Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Manifestação em defesa da Língua Portuguesa unificada e aceitação do Acordo Ortográfico, formulado por Portugal, Brasil e outros países da Língua Portuguesa.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA CULTURAL.:
  • Manifestação em defesa da Língua Portuguesa unificada e aceitação do Acordo Ortográfico, formulado por Portugal, Brasil e outros países da Língua Portuguesa.
Publicação
Publicação no DSF de 18/03/2009 - Página 5630
Assunto
Outros > POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • DEFESA, IMPORTANCIA, ACEITAÇÃO, ACORDO, UNIFICAÇÃO, PADRONIZAÇÃO, SISTEMA ORTOGRAFICO, COMUNIDADE, PARTICIPAÇÃO, BRASIL, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL, ANGOLA, MOÇAMBIQUE, CABO VERDE, GUINE-BISSAU, SÃO TOME E PRINCIPE, TIMOR LESTE, AMPLIAÇÃO, DIFUSÃO, DIVULGAÇÃO, FACILITAÇÃO, PROCESSO, INTERCAMBIO CULTURAL, INTERCAMBIO CIENTIFICO, INCLUSÃO, LINGUA PORTUGUESA, IDIOMA OFICIAL, ORGANISMO INTERNACIONAL, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU).
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, PROFESSOR, MEMBRO NATO, ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL), QUESTIONAMENTO, POLEMICA, DISCORDANCIA, PAIS ESTRANGEIRO, PORTUGAL, ANGOLA, ATRASO, FORMALIZAÇÃO, UNIFICAÇÃO, LINGUA PORTUGUESA.
  • SUGESTÃO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES (CRE), ENCAMINHAMENTO, REQUERIMENTO, CONVOCAÇÃO, REPRESENTANTE, GOVERNO, MINISTERIO DA EDUCAÇÃO (MEC), ITAMARATI (MRE), MINISTERIO DA CULTURA (MINC), ACADEMIA BRASILEIRA DE LETRAS (ABL), DISCUSSÃO, ACORDO, ORTOGRAFIA, LINGUA PORTUGUESA, VALIDADE, CUMPRIMENTO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, de alguns anos até esta data, estamos participando ativamente dos trabalhos da Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional, como membro efetivo, e tenho visto a preocupação de muitos dos seus integrantes com a falta de presença da nossa língua portuguesa nos organismos internacionais, nas traduções que são feitas, nos trabalhos que são efetivados. E, ao invés de considerarem a nossa língua como um instrumento de comunicação internacional, deixam a língua portuguesa num segundo plano, enquanto outros idiomas são destacados nesses encontros internacionais, principalmente na ONU (Organização das Nações Unidas).

O Brasil, como todos sabem, faz parte de um grupo de oito países que falam português. É a Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), uma federação de países que vem discutindo, há mais de 18 anos, as formas de unificação do idioma português, pelo menos na grafia, de forma que possamos estabelecer uma língua unificada, como já são, por exemplo, o francês ou o inglês.

Então, esse discurso é em defesa da língua portuguesa unificada e de muito mais presença da nossa língua nos fóruns internacionais. Por isso, tem muita importância, nesse sentido, o atual acordo ortográfico. Este acordo é parte das múltiplas iniciativas que o Brasil vem tomando, junto à comunidade de fala portuguesa, através do Governo, através de três dos nossos Ministérios, com a preocupação de unificar, consolidar e atribuir ao nosso idioma, ao português falado por essa comunidade de oito países, o status e a força que nosso idioma tem. E que merece ter.

Se compararmos, apenas a título de exemplo, nossa língua com o francês, falado por 77 milhões de pessoas, fica evidente que o português, abarcando 270 milhões de falantes, teria que ter uma presença mundial bem maior e, inclusive, poderia ter presença garantida como língua oficial nos organismos da ONU.

A ONU utiliza seis línguas oficiais: árabe, chinês, espanhol, francês, inglês e russo. Quase todas as reuniões oficiais são traduzidas simultaneamente para essas línguas. Quase todos os documentos oficiais, em suporte de papel e on-line, são traduzidos para esses seis idiomas. Em algumas esferas, inclusive, a ONU só opera com espanhol, francês e inglês. No entanto, o português é um dos grandes ausentes.

Temos que lutar pela nossa própria unidade. Nossa luta começa por aqui. Sabemos que existe uma diferença de grafia entre o português escrito de Portugal, do Timor Leste ou de Cabo Verde. Palavras como “espetáculo”, que tanto os lusitanos como os brasileiros pronunciamos “espetáculo,” são escritas pelos portugueses com um “c” mudo (espectaculo). O trema de palavras como “linguiça” já foi abolido em Portugal, mas o Brasil ainda o utiliza. E assim por diante.

Sabemos do nosso peso como nação de fala portuguesa. O Brasil é o País com o maior número de falantes no idioma português, com 190 milhões de habitantes, o que equivale a muitas vezes mais do que a soma de todos os demais países da comunidade de língua portuguesa; o Brasil possui muito mais gente falando português do que a soma dos habitantes de todos os sete países de língua portuguesa juntos. Por isso viemos, em todos esses anos, estabelecendo pontes, trocando informações e promovendo encontros com Portugal e outros membros da comunidade, de forma a que chegássemos a um acordo comum para um vocabulário comum, mesmo preservando a maneira peculiar e nacional de cada povo falar o português. Foi assim que, depois de quase 20 anos, chegamos a este Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa, que agora pode finalmente entrar em vigor, entrar no papel. Firmado em 1990, ele foi aprovado pelo Congresso em 1995.

Não se trata de um acordo português ou de um acordo brasileiro. Ele pertence às oito nações. Ele incorpora regras de todos os países, regras de Portugal, do Brasil, os dois mais influentes, e também dos seis demais países de língua portuguesa.

O acordo, em sua essência, apenas padroniza alguns pontos, como o emprego do hífen, algumas regras de acentuação e a queda de consoantes mudas. E estabelece, de forma bastante razoável, uma transição lenta da norma ortográfica atual para a nova, que irá durar os próximos três anos.

Assinado em Lisboa em 16 de dezembro de 1990, este acordo é considerado um marco de unificação da comunidade das oito países: Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, São Tomé e Príncipe, Timor Leste, Brasil e Portugal.

Esse acordo foi construído dentro da perspectiva do mais amplo bom-senso: ele se propõe a superar uma das grandes ou talvez a maior das barreiras que impede a mais ampla difusão da nossa língua, difusão que permitiria a publicação de livros e todo tipo de textos em comum dentro da comunidade, sua circulação oficial nos oito países e, em especial, permitiria encaminhar a nossa aceitação como idioma nos organismos oficiais internacionais, com reflexos sociais e econômicos no nosso Brasil e nos países da fala portuguesa. Já ressaltei o fato que o acordo resolve: as diferenças entre grafias impedem que sejamos aceitos como um idioma unificado. A intenção do acordo, portanto, vem a ser a de facilitar o processo de intercâmbio cultural e científico entre as nações e ampliar a divulgação do idioma e da literatura, inclusive científica, em língua portuguesa.

As culturas particulares serão respeitadas, a pronúncia será absolutamente respeitada, mas teremos, finalmente, uma língua que será escrita da mesma forma em Portugal, no Brasil e nos demais países que falam português.

Com a aprovação desse acordo por mais de três países, desde 2006, com sua ratificação por São Tomé e Príncipe, por Cabo Verde, pelo Brasil e por Portugal, ele está completamente em vigor. Entraria agora em fase de transição para sua implementação definitiva em 2012.

No entanto, tem havido resistências, Sr. Presidente, por parte de setores de Portugal. Segundo se observa na imprensa portuguesa, instalou-se um relativo silêncio oficial, acompanhado por manifestações contrárias ao acordo.

O professor Arnaldo Niskier, membro nato da Academia Brasileira de Letras, escreveu, recentemente, artigo na Folha de S.Paulo, chamando ao bom senso e apelando para que aqueles em Portugal que não concordam com a implementação do acordo ponderem sobre a enorme vantagem de finalmente termos um único idioma, grafado da mesma forma, como já fazem os ingleses, os franceses. Se não fizermos isto, ficaremos em desvantagem em relação a países bem menores que nós, mas que, graças à unificação de seu idioma, atingem esferas que não alcançamos.

Niskier registra o desentendimento de Portugal, por exemplo, que não abre mão de escrever “Antonio” com acento agudo - como se pronuncia em seu país - ou de Angola, que quer que palavras como quitanda sejam escritas com “k”, como acontece naquele país africano.

Ora, Sr. Presidente, por causa de minúcias desse tipo é que o acordo, em Portugal e em Angola, ainda não está sendo aceito, o que é um absurdo.

Enquanto tais divergências continuarem, não teremos um idioma comum, com um vocabulário comum, não seremos vistos pela comunidade internacional como uma única língua que somos. Certos meios culturais e uns poucos jornais de Portugal estão estimulando aquilo que o Professor Niskier chama de uma “guerra de palavras”. Com atitudes assim, põe-se em risco o destino comum de vários povos que conquistaram o raro privilégio de falar a língua de Euclides da Cunha e de Fernando Pessoa e que, por questões menores, poderão continuar impedidos de ocupar o espaço que 190 milhões de brasileiros ou, totalizando, quase 300 milhões de falantes de português têm direito legítimo de ocupar. É essencial, Srª Presidente, que prevaleça o acordo já assinado e aprovado pela maioria, costurado pacientemente por quase 20 anos, e que finalmente se formalize a unificação do português. Digo de novo: é preciso que prevaleça o bom senso.

O Ministério da Educação, o da Cultura e o das Relações Exteriores estão empenhados em conjunto com a Academia Brasileira de Letras e as entidades equivalentes nos outros países da comunidade portuguesa para que isso aconteça. De nossa parte, como Casa política, nós nos empenharemos para que este acordo do vocabulário comum prevaleça. Ele altera apenas alguma coisa em torno de 1% das palavras de cada país. Não vamos atrasar o progresso em nome de 1% de palavras, ainda mais que, em alguns casos, como o hífen, o Acordo chegou a uma relativa simplificação da utilização deste sinal gráfico, cujas regras estão entre as mais complexas da norma ortográfica. O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa agora é lei. Seu prazo de transição, de três anos a contar de janeiro de 2009 até dezembro de 2012, permite que se resolvam, de forma satisfatória, problemas menores de adaptação. Além disso, em relação a várias palavras mais polêmicas, o Acordo permite que permaneça a dupla grafia, como é o caso de “fenómeno” e de “fenômeno”, em que fica respeitada a diferença de entonação entre brasileiros e portugueses.

Só cito esses exemplos, Srª Presidente, para mostrar que se pensou de forma flexível em uma razoável transição, em razoáveis regras de convivência, de respeito às diferentes culturas, às diferentes entonações, de forma a se garantir o essencial: um idioma comum, que se escreva da mesma forma e que, assim, possa assegurar o status que merece. Tradições foram rigorosamente respeitadas. Chamo a atenção para que adotemos uma forma comum de comunicação escrita, para que assumamos, de vez por todas, a força do nosso idioma tão rico, tão diversificado, tão forte culturalmente, para que ele não permaneça no ostracismo oficial, internacional, sendo falado por centenas de milhões, mas tratado como se fosse uma língua de algumas dezenas ou milhares, apenas por conta de diferenças menores de grafia.

Srª Presidente, acho que não só este Plenário deveria se preocupar com a efetiva aceitação desse acordo ortográfico, que foi celebrado por Brasil, Portugal e outros países de língua portuguesa, como também nossa comissão específica, a Comissão de Relações Exteriores, da qual V. Exª faz parte também - V. Exª sempre foi um dos membros proeminentes da Comissão de Relações Exteriores. Tenho certeza de que não só V. Exª como os demais membros desta Comissão, a partir do seu Presidente Eduardo Azeredo, haveremos de lutar, inclusive fazendo requerimento de convocação de representantes do Governo do Ministério da Educação, do Ministério das Relações Exteriores, do Ministério da Cultura e também da Academia Brasileira de Letras, a fim de discutirmos, em todos os seus pormenores, esse Acordo e a validade do seu cumprimento.

Era o que eu tinha a dizer, Srª Presidente.

Muito obrigado pela tolerância de V. Exª.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/03/2009 - Página 5630