Discurso durante a 30ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

O excesso de leis no Brasil.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLATIVO.:
  • O excesso de leis no Brasil.
Publicação
Publicação no DSF de 20/03/2009 - Página 5797
Assunto
Outros > LEGISLATIVO.
Indexação
  • COMENTARIO, COBRANÇA, SOCIEDADE, EFICACIA, CONGRESSO NACIONAL, APRECIAÇÃO, APROVAÇÃO, PROJETO DE LEI.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, HISTORIA, TRABALHO, LEGISLATIVO, EXCESSO, LEIS, BRASIL, CRITICA, CRITERIOS, CRIAÇÃO, LEGISLAÇÃO, PREJUIZO, INTERESSE, POPULAÇÃO, IMPORTANCIA, SIMPLIFICAÇÃO, LEGISLAÇÃO FEDERAL, APERFEIÇOAMENTO, ORDEM JURIDICA.

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O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Senador Mão Santa. Obrigado, inclusive, pela cessão do tempo, pois estou usando o tempo que lhe pertencia.

Sr. Presidente, Srª Senadora Lúcia Vânia, Srs. Senadores, o Congresso, em geral, e o Senado, em particular, têm sido sistemática e insistentemente cobrados por não apreciar, nem aprovar, com a eficiência apontada por todos, as leis que o País e a sociedade estariam a reclamar. Isso se traduz, via de regra, na exposição dos plenários vazios e na constatação diuturna da ausência de votações.

Vamos aos fatos: nos dez primeiros anos, Senador Mão Santa, que se seguiram à Constituição de 1946, o Congresso Nacional aprovou 3.346 leis, ou seja, uma média de 334 leis por ano, num período em que o ano legislativo durava oito meses, hipótese em que a média era de 41,75% de leis por mês. Se contarmos os anos que vão de 1958 a 04 de março deste ano, ou seja, 602 meses, foram aprovadas e promulgadas 8.563 leis. A média anual, portanto, baixou para 173,06 por ano. Tomando-se a média de dez meses por ano, isso significa 27,3 leis por mês.

Os números, Sr. Presidente, aparentam dar razão às reclamações, se levarmos em conta apenas os números, não as circunstâncias. Em primeiro lugar, Senador Valter Pereira, o decênio seguinte à redemocratização, materializada com a Constituição de 1946, foi o período de reconstrução do modelo político e, mais do que isso, das instituições políticas democráticas que o novo regime erigiu sobre os escombros do Estado Novo. Portanto, foram anos atípicos.

O que deve nos constranger, porém - e tenho absoluta convicção disso -, não é a evidência aritmética, mas, ao contrário, o excesso de leis que entulham o ordenamento jurídico do País, cada vez mais difícil de ser dominado por qualquer mortal, se contarmos a enorme variedade da hierarquia de normas jurídicas que alimentam a monumental burocracia do Leviatã contemporâneo em que se transformou o poder público no Brasil.

Na verdade, não temos do que nos queixar. Temos mesmo é de lastimar o excesso a que chegamos nessa matéria. Há leis demais e direitos de menos. Melhor estaríamos, Senador Mão Santa, se, em vez de milhares de leis, tivéssemos adotado as regras de Ulpiano, por exemplo. Ele dizia: “Viver honestamente, não lesar o próximo e atribuir a cada um o que é seu”. Isso é menos que a lei das 12 tábuas e menos ainda que os mandamentos da Igreja. Como nos falta esse dístico eloquente, resta-nos adotar, juntamente com as milhares de leis já editadas e produzidas, o lema que encima a porta do Inferno de Dante: “Deixai aqui, ó vós que entrais, toda a esperança”.

Mais do que esse cipoal de leis ordinárias, de leis complementares, de decretos-leis, de leis delegadas, de PECs, de medidas provisórias, de decretos legislativos, de resoluções, de atos e de instruções normativas de toda ordem, de códigos e de consolidações, necessitamo-nos ocupar em racionalizar, sistematizar, codificar, compilar, consolidar e simplificar a legislação brasileira, Senador Mão Santa. Sem esforço dessa natureza, continuaremos, como até hoje, padecendo do mal que nenhum governo foi capaz de debelar ou de, pelo menos, amenizar.

Quando priorizamos a quantidade em detrimento da qualidade das leis, é hora de nos dedicarmos a rever esse emaranhado de leis e de normas que geramos, que foge ao alcance e à compreensão do cidadão brasileiro. Da forma como está, a sensação que passa é que toda essa produção legislativa é contra o cidadão, não a seu favor. Ao Congresso, de fato, cabe legislar, fazendo leis boas e justas, mas a quem cabe legislar cabe também a tarefa de aperfeiçoar o conjunto normativo nacional.

Por que não o fazemos, Senador Efraim? É porque o compromisso com o aperfeiçoamento jurídico cede sempre à tentação de darmos resposta imediatista às cobranças para votarmos, votarmos e votarmos, como se votar qualquer coisa e em quantidade nesta Casa significasse avanço no aperfeiçoamento do nosso ordenamento jurídico.

Esse tema desafia a agenda política do Congresso, desde que, na sessão de 16 de setembro de 1970, o falecido Deputado Henrique Turner, representante de São Paulo, Estado do Senador Suplicy, proferiu o discurso a que deu o título de “Reforma Legislativa para a Reforma do Legislativo” e apresentou projeto de lei complementar dispondo sobre “o processo legislativo, as normas técnicas para numeração, alteração, redação e controle das leis”. Sua ideia, Sr. Presidente, dormitou por dezoito anos na burocracia legislativa, mas frutificou no art. 59 da Constituição, cujo parágrafo único dispôs que “lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis”. Sua ideia foi materializada em duas leis complementares: a de nº 95, de 26 de fevereiro de 1998, e a de nº 107, de 26 de abril de 2001, que alterou a anterior.

O que nos falta, então, Sr. Presidente, se leis há em excesso, inclusive as que determinam a consolidação e a simplificação das leis? De que vale, ante a nossa inércia, o princípio universal que muitos de nós aprendemos na Faculdade de Direito, segundo o qual a ninguém é lícito alegar ignorância da lei para deixar de cumpri-la? Creio que, nesse caso, pode acudir-nos a lição de Tácito, Senador Mão Santa, V. Exª que cita tanto os filósofos. Ele dizia “corruptissima res publica, plurimae leges”, ou seja, o mais corrupto dos Estados é o que tem o maior número de leis.

Legislar tem sido, no Brasil, desde tempos imemoriais, uma atividade em que os interesses se sobrepõem à utilidade e às demandas coletivas da sociedade. Ou resgatamos essa dívida que temos com a sociedade, ou pagaremos o preço de nossa omissão, de nossa indiferença e de nosso desinteresse, se não quisermos, Senador Mão Santa, arrostar o julgamento da História.

Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

Muito obrigado.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Fugindo à formalidade, Senador Geraldo Mesquita, eu pediria a V. Exª que repetisse o nome daquele filósofo cujas leis são menos de dez, para eu gravar essa mensagem na minha mente e dar oportunidade para que o Brasil aprenda.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Deixe-me localizar aqui, Senador Mão Santa. É Ulpiano.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Como é o nome?

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Ulpiano.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Ulpiano.

O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Ele pregava o seguinte: “Viver honestamente, não lesar o próximo e atribuir a cada um o que é seu”.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/03/2009 - Página 5797