Pronunciamento de Eduardo Suplicy em 06/04/2009
Discurso durante a 46ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal
Homenagem de pesar pelo falecimento do ex-Deputado Federal e jornalista Márcio Moreira Alves.
- Autor
- Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
- Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
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HOMENAGEM.:
- Homenagem de pesar pelo falecimento do ex-Deputado Federal e jornalista Márcio Moreira Alves.
- Publicação
- Publicação no DSF de 07/04/2009 - Página 9545
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
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- HOMENAGEM POSTUMA, EX-DEPUTADO, JORNALISTA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), REGISTRO, BIOGRAFIA, ELOGIO, VIDA PUBLICA, DEFESA, DEMOCRACIA, VITIMA, CASSAÇÃO, MANDATO PARLAMENTAR, DITADURA, REGIME MILITAR.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Para encaminhar. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, prezados Senadores, Marcito, como era conhecido pelos amigos e parentes, nasceu no Rio de Janeiro, em 14 de julho de 1936, filho de Márcio de Mello Franco Alves, que foi Prefeito de Petrópolis (RJ) e Secretário de Finanças do Estado da Guanabara no Governo Negrão de Lima, e de Branca de Mello Franco Alves, influente personalidade no meio católico, membro da Pontifícia Comissão do Apostolado Leigo do Vaticano e coordenadora do Movimento de Ação Católica dos Meios Independentes. Seu avô paterno, Honorato José Alves, foi Deputado Federal por Minas Gerais, de 1906 a 1929.
Começou a trabalhar como jornalista aos 17 anos, no Correio da Manhã. Em 1956, aos 20 anos, foi correspondente de guerra do jornal durante o conflito anglo-egípcio, resultante da nacionalização do canal de Suez pelo presidente egípcio Gamal Nasser. Em 1957, durante a cobertura do impeachment do então Governador de Alagoas, Muniz Falcão, foi ferido por uma bala perdida dentro da Assembléia. Mesmo assim, conseguiu mandar a notícia por telegrama, o que lhe valeu seu primeiro prêmio de jornalismo, o Prêmio Esso de reportagem, de 1958.
A trajetória do jornalista -colunista do jornal O Globo por dez anos - foi marcada pela defesa da democracia. Márcio Moreira Alves foi uma das primeiras vozes a se levantar contra as violências e ilegalidades do regime militar. Ele foi um dos primeiros a escrever livros com denúncias das torturas que aconteciam à época. Como repórter e articulista do Correio da Manhã, destacou-se no combate à política econômica e financeira do então Ministro do Planejamento, Roberto Campos (1964 a 1967), a quem acusava de entregar aos estrangeiros as riquezas do País.
Na década de 60, entrou para a vida política e, em 1966, aos 30 anos, elegeu-se Deputado Federal pelo antigo MDB. Seu discurso de oposição no Congresso Nacional, em 2 de setembro de 1968, conclamando o povo a “boicotar o militarismo”, levou o Governo a criar o AI-5, conforme os Senadores Paulo Paim e Alvaro Dias aqui nos disseram. Em dezembro do mesmo ano, foi cassado pelo regime militar e deixou clandestinamente o País com destino ao Chile, onde permaneceu até 1971. Durante esse período inicial do exílio, percorreu a Venezuela, a Colômbia, o Equador, o Peru, a Argentina, a Bolívia, o México e os Estados Unidos, fazendo conferências em mais de 40 universidades nesses países. Em 1971, seguiu para a França, onde se doutorou pela Fundação Nacional de Ciências Políticas de Paris. Só voltou ao Brasil após a anistia de 1979.
Restabelecida a democracia, contou o que o inspirara naquele discurso de 1968: “Foi um discurso de cinco minutos, baseado na história da Lisístrata, uma peça sobre as mulheres de Atenas, que se recusavam a encontrar com os maridos enquanto eles não voltassem e lutassem contra Esparta”, contou, em depoimento no documentário O Dia que Não Existiu, da TV Cultura e da TV Câmara. “Não podia imaginar que fosse ter a importância que lhe deram.”
Em 1990, pediu desligamento do Partido do Movimento Democrático Brasileiro para, como ele mesmo dizia, exercer com independência a atividade de assessoria e para reiniciar sua atuação na imprensa, tornando-se colaborador de O Estado de S.Paulo e do Jornal do Brasil.
Em agosto de 1993, colaborador eventual do jornal O Globo, propôs à sua direção a realização da cobertura, em Brasília, dos trabalhos da revisão constitucional. A partir daí, tornou-se articulista permanente e, em seguida, colunista diário do jornal, encarregado de assuntos de política nacional.
Apesar da ampla abrangência temática da coluna, procurou dar um enfoque especial aos temas ligados à formulação e implementação de políticas públicas. Passou a dedicar as colunas dos sábados a projetos de execução bem-sucedidos em todos os níveis de governo - municipal, estadual e federal - e em todo o País. Nessa perspectiva de buscar “o Brasil que dá certo”, foram publicadas três coletâneas de artigo: Sábados Azuis, em 1999, Brava Gente Brasileira, em 2001, e Histórias do Brasil Profundo, em 2003.
Márcio Moreira Alves foi um jornalista com uma capacidade de percepção especial, demonstrada em seus artigos e textos, que muitas vezes tiveram grande influência e repercussão. Um exemplo dessa percepção tocou-me profundamente: o artigo “A Coragem de Sorrir”, publicado no jornal O Globo, em 4 de junho de 1995. Marcio escreveu sobre o pagamento, em dinheiro, pela Prefeitura de Campinas, quando era prefeito José Roberto Magalhães Teixeira, aos moradores da cidade, dentro do Programa de Renda Mínima associado às oportunidades de educação, recém-implantado e pioneiramente naquele Município, enquanto aqui Cristovam Buarque instituía o Bolsa-Escola.
Márcio, naquela ocasião, descreveu a atitude de uma mulher beneficiária do programa, que comentava a utilização do valor recebido para adquirir uma dentadura: “ter a coragem de sorrir de novo”, sem precisar tapar a boca, sem sentir vergonha, tendo até mesmo melhores condições de conseguir um emprego, ou ser amada. Assim, Márcio Moreira Alves argumentava porque que a própria pessoa beneficiária do Programa de Renda Mínima era a que melhor sabia o que fazer com aqueles recursos.
A notícia da morte de Marcito provocou comoção entre políticos. Todos destacaram sua luta em defesa da democracia. O Presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em nota de pesar, afirmou que ele teve atuação destemida contra o regime militar e que será reconhecido pela história como homem de coragem que não se curvou ao autoritarismo. “O Brasil perde um grande democrata que exerceu com dignidade a profissão de jornalista e o mandato parlamentar”.
Para os filhos, a lembrança mais forte é a do “pai brincalhão”. Pedro Afonso definiu o pai como “ótimo jornalista e um mau político”, por sempre dizer aquilo que pensava e por não conseguir dizer o que não pensava. Uma das filhas, Leonor, disse que o pai era uma pessoa extremamente feliz. “Como pai, ele nos educou dando valores de honestidade. Fez tudo na vida com paixão”. Já a filha mais velha, Isabelle Marie, destacou a coragem do pai, referindo-se à cassação de seu mandato de Deputado Federal em dezembro de 1968. “Ele foi um homem de muita coragem. Uma grande honra que eu tenho é que meu pai não amarelou”.
A seus três filhos, à sua esposa Marie, e à querida Maria Helena Moreira Alves, irmã de Marcito, que tive a honra de ter como assessora quando fui Deputado Estadual, na Assembléia Legislativa de São Paulo, de 1979 a 1982, meu especial carinho e sentimentos de pesar.
Sr. Presidente, tal como o Senador Paulo Paim, cujo requerimento assinei, também havia aqui preparado este requerimento de pesar para que sejam inseridos nossos votos de pesar pelo falecimento do grande jornalista, ex-Deputado Federal e combatente das liberdades democráticas Márcio Moreira Alves.
O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Senador Suplicy, V. Exª me permite um aparte?
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Com muita honra, Senador Marcelo Crivella.
O Sr. Marcelo Crivella (Bloco/PRB - RJ) - Senador Suplicy, eu gostaria de subscrever o discurso de V. Exª em cada item da cronologia brilhante, de bravura, de destemor, de prática ilesa da democracia que o grande parlamentar da minha terra demonstrou na sua vida pública no Congresso Nacional e, depois, como jornalista. V. Exª é sempre uma voz importante. Sei que os povos, quando não honram a memória de seus nomes tutelares, acabam sendo um ajuntamento de pessoas, mas não formam uma nação. É preciso cultuar aqueles brasileiros que agiram, a seu tempo, com galhardia, com valentia, com honestidade de princípios e com moral elevada. Acho que Márcio Moreira Alves é um grande exemplo disso. Gostaria, então, de subscrever o seu discurso e o seu voto de pesar. Tenho certeza de que até em nome da bancada do Rio de Janeiro, que se sente muito orgulhosa pela figura do grande jornalista e do grande político. Muito obrigado.
O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP) - Muito obrigado, Senador Marcelo Crivella. Vou até V. Exª para obter também a sua assinatura.
Obrigado, Sr. Presidente.