantes nomes da nossa literatura.
Apesar da origem humilde e da saúde frágil, epilético e gago, Machado de Assis, filho de Francisco José de Assis, pintor de paredes e descendente de escravos alforriados, e de Maria Leopoldina Machado, lavadeira portuguesa na Ilha de São Miguel, foi responsável por uma das maiores produções literárias brasileiras e se tornou um dos grandes intelectuais do País ainda jovem. Sua extensa bibliografia compreende nove romances, duzentos contos, uma dezena de peças de teatro, cinco coletâneas de poemas e milhares de crônicas.
A emoção toma conta daqueles que lembram da vida e detalhes dos romances desse importante escritor brasileiro. Gênio e autodidata, Machado era um daqueles iluminados que fundaram a ABL. Ele conseguiu conciliar as aulas com a venda de doces, não tendo acesso a cursos regulares. Superou sua situação social e histórica, para criar uma ficção universal. Suas obras apresentam uma rica descrição de detalhes e de movimentos, fazendo o leitor se misturar a seus personagens.
Em 1869, casou-se com a portuguesa Carolina Augusta Xavier de Novais, irmã do poeta Faustino Xavier de Novais e quatro anos mais velha. Viveram juntos até 1904, quando Carolina morreu. Machado, então, escreveu um de seus melhores poemas, “Carolina”, em homenagem à falecida esposa. Muito doente, solitário e triste depois da morte da mulher, Machado de Assis faleceu em 29 de setembro de 1908, em sua velha casa no bairro carioca do Cosme Velho.
Machado, como todos os autores do gênero, escapa aos limites de todas as escolas, criando uma obra única. Um de seus livros mais famosos, Memórias Póstumas de Brás Cubas, marca o início do Realismo no Brasil. O livro, extremamente ousado, é narrado por um defunto e começa com uma dedicatória inusitada: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas Memórias Póstumas”.
Machado de Assis é considerado um dos cem maiores gênios da literatura de todos os tempos, ao lado de clássicos como Dante, Shakespeare e Cervantes.
Atualmente, toda a obra de Machado de Assis é de domínio público. O Ministério da Educação (MEC) disponibilizou suas 243 obras na Internet, em edições digitais, confiáveis e gratuitas, no endereço www.portal.mec.gov.br/machado.
Por meio de sua obra, Machado de Assis cruzou fronteiras d’além mar e se tornou imortal com seus escritos e exemplo de superação.
Todos os dias, vemos depoimentos de pessoas que estão ainda comovidas com cada aspecto de seu trabalho.
Ainda hoje, recebi uma carta de André Augusto Passari, que diz:
É com muito respeito e admiração ao senhor que venho tratar de um tema muito especial para mim: os cem anos da morte de Machado de Assis.
[...]
Minha relação com Machado de Assis iniciou-se na adolescência, com a leitura de suas obras. Logo ele se tornou uma figura modelo para mim, não só pelos seus textos, mas também pela sua pessoa. Pode parecer estranho, mas, em minha adolescência, via em Machado de Assis um espelho de personalidade ao qual me mirar. Provavelmente o que mais me atraía em sua figura era o seu recato e honradez. Sendo eu um rapaz tímido, me agradava a figura de um gigante da literatura resguardado em sua vida pessoal, não afeito a grandes badalações. Me enfeitiçava a imagem de um homem solitário, que ultrapassou adversidades imensas, e lapidou, com persistência e paciência, o seu labor literário. O amor à Literatura. A crença na palavra. Também me encantava a reclusão com sua Carolina, um amor do qual não sabemos muitas intimidades, mas que sempre me pareceu belo, calmo e honrado. Lembro que nos meus 16 ou 17 anos costumava perguntar aos meus colegas qual grande personalidade da história eles gostariam de conhecer. Fazia essa pergunta só para depois responder que o meu sonho era conhecer Machado de Assis.
Foi, sem dúvida, o meu primeiro grande mestre, alguém com quem até hoje dialogo quando me ponho a filosofar ou a escrever. Depois, outros grandes mestres apareceram, mas Machado de Assis sempre ocupará a posição de ter sido o primeiro.
André Augusto Passari, médico psiquiatra em Ribeirão Preto, escreve uma poesia em homenagem a Machado. Trata-se de um brasileiro que, como muitos outros, vibra com os escritos de Machado de Assis. Diz ele:
O Mago da Ironia
Lá se vão cem anos, e quanta solidão!
De lá para cá, o ser humano
Esse espectro frágil de qualquer coisa que seja Deus
Tropeçou em suas próprias armadilhas e se perdeu
Por isso, com a mesma ironia
E em memória àquele que um dia iluminou essa escuridão
Dedico estes versos, pobres e insuficientes versos
Mas que dão mote à grandeza do nome sobre o qual verso
Antes do mais, perdoe-me o engano
Não, não é um espectro frágil o ser humano
É antes o próprio ideal trágico de um sonho infeliz e patético
Uma gargalhada profunda de um Deus incrédulo e imagético
Mas vá lá, voltemos ao nosso mote
E à homenagem ao grande Cavaleiro das Letras
Fundador da Academia Brasileira de Letras
E que nos inspira em vida e em morte
Joaquim Maria Machado de Assis
Ou somente Machado de Assis
Não era mesmo para ser o orgulho da pátria
Estava mais para um néscio ou um pária
Mulato pobre, gago, órfão, epilético e sem estudo
Tornou-se logo entre todos o mais culto
E contrariando a ordem lógica do mundo
Inverteu a lógica, o real e o oculto
Enxergou como ninguém a alma humana
E a revelou com a elegância de uma arte grega ou romana
Mas o fez com tal sinceridade
Que até parece crueldade
É que o homem vive numa crise de identidade
Ante o bem e o mal, a dualidade.
Homenageado com honras em seu velório
Machado de Assis nunca foi um simplório
Sabia que a vida é um desafio complexo
E que só com maestria e valentia é que faz nexo
Por isso aproveitou a ironia de ter nascido pobre
Para morrer com a insígnia de um espírito nobre.
(André Augusto Passari)
Gostaria, Sr. Presidente, de encerrar minhas palavras com as palavras de uma das mais saborosas poesias de Machado de Assis:
Condão
Uns olhos me enfeitiçaram,
Uns olhos... foram os teus.
Falaram tanto de amores
Embebidos sobre os meus!
Eram anjos que dormiam
Dessas pálpebras à flor
Nas convulsões palpitantes
Dos alvos sonhos de amor.
Foi à noite... Hora das fadas;
Bem lhes sentira o condão;
Mas refletiam tão puras
Os sonhos do coração!
Como ao sol do meio-dia
Dorme a onda à flor do mar,
Eu dormi, - pobre insensato,
Ao fogo do teu olhar...
Pobre, doida mariposa,
Perdi-me... - pecados meus!
Na chama que me atraía,
No fogo dos olhos teus.
Venci protestos de outrora,
Moirei no teu alcorão,
E vim purgar nesses olhos
Pecados do coração.
Pois bem hajam os teus olhos,
Onde um tal condão achei:
Doido inseto em torno à chama,
Todo aí me queimarei.
Muito obrigado.
Meus cumprimentos ao Senador Marco Maciel! (Palmas.)
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