Discurso durante a 53ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Importância da audiência pública realizada, ontem, na CDH, que tratou da questão da violência contra a mulher trabalhadora na área rural. Transcrição de documento da Campanha Mundial da Via Campesina.

Autor
Serys Slhessarenko (PT - Partido dos Trabalhadores/MT)
Nome completo: Serys Marly Slhessarenko
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DIREITOS HUMANOS. FEMINISMO.:
  • Importância da audiência pública realizada, ontem, na CDH, que tratou da questão da violência contra a mulher trabalhadora na área rural. Transcrição de documento da Campanha Mundial da Via Campesina.
Publicação
Publicação no DSF de 17/04/2009 - Página 11659
Assunto
Outros > DIREITOS HUMANOS. FEMINISMO.
Indexação
  • REGISTRO, AUDIENCIA PUBLICA, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, DEBATE, VIOLENCIA, CAMPO, VITIMA, MULHER, CAMPANHA, DEFESA, FEMINISMO, TRABALHADOR RURAL, LEITURA, DECLARAÇÃO, LIDER.
  • DEFESA, TRANSFORMAÇÃO, MINISTERIO, SECRETARIA ESPECIAL, POLITICA, MULHER.
  • APOIO, CAMPANHA, ENTIDADE, AMBITO INTERNACIONAL, TRABALHADOR RURAL, COMBATE, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, IMPORTANCIA, RECONHECIMENTO, IGUALDADE, CONTRIBUIÇÃO, DESENVOLVIMENTO, AGRICULTURA, BIODIVERSIDADE, ALIMENTAÇÃO, CULTURA, TRADIÇÃO, OPOSIÇÃO, APROPRIAÇÃO, PATENTE DE REGISTRO, EMPRESA MULTINACIONAL, LEITURA, TRECHO, DOCUMENTO.
  • CONCLAMAÇÃO, SOCIEDADE, COMPROMISSO, PAZ, IGUALDADE, DIREITOS.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


A SRª SERYS SLHESSARENKO (Bloco/PT - MT. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Obrigada, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, ontem, na Comissão de Direitos Humanos, houve uma audiência pública que, eu diria, foi da maior importância. Nessa audiência, tratou-se da violência no campo, mais especificamente da violência contra a mulher trabalhadora na área rural. Aqui, inclusive, está o folder da campanha “Mulheres donas da própria vida. Viver sem violência: direito das mulheres do campo e da floresta”.

Antes de iniciar propriamente minha fala, vou ler rapidamente o que disse Dona Raimunda dos Cocos, liderança do Movimento das Mulheres Quebradeiras de Coco e Babaçu:

A gente quer paz, a gente não quer briga, não quer morte, a gente quer vida. A gente trabalha para ter vida, para ter o que comer, ficar com a barriga cheia, uma casinha para morar, ter água fria para beber, ter uma vida digna onde a gente está. Não queremos tomar nada de ninguém, só queremos o nosso direito para viver e ter gosto de viver.

É uma campanha que está acontecendo no Brasil inteiro pelo enfrentamento da violência contra as mulheres do campo e da floresta e que conta com a participação do nosso Ministério. O Presidente Lula já declarou que encaminhará ao Congresso Nacional a transformação da Secretaria Especial de Políticas para Mulheres, hoje muito bem comandada pela Ministra Nilcéia Freire. É uma Secretaria com status de Ministério, mas, para ser forte e para responder realmente às necessidades das mulheres deste País, precisa ser transformada em Ministério - não tenho dúvida disso.

Estamos de posse de um documento, que não vamos ler na íntegra -pedimos que seja registrado na íntegra -, que trata da Campanha Mundial da Via Campesina para acabar com a violência contra as mulheres.

O que é a organização da Via Campesina Internacional? A Via Campesina é um movimento internacional de camponeses e de camponesas, de pequenos e de médios produtores, de mulheres rurais, de indígenas, de gente sem terra, de jovens rurais e de trabalhadores agrícolas. Defende os valores e os interesses básicos de seus membros. É um movimento autônomo, plural, multicultural, independente, sem nenhuma filiação política, econômica ou de outro tipo. As organizações-membros da Via Campesina provêm de 56 países da Ásia, da África, da Europa e do continente americano.

As mulheres levam, em nível interno da Via Campesina, toda uma vida de luta e de resistência camponesa, indígena e afrodescendente. Tem havido muito sacrifício, mas também sucessos e satisfação dentro do movimento. O significado de posicionar o trabalho das mulheres em nível interno da Via Campesina e a paridade de gênero têm sido um bom logro.

Estamos conscientes de que, na Via Campesina, o maior logro das mulheres é o reconhecimento do trabalho que realizam nas organizações camponesas, indígenas e afrodescendentes, o papel das mulheres no desenvolvimento da agricultura, na biodiversidade e na alimentação e, sobretudo, o empenho para não se deixar submeter às transnacionais, que tentam apropriar-se do conhecimento das mulheres, utilizando o sistema de patentes para privatizar esse conhecimento, e a riqueza cultural conservada pelas mulheres, no que destacamos a soberania alimentar como termo de referência necessário para uma verdadeira libertação das mulheres e de nossos povos no geral, que permita construir um mundo sem discriminação, onde possamos ser consideradas como seres humanos.

[...]

A sociedade mostra a cada dia que ainda há muitas contradições, especialmente na desigualdade de gênero, na divisão sexual do trabalho, que mantém as mulheres como responsáveis pelo trabalho doméstico e com o cuidado dos filhos, doentes e idosos nas famílias. No trabalho assalariado, as mulheres, ainda que tenham a mesma ou maior qualificação para exercer a mesma função, recebem salários menores que os homens.

[...]

Chamamos atenção para a quase inexistência de pesquisas com recorte de gênero, raça ou etnia, além das já existentes serem parciais, especialmente quando se trata de mulheres camponesas. Esse fator limita e, por outro lado, nos desafia a buscar alternativas para solucionar esta questão.

[...]

A violência física, por exemplo, acontece através de tapas, socos, pontapés, puxões de cabelo, com uso de arma branca e de fogo e, muitas vezes, leva à morte. A violência moral e psicológica atinge a autoestima da mulher que é agredida verbalmente, humilhada, ameaçada. Essa é a forma mais velada de violência, que incapacita a reação da mulher, que, muitas vezes, fica resignada e aceita como natural esse tipo de agressão.

[...]

Dados da OMS mostram que de 10% a 34% das mulheres no mundo já foram agredidas e que, em 70% dos casos, essas agressões partem de seus maridos, companheiros ou namorados.

[...]

4) Caráter da campanha mundial pelo fim da violência contra as mulheres.

A campanha tem como foco central o enfrentamento a todas as formas de violência praticadas contra as mulheres do campo, mas também quer dar visibilidade à violência praticada contra todas as mulheres da classe trabalhadora [Na audiência pública de ontem, tratou-se do caso das mulheres que vivem, moram e trabalham no campo]. O caráter é de denúncia e pelo fim de todas as formas de violência, para desmistificar a violência naturalizada contra as mulheres [tida como natural por aí] e para mostrar que a violência é estrutural numa sociedade patriarcal.

[...]

5) Objetivos da campanha:

- fazer a denúncia da violência praticada contra as mulheres em todos os países;

- fortalecer a organização e a luta das mulheres por sua emancipação e avançar na igualdade de gênero e na participação das mulheres nos espaços de poder;

     aumentar o nível de consciência das mulheres para se compreenderem as causas da violência;

     contribuir com a construção de um projeto de sociedade global justo e igualitário, entendendo que, no capitalismo e na cultura patriarcal, não há espaço para mudanças;

     fortalecer alianças com todas as entidades, movimentos e pessoas que estejam dispostas a assumir a campanha como uma bandeira de luta;

     pressionar para que os governos cumpram os acordos nacionais e os tratados internacionais e implementem políticas públicas para o combate a todas as formas de violência contra as mulheres.

É um movimento da Via Campesina. Ontem, a Srª Rosângela fez um discurso importantíssimo, assim como as outras seis companheiras que estavam à Mesa. Orientaram suas falas no sentido da busca de contribuições para superarmos realmente a violência.

Ontem, tratou-se do caso específico da mulher que mora, vive e trabalha, como eu já disse aqui, na área rural. É muito mais difícil a vida e a situação dessas mulheres. A mulher que vive nas áreas urbanas de maior movimento, nas grandes cidades principalmente, já conta hoje com as delegacias especializadas para as mulheres, com casas de acolhimento para as mulheres. Se para essa mulher a questão da violência doméstica especificamente ainda é muito significativa, procuremos imaginar a situação daquela que vive no campo. A gente não tem como avaliar o tamanho da violência cometida contra a mulher que mora na área rural e a dificuldade que ela enfrenta para se libertar dessa violência. No campo, muitas vezes, a mulher não conta sequer com a ajuda de uma pessoa na vizinhança, não tem para onde ir, não tem onde pedir socorro.

Fico imaginando, Senador Jefferson Praia, o que acontece com a mulher lá do Amazonas se, de repente, sofrer uma violência, uma lesão corporal grave até. Ela vai ter de pegar até barco para chegar a alguma delegacia, que não é delegacia da mulher, com certeza. O Senador fez uma brincadeira: ela pode até se afogar. Isso pode acontecer com certeza e com facilidade, e ninguém vai saber por quê.

Então, é como digo sempre: o que precisamos é de mudança de mentalidade, mas, infelizmente, ainda se faz necessária a existência da Lei Maria da Penha e de delegacias especializadas. No Brasil, onde há mais cinco mil Municípios, há quatrocentas delegacias especializadas nas questões que envolvem a mulher, e estas estão, praticamente, só nas capitais. São raros os Municípios de maior destaque populacional que têm uma delegacia especializada no tratamento das questões de violência contra a mulher.

Mas o que precisamos é fazer o eterno apelo. E essa não é uma questão só para nós, mulheres. Não é um problema só de organização, de denúncia, de mobilização das mulheres. Não! Faz-se necessária a mobilização da sociedade como um todo, de homens e de mulheres. Digo e repito: não queremos ser mais, mas, muito menos, menos. Queremos direitos absolutamente iguais.

Se somos 52% da população brasileira, Senador Gerson Camata, que preside neste momento esta sessão, e se os outros 48% são nossos filhos, em nome da sociedade como um todo, é preciso que nós, homens e mulheres, juntemos nossas forças e façamos realmente o compromisso de lutar contra a violência, de dizer “sim” à paz, ao entendimento, à sociedade do bem, à sociedade dos direitos absolutamente iguais entre homens e mulheres seja no âmbito da política, seja no da família, seja no do trabalho ou em qualquer outra situação.

Muito obrigada.

 

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SEGUE DOCUMENTO A QUE SE REFERE A SRª SENADORA SERYS SLHESSARENKO EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

- “Campanha mundial da Via Campesina para acabar com as violências contra as mulheres”.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/04/2009 - Página 11659