Discurso durante a 12ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Manifestação sobre o ensino básico. Defesa de priorização da educação.

Autor
Marco Maciel (DEM - Democratas/PE)
Nome completo: Marco Antônio de Oliveira Maciel
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO. POLITICA SOCIO ECONOMICA.:
  • Manifestação sobre o ensino básico. Defesa de priorização da educação.
Publicação
Publicação no DSF de 21/02/2009 - Página 3135
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO. POLITICA SOCIO ECONOMICA.
Indexação
  • COMENTARIO, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO BASICA, PROCESSO, DESENVOLVIMENTO, PAIS, APRESENTAÇÃO, DADOS, INSUFICIENCIA, ESFORÇO, AUMENTO, ALFABETIZAÇÃO, REGISTRO, REDUÇÃO, PERCENTAGEM, MATRICULA, INFORMAÇÃO, ESTUDO, INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), PREVISÃO, TEMPO, ERRADICAÇÃO, ANALFABETISMO, DEFESA, INVESTIMENTO, TECNOLOGIA, OBJETIVO, AMPLIAÇÃO, PARTICIPAÇÃO, BRASIL, AREA, CIENCIA E TECNOLOGIA.
  • COMENTARIO, DADOS, DEFICIT, QUALIDADE, ENSINO, REGISTRO, DECLARAÇÃO, PROFESSOR, PRECARIEDADE, EDUCAÇÃO BASICA, AGRAVAÇÃO, INDICE, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, DESENVOLVIMENTO ECONOMICO.
  • IMPORTANCIA, DEMOCRACIA, EDUCAÇÃO, GARANTIA, CIDADÃO, UTILIZAÇÃO, DIREITOS, COMENTARIO, SITUAÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, DESIGUALDADE REGIONAL, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, OBSTACULO, COMBATE, POBREZA, PROBLEMA, NATUREZA SOCIAL, BRASIL.
  • DEFESA, NECESSIDADE, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, AMPLIAÇÃO, ESFORÇO, DESENVOLVIMENTO, POLITICA, SETOR PUBLICO, CORREÇÃO, COMPENSAÇÃO, DISCRIMINAÇÃO, ADOÇÃO, PROVIDENCIA, NATUREZA FISCAL, ESPECIFICAÇÃO, PROGRESSÃO, TRIBUTOS, BENEFICIO, JUSTIÇA SOCIAL.
  • IMPORTANCIA, MANUTENÇÃO, ESTABILIDADE, ECONOMIA, REFORÇO, DESENVOLVIMENTO NACIONAL, MODERNIZAÇÃO, MELHORIA, EFICIENCIA, INSTITUIÇÃO PUBLICA, ACELERAÇÃO, DESENVOLVIMENTO EDUCACIONAL, CRESCIMENTO, BRASIL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. MARCO MACIEL (DEM - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, nobre Senador Mão Santa; Sr. Senador Geraldo Mesquita Júnior; Sr. Senador Marcelo Crivella; Srªs e Srs. Senadores, a sociedade do futuro, que já começa no presente, é a sociedade do saber pela educação.

O mundo ainda está dividido entre os que sabem e os que não sabem. Aliás, essa frase é de autoria de Norberto Bobbio, que diz, com o rigor conceitual que possui, que o mundo vai se dividir entre os que sabem e os que não sabem.

É lógico que ele antes reconhece que o mundo se divide entre nações ricas e pobres, fortes e fracas, mas que as tecnologias da informação vão fazer com que o mundo se divida entre os que sabem e os que não sabem, o que significa, se não avançarmos no campo da educação, ficaremos em situação desfavorável no ranking internacional, ou seja, o País ficará sempre em posição desvantajosa entre as nações mais importantes. Daí a importância da educação, tema que venho aferir nesta manhã no Senado Federal.

A questão brasileira começa, evidentemente, na educação e, de modo especial, no ensino básico, origem de toda revolução no campo da educação.

No Brasil, lamentavelmente, o analfabetismo residual de pessoas com mais de quinze anos resiste aos insuficientes esforços para erradicá-lo. Entre 2005 e 2006, a taxa de alfabetização aumentou em apenas 1%, isto é, de 88,6% para 89,6%. Quanto à taxa de matrículas, caiu de 87,5% para 87,3%, o que denota claramente, na minha opinião, a sua estagnação. Com o resultado de 14 milhões de analfabetos totais, além dos 30% funcionais com mais de 15 anos de idade. Isso significa um enorme peso na economia e na sociedade do Brasil, com tantas pessoas sem grandes possibilidades de ascensão social.

O Ipea, conhecido Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, prevê, pelo ritmo atual, cerca de vinte anos para a eliminação do analfabetismo em nosso País, tempo, temos que reconhecer, excessivamente longo, pois o mundo não pode parar para nos esperar.

Daí porque a educação é hoje, de forma muito clara, a grande questão brasileira. E devemos dar, consequentemente, toda ênfase, tanto nos projetos em execução quanto nas perspectivas do futuro. Devemos dar, repito, toda ênfase à solução da questão educacional, inclusive em seus desdobramentos no campo das tecnologias da informação, que vão permitir fazer com que o País cresça no sentido de aumentar a sua participação na geração de ciência e tecnologia e também no campo da inovação, que ainda é hoje, no Brasil, algo em que não se avançou muito, sobretudo se fizermos um cotejo com países já desenvolvidos.

Voltando especificamente à questão da educação, quanto à faixa de 7 e 14 anos, 2,4 milhões de brasileiros continuam analfabetos. O mais grave é que a metade desses analfabetos, já com 14 anos de idade, está na escola sem ser alfabetizada, o que demonstra o déficit qualitativo do ensino e não só quantitativo. E 43,6% dos próprios professores do primeiro grau reconhecem, em pesquisa efetuada pela Organização dos Estados Ibero-Americanos, que as três últimas séries do ensino básico são ruins ou - o que é mais grave ainda - muito ruins.

A progressão automática, que vem sendo adotada em alguns Estados ou Municípios - de ano em ano didático - só pode bem funcionar se houver professores em quantidade suficiente para a recuperação dos alunos incapazes de progressão normal. Do contrário, levarão seus problemas para a série seguinte, com resultado da queda geral de nível, como está acontecendo, e isso se revela nas pesquisas realizadas por instituições idôneas em nosso País.

A educação brasileira está, assim, diante de um duplo dilema: o quantitativo de um lado e o qualitativo do outro, juntos contribuindo para manter e agravar os nossos desníveis socioeconômicos.

Anísio Teixeira, grande reformador da pedagogia no nosso País e que tanto contribuiu, consequentemente, para uma nova leitura da importância da educação em nossa pátria, já chamava a atenção nacional para o fato de que a educação não deve ser um privilégio, e sim, democrática nos meios e democratizante nos objetivos. Ainda hoje, estamos diante deste dilema, que, aliás, continua se agravando. Sem resolver esta questão fundamental, nós, brasileiros, continuaremos no primeiro dos nossos impasses, ainda nos desafiando para sua solução.

Na realidade, Sr. Presidente, a educação, além de fazer do cidadão um partícipe ativo da vida social, contribui para o desenvolvimento do País, tem também uma significação muito grande no campo da realização, porque somente a educação liberta, emancipa, isto é, somente a educação dá ao cidadão a plena fruição dos direitos assegurados no estado democrático de direito.

Se quisermos ter uma sociedade participante, uma sociedade capaz de fazer suas escolhas com relação ao futuro, isso, naturalmente, passa pelo acesso à educação e, consequentemente, a uma escola de boa qualidade, aí incluindo uma boa biblioteca. Se não houver uma boa biblioteca, não há leitor. Sem que haja leitor, não há escritor, e sem haver escritor, não podemos avançar no campo da cultura, que divide a identidade de um povo.

Sr. Presidente, eu gostaria de aproveitar a ocasião para dizer que, ao falarmos da questão da educação a que hoje estou me referindo, devemos ter consciência de que as desigualdades brasileiras encontram sua raiz baixo desempenho educacional do País.

Pobreza e desigualdade não são, no mundo contemporâneo, monopólio dos países mais pobres. São mazelas que sobrevivem até mesmo em algumas das mais ricas comunidades internacionais. Trata-se, portanto, de uma preocupação mundial; talvez a mais importante da agenda política.

Se a desigualdade é o fundamento e a causa principal da crise social, em qualquer parte do mundo - e não somos uma exceção - em que ela consiste? Considerando-se o caso brasileiro, não se pode falar de um padrão diferenciado e, portanto, não tem sentido aludir-se à “desigualdade”, mas às nossas várias “desigualdades”. A mais conhecida e menos comentada é, seguramente, a desigualdade étnica. Não apenas aquela que separa os índices de padrões de renda e os indicadores de proteção social, como escolaridade, expectativa de vida, habitação e acesso aos serviços de água tratada, saneamento e assistência médica, criando um enorme hiato entre negros e brancos.

Outra vertente é a que atinge, de forma ainda mais aguda, porém menos admitida, os descendentes dos silvícolas, a despeito de seu crescimento populacional, dado positivo no esforço imemorial de integrá-los à comunidade de cidadãos. Se a esses grupos, numerosos em seu conjunto, juntamos as minorias e os novos excluídos representados pelos imigrantes vivendo na ilegalidade, teremos uma idéia aproximada, ainda não efetiva, nem convenientemente mensurada, do que ainda seria a primeira de nossas desigualdades.

Se essa é a desigualdade, poderíamos dizer vertical, há outra tão grave e não menos excludente e injusta, a de cunho espacial ou geográfico. É a diferença, tão marcante quanto cruel, traduzida numa velha constatação de muitas vertentes. Ela se materializou, no século XIX, com a constatação de Ferdinand Dénis, no seu livro Resumo Da História Literária do Brasil, quando afirmou que éramos “um país sem povo”, dividido em apenas duas categorias: a elite altamente capacitada, que lidera o País e usufrui de todos os benefícios do Estado, e os escravos, marginalizados de toda e qualquer proteção jurídica, de direitos sociais e até mesmo, Sr. Presidente, de proteção política. Essa questão foi retomada um século depois pelo seu conterrâneo Jacques Lambert, autor do clássico Os Dois Brasis, reeditado pelo professor Edmar Bacha com a imagem da “Belíndia”, ou seja, o Brasil como uma mistura de Bélgica com Índia, , uma área muito desenvolvida de um lado e uma área pobre do outro. Ela resultou da estrutura social, imposição do arcabouço econômico calcado na monocultura e no latifúndio que a independência e a abolição não foram capazes de vencer. Isso levou Joaquim Nabuco, certa feita, a dizer que, embora tenhamos conseguido abolir a escravidão, as causas da escravidão ainda não foram superadas. E Nabuco insistia muito - esse é um dado que não podemos desconhecer - no fato de que, enquanto não investíssemos em educação, a questão da abolição não estaria totalmente resolvida.

Mas, Sr. Presidente, eu falaria agora, portanto, que essa desigualdade espacial penaliza exatamente a mais pobre e que já foi a mais populosa região brasileira. Eu me refiro ao Nordeste, que responde hoje, indistintamente, pelos índices de mais baixo desempenho no conjunto da federação brasileira. E isto, a despeito de o Nordeste, nos últimos anos, haver crescido mais do que o País como um todo, o que dá uma idéia do fosso que o distancia da média brasileira e, de forma mais grave, das regiões de maior desenvolvimento - aí eu me refiro basicamente ao Sudeste e, por que não dizer, ao Sul do País.

Às desigualdades étnica e espacial ou geográfica é preciso acrescer outra: a condição feminina, isto é, a que afasta, já não mais em desempenho profissional, mas em matéria de renda em situações de igualdade, mulheres e homens, aqui e em quase todos os países.

Cotejando-se essas três vertentes das nossas desigualdades, torna-se fácil diagnosticar o perfil dos desafios que teremos de vencer. Aliás, a experiência está revelando que é menos difícil combater a pobreza que superar as desigualdades. O IBGE, que é uma instituição reputada em nosso País e que, de alguma forma, é responsável pelos levantamentos estatísticos, realizados pela instituição desde a sua criação - e é bom lembrar que os recenseamentos no Brasil começaram em 1872, se não estou equivocado, e vêm se repetindo a cada dez anos -, ao divulgar as suas últimas séries históricas dos indicadores sociais brasileiros, dá um quadro do que é o País hoje. Em apenas um não conseguimos progresso, o que separa o fosso dos mais ricos dos mais pobres, isto é, da desigualdade que, refletida em termos econômicos, ainda não traduz as conquistas do aumento da escolaridade, diminuição da mortalidade infantil, erradicação do trabalho penoso de crianças, manutenção de renda e do poder aquisitivo e a diminuição da pobreza, para aludirmos a apenas alguns indicadores mais utilizados.

Essa guerra, Sr. Presidente, a meu ver, não será vencida só pelo governo. Exigirá a conscientização, a participação e a mobilização de toda a sociedade, aí incluídas as empresas, os atores econômicos e todos os agentes sociais.

Aliás, certa feita, o presidente americano John Kennedy, disse que governar é administrar pressões. Com isso, penso que ele queria dizer que, obviamente, o Governo age em função das demandas da sociedade; e a sociedade tem que se caracterizar por uma cidadania ativa, que cobre, obviamente, o atendimento desses pressupostos básicos, indispensáveis a uma correta política de desenvolvimento.

A democracia começa no reino das consciências, e é, portanto, a partir da cidadania, que podemos fazer nossas opções. Que sejam opções corretas e que nos levem a ter uma maior participação na comunidade internacional dos nossos tempos.

Sr. Presidente, é preciso, portanto, trabalhar a questão da educação como prioridade das prioridades. É preciso também ampliar o esforço de congregar governo e sociedade nesse sentido, aproximar cada vez mais as políticas públicas das ações corretivas e compensatórias das desigualdades; especialmente também adotar medidas fiscais que reforcem os laços de solidariedade social, quer por meio da progressividade tributária, quer por intermédio de uma política de gastos públicos, fundada em benefícios comprometidos com a justiça social.

Temos uma carga tributária muito elevada, que cresce e que está próxima já de quase 37%, segundo dados revelados nos jornais de anteontem. E devemos destacar que essa elevada carga tributária penaliza os de menor poder aquisitivo, em função da alta regressividade dos tributos.

Sr. Presidente, para que aceleremos esse processo que se funda na educação, isso vai depender de três requisitos: primeiro, manter a estabilidade econômica. Isso significa manter o Plano Real, o mais bem-sucedido programa de estabilidade que o País já conheceu. Nenhum plano de estabilidade econômica foi tão completo e exitoso quanto o Plano Real. E a prova do que afirmo é o fato de ele estar em vigor há 13 anos, criando condições para que o País se liberte do vírus da inflação e possa ter, consequentemente, taxas continuadas de crescimento compatíveis. Então, como eu dizia, manter a estabilidade econômica, intensificar o desenvolvimento e modernizar, através de reformas políticas, os mecanismos decisórios do governo, melhorando a eficiência das instituições do Estado.

E, quando se fala em melhorar as instituições do Estado, Sr. Presidente, significa justamente criar instituições capazes de responder às demandas da sociedade. O grande desafio brasileiro é melhorar institucionalmente o País. Não podemos ficar dependendo de pessoas que têm, sobretudo, seus defeitos. Todo um processo vertebrado de desenvolvimento dependerá de instituições fortes, mesmo porque os homens passam, mas as instituições ficam. E são elas que asseguram um projeto continuado de crescimento.

Este é, portanto, o nosso desafio. Ninguém pode deixar de dar sua contribuição para eliminarmos a pobreza e reduzirmos as desigualdades, que, no Brasil, não são poucas nem irrelevantes.

Muito obrigado a V. Exª, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 21/02/2009 - Página 3135