Discurso durante a 217ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comenta a inconstitucionalidade da decisão do Presidente do Senado, Senador Garibaldi Alves Filho, de devolver a Medida Provisória 446.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO. REGIMENTO INTERNO.:
  • Comenta a inconstitucionalidade da decisão do Presidente do Senado, Senador Garibaldi Alves Filho, de devolver a Medida Provisória 446.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2008 - Página 46713
Assunto
Outros > SENADO. REGIMENTO INTERNO.
Indexação
  • REGISTRO, HISTORIA, PARTICIPAÇÃO, ORADOR, TENTATIVA, REGULAMENTAÇÃO, ALTERAÇÃO, TRAMITAÇÃO, AMPLIAÇÃO, CONTROLE, MEDIDA PROVISORIA (MPV), OCORRENCIA, DIFICULDADE, VOTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, DEFESA, DEBATE, REDUÇÃO, EXCESSO, GOVERNO FEDERAL, GARANTIA, AUTONOMIA, INDEPENDENCIA, LEGISLATIVO.
  • DISCORDANCIA, DECISÃO, AUTORITARISMO, FALTA, COMPETENCIA, PRESIDENTE, SENADO, DEVOLUÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), ANISTIA, NATUREZA FISCAL, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, NECESSIDADE, APRECIAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, APREENSÃO, INCONSTITUCIONALIDADE, PROVIDENCIA, ABERTURA, PRECEDENCIA, FORMAÇÃO, JURISPRUDENCIA.
  • QUESTIONAMENTO, DEVOLUÇÃO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, OCORRENCIA, RECURSO REGIMENTAL, APRECIAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, SIMULTANEIDADE, VOTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, IMPOSSIBILIDADE, PARALISAÇÃO, TRAMITAÇÃO.
  • DEFESA, MEDIDA PROVISORIA (MPV), MANUTENÇÃO, INSTITUIÇÃO BENEFICENTE, NECESSIDADE, ENTENDIMENTO, GOVERNO FEDERAL, SENADO.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Para uma explicação pessoal. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o Sr. Senador Pedro Simon fez um longo relato sobre uma tarefa fundamental de fortalecimento do Poder Legislativo, que é a regulamentação, o estabelecimento de limites e de procedimentos em relação às medidas provisórias. Quero, primeiro, lembrar que esse rito de tramitação das medidas provisórias não foi feito neste Governo. O Presidente Lula não era Presidente, mas o Senador Pedro Simon já era Senador. Isso foi feito no final da gestão do Governo anterior, quando foi construído um grande consenso em torno desse rito na Câmara e no Senado, consenso de que o Senador Arthur Virgílio participou, de que participei, de que o Senador Pedro Simon participou, ou seja, todos o construíram, imaginando que o rito atual permitiria ao Senado, à Câmara e ao Congresso impor limites à edição de medidas provisórias porque, no passado recente, elas eram editadas, mas não eram votadas, e o Congresso já não aceitava mais aquela situação. A concepção de travar a pauta era exatamente para estabelecer um freio, um contrapeso e um limite.

            Na prática, não conseguimos resolver a questão, e a edição de medidas provisórias tem levado a outro problema: se, no passado, não tínhamos a prerrogativa de legislar, hoje, a medida provisória interfere na nossa capacidade de legislar; não temos autonomia para legislar. A agenda está sempre sendo pautada pelo Poder Executivo.

            Em função desse diagnóstico, no início desta Legislatura, formamos uma comissão para tratarmos desse assunto, inclusive por iniciativa do Senador Antonio Carlos Magalhães, e construímos uma proposta de modificação do rito de tramitação das medidas provisórias. Depois, a votação não foi concluída no âmbito da Câmara dos Deputados. O Senado estabeleceu a proposta, e a não conclusão do novo rito se deu por que não conseguimos engajar a Câmara dos Deputados nesse processo.

            Portanto, da minha parte, e acho que da maioria dos Senadores, se não de todos os Senadores desta Casa, há disposição, empenho e histórico para buscar resolver essa questão institucional, que é procedente, importante e estratégica.

            Mas, Sr. Presidente, a forma como V. Exª fez hoje, do meu ponto de vista, não ajuda a resolver o problema, e vou repetir dois argumentos: primeiro, V. Exª acatou a medida provisória; V. Exª encaminhou a medida provisória; constituiu uma comissão mista, no dia 07 de novembro; deu prazo para que os Parlamentares emendassem a medida provisória até o dia 16 de novembro; os Parlamentares emendaram a medida provisória. E o prazo de tramitação na Comissão, porque não houve indicações por parte dos Partidos, termina no dia 23.

            Por que acho que esse não foi um bom caminho? Não foi um bom caminho porque abre um precedente, abre uma jurisprudência. O Presidente da Casa se sente em condição de substituir o Plenário do Senado e da Câmara. Não há Presidente do Congresso; há Presidente das sessões do Congresso Nacional. Há um Presidente do Senado e um Presidente da Câmara dos Deputados. São 513 Deputados e 81 Senadores, que, hoje, perderam outra prerrogativa: a de decidir se a medida provisória terá validade ou não, se ela vai ser rejeitada ou não. Fui eleito para decidir sobre essa questão. Não quero perder esse poder decisório do meu mandato, do qual acho que nenhum Senador aqui deveria abdicar.

            Portanto, no dia em que essa medida provisória chegar a esta Casa - - e isso poderá se dar a partir do dia 24 - e em que os Senadores, por maioria, rejeitarem a medida, eu a acatarei de imediato, como já fiz, em vários momentos, nesta Legislatura. Algumas, inclusive, eu não as rejeitaria, como a dos Bingos, mas foi decidido, foi acatado. O Congresso decidiu, o Plenário decidiu soberanamente.

            Se V. Exª pode fazer isso com essa medida provisória, V. Exª poderá fazê-lo com qualquer outra proposição. V. Exª pode interferir numa comissão constituída, retirar a proposição, interromper a tramitação do processo legislativo ou, em relação a qualquer outra medida provisória que tramite, V. Exª pode, a qualquer momento, julgar-se no direito de retirar e devolver aquilo que já havia sido acatado? Não vejo que esse seja um bom caminho para se resolver um problema institucional.

            Na próxima quarta-feira, haverá reunião da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), mas, na terça-feira, a Câmara já poderá votar a medida provisória. E, se a Câmara votar a medida provisória, onde estará a autoridade de V. Exª na devolução da medida provisória? Ela não foi devolvida. Por sinal, ela não pôde ser devolvida hoje. O Líder pediu recursos à CCJ, e V. Exª acatou, porque a matéria está na CCJ. Ela não foi devolvida; ela foi encaminhada à CCJ, mas continua tramitando na Câmara. Ela terá de ser encaminhada à Câmara, que poderá encaminhar, a partir do dia 23, vencido o prazo da Comissão, o processo de votação. Então, imaginem se a Câmara aprova medida provisória que V. Exª disse que devolveu? Onde estamos reconstituindo as prerrogativas do Congresso Nacional? Onde estamos aprimorando a Instituição? Onde estamos nos afirmando como Poder?

            Sr. Presidente, realmente, acho que, pelo voto democrático do Plenário, podemos hoje devolver qualquer medida provisória. Mais do que isto: o Senado poderia, sim, convocar a Câmara, para concluirmos a discussão de medida provisória, para estabelecermos limites, novo rito e novo procedimento e para colocarmos isso como prioridade na nossa pauta legislativa neste ano ou no início do ano que vem. Seguramente, seria grande contribuição desta Presidência para o fortalecimento do Senado Federal.

            Porém, há casuísmo legislativo, intervenção intempestiva, ausência de legalidade, porque a Constituição, em nenhuma parte, diz que o Presidente do Senado Federal tem a prerrogativa de devolver medida provisória. Não há essa prerrogativa. O art. 62 da Constituição, nos incisos V e IX, dá ao Plenário da Câmara e do Senado - e só ao Plenário da Câmara e do Senado - o poder democrático e soberano de recusar uma medida provisória. O art. 48, V. Exª o citou, por analogia às proposições, o que seria uma coisa inédita, mas, talvez, poderia ter havido certa reflexão no dia 7, quando a medida provisória veio ao Congresso Nacional. Como era um projeto com força de lei, acho que isso não caberia. Não era uma proposição; era um projeto, uma medida provisória, com força de lei.

            A Constituição é muito clara: cabe à Comissão Mista acolher urgência e relevância e ao Plenário da Câmara e do Senado decidir. Portanto, acho que essa decisão é do Plenário, só do Plenário; só ele poderia decidir.

            V. Exª, no dia da votação, poderia pedir, como Presidente do Senado, respeito à instituição e derrubar a medida provisória. Seguramente, o discurso de V. Exª seria ouvido com muita atenção por este Plenário, mas usar a prerrogativa de Presidente para devolver aquilo que não tem amparo constitucional não é um bom caminho. Nem acho que o objetivo seja nobre. O objetivo de aprimorar o mecanismo de convivência do Congresso com o Poder Executivo é nobre, e, no mérito da medida provisória, qualquer Parlamentar aqui pode revogar dispositivos, alterar conteúdo, modificar ou simplesmente rejeitar medida provisória.

            Particularmente, defendi que houvesse negociação, entendimento. O Líder Arthur Virgílio disse que estava disposto - inclusive, elogiei a atitude dele - de buscar o entendimento, de retirar dispositivos que abrissem brechas que não poderíamos abrir para instituições que não deveriam continuar existindo. Mas deveríamos preservar as instituições filantrópicas, que precisam ter o certificado prorrogado, que era o que estava sendo dito. Portanto, Sr. Presidente Garibaldi, não acho que este foi um bom momento para a reconstituição das prerrogativas do Senado Federal, na qual acho que todos nós temos de estar engajados. Acho que não é esse o caminho. Não vejo sustentação legal para o que foi feito, tanto que o fato foi ineficaz, porque, efetivamente, a medida não pôde ser devolvida, porque não há amparo constitucional e legal para a decisão que foi tomada.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/11/2008 - Página 46713