Discurso durante a 28ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Decepção com a matéria de autoria do Jornalista Ricardo Noblat, intitulada "Velhacos!", publicada no jornal O Globo de ontem, a respeito do Senado Federal.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IMPRENSA. SENADO. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.:
  • Decepção com a matéria de autoria do Jornalista Ricardo Noblat, intitulada "Velhacos!", publicada no jornal O Globo de ontem, a respeito do Senado Federal.
Aparteantes
Alvaro Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 18/03/2009 - Página 5634
Assunto
Outros > IMPRENSA. SENADO. ATUAÇÃO PARLAMENTAR.
Indexação
  • MANIFESTAÇÃO, FRUSTRAÇÃO, DIVULGAÇÃO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), AUTORIA, JORNALISTA, DIFAMAÇÃO, SENADOR, FALTA, IDONEIDADE, MORAL, SENADO.
  • QUESTIONAMENTO, FALTA, MOBILIZAÇÃO, SENADOR, RESPOSTA, POPULAÇÃO, BUSCA, MOTIVO, DIFAMAÇÃO, DEFESA, MORAL, INTEGRIDADE, MEMBROS, SENADO.
  • SUGESTÃO, PRESIDENTE, SENADO, CRIAÇÃO, COMISSÃO, DEBATE, SITUAÇÃO, FALTA, CONFIANÇA, POPULAÇÃO, SENADOR, BUSCA, MOTIVO, ERRO, CONDUTA, VIABILIDADE, SOLUÇÃO, MELHORIA, REPUTAÇÃO, LEGISLATIVO.
  • ESCLARECIMENTOS, CONDUTA, ORADOR, MANUTENÇÃO, TRABALHO, RECESSO, PRESTAÇÃO DE CONTAS, UTILIZAÇÃO, VERBA, INDENIZAÇÃO, AUSENCIA, ONUS, SENADO, VIAGEM, AMBITO INTERNACIONAL.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Srª Presidenta, fico feliz de falar sempre que tem uma mulher na Presidência desta Casa; Srªs Senadoras, Sr. Senadores.

Senador Mão Santa, O Globo, de ontem, um dos jornais mais respeitados não só do Brasil, Senador Gim, mas, eu diria até, de todo o continente e no mundo, em uma de suas colunas mais respeitadas que há, escrita por um dos jornalistas mais respeitados deste País, ontem, quando eu abri, de manhã, o jornal, vi o título da matéria: Velhacos! Quando vi este título, pensei que o jornalista Ricardo Noblat iria falar dos traficantes de drogas deste País. Eu achei que ele iria falar daquele padrasto, que engravidou uma menina. Eu achei que ele iria falar dos pedófilos, que o nosso Senador Magno Malta tem descoberto por este País afora. Mas ele falava da gente, Senadora! Ele falava do Senado! Aí achei que talvez eu estivesse com o significado equivocado da palavra “velhaco”, e fui ao dicionário. Tanto no Houaiss quanto no Aurélio o que está escrito - lamento não tê-los trazido - é que “velhaco” - não há dúvida - significa “traiçoeiro; mentiroso; quem engana; quem vende o que não tem; quem não presta;” e por aí afora. Eu não estou falando de um jornalista qualquer; estou falando de um jornalista respeitado, sério, com o qual, inclusive, tenho muito boa relação de amizade. Não estou falando de um jornal qualquer; estou falando de O Globo, de uma coluna importante. Agora, o que me assusta, não é que o jornalista tenha dito isso, é que a gente não esteja fazendo nada.

Mas não é a primeira vez. O Senador Jarbas Vasconcelos, faz pouco tempo, falou, aqui, não com estas palavras, mas falou coisas aqui que mereciam um aprofundamento, uma análise, uma avaliação em saber onde é que esses caras estão nos difamando, ou onde é que nós estamos errando, porque eles estão dizendo a verdade, e nós não estamos respondendo ao povo brasileiro se são difamadores ou se nós é que estamos errando. Prefiro analisar pelo lado melhor para encontrarmos um caminho: é de que, em princípio, não é difamação, de que, em princípio, algo estamos fazendo que leva a essa desmoralização. Temos de pensar por que estamos passando por esse momento! E, antes mesmo disso, para justificar pensarmos e sabermos como sair disto, creio que a gente deve pensar quais são as consequências. A consequência da desmoralização do Congresso tem, em primeiro lugar, o destino de desmoralizar a própria democracia. E nós somos os zeladores da democracia. Se nós somos os zeladores da democracia, temos que zelar pelo Congresso. Se nós temos que zelar pelo Congresso, temos de impedir que haja qualquer motivação para que ocorra um discurso como o do Senador Jarbas, ou para que haja uma matéria como essa do Senador, desculpe-me - ele deve ter considerado que eu o ofendi ao chamá-lo de Senador, o jornalista Ricardo Noblat. Esta é a primeira consequência: a desmoralização completa da democracia através da Casa. Uma segunda consequência, que talvez poucos estejam imaginando, é o que é que passa na cabeça dos jovens brasileiros quando eles veem que Senador é “velhaco”. O que eu imagino, é que nenhum jovem sério vai querer sentar nesta Cadeira. Ou seja, quem quiser vir para cá, já vou começar a ficar desconfiado que quer vir tirar proveito, porque essa é a imagem que temos hoje. Então, primeiro, é a democracia; segundo, é a juventude e o que ela está pensando, que são os que vão nos substituir. Temos de ser substituídos por melhores que nós. Mas, com essa imagem, os melhores não vão querer. E o terceiro - acho que temos o direito e a obrigação - é pensar individualmente. Qual é a consequência disso sobre cada um de nós, Senadora Serys Slhessarenko? Qual é a consequência sobre cada um de nós, cidadãos, que aqui estamos, quando existe essa generalização, e existe, sim, um tipo de trabalho que hoje está sob suspeição? Eu trabalhei, porque moro aqui - os outros não poderiam fazer isso -, eu moro em Brasília, eu trabalhei todos os dias do recesso, salvo, o dia 26, que era uma sexta-feira, e salvo, o dia 2 de janeiro, que era uma sexta-feira. E aqui estão outros dois Senadores que trabalharam aqui. Eu não consigo trabalhar sozinho no gabinete. Se eu vier sozinho para o gabinete é porque estou lendo. Para trabalhar, eu tenho que ter gente ao telefone, eu tenho que ter gente colaborando. Teve horas extras. Houve dia em que o vigilante teve que tirar os meus funcionários do gabinete, porque disse que não tinha permissão para continuar. Mas, estamos sendo acusados de desperdiçar dinheiro público.

Vamos falar com franqueza: qual de nós virá trabalhar no próximo recesso? Eu tenho dúvidas se vale à pena vir trabalhar?

Agora, estão falando em viagens internacionais.

Eu levantei 22 convites internacionais no ano passado, todos pagos por entidades estrangeiras, entidades brasileiras, mas não pelo Senado. Não consegui, obviamente, atender nem metade dessas.

Fiz quatro viagens ao Uruguai como membro do Parlamento do Mercosul, porque sou latino americanista, porque acredito na integração. Porque acho que a gente deve defender uma pátria única na América Latina. Hoje eu me pergunto se vale a pena ser Deputado do Mercosul e ser acusado. Tenho de sair daqui de madrugada, deixando a família aqui; a volta, sempre às cinco da manhã, do Uruguai para cá. Fica um dia lá, não tem tempo de nada. Vale a pena? Talvez, melhor deixar para outros.

Hoje de manhã, na Comissão de Educação, um importante Senador, ex-Governador, não de primeiro mandato, Senador como eu, Governador de mais de um mandato - se quiserem, vão eliminando e cheguem, se quiserem - disse-me que tem, todos os dias, a tentação de renunciar ao mandato de Senador. Um importante Senador, ex-Governador, com mais de um mandato aqui nesta Casa.

Nestas condições, Senador Mão Santa, a gente começa a achar que o Senador Jefferson Péres tinha razão, quando ele disse que não se candidataria outra vez. Ele não disse que renunciaria, porque a renúncia, eu acho, que a gente não deve fazer mesmo. Mas, se cada um começar a não querer voltar para cá, pelos riscos que a gente tem. Será que vale a pena voltar para trabalhar, aqui, como Senador, se não for para lutar, no meu caso, por uma revolução pela educação? Para mim, não vale a pena. Como é que vou fazer isso sem usar recursos da verba indenizatória? Porque eu a uso e presto contas todos os meses. Há mais de um ano presto contas para onde foi cada Real. Mas, como é que vou fazer as manifestações pelo educacionismo, pela revolução educacional?

Não há dúvida que precisa! Mas, hoje, está sob suspeição. E tem gente achando que o certo é incorporar isso no salário. Aí é aumentar o salário. Eu sou contra. Não tem que aumentar mais o salário. Agora, não ter recursos para você gastar na luta que você tem por um Brasil melhor, para as crianças irem para a escola, dá para se perguntar se vale a pena! Mas, ao mesmo tempo, vale a pena ficar sob suspeição por que usa esse dinheiro corretamente, mesmo que justificando transparentemente? É capaz de não valer. Porque o amor à Pátria, o amor à revolução pela educação tem que ser menor do que o amor pela honra. Quando houver uma ameaça, eu não terei dúvidas: peço licença, mas o meu patriotismo é menor do que meu apego à honra.

Hoje está difícil ser político. Eu nem falo de caixa 2 para ganhar a eleição. Eu falo pura e simplesmente do uso transparente, correto, para levar adiante a missão.

(A Srª Presidente faz soar a campainha.)

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu tenho um aparte, Senadora, mas queria avançar um pouquinho mais.

E as passagens? A quantidade de convites que eu recebo de estudantes para fazer palestra que não têm dinheiro nem para pagar o táxi para me buscar no aeroporto. Eu pago. Qual é o problema de eu usar a passagem, transparentemente, do Senado? Podem olhar, nunca parente, conhecido, amigo viajou com cota do Senado. Não fiz uma viagem de férias por cota do Senado. Mas não atender a convite de estudantes para fazer palestras? Não ter ido ao Rio Grande do Sul para apoiar os professores na sua luta, acho que é não cumprir o meu papel.

Pois quero dizer que começo a duvidar se vale a pena aceitar convites para fazer palestras quando os estudantes não puderem pagar a minha passagem. Aí só vou aceitar passagem e fazer conferência para empresários, para banqueiros, para quem pode pagar as passagens. Aí é melhor não ir. Aí é melhor não estar aqui. Aí é melhor não cumprir o mandato, porque um mandato só pelo cargo!

Um mandato para quê? Tenho a sorte de, como ex-Reitor da Universidade de Brasília, não precisar deste salário na hora em que sair daqui. Então, não é por causa de salário. Já moro em Brasília, se é que alguns Senadores amam Brasília e são Senadores só para ficarem aqui, já moro aqui. Não vejo vantagens, a não ser a luta. Agora, a luta sem ameaçar nem um trisque da honra que a gente constrói ao longo do tempo.

Pois bem, quando vi “velhacos”, não venham me dizer que não foi comigo, não venham dizer que foi com outros. Não. Foi com a Casa. E eu me sinto parte desta Casa. Mas isso não quer dizer que a gente deva passar a mão na cabeça.

Por isso, vou querer fazer uma sugestão ao Presidente Sarney, mas antes quero passar a palavra ao Senador Alvaro Dias.

O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Senador Cristovam, o discurso de V. Exª é tão importante que não poderia ficar sem pelo menos um aparte para aplaudi-lo em nome, certamente, de todos os colegas. V. Exª faz uma análise insuspeita, até porque tem credibilidade e autoridade moral e política para fazê-la. Eu assino embaixo das declarações de V. Exª, da tribuna do Senado, hoje. O Senado tem que ser transparente mesmo. Temos que fazer um diagnóstico da gestão administrativa da Casa. Temos que buscar um modelo de gestão mais eficiente, mais transparente, mais econômico, sem dúvida nenhuma. Que se façam denúncias sobre eventuais irregularidades existentes aqui, e temos que investigá-las, mas não podemos, de forma alguma, fazer com que, quando as luzes se voltem para o Congresso Nacional, apaguem-se sobre o Executivo. Uma denúncia feita aqui há poucos dias de que o BNDES realizou uma operação irregular da ordem de R$650 milhões já está esquecida. Quando a imprensa noticia que os gastos sigilosos da Presidência da República cresceram 116%, não há espanto mais. Houve a banalização. Quanto custa por mês o Aerolula, as diárias, as viagens no Poder Executivo?Temos que investigar aqui, mas temos que investigar lá. As contas da Presidência da República não podem ser sigilosas. Estão gastando muito mais nos cartões corporativos do que gastavam antes, e fizemos uma CPI para nada. Portanto, V. Exª tem razão. Temos que defender a instituição parlamentar, que é a defesa da própria democracia. Temos que ser transparentes sim. Concordamos que se analise, que se faça o diagnóstico, que se proponha, que se encontre um novo modelo de gestão para administrar a Casa.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador.

Eu quero, na sua linha, talvez até avançando um pouco, dar algumas sugestões não de como resolver, mas de como buscar a solução.

O Presidente Sarney criou uma Comissão para buscar saídas para a crise econômica. Eu sou favorável a que ele crie esta Comissão. Agora, eu acho que antes ele deveria criar uma Comissão para ver como é que se sai da situação que a gente vive de descrédito e de desmoralização. Para isso, basta esta Comissão começar a responder a algumas perguntas. Por que, Senador Alvaro, viramos alvo? O que fizemos de errado para virarmos alvo?

Não vamos achar que quem está atirando na gente o faz por gosto, porque são conspiradores que querem fechar o Congresso. Não! Algo tem aí que nos levou a sermos alvos! O que foi? Por que o povo está acreditando nas denúncias? Se o povo está acreditando, a culpa não é do povo, a culpa é nossa, algo fizemos ou deixamos de fazer, porque a gente está pensando muito no que foi feito, mas pensando pouco nos nossos erros por omissão, como esta sessão de hoje aqui, com apenas 36 Senadores no painel, o que significa que estão na Casa, mas não aqui debatendo.

Por que perdemos credibilidade? Quais foram os erros nos últimos anos? Até porque não há como jogar a culpa desta crise na gestão que assumiu há um mês. Não tenho dúvida de que se o meu candidato, Tião Viana, tivesse ganhado estaríamos hoje um pouco melhor. Mas a culpa não é do descrédito dos atuais dirigentes nem do Presidente Sarney, ela já vem de antes.

O que mudar para recuperar a credibilidade? O que mudar para recuperar a credibilidade?! E umas perguntas certas: Quais as verdades do Jarbas? Quais as verdades do Jarbas?

Aí vão dizer: mas ele só acusou o PMDB. Não, ele tocou na classe política em geral. Quais as verdades do Ricardo Noblat na matéria de ontem? Como sair da letargia? Porque não é só sair dos maus usos que alguns de nós fazem ou então não explicarmos bem os bons usos. Há duas falhas hoje. Os maus usos nos desmoralizam e os bons usos não estão sendo bem explicados. Eu gostaria de sugerir ao Presidente Sarney que crie uma comissão, coloque alguns de nós para discutirmos com profundidade onde é que nós estamos errando, errando, errando e errando, a ponto de termos uma manchete nos chamando de velhacos, com toda a força que essa palavra tem. E eu recomendo que aqueles que ainda tenham dúvidas olhem no dicionário. Porque não é uma dessas palavras mais feias que a gente não deixa as crianças dizerem, não é. Mas o conteúdo dela é tão feio quanto algumas das piores palavras que podem ser ditas. Eu deixo aqui essa sugestão ao Presidente Sarney. Vamos refletir onde estamos errando. E, a partir daí, vamos ver como a gente, ao receber uma crítica, possa respondê-la à altura. Hoje não estamos em condições. Hoje estamos sendo obrigados, Senador Alvaro, a engolir acusações como essa.

Obrigado, Presidenta, pelo tempo extra que me deu.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/03/2009 - Página 5634