Discurso durante a 66ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Relato sobre desempenho de missão parlamentar para acompanhar a retirada dos não índios da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.

Autor
Augusto Botelho (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Relato sobre desempenho de missão parlamentar para acompanhar a retirada dos não índios da Reserva Indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima.
Aparteantes
Magno Malta.
Publicação
Publicação no DSF de 07/05/2009 - Página 15356
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • DEPOIMENTO, CUMPRIMENTO, MISSÃO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, ACOMPANHAMENTO, RETIRADA, FAMILIA, AREA, RESERVA INDIGENA, ESTADO DE RORAIMA (RR), SAUDAÇÃO, AUSENCIA, OCORRENCIA, CONFLITO, NECESSIDADE, GARANTIA, DIGNIDADE, ASSENTAMENTO RURAL, JUSTIÇA, INDENIZAÇÃO.
  • REGISTRO, AUTORIZAÇÃO, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), RETORNO, EMPREGADO, PROPRIEDADE RURAL, AREA, RESERVA INDIGENA, REALIZAÇÃO, COLHEITA, ARROZ.
  • REITERAÇÃO, COMPROMISSO, ORADOR, BUSCA, SOLUÇÃO, AUSENCIA, ABANDONO, FAMILIA, RETIRADA, AREA, RESERVA INDIGENA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco PT - RR. Para uma comunicação inadiável. Sem revisão do orador.) - Muito obrigado, Sr. Presidente Mão Santa.

Srªs e Srs. Senadores, fui designado pela Comissão de Relações Exteriores do Senado, junto com o Senador Mozarildo, para acompanhar a retirada dos não índios da reserva indígena Raposa Serra do Sol entre os dias 20 e 30 de abril lá no meu Estado de Roraima. Estive na área nos últimos dez dias e sinto a obrigação de vir à tribuna agora para relatar o que foi presenciado por mim e pelo Senador Mozarildo nos últimos dias em Roraima.

A demarcação em faixa contínua da terra indígena Raposa Serra do Sol foi objeto de várias contestações, desde o decreto presidencial de 2005 até a chegada ao Supremo Tribunal Federal, em ação de minha autoria, quando foi definida como seria a demarcação e a retirada dos não índios que lá viviam.

O único voto totalmente a favor da ação impetrada por mim no STF foi o do Ministro Marco Aurélio de Mello, que votou pela anulação do processo administrativo de demarcação. O Ministro apontou vícios durante todo o processo de demarcação da reserva e pediu a anulação de tudo, mas, infelizmente, isso não ocorreu. Agradeço ao Ministro por enxergar a importância dessa questão para nós de Roraima e do Brasil e votar com a sua consciência.

Mas hoje, Sr. Presidente Mão Santa, eu quero destacar aqui da tribuna que a retirada dos não índios da reserva Raposa Serra do Sol foi feita de forma ordeira e pacífica, mas com grande sofrimento, com grande sentimento de perda das pessoas que de lá eram retiradas.

Esse problema ainda não acabou totalmente. Felizmente os confrontos que temíamos não ocorreram até agora.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, por decisão do Supremo Tribunal Federal, os funcionários das fazendas que ficam dentro da reserva indígena, em Roraima, voltarão para o local para terminar a colheita do arroz. Cerca de 50 mil sacas do produto ainda estão na Reserva e devem ser retiradas até o dia 16 de maio, de acordo com determinação do STF. Seria uma falta de bom senso deixar estragar 50 mil sacas de arroz, de alimento de boa qualidade só por uma intransigência do relator da decisão no Supremo. A decisão foi acertada pois vai permitir a todos os plantadores terminarem a sua colheita.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o nosso trabalho, do Senado Federal, do Governo Federal, do governo estadual, não termina com a retirada dos não índios e com a colheita do arroz. As pessoas que viviam na Raposa Serra do Sol simplesmente não sabem para onde ir, não sabem como sobreviver a partir de agora. Nossas perguntas continuam as mesmas: o que essas pessoas que viviam na Raposa Serra do Sol há mais de 50 anos - e hoje alguns estão até com mais de 80 - onde criavam seus animais, faziam suas plantações e viviam disso? O que elas vão fazer agora? De que vão viver?

Precisamos garantir o reassentamento com dignidade das famílias que foram expulsas da Raposa. Precisamos garantir que essas pessoas tenham condição de reerguer suas vidas em outro pedaço de terra, fazendo o que sabem e sempre fizeram para sobreviver.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - V. Exª me concede um aparte?

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - Concedo um aparte ao Senador Magno Malta, com todo prazer.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - Aliás, antes de criar a reserva, primeiro, teria que se pensar nas pessoas. É fundamental que se tivesse pensado nesses seres humanos não índios, que, certamente, expulsos seriam da terra, da forma que está colocado. E eu tenho acompanhado e sei que são pessoas que ali nasceram, ali viveram, ali criaram os filhos e netos, ali criaram a sua galinha, o seu porco, vivem do arroz que plantam. O arrozeiro, que normalmente é o patrão, com todas as suas perdas, ele saberá se reinstalar. Mas é preciso que o poder político local - e V. Exª, que é do Partido do Presidente da República... E, agora, independentemente de cor partidária, porque o Romero é Líder do Governo. Não tem o menor cabimento que essa coisa não tenha solução. Não tem o menor cabimento! Na posição de Líder, o Romero tinha que exigir do Governo: é minha terra, é meu povo e eu preciso que o meu povo seja reassentado, que eles já saiam daqui para ali, que saiam de dentro desta casa para esta casa, que eles não fiquem vagando sem saber o que fazer. Posso até estar jogando conversa fora, mas imagino que é desse jeito que tinha que ser. Agora a: pessoa que estava radicada na terra virou indigente. Tinha o que comer e já não tem mais. Eles agora vão viver de cesta básica? A assistência social do Município mais próximo vai socorrê-los? O Governo do Estado fará um plano emergencial para socorrer agora os indigentes expulsos, os não índios? Resolvemos o problema dos índios e criamos um grande problema aos não índios?! Quer dizer, eu acho que isso deveria ter sido pensado primeiro. A terra deles já deveria estar preparada, e eles deveriam ter sido retirados,

deslocados com dignidade, e não enxotados. Porque cada relato que escuto... E V. Exª faz esse relato até de uma forma emocionada, o seu tom de voz não é esse, V. Exª está falando baixo, engasgado, porque é médico, conhece a situação de perto, é médico da família, sabe do que está falando, conhece as pessoas no relacionamento pessoal, no dia a dia, e imagino que V. Exª deve estar se sentindo muito doído também por ser do Partido do Governo e ser da Base do Governo. Eu também o sou, mas ninguém deve ser tonto e cego que não tenha que cobrar aquilo que é de direito. O Romero é Líder do Governo, eu, se sou Líder do Governo, metia o pé na porta: que história é essa? Agora o meu povo fica desamparado sem que seja colocado num outro local, com dignidade? Eu me preocupo. Na verdade o que posso fazer é gritar e me solidarizar com V. Exª e com as forças políticas, com o Mozarildo, com o próprio Romero, a Bancada federal, as forças políticas municipais, estaduais, vereadores, e com esses cidadãos e essas cidadãs que foram retirados e agora jogados ao léu da sorte, como V. Exª diz,: vagando, vagueando, sem saber para onde ir.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - Obrigado, Senador Magno Malta. Realmente esse é o sentimento que estou tendo. Existem promessas. Desde que fizeram aquela lei da homologação, prometeram que as pessoas seriam retiradas com indenização justa e seriam reassentadas. Realmente foram reassentadas umas 60 famílias - mas são 500 famílias -, mas em condições precárias, em terreno que não tem estrada, não tem luz, não tem água, não tem casa. Quer dizer, não é reassentada. Designaram aquele pedaço para elas, mas não as reassentaram.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - Não foram reassentadas, foram jogadas.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - Exato, a palavra certa é essa. Por isso que acho que a Nação brasileira tem uma dívida com essas pessoas. E eu aqui vou lutar para que essa dívida seja paga.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - Mas, quando a gente fala em Nação brasileira, estamos falando de quem, afinal de contas?

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - De nós, do Brasil.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - O povo quer ajudar, mas quem tem a caneta? Quem tem a chave do cofre? V. Exª é do Partido dele. Ele é do seu Partido. O Líder do Governo é de lá. Essa é a minha preocupação. Se V. Exª não vai ser atendido, não vou ser eu. Posso chiar aqui, posso gritar. Se o Líder do Governo não vai ser atendido... V. Exª fala que são 500 famílias e que sessenta foram jogadas, não foram assentadas coisa nenhuma - não tem água, não tem luz -, realmente é o caos. É o caos! Então, solidarizo-me com essas pessoas. Se há alguma coisa que possamos fazer, se vale assinar um documento que todos vamos assinar, estou pronto, até porque o seu Estado é magnífico. O seu Estado criou uma imagem para o Brasil, um movimento que nasceu na rua. As mulheres do seu Estado criaram um movimento chamado “Mães contra a Pedofilia”. Esse movimento está tomando conta do País. Nasceu lá, da indignação das mulheres, das mães na rua, mulheres simples, letradas e iletradas, que compraram uma briga de crianças abusadas por um Procurador e companhia, desgraçados, abusando de crianças de tenra idade! Elas criaram o movimento “Mães contra a Pedofilia”. É extraordinário o povo do seu Estado. Solidarizo-me com V. Exª.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - Muito obrigado, Senador Magno Malta.

Tenho consciência da minha responsabilidade de tentar achar uma solução para isso, e tenho trabalhado nesse sentido. Ainda tenho esperança de que, como é a Justiça que está fazendo - esses últimos que estão saindo estão saindo pela Justiça -, esses devem ser melhor assistidos e, quando assistirem a esses, vamos pegar as outras 440 famílias que não foram assistidas e cumprir isso. Por isso, Senador Magno Malta, venho aqui transmitir o sentimento das pessoas. É muito triste ver o indivíduo abandonado. Ele não é bandido, não é ladrão. É um trabalhador pobre. A mídia aqui divulgava como se tratavam de produtores de arroz, arrozeiros, mas esses são só seis, sete ou dez pessoas, no máximo, que são arrozeiros e que têm recursos.

Realmente, tem outra faceta. Esses têm recursos e, deles, dependem dois mil postos de trabalho no meu Estado. Esses dois mil postos vão acabar, ou melhor, já acabaram - não os do pessoal que está colhendo arroz, mas os dos outros acabaram.

Então, as pessoas estão com esse sentimento. É triste ver isso. Eu fui lá, vi e me senti ofendido com aquilo. Por isso, venho aqui para reafirmar a minha posição de que, como representante do povo de Roraima, vou defender os interesses deles, vou acompanhar as indenizações e vamos fazer barulho aqui, para que eles sejam atendidos. Eu ainda acredito que o Presidente Lula vai cumprir o que foi assinado naquele decreto feito no tempo do Márcio Thomaz Bastos.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - Sabe por que acredito no Presidente Lula também? E, aí, é mexer com o sentimento dele. O Presidente Lula é um homem sentimental. O sujeito que nega que, quando o Lula fala de pobre e chora, haja sinceridade está sendo mau. O Presidente Lula conhece a origem dele e, quando fala de inclusão social e de pobre, ele fala com verdade. Ele fala com verdade! Então, imagino que é a sensibilidade dele mesmo que tem de se buscar, porque são pobres e são retirantes agora também, como ele foi...

(Interrupção do som.)

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - São retirantes.

O Sr. Magno Malta (Bloco/PR - ES) - São retirantes, enxotados da sua terra, como ele foi, pelo sofrimento, para vir para São Paulo. Então, certamente, com o sentimento desse Presidente, que sabe de onde veio e que sabe com que sacrifício chegou aonde chegou, essa sua história vai fazer com que ele mande reparar rapidamente e essas pessoas sejam acudidas. Eu acho que é por aí. Eu também acredito no sentimento dele.

O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - Eu acredito... Essa vontade, esse fato está declarado, só que as coisas são muito devagar, não funcionam, não andam. Por isso, as pessoas estão abandonadas.

Então, eu vim aqui mais para firmar esta posição, Presidente Mão Santa, de que precisamos cuidar das pessoas que saíram e também dos indígenas que vão ficar, que, certamente, vão ser abandonados, se não fizermos barulhos e não lutarmos por eles.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 07/05/2009 - Página 15356