Discurso durante a 237ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Leitura do pronunciamento que S.Exa. faria durante a décima primeira Conferência Nacional dos Direitos Humanos, que se realiza hoje, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Balanço do trabalho realizado por S.Exa. no ano de 2008.

Autor
Paulo Paim (PT - Partido dos Trabalhadores/RS)
Nome completo: Paulo Renato Paim
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. ATUAÇÃO PARLAMENTAR. PREVIDENCIA SOCIAL.:
  • Leitura do pronunciamento que S.Exa. faria durante a décima primeira Conferência Nacional dos Direitos Humanos, que se realiza hoje, no Centro de Convenções Ulysses Guimarães. Balanço do trabalho realizado por S.Exa. no ano de 2008.
Aparteantes
Mão Santa.
Publicação
Publicação no DSF de 16/12/2008 - Página 52247
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. ATUAÇÃO PARLAMENTAR. PREVIDENCIA SOCIAL.
Indexação
  • JUSTIFICAÇÃO, AUSENCIA, ORADOR, CONFERENCIA NACIONAL, DIREITOS HUMANOS, MOTIVO, PARTICIPAÇÃO, DEBATE, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, COTA, UNIVERSIDADE, NEGRO, INDIO, POPULAÇÃO CARENTE.
  • LEITURA, PRONUNCIAMENTO, ORADOR, CONFERENCIA NACIONAL, COMENTARIO, ANIVERSARIO, DECLARAÇÃO, AMBITO INTERNACIONAL, DIREITOS HUMANOS, DEFESA, NECESSIDADE, TRANSFORMAÇÃO, DIA INTERNACIONAL, DEBATE, CRIAÇÃO, POLITICA, SETOR PUBLICO, MUNDO, MELHORIA, QUALIDADE, SERVIÇO DE SAUDE, EDUCAÇÃO, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, COMBATE, MISERIA, FOME, DESEMPREGO, APRESENTAÇÃO, TRECHO, OBRA LITERARIA.
  • COMENTARIO, BALANÇO ANUAL, ATUAÇÃO PARLAMENTAR, ORADOR, REGISTRO, EMPENHO, REALIZAÇÃO, REUNIÃO, AUDIENCIA PUBLICA, CRIAÇÃO, PROJETO, BENEFICIO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL (RS), ELOGIO, TRABALHO, BANCADA, REGIÃO, REITERAÇÃO, NECESSIDADE, REDUÇÃO, TRIBUTAÇÃO, VINHO, AMBITO NACIONAL, SAUDAÇÃO, APROVAÇÃO, SENADO, MATERIA, EXTINÇÃO, FATOR, NATUREZA PREVIDENCIARIA, RECUPERAÇÃO, VALOR, APOSENTADORIA, VINCULAÇÃO, BENEFICIO PREVIDENCIARIO, REAJUSTE, SALARIO MINIMO, MOBILIZAÇÃO, SENADOR, DEFESA, APOSENTADO.
  • CONGRATULAÇÕES, SANÇÃO, PROJETO, CRIAÇÃO, DIA NACIONAL, LUTA, COMUNIDADE INDIGENA, PESSOA PORTADORA DE DEFICIENCIA, DEFINIÇÃO, NORMAS, MELHORIA, ENTENDIMENTO, CONTRATO, ADESÃO.
  • SAUDAÇÃO, OPORTUNIDADE, ATUAÇÃO, ORADOR, QUALIDADE, PRESIDENTE, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, COMBATE, INJUSTIÇA, DISCRIMINAÇÃO, OBJETIVO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, POPULAÇÃO, AGRADECIMENTO, EMPENHO, SENADOR, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA.
  • REGISTRO, SOLICITAÇÃO, DEPUTADO FEDERAL, PRESENÇA, GRUPO, SENADOR, ASSEMBLEIA LEGISLATIVA, ESTADO DO CEARA (CE), REALIZAÇÃO, DEBATE, SITUAÇÃO, APOSENTADO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Senador Papaléo Paes, que preside a sessão, e Senador Neuto De Conto, que está no plenário neste momento, sou o primeiro orador inscrito e quero dar uma pequena justificativa da minha pressa.

         Hoje, Sr. Presidente, eu deveria estar no Centro de Convenções Ulysses Guimarães para participar da 11ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos. Não estarei lá, porque hoje a CCJ vai discutir, a partir das 14h30, a questão da universidade e as cotas, que incluem negros, brancos, índios e pobres. Devido a isso, Sr. Presidente, o discurso que eu iria fazer lá, com a presença do Presidente da República e do Ministro Paulo Vannuchi, farei aqui da tribuna do Senado, porque a Conferência vai se iniciar às 15 horas, quando vamos debater na CCJ.

Sr. Presidente, inicia-se hoje a 11ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos. Não poderei estar na abertura - tinha sido convidado para fazer uso da palavra -, porque vou participar aqui, na CCJC, do debate do projeto de cotas nas universidades, da nobre Deputada Nice Lobão, do Democratas. Assim, Sr. Presidente, farei meu pronunciamento desta tribuna, como se lá, na conferência, eu estivesse.

Excelentíssimo Senhor Presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva; Exmº Sr. Ministro da Secretaria de Direitos Humanos, Paulo Vannuchi; Exmº Sr. Presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara dos Deputados, Deputado Pompeo de Mattos, senhoras e senhores convidados a participar deste tão importante evento, que marca época dentro de seu tempo. Afinal, hoje, a 11ª Conferência Nacional dos Direitos Humanos realiza-se sob a simbologia dos 60 anos da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

Meus amigos e minhas amigas que estão no plenário, cerca de 1.500 pessoas, segundo informações que recebi dos organizadores deste importante evento, é a vocês que, neste momento, eu dirijo as minhas palavras. Cada um de nós, independente de nossas idades, podemos perceber que, com certeza, avançamos no que diz respeito aos direitos humanos, principalmente após a assinatura da Declaração Universal dos Direitos Humanos, a qual completou, neste último dia 10, seus 60 anos de idade. Porém, é preciso, com certeza, avançar mais, muito mais.

Também, cada um de nós tem conhecimento ou já presenciou, já assistiu a barbáries contra os povos, como, por exemplo, contra as crianças, as mulheres, a liberdade de crença, a livre orientação sexual, os idosos, os índios, os pobres, os negros. Infelizmente, essas barbáries ainda permanecem. Infelizmente, elas continuam ainda acontecendo.

Quantas guerras, quantos governos ditatoriais, quanta fome, quanta miséria, quanta agressão à natureza! Ações fruto da irresponsabilidade e da violência, infelizmente, dos homens.

Senhoras e senhores, o desejo de mudar esse cenário, de acabar com as injustiças, de transformar cada recanto em um lugar melhor para se viver é o que nos une aqui, neste momento. Com certeza, Sr. Presidente, esse desejo existe em todas as partes do mundo. Mesmo em lugares onde os direitos humanos não são respeitados, com certeza existe quem lute e até perca a vida por eles. Sempre foi assim e certamente será dessa forma. A luta pelos direitos humanos é permanente.

O nosso País, com a volta da democracia e o fim da ditadura, deu um passo importante no sentido da justiça, da igualdade e da liberdade.

Sr. Presidente, por uma questão de justiça, retorno a minha fala ao passado, que, embora pareça distante, continua vivo. Retorno ao passado para destacar a luta em defesa dos direitos humanos de pessoas como Zumbi, Sepé Tiaraju, Irmã Dulce, Betinho, Chico Mendes e tantos outros homens e mulheres cujas vozes ecoam no tempo, atravessam fronteiras em favor daqueles que nem sempre têm voz.

Como o nosso olhar é universal, citamos, com orgulho, as figuras daqueles que entraram para a história como grandes defensores dos direitos humanos. Destaco aqui Madre Tereza de Calcutá, Gandhi, Luther King e aquele que para mim é o maior líder vivo na luta pelos direitos humanos, Nelson Mandela. Pessoas que doam ou doaram sua vidas em defesa das vidas de tantos outros.

Meus amigos, tomo a liberdade, neste fórum, de dizer como seria bom se o dia 10 de dezembro deixasse de ser somente um dia para homenagear a Declaração Universal dos Direitos Humanos e passasse a ser o primeiro feriado internacional. Um dia em defesa da vida, da dignidade, da qualidade de um viver e envelhecer num mundo em que todos tenham o direito à solidariedade, à igualdade e à liberdade. Um dia, somente um dia, para debater o desemprego, a fome, a educação, a saúde, a habitação, o saneamento básico, a humanização dos presídios e de tantas outras formas de viver com dignidade.

Imaginem os senhores e as senhoras que maravilha seria se, no próximo dia 10 de dezembro, no ano que vem, o mundo parasse por 24 horas para discutir políticas de paz, pra discutir o fim definitivo das guerras! Que bom seria se em cada 10 de dezembro o mundo parasse para cantar e celebrar a solidariedade entre os povos! Que bonito seria se as pessoas das mais diversas origens, culturas, etnias e religiões debatessem e trocassem idéias que apontassem para a construção de um mundo melhor para todos!

Ah, seriam inesquecíveis os 10 de dezembro! Negros, brancos, índios, orientais, enfim, todos estariam nesse dia debatendo políticas públicas a serem adotadas em todos os países do mundo.

Que bom seria se nos dias 10 de dezembro surgissem, da interação entre os povos, uma amizade permanente e a conseqüente derrubada de todos os preconceitos!

Temos a convicção de que os debates promovidos em um único dia, no mundo todo, numa única nota, nos levarão ao fim da pena de morte, dos assassinatos, das torturas, dos cárceres onde as pessoas são tratadas como se não fossem seres vivos.

Insisto em como seria interessante se, nos dias 10 de dezembro, líderes de todo o planeta, de todas as nações discutissem a importância da saúde, da alimentação, do meio ambiente, da água e do combate à miséria.

Dez de dezembro. Nesse dia, todos teriam como mandamento pensar no papel que cada um tem em defesa de uma sociedade efetivamente humanitária.

Dez de dezembro. A forma de pensar do mundo será alterada. Veremos, nesse dia, judeus e palestinos falando em paz e em harmonia. Veremos as Coréias unidas, num único linguajar, num único tom, embaladas pela mesma música.

Dez de dezembro. Os monges tibetanos teriam conquistado o seu espaço, em harmonia com o povo chinês. A independência tão sonhada seria uma realidade. Nesse dia, todas as divergências religiosas e étnicas seriam coisa de um passado triste.

Senhores e senhoras, falando em monges budistas, recordo-me de que, há algum tempo, li um texto budista que dizia que uma gota de água carrega em si a essência dos oceanos. Porém, só, ela é simplesmente uma gota, sujeita a evaporar a qualquer momento. Diz ainda o texto que, se essa gota for jogada no oceano, imediatamente ela se torna esse oceano.

Vamos juntar, no dia 10 de dezembro, as gotas espalhadas pelo mundo e formar um imenso oceano de luta pelos direitos humanos. Um oceano humano no qual predominem as mais diversas formas e cores, as múltiplas culturas, os mais distintos idiomas...

Uma imensidão de todas as idades, gêneros e crenças debatendo como cada pessoa, mesmo dentro de sua casa, pode contribuir para fazer do mundo um lugar melhor para se viver.

Dez de dezembro poderia ser a estrela maior a iluminar todos os lares do planeta, nos cinco continentes.

Sr. Presidente, se dependesse de mim, no dia 10 de dezembro, a humanidade pararia para ler e incorporar à sua vida o que está disposto no Os Estatutos do Homem, do poeta Thiago de Mello.

           Thiago Mello escreveu, em 1964, em Santiago, no Chile, o texto que contém treze importantes artigos, dos quais aqui destaco um. Repito: Thiago de Mello é brasileiro.

Diz ele:

Fica decretado que o homem não precisará nunca mais duvidar do homem. Que o homem confiará no homem como a palmeira confia no vento, como o vento confia no ar, como o ar confia no campo azul do céu.

Sr. Presidente, como sou apaixonado por esse texto, escrito por Thiago de Mello, eu o deixo aqui, na íntegra, com seus treze artigos. Destaquei o quarto e vou para o final do pronunciamento que teria feito na Convenção.

Artigo final

Fica proibido o uso da palavra liberdade, a qual será suprimida dos dicionários e do pântano enganoso das bocas.

A partir deste instante a liberdade será algo vivo e transparente como um fogo ou um rio, e a sua morada será sempre o coração do homem.

           Senhoras e senhores, sei que alguém poderia dizer que essa minha proposta, essa minha idéia, é um sonho. Bem, sou daqueles que acreditam nos sonhos. Acreditamos que a conquista de nossos sonhos depende exclusivamente de nós. Por isso, que todos tenhamos esse sonho coletivo de um mundo em que a paz seja uma constante e no qual o viver seja mais humano, igualitário e justo para todos!

Vida eterna à Declaração Universal dos Direitos Humanos!

Dez de dezembro, um dia para pensar, para amar, para se doar ao próximo.

Vida eterna aos ideais que norteiam a caminhada de todos aqueles que dedicam suas vidas a tão importante causa!

Dez de dezembro, essa data é universal, esse sonho pode, sim, se tornar realidade.

Sr. Presidente, nos últimos seis minutos de que ainda disponho pelo tempo regimental, já que este era o pronunciamento que eu faria na Convenção e, por ter que participar de um debate às 14h30, fiz aqui, gostaria de fazer o pronunciamento programado para o dia de hoje.

Vou fazer um pequeno balanço da nossa atividade neste ano. Por isso, Srªs e Srs. Senadores, peço licença, e licença pede atenção. Hoje, faço um pequeno balanço do que foi nosso trabalho no ano de 2008. Falarei sobre os dias que nem o tempo esquece.

Quando tenho oportunidade, sempre digo que o exercício legislativo é semelhante em muito ao ato de abrir uma picada na mata fechada em busca de um rio com águas límpidas e caudalosas. Primeiro, tem que se gostar do que se faz. Segundo, tem que se estar bem aparelhado, com ferramentas afiadíssimas, senão não se limpa a picada. E, por fim, tem que ter o respaldo de quem passou o esquadro e o nível, para uma boa estrada.

Pode ser arte, quem sabe, ofício; pode ser sina, outrossim destino. Mas, se não tiver no alforje coerência e paixão como virtudes maiores, de nada terá adiantado pisar na colinas verdejantes e ir ao encontro da picada tão sonhada.

Comungo com o poeta de cabelos brancos e faço de algumas de suas simples palavras um pouco do caminho que até agora percorri, que todos nós percorremos. Diz o poeta: “O que mata a sede é a água; não o copo”.

Nos momentos mais difíceis que esta Casa viveu neste ano e, quando os nossos braços muitas vezes perdiam força e fraquejavam, em nenhum momento, soltamos as rédeas, nem quando escutávamos a serenata dos pássaros afinando-nos ao pé do ouvido as vitórias alcançadas. Em nenhum segundo sequer, o tempo foi capaz de parar os minutos das horas. Sempre fomos seguindo em frente.

Sr. Presidente, quando a aurora despontou no início desta caminhada, iniciamos, meio que a passos lentos, mas, logo em seguida, o ano pegou ritmo, e engrenamos os nossos trabalhos aqui na Casa.

Redobramos a atenção dada às Prefeituras municipais, às Câmaras de Vereadores. Já é uma marca do nosso gabinete atender, da melhor forma possível, os nossos munícipes.

Para a indicação das emendas mantivemos os mesmos critérios dos anos anteriores. Continuamos priorizando aqueles Municípios que ainda não foram contemplados, dando destaque sempre para o menor IDH e para aquelas administrações que adotem o corte das diferenças, ou seja, tenham políticas públicas para as pessoas com deficiência, para os idosos, para as crianças, para os desempregados, para os índios, para as mulheres; e as que combatam todo tipo de preconceito.

É para lá; não importava, para mim, se o Município tinha dois mil habitantes, cinco mil, cem mil, um milhão: quem dava o corte da diferença teve o respaldo das emendas deste Senador.

Priorizamos 100 Prefeituras, com indicações de emendas individuais em diversas áreas do Orçamento para o ano de 2009. No total, Sr. Presidente, ao longo desses meus seis anos, são 496 Municípios do Rio Grande. Nas emendas individuais, já cheguei a 412 Municípios, não importando nunca a cor partidária, sempre do menor para o maior.

Sr. Presidente, faço aqui a listagem das emendas apresentadas e, naturalmente, não vou ler aqui, senão vou ficar muito parecido com um outro Deputado, que fala muito das emendas; não que ele esteja errado, mas não vou precisar usar esse tempo - em seguida, vou dar um aparte ao Senador Mão Santa -, deixando o rol do valor das emendas. Mas todo mundo sabe que cada Senador pode destinar algo em torno de R$9 milhões das emendas. Foram esses R$9 milhões que destinei para esses 412 Municípios, e até 2010, vamos atingir os 496 Municípios. O Município que não recebeu emenda é aquele cujo Prefeito não encaminhou. Deixo no ar o desafio. Não é que ele não tenha encaminhado, Senador Conto, não precisa nem encaminhar, porque consulto a região e mando: é porque não apresentou o projeto. Ele só não recebeu emenda, se não apresentou o projeto.

Sr. Presidente, por várias vezes, até mesmo aqui desta tribuna, disse que o meu sonho seria, um dia, ver todos os gaúchos unidos, ajudando na construção de um Estado melhor, onde maragatos e chimangos, farrapos e imperiais estariam juntos, tecendo lenços cívicos e patrióticos que, efetivamente, aportassem em um projeto do tamanho do Rio Grande - lenços aqui, por que não lembrar, brancos e vermelhos.

O meu mandato de Senador tem sido uma trincheira em defesa dos interesses do Rio Grande, como é o dos outros dois Senadores, Pedro Simon e Sérgio Zambiasi. Não há mau tempo, quando se coloca à frente o bem-estar dos gaúchos e de nosso Estado.

Neste ano que passou, pude acompanhar de perto e dar total apoio, junto com os outros dois Senadores, aos empréstimos junto ao BIRD, para as Prefeituras de Pelotas, Bagé, Uruguaiana, Canoas; e, da mesma forma, para o Estado do Rio Grande do Sul, ao empréstimo, que os três Senadores defenderam, de US$1,1 bilhão.

Destaco o espírito aguerrido e de unidade que se fez sempre presente na bancada gaúcha. Aqui no Senado, destaco o trabalho dos Senadores Pedro Simon e Sérgio Zambiasi. Trabalhamos sempre em um trio, articulados para o bem do Rio Grande e de cada um dos nossos Municípios.

Sr. Presidente, aqui da tribuna, critiquei o embargo europeu à exportação da carne bovina brasileira que atingiu o Rio Grande do Sul, já que a decisão da Comunidade Européia foi tomada devido a pressões de pecuaristas irlandeses e britânicos, que, por terem altos custos de produção, acharam-se prejudicados pela carne brasileira, que é mais barata e de muito melhor qualidade.

Com relação à vitivinicultura, faço questão de dizer que é mais que necessária a redução da tributação do vinho nacional. Já defendemos isso, juntamente com os outros dois Senadores, e agora o repetimos.

O nosso gabinete acompanhou de perto todas as reivindicações dos Municípios gaúchos que, atingidos pelas secas e pelas chuvas, decretaram situação de emergência.

Aprovamos, junto com a bancada gaúcha no Congresso Nacional, recursos para recuperação do rio do Sino e para a implantação das rodovias que unem as serras gaúchas e catarinenses; apresentamos também outras propostas nesse sentido, junto à LDO.

Sr. Presidente, também mediante indicação que fiz à bancada gaúcha, aprovamos R$10 milhões para a UERGS (Universidade Estadual do Rio Grande do Sul). Para o atual Orçamento, apoiamos a implantação de infra-estrutura aqüícola e pesqueira, na Comissão de Agricultura, no valor de R$8 milhões; o fomento ao desenvolvimento da educação profissional, na Comissão de Educação - o ensino técnico tão falado por mim -, também no valor de R$8 milhões. Apoiamos também a implantação de Conselhos de Direitos das Pessoas com Deficiência, na CDH, no valor de R$4 milhões; e outras iniciativas na linha da igualdade racial.

Ainda falando do Rio Grande do Sul, lembro que obtivemos êxito na apresentação da proposta de aquisição de cinco campi da Universidade Federal da Mesorregião Grande Fronteira do Mercosul, junto ao MEC. O projeto pretende atender o norte gaúcho, o oeste catarinense e o sudoeste do Paraná.

O pólo naval do Rio Grande contou com projeto de nossa autoria para a criação de um centro de educação tecnológica e profissional para o setor. A Univates (Universidade do Vale do Taquari) obteve, com o apoio de nossos gabinetes, aprovação do projeto para a Feira da Agroindústria, patrocinada pela Eletrosul. Realizamos audiência pública, na Comissão de Direitos Humanos, para tratar do Fundo de Pensão dos Trabalhadores Portuários.

Participamos, junto com os Senadores Pedro Simon e Sérgio Zambiasi, com o Presidente da Assembléia gaúcha, Deputado Alceu Moreira, e com o Deputado Henrique Fontana, de uma importante reunião com o Ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, para tratar da viabilidade da extensão da matriz energética eólica do Estado.

Enfim, Sr. Presidente, foram muitas e muitas atividades, reuniões, audiências, propostas e projetos em benefício do Rio Grande do Sul. Aprovamos, na CCJ, um projeto chamado Fundep, que é um fundo de Investimento para o ensino técnico que vai gerar R$9 bilhões. Apresentamos, ainda, Sr. Presidente, 33 projetos de lei, cinco Propostas de Emenda à Constituição e 31 requerimentos.

Quero destacar que algumas dessas propostas já foram aprovadas na Casa e estão na Câmara. Destaco os três projetos que beneficiam os aposentados: o fim do fator, o reajuste integral para os aposentados e pensionistas de acordo com o salário mínimo e, ainda, a recuperação do valor dos benefícios de acordo com o número de salários mínimos da época da aposentadoria.

Destaco, ainda, Sr. Presidente, que foi importante a aprovação do Centro de Especialização em Tecnologia da Carne, na cidade de São Gabriel, no Rio Grande, e do Dia Nacional de Luta pelos Direitos das Pessoas com Doença Falciforme, bem como a fixação de formas de reajuste da bolsa-auxílio para estudante do terceiro grau e ensino profissionalizante, a eleição de Presidente e do Vice-Presidente das Cipas como forma de evitar o acidente em local de trabalho, a proibição do uso de métodos de recrutamento de pessoal que possam causar dano à honra e à dignidade do trabalhador, atualização dos benefícios da Previdência, conforme aqui já descrevi, como também o do Fundep (Fundo Nacional de Desenvolvimento do Ensino Profissionalizante).

Termino falando, Sr. Presidente, de três projetos que foram sancionados este ano, que eu considero de uma simbologia importante: o que institui o Dia Nacional de Luta dos Povos Indígenas, que passou a ser celebrado no dia 07 de fevereiro; o que define o tamanho mínimo de fonte em contratos de adesão; e o terceiro, que é o da instituição do Dia Nacional de Luta das Pessoas Portadoras de Deficiência, também sancionado este ano, que é o dia 21 de setembro, data do início da primavera.

Sr. Presidente, para concluir, eu só queria dizer que, nas minhas breves palavras, texto de introdução do livro O Canto dos Pássaros nas Manhãs do Brasil - Diário dos Direitos Humanos, que lancei em novembro, eu disse que presidir a Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa do Senado Federal foi uma das mais importantes tarefas da minha vida pública.

Creio que os direitos humanos estão relacionados diretamente com o combate às injustiças e às discriminações, passando pelas discussões dos direitos civis, políticos, sociais, econômicos e culturais.

Os trabalhos que a CDH desenvolve são pautados por temas que visam a melhorar a vida das pessoas.

Sei que essa estrada só foi possível graças ao empenho de todos os Senadores que integram a CDH e também a este Plenário.

Minha eterna gratidão a todos os queridos colegas e funcionários, Senadores e Senadoras, funcionários e funcionárias.

Durante o decorrer do ano, Sr. Presidente, realizamos na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa 52 reuniões, das quais 35 audiências públicas, 17 reuniões deliberativas para a análise de projetos em tramitação ou apresentados na Comissão, e um encontro dedicado ao Plano Plurianual (PPA).

A CDH aprovou este ano 116 propostas, entre projetos de leis, requerimentos, sugestões e petições. As audiências públicas tiveram ampla participação da sociedade organizada. Tratamos de todos os temas, Sr. Presidente. Podemos destacar aqui a violência urbana, o preconceito, o racismo, o sistema prisional, o idoso, a pessoa com deficiência, o meio ambiente, o direito indígena, a Previdência Social, o trabalho escravo, a estrutura sindical, o direito dos trabalhadores, o desemprego.

Sr. Presidente, termino dizendo que recebi este ano cerca de mais de 250 mil e-mails durante o ano de 2008 - na verdade, foi um pouquinho mais; eu arredondei - a respeito dos diversos temas que tratamos aqui no plenário e na Comissão. E, naturalmente, Sr. Presidente, não vou poder me aprofundar sobre cada um deles, mas só o fato de esta Casa ter aprovado os três projetos de interesse dos aposentados já me faz muito satisfeito. Foram três vigílias que, no meu entendimento, marcaram época neste Senado pela participação, eu diria, de tantos Senadores.

Finalizo, Sr. Presidente, deixando uma mensagem em forma de parábola, que consta do livro A luta social pelo resgate da dignidade é o pleno exercício do poder, de autoria de Benedito Marques. Tudo o que falei aqui, bem como esse texto de esperança,...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Senador Paim...

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - ... incentivo, otimismo, confiança e fé, mostra-nos que a nossa luta deve ser cotidiana e totalmente coerente e com muita paixão. Senador Mão Santa, por favor.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Com a sensibilidade que é peculiar ao Presidente Papaléo, vou aparteá-lo, Senador Paim. Estamos atentamente ouvindo o pronunciamento de V. Exª, e - atentai bem! - vimos a importância que V. Exª tem, como Senador, ao Rio Grande do Sul, os benefícios, os critérios de alocar as emendas, o apoio a todas as prefeituras. Mas, Paim, quero dizer que V. Exª não é do Rio Grande do Sul, não; V. Exª é do Brasil todo. Eu vim do fim de semana no Piauí. Estamos em uma encruzilhada que não tem volta. Eu fui, e sexta-feira cheguei; moro em Teresina perto do rio Poti, avenida, no Edifício Renoir, e tinha um convite muito bacana de confraternização dos que moram no edifício. Eu não podia faltar porque, estando lá, iam dizer: “Olha, é Senador, está bem, não fala com ninguém”, eu fui. Mas, Paim, é um prazer enorme, fizeram lá aquela confraternização boa de Natal. Mas eu ia de mesa em mesa, no edifício onde moro, e o assunto era só um: os aposentados perguntando pela luta do Paim, que V. Exª simboliza, o redutor das coisas. Eu passei a noite comemorando ali, mas respondendo, indagando e dando fé: “Não, o Paim já fez foi uma manifestação pública, já saiu às ruas, em Santos. Eu não fui porque tinha um compromisso. Mas eu vi os retratos, a imagem; nós estamos dispostos a cair no povo, buscar a força do povo, como nas Diretas Já. Disse que nós estamos planejando uma na Praça da Sé; depois, no Rio Grande do Sul, no Pará. Aí, no dia seguinte, eu fui para a minha cidade, passei por Campo Maior e entrei na maior churrascaria. Rapaz, mas era muita gente, porque era sábado. Você sabe a churrascaria que Campo Maior tem. Rapaz, eu quase não comia porque todo mundo está sendo cortado, o prejuízo é grande desses velhinhos. E eles não perguntavam outra coisa; não era do Piauí, não; era esse negócio do redutor do Paim, se vai, se não vai, o que acontece. Depois, eu fui para a minha cidade, para uma festa do jornalista mais importante, o intelectual Rubem Freitas. Ele tem 76 anos de jornalismo, de radialismo; é uma dessas pessoas que marcam a cidade. E fui homenageado lá como o político de maior projeção do Piauí. Mas, em um ambiente muito agradável, já em Parnaíba, olha, os cumprimentos do Natal era só para encostar, mas o que eles queriam mesmo...

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Era saber da aposentadoria.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Então, fiquei em Parnaíba, depois passei por Buriti, uma cidade que tem uma prefeita muito bonita, com perspectiva invejável. Só isso. E fui a uma inauguração em uma cidade nova de Morro do Chapéu, ou de uma prefeitura. Mas o assunto não era a prefeitura, não era o que estava acontecendo, não. Então, Paim, eu respondia que estava em andamento e que, no dia 17, V. Exª ia liderar uma caminhada e que eu convidava a todos à Câmara de Deputados Federais, porque o que era para ser feito no Senado já foi feito. Então, a expectativa...

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Senador Mão Santa...

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Vou terminar, já vou encerrar.

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Vou dar dois minutos para o encerramento, porque o Senador Paulo Paim já está há 35 minutos na tribuna.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Mas ele está encarnando...

O SR. PRESIDENTE (Papaléo Paes. PSDB - AP) - Ele tem reunião às 14 horas e 30 minutos da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania.

Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Ele está há 35 minutos na tribuna, mas ele traduz a esperança de 35 milhões de aposentados. Quantos são, Paim?

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - São mais ou menos 40 milhões.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Olhe aí. Então, esses 35 minutos são em defesa de 35 milhões de aposentados.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - São 26 milhões de aposentados e 40 milhões que estão na expectativa.

O Sr. Mão Santa (PMDB - PI) - Então, valeu. Mas quero dizer que eu tinha de dar alguma resposta. No dia 17, eu estarei acompanhando o Paim à Câmara Federal. Então, quero dizer que sei da sua força no Rio Grande do Sul, mas hoje V. Exª tem responsabilidade com todo o Brasil. É como disse o poeta Antoine de Saint-Exupéry, em O Pequeno Príncipe: “És eternamente responsável pelo que cativas”. V. Exª cativou os velhinhos aposentados, e vamos livrá-los do calote que estão recebendo do Governo Federal.

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Só para informar - também para cumprimentar seu aparte - quero dizer que hoje ainda o Deputado Estadual do Ceará... (Pausa.)

O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS) - Edson Silva. Eu tive de usar o celular aqui, de forma meio inédita, porque eu não queria errar o nome do Deputado.

O Deputado Edson Silva, do Ceará, está há dias ligando para o nosso gabinete. Ele quer que uma comitiva de Senadores se desloque para a Assembléia Legislativa, que vai preparar um evento para fazermos um debate sobre os aposentados. Então, comprometi-me com ele a, no final de fevereiro - vamos ver os Senadores que poderão ir -, irmos à Assembléia Legislativa do Estado do Ceará debater a questão dos aposentados, o fim do fator e também os outros projetos que garantem o reajuste aos aposentados.

Sr. Presidente, meu tempo terminou. Eu tinha aqui uma parábola, mas não vou fazer a leitura da completa, vou apenas sintetizá-la.

Estava um jovem, na beira do mar, recolhendo as estrelas-do-mar que morriam ao sol. Um senhor de mais idade, idade avançada, chegou para ele e disse: “De que adianta você recolher uma estrela se milhares de estrelas-do-mar, jogadas na areia branca, com a força do sol, vão morrer?” O jovem se explicou - é uma parábola longa -, mas, no fim, ele sorriu, pegou mais uma estrela e disse, atirando-a de volta ao mar: “Para esta estrela, eu fiz a diferença”.

É uma parábola linda! Se você salvar uma vida, você faz a diferença. Salvando uma estrela, ele fez a diferença.

Era o que eu tinha a dizer.

Obrigado, Sr. Presidente.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PAULO PAIM

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O SR. PAULO PAIM (Bloco/PT - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) -Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, peço que seja registrado nos Anais desta Casa o texto do Juiz Federal William sobre as cotas para negros.

            AS COTAS PARA NEGROS:

            POR QUE MUDEI DE OPINIÃO.

            William Douglas, juiz federal (RJ), mestre em Direito (UGF), especialista em Políticas Públicas e Governo (EPPG/UFRJ), professor  e escritor, caucasiano e de olhos azuis.

            Roberto Lyra, Promotor de Justiça, um dos autores do Código Penal de 1940, ao lado de Alcântara Machado e Nelson Hungria, recomendava aos colegas de Ministério Público que "antes de se pedir a prisão de alguém deveria se passar um dia na cadeia". Gênio, visionário e à frente de seu tempo, Lyra informava que apenas a experiência viva permite compreender bem uma situação.

            Quem procurar meus artigos, verá que no início era contra as cotas para negros, defendendo - com boas razões, eu creio - que seria mais razoável e menos complicado reservá-las apenas para os oriundos de escolas públicas. Escrevo hoje para dizer que não penso mais assim. As cotas para negros também devem existir. E digo mais: a urgência de sua consolidação e aperfeiçoamento é extraordinária.

            Embora juiz federal, não me valerei de argumentos jurídicos. A Constituição da República é pródiga em planos de igualdade, de correção de injustiças, de construção de uma sociedade mais justa. Quem quiser, nela encontrará todos os fundamentos que precisa. A Constituição de 1988 pode ser usada como se queira, mas me parece evidente que a sua intenção é, de fato, tornar esse país melhor e mais decente. Desde sempre as leis reservaram privilégios para os abastados, não sendo de se exasperarem as classes dominantes se, umas poucas vezes ao menos, sesmarias, capitanias hereditárias, cartórios e financiamentos se dirigirem aos mais necessitados.

            Não me valerei de argumentos técnicos nem jurídicos dado que ambos os lados os têm em boa monta, e o valor pessoal e a competência dos contendores desse assunto comprovam que há gente de bem, capaz, bem intencionada, honesta e com bons fundamentos dos dois lados da cerca: os que querem as cotas para negros, e os que a rejeitam, todos com bons argumentos.

            Por isso, em texto simples, quero deixar clara minha posição como homem, cristão, cidadão, juiz, professor, "guru dos concursos" e qualquer outro adjetivo a que me proponha: as cotas para negros devem ser mantidas e aperfeiçoadas. E meu melhor argumento para isso é o aquele que me convenceu a trocar de lado: "passar um dia na cadeia".  Professor de técnicas de estudo, há nove anos venho fazendo palestras gratuitas sobre como passar no vestibular para a EDUCAFRO,  pré-vestibular para negros e carentes.

            Mesmo sendo, por ideologia, contra um pré-vestibular "para negros", aceitei convite para aulas como voluntário naquela ONG por entender que isso seria uma contribuição que poderia ajudar, ou seja, aulas, doação de livros, incentivo. Sempre foi complicado chegar lá e dizer minha antiga opinião contra cotas para negros, mas fazia minha parte com as aulas e livros. E nessa convivência fui descobrindo que se ser pobre é um problema, ser pobre e negro é um problema maior ainda.

            Meu pai foi lavrador até seus 19 anos, minha mãe operária de "chão de fábrica", fui pobre quando menino, remediado quando adolescente. Nada foi fácil, e não cheguei a juiz federal, a 350.000 livros vendidos e a fazer palestras para mais de 750.000 pessoas por um caminho curto, nem fácil. Sei o que é não ter dinheiro, nem portas, nem espaço. Mas tive heróis que me abriram a picada nesse matagal onde passei. E conheço outros heróis, negros, que chegaram longe, como Benedito Gonçalves, Ministro do STJ, Angelina Siqueira, juíza federal. Conheço vários heróis, negros, do Supremo à portaria de meu prédio.

            Apenas não acho que temos que exigir heroísmo de cada menino pobre e negro desse país. Minha filha, loura e de olhos claros, estuda há três anos num colégio onde não há um aluno negro sequer, onde há brinquedos, professores bem remunerados, aulas de tudo; sua similar negra, filha de minha empregada, e com a mesma idade, entrou na escola esse ano, escola sem professores, sem carteiras, com banheiro quebrado. Minha filha tem psicóloga para ajudar a lidar com a separação dos pais, foi à Disney, tem aulas de Ballet. A outra, nada, tem um quintal de barro, viagens mais curtas. A filha da empregada, que ajudo quanto posso, visitou minha casa e saiu com o sonho de ter seu próprio quarto, coisa que lhe passou na cabeça quando viu o quarto de minha filha, lindo, decorado, com armário inundado de roupas de princesa. Toda menina é uma princesa, mas há poucas das princesas negras com vestidos compatíveis, e armários, e escolas compatíveis, nesse país imenso. A princesa negra disse para sua mãe que iria orar para Deus pedindo um quarto só para ela, e eu me incomodei por lembrar que Deus ainda insiste em que usemos nossas mãos humanas para fazer Sua Justiça. Sei que Deus espera que eu, seu filho, ajude nesse assunto. E se não cresse em Deus como creio, saberia que com ou sem um ser divino nessa história, esse assunto não está bem resolvido. O assunto demanda de todos nós uma posição consistente, uma que não se prenda apenas à teorias e comece a resolver logo os fatos do cotidiano: faltam quartos e escolas boas para as princesas negras, e também para os príncipes dessa cor de pele.

            Não que tenha nada contra o bem estar da minha menina: os avós e os pais dela deram (e dão) muito duro para ela ter isso. Apenas não acho justo nem honesto que lá na frente, daqui a uma década de desigualdade, ambas sejam exigidas da mesma forma. Eu direi para minha filha que a sua similar mais pobre deve ter alguma contrapartida para entrar na faculdade. Não seria igualdade nem honesto tratar as duas da mesma forma só ao completarem quinze anos, mas sim uma desmesurada e cruel maldade, para não escolher palavras mais adequadas.

            Não se diga que possamos deixar isso para ser resolvido só no ensino fundamental e médio. É quase como não fazer nada e dizer que tudo se resolverá um dia, aos poucos. Já estamos com duzentos anos de espera por dias mais igualitários. Os pobres sempre foram tratados à margem. O caso é urgente: vamos enfrentar o problema no ensino fundamental, médio, cotas, universidade, distribuição de renda, tributação mais justa e assim por diante. Não podemos adiar nada, nem aguardar nem um pouco.

            Foi vendo meninos e meninas negros, e negros e pobres, tentando uma chance, sofrendo, brilhando nos olhos uma esperança incômoda diante de tantas agruras, que fui mudando minha opinião. Não foram argumentos jurídicos, embora eu os conheça, foi passar não um, mas vários "dias na cadeia". Na cadeia deles, os pobres, lugar de onde vieram meus pais, de um lugar que experimentei um pouco só quando mais moço. De onde eles vêm, as cotas fazem todo sentido.

            Se alguém discorda das cotas, me perdoe, mas não devem fazê-lo olhando os livros e teses, ou seus temores. Livros, teses, doutrinas e leis servem a qualquer coisa, até ao nazismo. Temores apenas toldam a visão serena. Para quem é contra, com respeito, recomendo um dia "na cadeia". Um dia de palestra para quatro mil pobres, brancos e negros, onde se vê a esperança tomar forma e precisar de ajuda. Convido todos que são contra as cotas a passar conosco, brancos e negros, uma tarde num cursinho pré-vestibular para quem não tem pão, passagem, escola, psicólogo, cursinho de inglês, ballet, nem coisa parecida, inclusive professores de todas as matérias no ensino médio.

            Se você é contra as cotas para negros, eu o respeito. Aliás, também fui contra por muito tempo. Mas peço uma reflexão nessa semana: na escola, no bairro, no restaurante, nos lugares que freqüenta, repare quantos negros existem ao seu lado, em condições de igualdade (não vale porteiro, motorista, servente ou coisa parecida). Se há poucos negros ao seu redor, me perdoe, mas você precisa "passar um dia na cadeia" antes de firmar uma posição coerente não com as teorias (elas servem pra tudo), mas com a realidade desse país. Com nossa realidade urgente. Nada me convenceu, amigos, senão a realidade, senão os meninos e meninas querendo estudar ao invés de qualquer outra coisa, querendo vencer, querendo uma chance.

            Ah, sim, "os negros vão atrapalhar a universidade, baixar seu nível", conheço esse argumento e ele sempre me preocupou, confesso. Mas os cotistas já mostraram que sua média de notas é maior, e menor a média de faltas do que as de quem nunca precisou das cotas. Curiosamente, negros ricos e não cotistas faltam mais às aulas do que negros pobres que precisaram das cotas. A explicação é simples: apesar de tudo a menos por tanto tempo, e talvez por isso, eles se agarram com tanta fé e garra ao pouco que lhe dão, que suas notas são melhores do que a média de quem não teve tanta dificuldade para pavimentar seu chão. Somos todos humanos, e todos frágeis e toscos: apenas precisamos dar chance para todos.

            Precisamos confirmar as cotas para negros e para os oriundos da escola pública. Temos que podemos considerar não apenas os deficientes físicos (o que todo mundo aceita), mas também os econômicos, e dar a eles uma oportunidade de igualdade, uma contrapartida para caminharem com seus co-irmãos de raça (humana) e seus concidadãos, de um país que se quer solidário, igualitário, plural e democrático. Não podemos ter tanta paciência para resolver a discriminação racial que existe na prática: vamos dar saltos ao invés de rastejar em direção a políticas afirmativas de uma nova realidade.

            Se você não concorda, respeito, mas só se você passar um dia conosco "na cadeia". Vendo e sentindo o que você verá e sentirá naquele meio, ou você sairá concordando conosco, ou ao menos sem tanta convicção contra o que estamos querendo: igualdade de oportunidades, ou ao menos uma chance. Não para minha filha, ou a sua, elas não precisarão ser heroínas e nós já conseguimos para elas uma estrada. Queremos um caminho para passar quem não está tendo chance alguma, ao menos chance honesta. Daqui a alguns poucos anos, se vierem as cotas, a realidade será outra. Uma melhor. E queremos você conosco nessa história.

            Não creio que esse mundo seja seguro para minha filha, que tem tudo, se ele não for ao menos um pouco mais justo para com os filhos dos outros, que talvez não tenham tido minha sorte. Talvez seus filhos tenham tudo, mas tudo não basta se os filhos dos outros não tiverem alguma coisa. Seja como for, por ideal, egoísmo (de proteger o mundo onde vão morar nossos filhos), ou por passar alguns dias por ano "na cadeia" com meninos pobres, negros, amarelos, pardos, brancos, é que aposto meus olhos azuis dizendo que precisamos das cotas, agora.

            E, claro, financiar os meninos pobres, negros, pardos, amarelos e brancos, para que estudem e pelo conhecimento mudem sua história, e a do nosso país comum pois, afinal de contas, moraremos todos naquilo que estamos construindo.

            Então, como diria Roberto Lyra, em uma de suas falas, "O sol nascerá para todos. Todos dirão - nós - e não - eu. E amarão ao próximo por amor próprio. Cada um repetirá: possuo o que dei. Curvemo-nos ante a aurora da verdade dita pela beleza, da justiça expressa pelo amor."

            Justiça expressa pelo amor e pela experiência, não pelas teses. As cotas são justas, honestas, solidárias, necessárias. E, mais que tudo, urgentes. Ou fique a favor, ou pelo menos visite a cadeia.

 

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR PAULO PAIM EM SEU PRONUNCIAMENTO

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

- “Os Estatutos dos Homens”.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/12/2008 - Página 52247