Pronunciamento de João Pedro em 10/12/2008
Discurso durante a 234ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Homenagem pelo transcurso, hoje, dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
- Autor
- João Pedro (PT - Partido dos Trabalhadores/AM)
- Nome completo: João Pedro Gonçalves da Costa
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
SENADO.
DIREITOS HUMANOS.:
- Homenagem pelo transcurso, hoje, dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.
- Aparteantes
- Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 11/12/2008 - Página 50713
- Assunto
- Outros > SENADO. DIREITOS HUMANOS.
- Indexação
-
- SAUDAÇÃO, PRESENÇA, SENADO, PAULO DELGADO, EX-DEPUTADO.
- HOMENAGEM, ANIVERSARIO, CRIAÇÃO, DECLARAÇÃO, AMBITO INTERNACIONAL, DIREITOS HUMANOS, DETALHAMENTO, ARTIGO, ANALISE, HISTORIA, BRASIL, MUNDO, DESRESPEITO, DOCUMENTO, IMPORTANCIA, LUTA, CONSCIENTIZAÇÃO, APLICAÇÃO, DIRETRIZ, JUSTIÇA, PAZ, DIGNIDADE.
- ANALISE, CONTINUAÇÃO, CONFLITO, NATUREZA SOCIAL, MUNDO, OPOSIÇÃO, IDEOLOGIA, CAPITALISMO, SOCIALISMO, REPUDIO, DECISÃO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), FAVORECIMENTO, INTERVENÇÃO, AÇÃO MILITAR, DESRESPEITO, DIREITOS HUMANOS, RETROCESSÃO, GUERRA, DEFESA, REFORÇO, ACEITAÇÃO, TRIBUNAIS SUPERIORES, MATERIA PENAL, AMBITO INTERNACIONAL.
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. JOÃO PEDRO (Bloco/PT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, no início de meu pronunciamento pelo dia 10 de dezembro, uma data mundial, quero me associar às palavras do Senador Arthur Virgílio acerca de Paulo Delgado, um membro inesquecível do Congresso Nacional, que honrou não só o Congresso, mas, acima de tudo, a história deste nosso Partido, o PT... Mas não conseguiu, é uma convicção inabalável...
Não poderia deixar de registrar as minhas considerações sobre a importância da Declaração Universal dos Direitos Humanos, que completa 60 anos de existência nesta data, 10 de dezembro.
O preâmbulo e os trinta artigos desse documento referem-se aos mais elevados fundamentos da existência humana, tais como: a garantia do direito à vida, à liberdade, à fraternidade e à segurança pessoal; a proibição da escravidão, da servidão e do tráfico de escravos; a condenação à tortura, ao tratamento e ao castigo cruel, desumano ou degradante; e o resguardo do direito de todo ser humano ser reconhecido como pessoa; garantias judiciais e processuais, exigência de que os tribunais sejam independentes e imparciais, presunção de inocência, direitos de ampla defesa, proibição da prisão arbitrária e da condenação por crime não previamente definido e com pena previamente estabelecida; defesa da privacidade, liberdade de locomoção e residência, do asilo, nacionalidade, casamento e da propriedade; garantia da liberdade de opinião, expressão, reunião, associação, participação na vida política e da origem popular do poder.
Se refletirmos sobre a história recente do Brasil, vamos ver como essa regra universal foi contrariada.
Segue: garantia da segurança social, dos direitos econômicos e culturais, assim como a proteção do trabalho e do trabalhador e de um padrão de vida digno; garantia da instrução e participação na vida cultural, a uma ordem social e internacional que assegure a efetiva vigência dos direitos humanos, bem como dos deveres para com a comunidade; e, finalmente, aqueles que estabelecem a cláusula proibitiva da invocação da Declaração Universal para fraude a ela própria.
Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, gostaria certamente de ocupar esta tribuna para celebrar o cumprimento de todos os direitos e deveres determinados por esse importante e histórico documento elaborado pela Organização das Nações Unidas (ONU) para aperfeiçoar a convivência humana.
Infelizmente, o regozijo pleno ainda não será dessa vez. O mundo viveu, nesses últimos 60 anos, muitas tragédias sociais e guerras que empanaram a luta dos que agem pela paz, pela justiça, pela liberdade, pela fraternidade e pela solidariedade.
Mas é prudente reconhecer, de igual modo, que os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos estimularam a consciência de pessoas e de povos a reprovar os atos que sinalizaram o retrocesso à barbárie.
Por isso, a comunidade mundial reconhece que esse compromisso em torno dos direitos humanos universais agrega forças que se contrapõem à degradação da pessoa humana e da vida de um modo geral.
Lembro-me de que foi elaborada e promulgada no rescaldo da Segundo Guerra Mundial, no momento em que a humanidade se questionava a respeito das atrocidades das quais havia sido vítima mais uma vez. O propósito desse documento reflete, de certo modo, uma rejeição à repetição da guerra que se encerrava aos seus efeitos e também manifesto desejo de que, por intermédio de uma nova ética universal, haveríamos de construir um mundo mais justo.
É claro, haveremos de construí-lo. Esse é um processo longo, duradouro, mas cheio de muita esperança.
Está claro que a Declaração Universal dos Direitos Humanos é movida por utopias. Aliás, utopias inerentes à existência humana. Inúmeros tratados e cartas haviam anteriormente demonstrado o desejo de uma convivência universal respeitosa e harmoniosa. Mesmo assim, os princípios dessa carta se constituem em avanço notável, porque, pela primeira vez, foram estabelecidos os direitos universais para todos os povos, independentemente do credo, da cor, do gênero ou da raça.
É isso o que expressa o art. 1º, Srªs e Srs. Senadores: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns com os outros em espírito de solidariedade”.
Esse artigo resume a grande utopia do prevalecimento dos direitos humanos universais sobre a vontade particular de pessoas, grupos, instituições e, principalmente, sobre a vontade de governantes autoritários. Essa utopia existirá enquanto existir a insensatez, a intolerância e a injustiça. Essa utopia vai durar enquanto os princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos não se transformarem em ações que impeçam a violência contra a dignidade humana. Talvez estejamos longe desse momento, mas nem esse receio que nos vem da realidade das guerras, da desigualdade social e das políticas neocolonialistas deve nos esmorecer na luta por melhores dias.
A força dos direitos humanos universais se expressa de inúmeras formas e se constitui em política global.
Sabe-se, por exemplo, que esse documento está disponível em mais de trezentos idiomas, e que ele inspirou a Constituição de várias países, inclusive a Constituição Cidadã brasileira, de 1988. Existe, de igual modo, uma vasta rede de instituições governamentais e não governamentais agindo pela aplicação e consolidação dos princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos em todo o mundo. O resultado desse feito configura-se nos relatórios que denunciam o desrespeito e a violência contra a pessoa e contra a natureza em vários países ou em escala global.
Estou certo, Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de que a Declaração Universal dos Direitos Humanos é uma idéia de convergência de todos os esforços para que tenhamos um mundo mais solidário, mais fraterno e de paz duradoura. Ela é a sinergia da humanidade capaz de agrupar todas as utopias que almejam as mudanças de atitude necessárias à continuidade da vida neste Planeta. Para reconhecer esse fato, basta olharmos para os inúmeros tratados internacionais de direitos políticos, econômicos, sociais, culturais dos trabalhadores migrantes, das mulheres e das crianças. Em menor ou maior grau, todos têm alguma referência ou algumas das preocupações suscitadas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Tantos tratados decorrem de novos problemas na ordem mundial ou no âmbito de países ou entre países, mas eles estão longe de atestar a ineficiência ou a fragilidade dos princípios da Declaração Universal dos Direitos Humanos. É mais correto reconhecê-los como obra do engajamento gerado pela necessidade de uma nova ética universal em razão do solapamento da dignidade humana pelas atrocidades e horrores da Segunda Guerra Mundial. A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi a precursora desse desejo de vigilância permanente contra a violação dos direitos coletivos e individuais, seja em âmbito local, regional ou em escala planetária.
O mundo, por sua vez, não se livrou das tensões e dos conflitos sociais beligerantes do pós-guerra. O reordenamento geopolítico mundial, baseado principalmente no confronto ideológico entre o capitalismo e o socialismo, gerou problemas e situações de instabilidade política, social e econômica em diferentes lugares.
O desmoronamento do principal bloco socialista, a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, em 1991, que chegou a ser compreendido como o fim da história, não atenuou as mazelas do mundo. Em vez disso, deflagrou guerras regionais, migração, desemprego e fome. Todos esses problemas são tão graves quanto o autoritarismo atribuído ao socialismo soviético e seus congêneres.
O capitalismo, por sua vez, está aquém de promover uma verdadeira igualdade social e econômica que sustente os esteios dos fundamentos da dignidade humana, como o direito ao emprego, à moradia, à educação e ao lazer. A globalização, orientada pelo apetite do mercado, privilegia a economia a favor dos países ricos em prejuízo dos demais setores da vida cotidiana nos países pobres.
A cada dia fica mais visível que o capitalismo é um modo de produção excludente por excelência. O exemplo está diante de todos nós, que é essa crise que, embora criada na economia norte-americana, terá conseqüência mundial e será mais cruel com os pobres. Inclusive com os pobres e empobrecidos dos países ricos, haja vista o desemprego nos Estados Unidos. Os Estados Unidos - observem V. Exªs - possuem hoje mais de quinhentos mil desempregados.
Bem observados, os anseios da Declaração Universal dos Direitos Humanos estão além daquilo que o socialismo ou o capitalismo que conhecemos ofereceram até agora à humanidade. A minha formação política e a minha convicção biológica apontam que o mundo precisa de uma experiência nova, de um socialismo que supere o capitalismo e corrija as suas próprias experiências históricas. Uma nova etapa baseada na igualdade, na justiça social e não mais na exploração exacerbada da classe trabalhadora em benefício de poucos.
É isso, no meu entendimento, que almeja a Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Minha avaliação, Srªs e Srs. Senadores, é de que a Declaração dos Direitos Humanos não pode ser vista como um ato estático. Em vez disso, trata-se de um documento aberto às mudanças e às transformações, ao progresso do ser humano na sua busca de superação dos seus problemas. Por isso, cabe-nos descobrir e apresentar sugestões decorrentes da experiência histórica que possam ser colocadas em ação e, com isso, ultrapassar conquistas e desafios da própria Declaração dos Direitos Humanos.
Neste pronunciamento, quero enfatizar que virtude da Declaração Universal dos Direitos Humanos não deveria ser profanada por decisões da ONU, a favor de intervenções militares em diversos países. Infelizmente, essa instituição multilateral tem agido sob pressão dos países que detêm a hegemonia política, econômica e militar. Esse tipo de autorização não conta com o apoio da opinião pública mundial, nem poderia contar, porque a intervenção militar e a guerra representam um retrocesso às aspirações pontuadas pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esse é um problema que precisa ser resolvido. Ele exige esforços planetários, uma vez que a hegemonia econômica, política e militar resulta da concentração de riquezas em poucos países e a acumulação de riquezas causa desequilíbrio social e desigualdade entre os povos. Esse é um cenário real para a estupidez e para a arrogância.
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi criada para combater esse estado de agressão aos humanos e aos demais seres vivos do planeta. A persistência dos entulhos, da ignorância, da ganância e da mesquinhez humana encobre até avanços retumbantes, como é o caso do Tribunal Penal Internacional - TPI, que representa a possibilidade de uma justiça de abrangência internacional para situações excepcionais. Essa Corte ainda enfrenta restrições que precisam ser vencidas, para que autores de genocídios, de crimes de guerra e crimes contra a humanidade não escapem da Justiça. Essa é outra questão que requer, também, empenho da comunidade internacional.
Congratulo-me, portanto, com todas as pessoas e instituições que lutam pela prevalência dos direitos humanos sobre todas as formas de constrangimentos à existência humana ou ataque à vida do planeta.
Participo da idéia de que cada um de nós deve renovar, todos os dias, as nossas esperanças em um mundo melhor. Se agirmos assim, o medo, a violência e as angústias jamais suplantarão a nossa capacidade de sonhar.
Por fim, Srs. Senadores, parabenizo o Governo do Presidente Lula pela criação de políticas públicas de inclusão social, de combate ao trabalho escravo, à violência sexual, ao tráfico de pessoas, à exploração do trabalho infantil e às demais formas de subtração da decência, da decência humana.
Concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy,
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador João Pedro, quero cumprimentá-lo pelo seu pronunciamento hoje neste sexagésimo aniversário da Declaração dos Direitos Humanos, e também pela análise que faz dos avanços que têm sido colocados em prática pelas diversas políticas do Governo do Presidente Lula, com o reconhecimento de que ainda temos muito por fazer. Gostaria de dar-lhe uma informação relevante sobre o julgamento do Supremo Tribunal Federal, que, desde cedo, V. Exª e eu estamos acompanhando, pois, neste instante, dos onze votos, já são oito favoráveis a que a Reserva Raposa Serra do Sol seja considerada contínua, confirmando, portanto, a decisão do decreto que definiu a Reserva Raposa Serra do Sol. Assim já votaram, além do Ministro-Relator Carlos Ayres Britto, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Eros Grau, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, e acredito que esse resultado, até o final da tarde, será consolidado. Meus cumprimentos, portanto, a V. Exª.
O SR. JOÃO PEDRO (Bloco/PT - AM) - Obrigado pelo aparte, que enriquece a minha reflexão, e obrigado pela boa nova, pela notícia dessa decisão do Supremo. É mais do que uma vitória dos povos indígenas. É um avanço, uma vitória do Estado brasileiro em reconhecer as etnias, em reconhecer os povos indígenas que compõem a pluralidade, a riqueza cultural e esse povo tão bonito, que é o povo brasileiro.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Foi encerrada a sessão. A matéria continuará no Supremo Tribunal Federal noutro dia, porque houve pedido de vista por parte do Ministro Marco Aurélio. Só para completar a informação, houve oito votos favoráveis.
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