Discurso durante a 250ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Voto de congratulações a Frei Leonardo Boff, pelo transcurso de seu septuagésimo aniversário. Comemoração pela aprovação no Senado, da proposta de emenda constitucional que assegura aposentadoria aos extrativistas vegetais. Solicita aprovação de projeto de lei de autoria de S.Exa., que institui o Fundo de Desenvolvimento Sustentável para os Estados - FPE Verde. Considerações sobre o Programa de Desenvolvimento Sustentável das Populações e das Comunidades Tradicionais.

Autor
Marina Silva (PT - Partido dos Trabalhadores/AC)
Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.:
  • Voto de congratulações a Frei Leonardo Boff, pelo transcurso de seu septuagésimo aniversário. Comemoração pela aprovação no Senado, da proposta de emenda constitucional que assegura aposentadoria aos extrativistas vegetais. Solicita aprovação de projeto de lei de autoria de S.Exa., que institui o Fundo de Desenvolvimento Sustentável para os Estados - FPE Verde. Considerações sobre o Programa de Desenvolvimento Sustentável das Populações e das Comunidades Tradicionais.
Publicação
Publicação no DSF de 20/12/2008 - Página 54015
Assunto
Outros > HOMENAGEM. PREVIDENCIA SOCIAL. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. DESENVOLVIMENTO REGIONAL.
Indexação
  • CONGRATULAÇÕES, ANIVERSARIO DE NASCIMENTO, LEONARDO BOFF, PROFESSOR, ESCRITOR, COMENTARIO, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, TEORIA, DEFESA, IGREJA, JUSTIÇA SOCIAL.
  • SAUDAÇÃO, APROVAÇÃO, SENADO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, GARANTIA, APOSENTADORIA, TRABALHADOR, EXTRATIVISMO, VEGETAIS.
  • CRITICA, DEMORA, CAMARA DOS DEPUTADOS, APROVAÇÃO, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, FUNDOS, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, ESTADOS, OBJETIVO, UTILIZAÇÃO, INSTRUMENTO, INCENTIVO, POPULAÇÃO, CONTRIBUIÇÃO, PROTEÇÃO, BIODIVERSIDADE, MANEJO ECOLOGICO.
  • FRUSTRAÇÃO, AUSENCIA, LANÇAMENTO, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA), PROGRAMA, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, COMUNIDADE, TRADIÇÃO, COMUNIDADE INDIGENA, ATENDIMENTO, REIVINDICAÇÃO, TRABALHADOR RURAL, INCLUSÃO, PRODUÇÃO, IMPORTANCIA, OBJETIVO, CONSERVAÇÃO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS NATURAIS, REGULARIZAÇÃO, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA.
  • REGISTRO, ASSINATURA, GOVERNADOR, PRESIDENTE DA REPUBLICA, BANCO MUNDIAL, PROGRAMA DE INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO REGIONAL, ESTADO DO ACRE (AC), INCLUSÃO, PRODUÇÃO, POPULAÇÃO, TRADIÇÃO, AGREGAÇÃO, VALOR, IMPORTANCIA, POLITICA, SETOR PUBLICO, PLANO, COMBATE, DESMATAMENTO, PROGRAMA, EQUILIBRIO ECOLOGICO, REGIÃO AMAZONICA, INVESTIMENTO, TOTAL, ACESSO, ENSINO MEDIO, TECNOLOGIA DIGITAL, ORGANIZAÇÃO, COMUNIDADE, RECEBIMENTO, CREDITOS, SANEAMENTO BASICO, ATENDIMENTO, GESTANTE, VACINAÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


A SRª MARINA SILVA (Bloco/PT - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Senador Mão Santa, pelo acolhimento que faz da minha participação nesta tarde. Fico muito feliz de poder ter ouvido também o pronunciamento dos Senadores José Nery e Cristovam Buarque.

Neste final de período legislativo, é fundamental que percebamos que o encerramento do ano não significa o encerramento das nossas obrigações. Cada um de nós vai para este recesso, mas boa parte, e talvez a maior parte, tem uma agenda bem intensa de trabalho, porque ir para o contato com a sociedade, vivenciar os problemas que ela está vivendo significa uma aproximação que é alimentadora do trabalho que fazemos nesta Casa. De sorte que estou aqui muito mais para fazer um pronunciamento, que não significa o encerramento das atividades, que continuarão mesmo durante o recesso.

Talvez fizesse um índice aqui para esta fala. Tenho vários temas a abordar. Um deles é sobre o voto de congratulação pelo 70º aniversário do Frei Leonardo Boff, um grande amigo e teólogo reconhecido no Brasil e em várias partes do mundo. Outro tema é sobre a assinatura do programa ProAcre, que foi assinado entre o Governo do Estado do Acre o Governo Federal e o Banco Mundial, ainda há pouco, na Presidência da República, com a presença do Presidente Lula e do Governador Binho Marques.

Outro assunto é sobre a aprovação que tivemos da PEC que assegura aos extrativistas vegetais a sua aposentadoria. São pessoas que historicamente não gozavam desse benefício, a exemplo de outros setores, e que agora têm a esperança de que, com a aprovação na Câmara dos Deputados e a sanção presidencial, também possam gozar desse benefício.

         Quero, ainda, falar sobre o FPE Verde, que é a forma que utilizamos para dar um nome fantasia ao Fundo de Desenvolvimento Sustentável para os Estados que têm a área preservada, tanto na modalidade de unidade de conservação quanto de terra indígena, a partir da composição de uma reserva do fundo de participação dos Estados, na ordem de 2%, sendo 1,5% do Sul e Sudeste, e 0,5% do Norte, Nordeste e Centro-Oeste.

Por último, eu gostaria de falar sobre o Programa de Desenvolvimento Sustentável das Populações Tradicionais.

Então, serão alguns temas. Eu espero não precisar dos quarenta minutos, já agradecendo, enfim, a audiência do Senador Mão Santa, bem como daqueles colegas que trabalham na Casa e aos que nos assistem neste momento.

Eu pediria à Jandira que, por favor, pegue o celular que está tocando insistentemente lá na minha bancada.

Senhoras e Senhores, o Frei Leonardo Boff, como o chamam carinhosamente de Frei Leonardo Boff, é uma pessoa que goza do nosso imenso respeito e completou setenta anos, fazendo, inclusive, um momento de congraçamento com seus amigos e a sua família. Infelizmente, não pude comparecer a essa festa e gostaria aqui de fazer uma rápida referência ao requerimento que apresentei, de acordo com o art. 222 do nosso Regimento Interno, que concede um voto de congratulação pelo aniversário de 70 anos do teólogo e professor Leonardo Boff.

O Leonardo é um teólogo e professor que deu uma grande contribuição a este País, sobretudo a partir da Teologia da Libertação. As suas posições o levaram a sofrer conseqüências, inclusive tendo sido obrigado ao silêncio obsequioso em função das sanções que lhe foram aplicadas no período em que estava no auge o debate sobre como a Igreja deveria assumir o compromisso radical da defesa dos pobres, da libertação daqueles que mais precisam, à luz do Evangelho.

Não tenho tempo de ler toda a justificativa desse voto de congratulações, mas o que eu quero dizer é que o Leonardo deixou uma grande... deixou não, ele ainda é um militante da causa, ainda é alguém que se coloca na perspectiva sonhadora de um Brasil melhor, de um mundo melhor, com um olhar sobretudo para a ecologia, uma ecologia que seja capaz de pensar as pessoas, de pensar as outras formas de existência, e de pensar uma ética para o nosso tempo que assegure não apenas o homem na sua visão antropocêntrica de que ele é o centro de todas as coisas, mas que ele seja capaz de se colocar como parte de um processo em que as outras formas de existência é que sustentam a sua própria.

E o Leonardo, acho que, mais do que ninguém, deu e dá essa contribuição nos debates que faz, nos livros que escreve. Eu queria aqui apenas fazer esse registro e dou como lida a justificativa desse voto de congratulações.

Um outro assunto que eu gostaria de trazer aqui, Sr. Presidente, refere-se à aprovação, pelo Plenário deste Senado, da PEC que concede aposentadoria especial para o extrativista vegetal.

         Eu, infelizmente, em função de compromissos assumidos em um período bem anterior à nossa agenda de votação, não tive como estar presente. Fiquei o tempo que pude, mas não tive como deixar de viajar para São Paulo, mas, antes, além de já ter conversado com a nossa Líder, Ideli Salvatti; com os colegas da minha Bancada; com a Liderança do Governo; com a Base de sustentação, tive a oportunidade de conversar com o Senador Agripino, com o Senador Nery, com o Senador Arthur Virgílio e pedi acolhimento para a aprovação dessa PEC, que repara uma injustiça histórica em relação àqueles que praticam o extrativismo vegetal.

A PEC foi aprovada e agora vai à Câmara dos Deputados. Ela concede esse benefício, que não havia sido alcançado na Constituição de 88 - portanto, a aposentadoria dos extrativistas ficava a critério do gestor ou das instituições que faziam essa avaliação; que podia ser acolhida ou não.

Agora, a exemplo do que acontece com os trabalhadores rurais, que gozam do benefício do Funrural, também os extrativistas vegetais poderão receber esse benefício. Essa é a reparação de uma injustiça, com uma inovação: os homens poderão se aposentar aos 60 anos e as mulheres aos 55 anos.

E por que isso, Sr. Presidente?

Porque o trabalho dos extrativistas é um trabalho muito pesado, muito árduo, e essas pessoas sofrem um desgaste muito forte ao longo de sua vida. De sorte que, quando chegam aos 60 anos, eles já não têm, não reúnem mais forças para continuar o seu trabalho, e nós aprovamos aqui que os homens se aposentarão com 60 anos e as mulheres com 55 anos de idade. Então, é um ganho. Essa idéia surgiu apresentada numa reunião em um Município do Estado de Rondônia, em que uma trabalhadora extrativista sugeriu que se fizesse uma lei para que eles também pudessem ser beneficiados. A Senadora Fátima Cleide também se empenhou para que essa PEC fosse aprovada. A iniciativa de uma pessoa simples, vivendo lá na sua comunidade, lá dentro da sua reserva, numa reunião com um grupo de pessoas que eram da minha assessoria, foi transformada numa iniciativa legislativa, e agora está bem próxima de ser transformada em lei, em uma realidade que os favorecerá.

Uma outra questão que eu gostaria de tratar: nós estaríamos fazendo o coroamento deste ano legislativo, pelo menos para mim, depois da aprovação no Senado dessa PEC, seria a aprovação do FPE Verde, lá na Câmara dos Deputados.

Infelizmente, não foi possível. Uma longa tramitação vem ocorrendo em relação a esse projeto de lei e, no meu entendimento, há uma falta de compreensão quanto ao seu alcance.

Vários requerimentos já foram feitos pedindo para que entre em votação. O projeto está com o parecer favorável de Deputado Sigmaringa Seixas, que o aprovou na Comissão de Constituição e Justiça. O projeto foi para a Mesa e há mais de um ano, em que pese eu ter conversado com o Presidente Arlindo Chinaglia, assim como o próprio Governador Marques. Apesar de termos tentado, a exemplo do que fizemos aqui com todos os senhores Líderes para aprovar a PEC do extrativismo em homenagem à memória de Chico Mendes na passagem dos 20 anos de seu assassinato, em que pese todo esse esforço, não foi colocado em votação. E eu espero que na próxima Legislatura o projeto seja aprovado, porque se trata de criar um mecanismo que possibilite a contribuição de todos os brasileiros para a proteção da biodiversidade, a proteção das florestas, a proteção e o uso dos nossos serviços ambientais.

Como é que isso aconteceria? Sabemos que boa parte das chuvas que acontecem no Sul e Sudeste do País são produzidas na Amazônia, segundo estudos feitos pelo Professor Antônio Nobre. E nós sabemos também que, se a Amazônia for destruída, nós corremos o risco de que essas regiões se transformem em deserto. É isso que está dito nos estudos que têm sido feito no Instituto de Pesquisas da Amazônia, órgão de elaboração e produção científica muito sério e respeitável. Os amazônidas têm a responsabilidade, por si mesmos, de proteger a Amazônia. Mas o Brasil todo tem essa responsabilidade também.

           E como dividiríamos essa responsabilidade com todos os brasileiros? O que encontramos, como uma modesta contribuição, foi a criação de uma reserva do Fundo de Participação da ordem de 2%. Essa reserva poderia ser composta e dividida, proporcionalmente às áreas preservadas, nas 27 Unidades da Federação (26 Estados e o Distrito Federal). Dessa forma, de acordo com as terras indígenas e unidades de proteção integral e uso sustentável, o Estado faria jus a um “x” dessa reserva de Fundo de Participação. Seria tirado 1,5% do Sul e do Sudeste, e 0.5% do Norte, do Nordeste e do Centro-Oeste.

           Essa discussão foi feita intensamente aqui no Senado, mas todos os Srs. Senadores se convenceram de que era a forma de darmos uma contribuição para a preservação das florestas, para a promoção do desenvolvimento sustentável.

           Dessa forma, esse recurso comporia um fundo estadual de desenvolvimento sustentável para, no lugar de ficarmos apenas dizendo que é possível fazer manejo de pastagem, evitar o uso do fogo, fazer o turismo sustentável, recuperar a área degradada, recuperar as áreas de preservação permanente, fazer o manejo florestal, ter uma economia da floresta, no caso da Amazônia especificamente, no lugar de ficarmos apenas falando, nós criaríamos os meios. E o meio seria esse fundo que seria regulamentado pelo Governo Federal e cada Estado criaria o seu próprio fundo estadual, compondo a partir desses recursos.

Na época, nós fizemos um cálculo e o que iria para o Estado de Roraima - um Estado que tem uma grande quantidade de área preservada, seja na modalidade de unidade de conservação ou de terra indígena - na época era em torno de R$65 a R$60 milhões. Isso comporia um fundo de desenvolvimento sustentável que poderia ser usado na pesquisa ou nas atividades produtivas.

Imaginem o que é um Estado como Roraima ser beneficiado porque tem área de preservação, porque tem terra indígena, sobretudo para acabar com essa história de que ter unidade de conservação e terra indígena é um prejuízo e não um grande benefício para a população e para o Estado. O Estado do Acre seria beneficiado, mas o seriam também os Estados do Nordeste que têm unidade de conservação.

Infelizmente, ainda não foi aprovado e eu espero que possa sê-lo no próximo período legislativo, porque será uma forma de juntar os esforços dos brasileiros para proteger essas áreas e para, mais do que a proteção pura e simples, criar novos mecanismos para promover o desenvolvimento sustentável, gerando emprego e melhorando a qualidade de vida das pessoas.

Um outro tema que queria trazer aqui ainda, Sr. Presidente, refere-se ao programa de desenvolvimento sustentável das populações e das comunidades tradicionais. Quando eu ainda estava no Governo, juntamente com a minha equipe, trabalhamos arduamente para que tivéssemos um processo de debate dentro do Governo.

O Presidente Lula assinou o Decreto nº 6.040, de fevereiro de 2007. Com esse Decreto, começamos a trabalhar, um conjunto de Ministérios, no âmbito da Comissão Coordenadora do Programa de Desenvolvimento Sustentável das populações e, a partir daí, estabelecemos uma dinâmica de que essas comunidades teriam direito a um programa que atendesse às suas necessidades de inclusão produtiva e de atendimento na área de saúde, de educação, enfim, em todos os aspectos.

Esses grupos e comunidades são grupos diferenciados, que abrangem os seringueiros, as quebradeiras de coco do Maranhão e de outras regiões, como é o caso de Tocantins, os pescadores artesanais, pessoas que vivem do extrativismo e que poderiam contar não só na Amazônia, mas no Brasil inteiro, no caso dos pescadores artesanais, com esse benefício de ter um programa para que não sejam assistidas como uma categoria invisível que necessita da caridade do Estado. O que eles reivindicam é a inclusão produtiva. São inúmeras as categorias dessas comunidades diferenciadas - não tenho aqui como citar todas -, mas o alcance do projeto seria também para as comunidades indígenas, que hoje abrangem mais de 220 povos, que falam mais de 180 línguas. Seriam beneficiadas cerca de oito milhões de pessoas, presentes em cerca de 25% do território nacional.

Qual o objetivo desse programa? O desenvolvimento sustentável local, porque essas comunidades, sejam de quilombolas, seringueiros ou ribeirinhos, têm uma prática social e econômica associada ao território em que vivem. Então, seria para o desenvolvimento sustentável local, utilizando adequadamente os produtos madeireiros, não-madeireiros, os recursos de pesca, de outras atividades, melhorando, com isso, a sua qualidade de vida e, ao mesmo tempo, preservando a floresta.

Outro aspecto seria a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais, porque, para essas comunidades continuarem utilizando as suas reservas de acordo com as exigências do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, que é um uso de baixo impacto, é fundamental que elas possam agregar valor aos seus produtos. Para essa agregação de valor, elas precisarão de investimento para poder promover a proteção dos recursos naturais a partir do uso sustentável e a inclusão produtiva, gerando trabalho e renda para essas famílias.

Outro aspecto seria o da regularização fundiária e do ordenamento territorial, que faz parte de uma agenda estratégica sobretudo para a Amazônia. As ações mais específicas seriam voltadas para a capacitação dos Povos e Comunidades Tradicionais no que concerne à gestão da produção e de negócios, proteção do território, manejo florestal e agroecologia, além da agregação de valor à produção e à comercialização.

Quando estávamos no Governo, criamos o programa de compra para os produtos dos extrativistas, que já está sendo implementado, que assegura a essas comunidades a capacidade de vender os produtos que têm, melhorando a sua condição de vida.

Outro alcance, outro benefício seria o apoio à organização dessas comunidades no que concerne à organização social e econômica, visando a melhorar a sua capacidade em termos de gestão - os acordos que são feitos, os conselhos, as associações, as cooperativas, em todos os sentidos - e ainda o apoio à produção sustentável, à organização da produção e à agregação de valor.

Outra questão seria o apoio à comercialização dos produtos da sociobiodiversidade e a regularização dos territórios que são ocupados por essas comunidades.

Lamento que também esse programa, que, inicialmente, estava orçado em cerca de R$1,6 bilhão até 2010, não tenha sido lançado. Ele deveria ter sido lançado quando do lançamento do Programa Amazônia Sustentável. Naquela época, havia o desejo dos extrativistas de que não fosse algo só para a Amazônia e de que, já que era um programa para o Brasil inteiro, fosse feito o lançamento numa solenidade específica. E no dia do lançamento do PAS, era de um programa para a Amazônia. Concordei com o apelo que alguns segmentos fizeram e achei por bem deixar para outra oportunidade.

Uma semana após, eu estava saindo do Governo, pelas razões que já são de conhecimento público e não vou repetir aqui, e, infelizmente, o programa não foi lançado até hoje, mesmo com os vinte anos da morte de Chico Mendes. Lamento profundamente, mas espero que ele possa ser recuperado.

Há uma visão errônea, preconceituosa, que entende que essas comunidades já passaram, que são sobreviventes que precisam ser assimiladas pela modernidade, ou seja, deixarem de ser extrativistas.

Eles são uma categoria social que liga a sua identidade social e cultural ao território que ocupam e às práticas produtivas que têm de manejo sustentável, do uso dos recursos naturais, seja no caso da pesca, do trabalho com a castanha, com a borracha, do manejo comunitário de madeira ou do uso de cipós, das resinas, da apicultura com abelha selvagem, sobretudo a abelha sem ferrão, pois muitos têm essas práticas econômicas. Enfim, várias atividades.

Existem aqueles que acham que ajudar o extrativismo seria suplantar essas categorias, achando que quem defende isso está fora do tempo. Eu discordo radicalmente de quem pensa dessa forma. Essa é uma visão antropocêntrica, preconceituosa, que acha que é bonito apenas aquilo que é espelho, e defendo que essas populações possam ser incluídas como estamos fazendo no Acre.

No Estado do Acre, o Governador Binho acabou de assinar, junto ao Banco Mundial e o Presidente Lula, o Programa Proacre, no qual um dos focos é exatamente a inclusão produtiva dessas comunidades, para que possam agregar valores aos seus produtos. Eles produzem, por exemplo, o óleo de copaíba. Existe um mercado fantástico para a indústria de fármacos e cosméticos. Eles podem ter uma vida economicamente viável, ambientalmente equilibrada, sem precisar destruir a floresta e sem precisar se desconstituir. E há um esforço muito grande que vem sendo feito ao longo de anos. Esse esforço começou com a luta dos próprios extrativistas, como Chico Mendes, a Aliança dos Povos da Floresta, e, depois, com o Programa Piloto do PPG7, onde os sete países ricos se juntaram para dar um aporte de recursos da ordem de 240 milhões, por 12 anos, para desenvolver vários programas com comunidades locais. Esse programa deu origem a vários produtos, boa parte dos quais já foi transformada em políticas públicas no Plano de Combate ao Desmatamento e no próprio Programa Amazônia Sustentável.

Quando eu estava no Ministério, conversei com o Presidente Lula, quando ele assinou o decreto, e lhe disse que não poderíamos ter o fim do Programa Piloto, que foi uma doação de países ricos para cuidar dos nossos índios, dos nossos ribeirinhos, das nossas quebradeiras de coco, e não colocar nada em seu lugar. Depois, as pessoas se revezam nesta tribuna, dizendo que os estrangeiros estão visitando os índios, que as ONGs estão fazendo trabalho dentro das comunidades... Mas se não tivermos programas do Estado brasileiro para essas comunidades, eles podem ficar inteiramente abandonados. Hoje, já são 11 milhões de hectares de unidades de conservação de uso sustentável.

É preciso que se faça essa inclusão produtiva e esse programa era exatamente para isso. Não apenas um componente, que é o da compra dos produtos dos extrativistas ou a política do preço mínimo. Era um programa amplo, que diz respeito a todos os aspectos da vida dessas pessoas, na área de habitação, de saúde, de educação, de transporte, de tecnologia, de assistência técnica, de pesquisa. Se não fizermos isso, mais à frente estaremos dizendo que o extrativismo não dá certo, que é coisa do passado, de gente atrasada, como alguns, às vezes, tentam nos convencer. Existe uma corrente que sabe que é fundamental que essas populações possam ficar nas suas comunidades, porque elas prestam serviço de manejo dos recursos naturais, até mesmo nos ensinando como fazê-lo.

Por último, Sr. Presidente, eu queria agora, já concluindo, fazer um registro deste programa que o Governador Binho assinou, ainda há pouco, no Palácio, com o Presidente Lula e demais autoridades: trata-se de um empréstimo do Governo do Estado do Acre no valor de US$120 milhões, com contrapartida de US$30 milhões junto ao Banco Mundial.

O objetivo desse programa é a atuação na área de saúde, educação e desenvolvimento comunitário, inclusive atendendo a essas demandas das comunidades. Na parte de educação, ele busca a universalização do acesso ao ensino fundamental e à cidadania digital. O Governador Binho foi Secretário de Educação na época em que o Governador Jorge Viana era Prefeito; depois, nos seus dois anos como Governador. Agora ele é o próprio Governador e priorizou essa agenda de universalização do acesso ao ensino fundamental para todo o Estado do Acre, bem como a inclusão digital - o Acre será um dos primeiros Estados a ficar digitalmente incluído -, para atender a todas as pessoas de uma forma ampla, inclusive as comunidades longínquas.

Um outro componente desse empréstimo é o desenvolvimento comunitário, visando à organização comunitária para vinculação às cadeias produtivas, e ao microcrédito. E, na área de saúde, o atendimento pré-natal, tratamento de água, esgotamento sanitário, melhoria sanitária e vacinação em massa, além de trabalhar outros componentes que derivarão a partir daí.

O empréstimo tramitou em tempo recorde junto ao Banco Mundial, o Governo foi altamente eficiente, em dois meses. O Dr. John Briscoe, do Banco Mundial, estava admirado com a capacidade de resposta do Governo.

         Mas nós temos agora uma ferramenta que estará trabalhando a dinâmica de desenvolvimento a partir da idéia de desenvolvimento sustentável. O Chico Mendes, que, há 20 anos, fez uma denúncia no Congresso Nacional de que o Banco Interamericano estava fazendo a BR-364 sem os cuidados ambientais, sem os cuidados com as populações indígenas e extrativistas, agora nos beneficia, porque temos um empréstimo feito junto ao Banco Mundial, que pega toda essa experiência, “ressignifica” aquele passado de muitos tensionamentos e trabalha novos conceitos, visando o desenvolvimento sustentável do Acre em todas as suas dimensões e, sobretudo, fazendo um resgate dessas comunidades, valorizando o seu potencial.

         Sr. Presidente, eu gostaria de terminar, dizendo que este é o momento em que as pessoas começam a fazer reflexões sobre o final de ano, e não é diferente com cada um de nós aqui. Então é fundamental que tenhamos claro que, às vezes, assumimos compromissos que se desconstituem durante o ano. Muita gente se compromete que vai caminhar, que vai ler mais, que vai estudar mais, e esses compromissos vão se desconstituindo. Mas espero, sinceramente, que cada compromisso assumido em 2007 possa ser lembrado agora, para que façamos compromissos que sejam realizados ou pelo menos perseguidos como objetivos em nossa vida para o ano de 2009.

A exemplo do Senador Cristovam, eu espero que 2009 seja o ano em que as pessoas estejam preocupadas em como sair da crise econômica sem preterir a crise ambiental que estamos vivendo e em como resolver a dramática situação de mudança do sistema climático, criando novas oportunidades de emprego, criando novas oportunidades para as economias dos diferentes países, porque é também um momento para oportunidades.

Sobretudo, que Deus possa também tocar o coração de cada pessoa, de cada homem, de cada mulher, para que tenhamos uma relação de mais respeito para com as outras pessoas, com a dor daqueles que sofrem. Que possamos nos alegrar com aqueles que estão felizes e respeitar também aqueles que pensam de maneira e diferente.

Muitas vezes nós achamos muito bonito o exemplo de Jesus Cristo, que é, digamos, o paradigma para os cristãos, de todos os varões, o homem que viveu a humanidade com perfeição. Achamos bonito o exemplo da fé de Abraão, a coragem de Davi, a força de Sansão. Mas achamos bonito nos outros e, muitas vezes, não temos a ousadia de querer exercitar isso na nossa própria vida. É fundamental que tenhamos esse desejo de fazer com que aquilo que está a nosso alcance seja feito.

Deus é um Deus de impossíveis. O impossível Ele faz. O possível nós temos que fazer. Tanto é assim que, quando Herodes foi perseguir o menino Jesus, Ele aconselhou Maria e José a fugirem com o menino para o Egito. E é engraçado, pois Ele poderia proteger o Menino Jesus, mas Ele deixou a cargo de Maria e José fazer o possível dos homens, que era fugir para proteger o Menino Jesus, numa demonstração concreta de que o possível são os homens e as mulheres que fazem, mas o impossível é Deus que faz.

Se não fizermos o nosso possível, de acelerar os projetos estratégicos para resolver o problema da saúde e da educação, melhorar o orçamento, a qualidade de vida das pessoas, com certeza, Deus não fará isso como mágica, porque ele não fez nem para proteger o seu filho. É só para que cada um de nós se coloque no lugar que tem em relação aos compromissos históricos, aos compromissos sociais de constituir uma humanidade que se faz pela construção no lugar da cultura, lugar esse em que nós nos transformamos e somos transformados, e talvez seja essa a maior benção que recebemos para viver aqui, no período em que vivemos neste Planeta Terra.

E que o Senhor Jesus nos abençoe a todos, porque Ele foi o maior exemplo, na sua fragilidade de criança, depois na sua fragilidade de homem, para poder ressurgir na sua onipotência de Deus, mostrando que nós aqui na Terra temos que lidar com a potência, temos que lidar com a ciência e temos que lidar com a presença. E a presença significa sermos capazes de suportar e ser suportado pelo outro em suas diferenças. É isto que faz com a gente possa aprender, como dizia a minha mãe e a minha avó: vocês têm que aprender a ser gente. Aprender a ser gente é aprender que dependemos do outro, é aprender que temos que suportar uns aos outros, não suportando no sentido de “oh, como vou suportar o discurso da Marina, em plena sexta-feira, às 16h”? Não. Suportar no sentido do suporte que damos para poder assegurar os meios com os quais temos que viver.

Muito obrigada.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA MARINA SILVA EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e o § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

“Voto de congratulações pelo 70º aniversário de Leonardo Boff”.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/12/2008 - Página 54015