Discurso durante a 64ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Apresentação de requerimento de inserção em ata de voto de pesar pelo falecimento do diretor, dramaturgo e ensaísta brasileiro Augusto Pinto Boal.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Apresentação de requerimento de inserção em ata de voto de pesar pelo falecimento do diretor, dramaturgo e ensaísta brasileiro Augusto Pinto Boal.
Publicação
Publicação no DSF de 05/05/2009 - Página 14757
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, DIRETOR, ATOR, TEATRO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), RECONHECIMENTO, IMPORTANCIA, ALTERAÇÃO, METODO, PEÇA TEATRAL, BRASIL, MUNDO, OBJETIVO, DEMOCRACIA, PRODUÇÃO, EMPRESA TEATRAL, AMPLIAÇÃO, ACESSO, POPULAÇÃO, BAIXA RENDA, TRANSFORMAÇÃO, SITUAÇÃO, ATUALIDADE.
  • MANIFESTAÇÃO, PESAMES, FAMILIA.

  SENADO FEDERAL SF -

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O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, Srs. Senadores, quero apresentar um requerimento, regimentalmente, para que seja inserido em Ata voto de pesar pelo falecimento, no último sábado, 2 de maio, do diretor, dramaturgo e ensaísta Augusto Pinto Boal, aos 78 anos, bem como de apresentação de condolências à esposa, Cecília Boal, e aos seus dois filhos, um dos quais, Julían, seguiu a carreira do pai.

         Silêncio na coxia. O teatro brasileiro e o teatro internacional estão de luto. Baixaram-se as cortinas e todos choram a morte do grande diretor, dramaturgo e ensaísta brasileiro, mas também aplaudem a vida desse extraordinário Augusto Boal.

         Fundador do Teatro do Oprimido, Augusto Boal nasceu em 16 de março de 1931, no Rio de Janeiro. Tornou-se um dos nomes mais importantes do teatro brasileiro e ficou conhecido no mundo como ator e diretor de teatro, daqueles que vão ao fundo das coisas, que fazem experiências, que não têm medo de transformar o estabelecido. Tanto é que, no dia 27 de março, Augusto Boal recebeu da Unesco o título de Embaixador Mundial do Teatro, em 2008.

Formado em Química, na Universidade Federal do Rio de Janeiro, em 1950, viajou para Nova Iorque para estudar teatro na Universidade de Colúmbia. Ao retornar ao Brasil, passou a integrar o Teatro de Arena de São Paulo, dividindo a direção com José Renato.

Na companhia, ele adaptou o método de Stanislavski à realidade brasileira e ao teatro de arena. Com a sua estreia na direção do Teatro de Arena com Ratos e Homens, de John Steinbeck, este lhe rendeu o prêmio de Diretor Revelação pela Associação Paulista de Críticos de Arte, em 1956.

Na sua parceria com o Oficina, resultou a adaptação de A Engrenagem, de Jean-Paul Sartre, concluída por ele e José Celso Martinez, em 1960. Outro marco dessa parceria foi Um Bonde Chamado Desejo, de Tennessee Williams.

Durante o regime militar, Augusto Boal dirigiu o show Opinião, com Zé Keti, João do Vale e Nara Leão, depois substituída por Maria Bethânia, no Rio de Janeiro e em São Paulo. O evento passou a influenciar a cena artística brasileira do período.

Quero dizer que, justamente, nesses anos em que Augusto Boal esteve no Teatro de Arena, no Teatro Oficina e em outros teatros de São Paulo, eu o acompanhei de perto.

Assisti a praticamente todos os espetáculos Um Bonde Chamado Desejo, A Engrenagem e tantos outros que foram apresentados com Boal, Guarnieri, José Celso e todos seus companheiros e companheiras.

         Preso e exilado em 1971, Augusto Boal prossegue sua carreira no exterior - inicialmente na Argentina, onde permanece cinco anos - e desenvolve a estrutura teórica dos procedimentos do Teatro do Oprimido, um método teatral que reúne exercício, jogos e técnicas teatrais. Os seus principais objetivos são a democratização dos meios de produção teatral, o acesso das camadas sociais menos favorecidas e a transformação da realidade através do diálogo e do teatro. Retornou ao Brasil em 1984. No ano seguinte, dirigiu o musical O Corsário do Rei, com músicas de Edu Lobo e letras de Chico Buarque.

         Querido e respeitado por amigos e colegas que trabalharam com Boal ao longo da sua carreira, todos eles prestaram uma última homenagem antes da solenidade de cremação. Um músico tocou ao violino a música “Meu caro amigo”, composta por Chico Buarque para Boal.

Augusto Boal também foi eleito, pelo povo do Rio de Janeiro, Vereador à Câmara Municipal do Rio Janeiro. Nessa ocasião multiplicou as experiências do Teatro do Oprimido por quase todos os bairros do Rio de Janeiro.

Eu fui testemunha disso. Ele costumava ser chamado por grupos que queriam aprender com ele e fazer teatro para transformar as suas vidas, a sua realidade. E ele teve um trabalho formidável nessa direção.

A cultura brasileira fica desfalcada, mas o trabalho de Augusto Boal permanecerá entre nós, entre todos os que se dedicam ao teatro e para aqueles que descobrem a dramaturgia como um dos meios principais de transformar a realidade de nossas vidas para melhor, assim como ele preconizava: “Atores somos todos nós, e cidadão não é aquele que vive em sociedade: é aquele que a transforma!”

Exemplo disso é a vida de Asdrúbal Serrano, que, no seu livro Guerreiros Urbanos, publicado pela Editora Expressão e Arte, em 2007, relata como Augusto Boal, Francisco Guarnieri e o Teatro Popular União Olho Vivo, de Edibal Piveta, conseguiram transformar inteiramente, através do teatro, a vida de um jovem egresso da Febem, que lá havia vivido dos dois até os dezessete anos.

Ainda há duas semanas, convidei Asdrúbal Serrano para apresentar a sua peça Guerreiros Urbanos para os estudantes da Fundação Getúlio Vargas, da Escola de Administração de Empresas, de Administração Pública, de Economia, em São Paulo.

Ali, ele demonstrou como aquele jovem, que havia passado por situações críticas - por falta de condição dos pais, ele fora deixado na Febem dos 2 anos aos 17 anos -, certo dia descobriu que por meio da dramaturgia, do teatro, exatamente das lições que aprendeu com Augusto Boal, com Gianfrancesco Guarnieri, no Teatro União e Olho Vivo, e com tantos outros dramaturgos, podia se transformar e transformar as pessoas em torno de si. Ele tem feito muita prática do Teatro do Oprimido, seja no bairro de Guaianases, seja em diversas regiões ou Municípios do interior de São Paulo, como, presentemente, em Caconde. Ele tem seguido os passos de pessoas como Augusto Boal que, em todo o Brasil e em todo o mundo, deixou indivíduos procurando ver como o teatro pode transformar suas vidas e transformar a nossa realidade.

Portanto, prezado Senador Mão Santa, aqui fica minha calorosa homenagem ao querido Augusto Boal, uma luz para todos aqueles que se dedicam à dramaturgia e ao teatro no Brasil e no mundo. 

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/05/2009 - Página 14757