Discurso durante a 57ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com as enchentes no Estado do Amazonas, que estão assumindo proporções desastrosas.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA.:
  • Preocupação com as enchentes no Estado do Amazonas, que estão assumindo proporções desastrosas.
Publicação
Publicação no DSF de 24/04/2009 - Página 12535
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, INUNDAÇÃO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), CRITICA, AUSENCIA, MOBILIZAÇÃO, AMBITO NACIONAL, APOIO, POPULAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, REGISTRO, ANTERIORIDADE, MANIFESTAÇÃO, SOLIDARIEDADE, ESTADO DE SANTA CATARINA (SC).
  • DEFESA, NECESSIDADE, GOVERNO FEDERAL, GOVERNO ESTADUAL, ADOÇÃO, MEDIDA DE EMERGENCIA, AUXILIO, POPULAÇÃO, REGIÃO NORTE, REGIÃO NORDESTE, VITIMA, INUNDAÇÃO, SOLICITAÇÃO, AGILIZAÇÃO, FORMAÇÃO, COMISSÃO EXTERNA, SENADO, ANALISE, PREJUIZO, REGIÃO AMAZONICA.

  SENADO FEDERAL SF -

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SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - É verdade, Presidente. Muito obrigado a V. Exª.

Senador Cristovam Buarque, Senador Mão Santa, o assunto é o mesmo. Venho me referir, mais uma vez, às enchentes no Estado do Amazonas, que vêm assumindo proporções desastrosas.

Nós temos dois tipos de municípios: aqueles cujas sedes são construídas bastante próximas à água, e essas, as sedes municipais, estão inundadas, e temos aquelas que, como o Município de Tapauá, por exemplo, estão a 33 ou mais metros acima do nível do mar e essas sofrem pouco efeito da subida das águas na cheia, mas não escapam - e nenhum município escapa - do efeito danoso daquele dilúvio verdadeiro nas zonas rurais.

Eu tenho visto muito pouca movimentação. Incrível, Senador Cristovam, é que, quando aconteceu o fenômeno da seca, aquele solo esturricado, parecendo a seca nordestina, aquilo despertou, no Município de Manaquiri, por exemplo, uma atenção enorme de fotógrafos internacionais, de revistas da mídia brasileira, enfim, das autoridades, como se, de fato, fosse surpreendente - e é surpreendente - o fenômeno da seca no meu Estado. Já o da cheia, acho que as pessoas pensam que é comum e que não devem dar tanta importância para aquelas vidas que são, da mesma maneira, prejudicadas, algumas arruinadas e algumas ceifadas no processo de subida das águas, que leva de roldão o que encontra pela frente. São municípios com ruas inteiras que viraram rios.

E não se sente uma mobilização nacional para atender aos Estados da Região Norte, que, também eles, foram solidários com o Estado de Santa Catarina, que merece de nós todo apreço, nesse verdadeiro esforço que virou uma espécie de SOS Santa Catarina, que sugiro que vire um SOS Nordeste - está aqui a Senadora Rosalba a nos dar inteira razão -, um SOS Amazonas, um SOS Amazônia, com os outros Estados enviando para lá roupas, víveres, médicos, psicólogos, enviando recursos humanos e recursos materiais para que se possa, efetivamente, mostrar integração nacional também por aí.

Eu prego sempre a prevenção. Há Municípios que não têm logística para distribuir as cestas-básicas que chegam. Quando a cesta básica chega às mãos do último necessitado já está na hora de mandar outra cesta básica. Os prefeitos se esforçam, têm de levar um caminhão, recolher as cestas básicas, colocá-las em um barco. Isso tudo demanda muito tempo. As famílias estão se miserabilizando. Ficam até o último instante em suas casas, com tudo aquilo que não vou me cansar de dizer. Na cheia há o perigo de as crianças serem afogarem numa rua que vira rio. Aparecem ratos, escorpiões, cobras, porque o rato faz parte da cadeia alimentar da cobra. Aparecem arraias que, provocadas, se tocadas, reagem com um ferrão, que às vezes é letal. Percebo um esforço muito solitário de prefeitos, de comunidades, para enfrentar essa questão. É uma questão que já deveria ter despertado a atenção da mídia brasileira, a atenção do resto do mundo, tanto quanto a seca o fez.

Já contei essa história uma vez no Senado e vou repeti-la. Quando cheguei de volta do Rio de Janeiro, em 1978, há 31 anos, em Manaus, fui visitar o Paraná do Cambixe, no Município de Careiro da Várzea. Lá um cidadão me disse: “ Arthur, volte aqui na época da “séca.” Pensei que era uma diferença de sotaque entre ele e o meu sotaque. Mas ele estava com muita sabedoria. E eu imagino que os dicionaristas deveriam tratar disso, porque até hoje eu não vi nenhum dicionário estabelecer a diferença entre seca(ê) e seca(é). Seca(ê) é quando não há água, no Nordeste; cheia - todo o mundo sabe - é quando há muita água. Então, cheia, na Amazônia, é quando há mais água ainda. Seca(ê) nunca tinha havido. Seca(é) era quando havia menos água, período da vazante. Inteligência do caboclo, inteligência do ribeirinho que deveria ser aproveitada pelos dicionaristas, porque eles têm que incorporar essa sabedoria popular a tudo que resume a mistura de sabedoria popular com erudição dentro dos dicionários mais categorizados do País.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Senador Virgílio, desculpe-me interrompê-lo. É só para prorrogar, porque, regimentalmente, às 18h30min encerra-se a sessão. Prorrogo por mais meia hora para que todos possam falar e ter a votação de requerimentos.

Continue.

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Pois não, Presidente, obrigado. Agradeço a V. Exª.

Então, pela primeira vez, em algum momento, aconteceu, há pouco tempo, não uma seca(é), uma mera vazante; mas uma seca(ê) com solo esturricado, com aquela figura tradicional nordestina de termos o esqueleto do gado ali faminto, esquálido, falta de água. Isso foi uma clara advertência da natureza por tantos malfeitos que cometem contra ela.

Mas, em seguida, veio o fenômeno da cheia com menos força, até que veio o extra que ameaça superar os efeitos danosos da cheia de 1953, que, simplesmente, devastou uma grande parte da cidade de Manaus até onde as águas puderam alcançar.

As iniciais - e, ainda, assim pessimistas - informações de Manaus diziam que seriam 30 mil desabrigados na minha cidade. Hoje, não há quem duvide de que passarão de 50 mil desabrigados. E a Prefeitura está lá cuidando de fazer o seu planejamento para enfrentar essa situação. No interior, outro tanto será alcançado, será atingido. 

Quando as águas baixam, o problema não está resolvido. As prefeituras têm que dar madeira para as casas serem reconstruídas; as prefeituras têm que cuidar das doenças que vêm, são doenças terríveis. São as hepatites, são as doenças, aquela doença, Sr. Presidente, transmitida pela urina do rato, é a leptospirose que é transmitida pela urina do rato, as picadas de cobra, são doenças terríveis que mostram que a vida das pessoas da minha região terminam sendo menos valorizadas do que a vida das pessoas de outras regiões, assim como eu julgo que, em um país de insegurança pública como o Brasil, a vida dos austríacos vale mais do que a vida dos brasileiros, isso é muito lamentável.

Então, estou a aguardar que as boas ONGs e que os governos dos outros Estados exerçam em relação à minha região e, sem dúvida alguma, ao Nordeste ou onde quer que se manifeste essa necessidade, uma solidariedade muito firme. Pedi a constituição de uma comissão externa e gostaria muito, Sr. Presidente, de vê-la ativada já na semana que vem, e que os Senadores da região, claro, mas inclusive também os Senadores de fora pudessem fazer parte dela e, assim, verem, in loco, o que passa o ribeirinho do meu Estado, verem, in loco, que sacrifício se faz, quanto esforço se faz para manter a soberania nacional sobre aquela região tão estratégica.

A sensação que as pessoas têm nos Municípios mais distantes, mais ermos, é de abandono e de indiferença, como se o Brasil não os considerasse, como se o Brasil não os estimasse, não os apreciasse.

Insisto que há uma visão muito caolha do Brasil, porque se ali tem toda a manifestação da pobreza, da penúria, da escassez, tem também a manifestação da riqueza, do jogo estratégico, da possibilidade e do futuro.

Portanto, mais uma vez, eu aqui apelo para que o Senado constitua, com rapidez, essa comissão externa e, ao mesmo tempo, que passe a ter, por parte do Governo Federal e do governo estadual, mais sentido de previsão. Se há conhecimento de que pode acontecer, tem que ter um comportamento padrão. Vai acontecer ou não, se não acontecer melhor. Se acontecer o pior, então, não se é apanhado de surpresa.

Há Municípios que não têm barcos, como é o caso de Barreirinha, por exemplo, para levar as cestas básicas e os remédios até a ponta do necessitado. Foi preciso o Município de Parintins ajudar com uma ambulancha, com lancha, com equipes médicas. Há Municípios que podem mais rapidamente ajudar os outros, aqueles que não são atingidos tão duramente podem ajudar aqueles atingidos mais duramente. Mas tem que haver uma coordenação estadual...

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Já concluo, Sr. Presidente. Tem que haver uma coordenação nacional também, o imediato e eficaz acionamento das defesas civis.

Temos que entender que a natureza é a natureza. Ninguém pode mexer na natureza. Não se deveria até mexer nela. Mas o homem tem que construir, pela engenharia e pelas atitudes de muito rápida ação administrativa, saídas para pessoas que estão desvalidas.

Se os brasileiros de Santa Catarina, em algum momento, sentiram-se sós - e eu me senti desesperado como eles -, posso assegurar que um amazonense atingido pela enchente se sente mais só do que qualquer outro ser humano, porque ele está no começo do Brasil. Não está no fim do Brasil. Eu entendo que ele está no começo do Brasil. E no começo do Brasil ele se sente só. É uma solidão incrível, porque quando está tudo bem pode até ser uma solidão bonita, mas quando está tudo mal é uma solidão dolorosa. É uma solidão muito triste. Uma solidão muito...

(Interrupção do som.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - ... efetivamente solitária, para ser tautológico, para repetir e enfatizar o fato de que as pessoas no meu Estado, nos rincões mais distantes, sentem-se abandonadas.

Então, imagino que quem nos ouve deveria pensar mesmo, começar a fazer manifestações. Tem aí a rede, tem a Internet; temos que usar esses instrumentos e começar a mobilizar vontades, a mobilizar pessoas para se criar um SOS Amazônia; não me importo se for um SOS Nordeste também, já que a Senadora Rosalba acabou de falar de cheias devastadoras no seu Estado, no Rio Grande do Norte. Um SOS Amazônia; um SOS Nordeste. Eu me bato muito para esse SOS Amazônia, de modo que o Brasil se incorpore a uma luta, que é uma luta nacional, a de preservar vidas que são muito úteis para a história que o futuro haverá de nos permitir contar, brilhantemente, do ponto de vista do desenvolvimento econômico, graças à exploração racional, decente e com sustentabilidade dos recursos da minha região.

Espero que os brasileiros se sensibilizem, porque é muito doloroso o que passa minha gente, desse momento grave de uma cheia de proporções superiores às manifestações das águas do ano de 1953. Aquela foi gravíssima. Esta é além de gravíssima, Sr. Presidente.

Era o que tinha a dizer.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 24/04/2009 - Página 12535