Discurso durante a 67ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com os desabrigados pelas enchentes no Estado do Amazonas. Reflexão sobre o debate acerca da reforma política e a tese do voto em lista fechada.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
CALAMIDADE PUBLICA. REFORMA POLITICA.:
  • Preocupação com os desabrigados pelas enchentes no Estado do Amazonas. Reflexão sobre o debate acerca da reforma política e a tese do voto em lista fechada.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 08/05/2009 - Página 16275
Assunto
Outros > CALAMIDADE PUBLICA. REFORMA POLITICA.
Indexação
  • APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, POPULAÇÃO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), VITIMA, INUNDAÇÃO, PERDA, HABITAÇÃO, ESPECIFICAÇÃO, MUNICIPIO, MANAUS (AM), SÃO GABRIEL DA CACHOEIRA (AM), IPIXUNA (AM), TAPAUA (AM), NHAMUNDA (AM), BARREIRINHA (AM), PARINTINS (AM), ITACOATIARA (AM), MANACAPURU (AM), URUCURITUBA (AM), MAUES (AM), CRITICA, BUROCRACIA, DEMORA, SOLUÇÃO, PROBLEMA.
  • IMPORTANCIA, APROVAÇÃO, CONGRESSO NACIONAL, PROJETO, CREDITO EXTRAORDINARIO, REPOSIÇÃO, VALOR, PERDA, FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICIPIOS (FPM), REGISTRO, REUNIÃO, BANCADA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), PARTICIPAÇÃO, REPRESENTANTE, MINISTERIO DA INTEGRAÇÃO NACIONAL, RECOMENDAÇÃO, GOVERNADOR, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), GARANTIA, MUNICIPIOS, EFICACIA, ASSISTENCIA, POPULAÇÃO.
  • COMENTARIO, REFORMA POLITICA, BRASIL, REITERAÇÃO, POSIÇÃO, PARTIDO POLITICO, OPOSIÇÃO, DISCORDANCIA, RENOVAÇÃO, REELEIÇÃO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, trago dois assuntos a esta tribuna. Primeiro, mais uma vez, quero pisar as dificuldades que o povo do Amazonas enfrenta com as enchentes avassaladoras que atingem hoje 42 dos 62 Municípios do Estado. Em Manaus, a coisa é grave: ameaça desabrigar cinquenta mil pessoas. Eu estava vendo, outro dia, um anuário, que me foi mostrado pelo Senador Eduardo Azeredo, dos prefeitos de Minas, e, de quase novecentas prefeituras em Minas, apenas 64 têm mais do que 50 mil habitantes. Esse é o número de desabrigados que a Capital do meu Estado enfrentará com as enchentes.

Lá, há várias sortes de Municípios. O Município de São Gabriel da Cachoeira tem uma formação geográfica completamente diferente da dos demais, é uma região inclusive com montanha também, uma região belíssima, que praticamente não foi atingida pelas enchentes. Há Municípios construídos acima do nível do mar, como é o caso de Ipixuna e de Tapauá, que sofrem na zona rural. Há Municípios que sofrem mais na orla, na zona urbana e bastante na zona rural, como é o caso de Nhamundá, por exemplo. Há Municípios que sofrem as duas investidas das águas, e o exemplo mais forte é o de Barreirinha, que, aliás, é terra do poeta Thiago de Mello. Barreirinha está literalmente ocupada pelas águas, a ponto de os desabrigados não poderem ir para as escolas. Eles vão para outro Município, que é o Município de Parintins, ali vizinho, que, aliás, tem dado grande assistência ao povo de Barreirinha e ao Prefeito Messias Sateré, que é um índio da etnia Sateré, que vai fazendo um trabalho muito interessante, muito dedicado, e que tem sido muito bem testado e muito bem aprovado nesta hora de luta.

O Município de Parintins, que é muito conhecido, ameaça adiar a data do tradicional festival folclórico dos dois Bumbás, porque o curral do Boi Garantido, que é um dos dois competidores, está literalmente ocupado pelas águas, e o caminho da cidade ao aeroporto está virtualmente interrompido, assim como a rodovia estadual AM-10, que liga Manaus a Itacoatiara, está interditada pelas águas num trecho. O Município de Itacoatiara, que é um dos maiores do interior, está absolutamente em situação de calamidade. No Município de Manacapuru, que, junto com Parintins, é outro dos três maiores do interior, há trinta mil desabrigados, segundo relato que seu Prefeito fez ontem, o Prefeito Bessa - são trinta mil pessoas em dificuldade entre a sede municipal e o interior do Estado.

A burocracia emperra demasiadamente a solução dos problemas. Sabemos que, depois, na baixada das águas, vêm as doenças, mas, aqui, tomamos algumas atitudes que visam a socorrer os Municípios. Ontem, o Congresso Nacional aprovou um projeto de crédito extraordinário que começa a restituir - o valor é de R$1 milhão - as perdas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM). Garantiu-me o Deputado Gilmar Machado, figura por quem tenho respeito e que sempre tratou os assuntos, em seu redor, com seriedade, que isso aí corresponde exatamente às perdas verificadas até o mês passado, em todos os Municípios brasileiros. Questionei se não era hora de esquecermos os maiores, como Curitiba e São Paulo, e de pensarmos nos menores, que são aqueles 4,5 mil mais pobres, e ele me disse que não, que o objetivo do Governo era repor aquilo que cada um havia pedido e que outros reforços dessa ordem iam sair. Fiquei tranquilo e feliz com isso, porque esta é uma boa atitude do Governo Federal de, em vez de esvaziar os cofres municipais, devolver-lhes o recurso, já que as isenções de Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI) que ele tem concedido têm prejudicado, e muito, o bolo de arrecadação do FPM.

Ontem, a Bancada da Amazônia fez uma reunião muito positiva no gabinete do nosso coordenador, que é o Senador João Pedro, com a presença de praticamente todos os Deputados - pelo que vi, estavam todos ali - e de dois representantes do Ministério da Integração Nacional. Depois, fizemos uma nota da Bancada, em que recomendamos ao Governador do Estado do Amazonas que fizesse a mesma coisa que o Governo Federal está fazendo, ou seja que restituísse as perdas do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), empobrecendo um pouco seus cofres, que estão bastante bem fornidos, em favor de soluções municipais, porque as dificuldades estão nas cidades. As dificuldades estão ali onde as pessoas sofrem, brutalmente, com uma cheia que já levou um menino no Município de Urucurituba, que está assolando o Município de Maués, que está deixando uma rádio, no Município de Urucurituba, até ela, literalmente ocupada, que está causando os piores transtornos a pessoas que não recebem as cestas básicas, porque há toda uma logística complicada para a cesta básica chegar à ponta do necessitado.

É um tratamento, assim, muito frio e muito igual para todo mundo, como se todos fossem iguais. Nem todo Município é igual. Há os que não são atingidos, os que quase não são atingidos, aqueles que são atingidos demais. Há aqueles que dispõem de situação financeira razoável, outros que estão em situação pré-falimentar. É um quadro muito grave, muito drástico.

E, quanto a essa ideia que V. Exª encampa para o Piauí - tenho insistido nela aqui - de um SOS Amazônia, de um SOS Nordeste, uma boa ocasião para dela tratar será a reunião de quarta-feira, para a qual nos convocou a Senadora Ideli Salvatti, que é Presidenta da Comissão de Clima, com a presença de figuras do porte de uma atriz como Christiane Torloni, que, com outros, estará aqui para uma vigília em defesa do clima, em defesa da natureza.

Gostaria - e vou fazer isto - de inserir a preocupação com os 25 milhões de habitantes da Região Norte. Temos de encontrar a forma de essas pessoas serem contempladas como fundamentais em qualquer solução que se busque ou que se intente buscar para a região. São pessoas que têm sido muito desconsideradas, apesar do papel que cumprem, garantindo a soberania nacional sobre aquela área; são pessoas que cumprem um papel muito abnegado, com muito sacrifício, vivendo em condições muito difíceis.

Dizer que a merenda escolar é tanto por aluno no Rio de Janeiro ou em São Paulo é bem diferente de dizer isso no interior do Amazonas, porque é muito difícil imaginar que seja esse o mesmo preço para alguém pegar uma canoa com motor, buscar as crianças nas casas e levá-las para a escola e depois devolvê-las e voltar para a base, onde fica aquele barquinho tão precário. A mesma coisa se dá em relação à merenda escolar, ao transporte escolar, é tudo mais caro lá. Mas as pessoas do poder central sempre imaginam que é tudo igual e estabelecem algo de cima para baixo. Esse é um defeito muito antigo do Brasil, não é deste Governo, é coisa que vem de muito para cá.

Espero que quarta feira seja um dia de chamarmos a atenção para valer, para começar de verdade o SOS Amazonas. Municípios e mais Municípios estão vivendo situação de penúria, de dificuldade. Tenho procurado acompanhar a evolução do quadro em todos eles. Se a natureza reagir dentro da sua normalidade anterior, o dia 12 de junho será a data em que as águas pararão de crescer na maioria dos rios. A partir daí, começaria a vazante; mesmo assim, não é uma vazante tão rápida, continua um quadro de calamidade. E, com a vazante, vêm doenças, vêm as hepatites, a leptospirose, vem tudo que a gente imagina de cosia ruim, verminose de vários tipos, casas arruinadas, pessoas que perderam tudo que tinham. É um quadro que mereceria aquela mesma atenção que demos e que nos orgulhamos de ter dado a Santa Catarina. É preciso um olho do Brasil para a nossa Região.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, aqui, quero comentar que a ideia de uma reforma política ganhou força nos últimos dias, com um debate que sugere, entre outros itens, a votação na chamada “lista fechada”. O eleitor, então, já não votaria em nomes, mas em partidos. Fala-se também em financiamento público, e, no bojo de tudo isso, outros temas se vão somando a um elenco de pontos que, dizem, são considerados relevantes para o aperfeiçoamento do processo político no Brasil. Nada contra ideias, sobretudo quando o que se propõe significa efetivamente avanços, mais do que nunca necessários ao País.

Em matéria de reforma política, há muito a avançar, e há muito a rechaçar. Como mostra o noticiário, são lançadas ao ar propostas que não contribuem para a democracia. São proclamadas subterraneamente, não raro incluídas em proposições que tratam de assuntos correlatos.

Fica, desde logo, a advertência da Oposição: se a reforma política ganhar terreno, nada mais além do que represente evolução verdadeira será aceito por nós. Retrocesso, nunca mais! A reconquista da democracia veio para ficar. E, pelo apreço ao Estado de direito, não permitiremos enxertos nocivos, sobretudo se na essência eles significarem ameaças ao saudável princípio da alternância no poder.

Agitados pela ideia de uma suposta reforma política, vozes retrógradas apressam-se em proclamar apreços, talvez amor repentino, pela ideia de perpetuação no poder, na rabeira do que pretende, no nosso continente, o Presidente Hugo Chávez, da Venezuela. Aqui, não!

As regras existentes no Brasil preveem para o cargo de Presidente da República a eleição por quatro anos e uma reeleição por igual período. É regra básica da democracia e assim haverá de ser. E convém repetir: a alternância no poder é princípio democrático, que não pode ser atropelado. Não aceitamos qualquer conversa que inclua essa ideia.

Perenização no poder, jamais!

A respeito disso, é no mínimo curiosa a recente declaração ecoada a título de opinião, mas uma opinião que não engrandece seu experiente arauto. Sair a proclamar - ou a atropelar a democracia - que um terceiro mandato será aceito candidamente pelo Congresso Nacional é desrespeitar um Poder que já deu demonstração cabal e extrema em defesa da decência, das liberdades e do Estado de direito.

Terceiro mandato, ninguém se iluda, não passaria, não passará mesmo! Nem se venha insistir, como foi dito recentemente, em que, “se perguntarmos à população se ela está de acordo com um terceiro mandato, pelo menos metade aprovará”. Ledo engano! E, ainda que isso fosse verdadeiro, estaria aberto, Senador Simon, um precedente terrível: amanhã, se o Presidente estivesse popular, haveria o terceiro mandato; se estivesse impopular, eu viria para a tribuna, para pedir que cassasse o mandato dele. Pelo amor de Deus! Não se cassa um Presidente por que ele é popular ou impopular, e digo isso com a autoridade de quem foi contra a tentativa de articulação das oposições do impeachment do Presidente Lula no episódio do mensalão. Fui contra, por entender que não seria bom para o País aquilo.

Então, é esdrúxulo alguém dizer: “Se está popular, terceiro mandato; se continuar popular, o quarto; em compensação, se ficar impopular, seis meses”. Que País seria esse, em que estaríamos nós destruindo e não construindo?

Muito bem, volto a esse interlocutor tão relevante.

No mínimo, é fazer pouco do Poder Legislativo afirmar: “[...] dos 17 partidos com representação no Congresso, 13 ou 14 fazem parte da base de sustentação do governo”. E mais, que “estão todos atendidos pelo Governo nas suas reivindicações”. Quer dizer que, se atendeu com cargo, por isso vai haver terceiro mandato? É erigirmos um elogio à fisiologia, não às regras democráticas e impessoais, que devem reger nosso sistema político.

Será esse, pergunto, o papel do Governo? Pior ainda é o tópico final da infeliz declaração:

        Uma mudança de governo significaria quebrar toda essa construção, que custou muito esforço para ser erguida... O empresariado todo está muito feliz, com alguma exceção do setor exportador. O setor financeiro nunca teve lucros tão altos. Então, quem é contra?

Aqui faço uma ressalva, lembrando o tempo em que o General Médici era aplaudido de pé no Maracanã, no Pacaembu. E o General Médici representou a fase mais cruel da ditadura militar, aquela que levou à tortura e à morte figuras como Manoel Fiel Filho, Vladimir Herzog e muitas pessoas. A fase mais dura da repressão promovida pelo regime militar foi precisamente aquela que coincidiu com uma bonança econômica que fazia o ditador de plantão ser aplaudido de pé pelo povo brasileiro. Não posso deixar de comparar quando se diz que há empresário feliz. Então, pelo fato de haver empresário feliz, haverá terceiro mandato? Se o empresário estivesse infeliz, cassaríamos o mandato do Presidente? Volto a insistir nessa ideia.

Aí pergunto: a que construção estaria querendo se referir o ilustre entrevistado? Custa-me acreditar que frases assim tenham sido de fato proclamadas por alguém tão vivido e sofrido como o Senador e ex-Presidente Fernando Collor de Mello.

Mesmo que saia vitorioso um candidato apoiado pelo Presidente, mudanças vão acontecer e desagradam. Temos indicadores econômicos satisfatórios, programas sociais avançando e um índice de popularidade elevadíssimo.

E aí pergunta o jornal Valor Econômico:

Valor: O próprio Presidente? Collor: Esse é o xis da questão. A única pessoa capaz de vetar uma nova reeleição seria o próprio Lula. Ele só não terá o terceiro mandato se não quiser.

Não é verdade. Nós, aqui, vetamos uma tentativa qualquer de terceiro mandato. Não é ele que veta. Acredito que ele tenha dignidade suficiente de se manter fiel à sua palavra e de dizer que essa é uma aventura e que não serve ao País. Agora, se porventura ele fraudasse sua própria palavra e quisesse insistir no que me parece uma rematada tolice, nós aqui vetaríamos. Não estamos com a sorte do País nas mãos de uma só pessoa, de jeito algum.

Já concedo o aparte ao Senador Suplicy.

Pergunta, então, o Valor Econômico ao ex-Presidente Collor:

Valor: E o Congresso aprovaria?

Collor: Ah, eu não tenho a menor dúvida. Aprova, e aprova de uma forma entusiástica.

Vou além, Sr. Presidente. Recentemente, erguemos barricada neste Plenário contra a Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira (CPMF), e todos viram no que deu. Aprovar um terceiro mandato? Sinceramente, no mínimo, parece desconhecimento das forças políticas que integram esta Casa. Se é para falar de reforma política, tratemos o assunto de forma séria. Nada de “janelas” para resolver a vida de trânsfugas, nada de pretextos para se chegar a terceiros ou quartos mandatos ou a quaisquer outros subterfúgios e demais malabarismos casuísticos.

Factóide o PSDB não aceita; golpes e casuísmos, repito, também não. Confio, sinceramente, que o Presidente Lula não se afastará um milímetro sequer do compromisso com a estabilidade política do País. É um insulto a ele - eu considero - e à sua biografia política de democrata ficarem alguns áulicos prestando desserviços à democracia, achando que, com isso, agradam ao líder. Minha impressão é a de que ele precisa se manifestar vigorosamente e dizer que essa manifestação de áulicos desagrada ao líder.

Concedo um aparte ao Senador Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Arthur Virgílio, V. Exª comenta as palavras do nosso colega Senador Fernando Collor de Melo, ex-Presidente. Já tive a oportunidade de aqui comentá-las, mas, diante de suas observações, quero reiterar que eu próprio ouvi, juntamente com todos os Senadores da Bancada do PT, há cerca de dois anos, o Presidente Lula nos transmitir - ainda que, primeiro, até brincasse um pouco, dizendo que “ser Presidente é uma coisa muito boa” -, com toda a seriedade, que, de maneira alguma, nós, do Partido dos Trabalhadores, deveríamos defender uma nova reeleição, um terceiro mandato.

V. Exª sabe que tantas vezes ele assim afirmou, inclusive quando...

O Sr. Pedro Simon (PMDB - RS) - Mas dois anos é muito tempo.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Mas podemos lembrar também, mais recentemente, uma audiência ainda com o nosso colega Jefferson Péres, que gostaríamos tanto que estivesse aqui. Então, isso faz um pouco mais de ano, porque Jefferson Péres, salvo engano, no dia 23 de maio, completará um ano de falecimento, mas eu me lembro de ele próprio, Cristovam Buarque e os membros do PDT terem relatado da audiência que tiveram com o Presidente Lula, na qual muito firmemente o Presidente Lula disse a eles que, de maneira alguma, seria candidato outra vez. E ele expressou isso em inúmeras outras oportunidades. Então, também compreendo e sei do sentimento de V. Exª como uma das pessoas que, aqui, não votaria num terceiro mandato. Externo isso abertamente, e o Presidente Lula sabe disso. Eu, por exemplo, como Senador do Partido dos Trabalhadores, não recomendo, não teria vontade, disposição, de votar pelo direito a uma outra reeleição, eu que já votei contra o direito a uma reeleição, a primeira, quando aqui votamos em 97 essa questão. E até registrei que o Presidente Fernando Henrique Cardoso tinha como um de seus autores favoritos Alexis de Tocqueville, que, em A Democracia na América, coloca, de maneira brilhante, olhando todas as vantagens e desvantagens, que não deveria haver o direito a reeleição, porque aquele que está no poder muitas vezes acaba se utilizando do conjunto da máquina administrativa, o que não é saudável para a democracia. Por isso, naquela ocasião, eu votei contrariamente. Eu aqui reitero: não acho adequado e não teria recomendado ao Presidente Hugo Chávez nem ao Presidente Álvaro Uribe nem a outros o direito de reeleição. Eu prefiro que haja o rodízio. Então, eu acho que V. Exª, com respeito a este assunto, pode estar tranquilo. Vai haver renovação e acho muito saudável que o Presidente Lula esteja como que preparando a sua sucessão. Quero dizer uma palavra importante sobre um tema que surgiu hoje na imprensa. O Ministro Celso Amorim transmitiu ao nosso Senador Cristovam Buarque e ao Márcio Barbosa, Vice-Diretor da Unesco, que o Brasil, pelo Itamaraty, avaliou que seria melhor escolher um ex-Ministro da Cultura do Egito para ser o Diretor da Unesco. Muitos de nós, aqui, havíamos apoiado o Senador Cristovam Buarque. Eu quero dizer que até sugeri que, na Comissão de Relações Exteriores, em breve, possamos ouvir o Ministro Celso Amorim sobre as razões da decisão, porque estava apoiando Cristovam Buarque. Ao mesmo tempo, relacionado ao tema, eu também estava apoiando a proposição de Cristovam Buarque de que os Senadores Arthur Virgilio, Pedro Simon, ele próprio e tantos de nós pudéssemos estar percorrendo as universidades, sindicatos e auditórios sobre ideias para o Brasil em 2010. Sentia uma certa dor no coração e pena se ele fosse para a Unesco, porque perderíamos aqui a presença do Senador Cristovam Buarque com ideias boas como essa. Então, de um lado, a decisão do Ministro Celso Amorim representa para nós a continuidade da presença do Senador Cristovam Buarque conosco e quero saudá-lo.

O SR. ARTHUR VIRGILIO (PSDB - AM) - Muito obrigado, Senador. Se isso é verdade, perde a Unesco e permanece ganhando, com a presença do Senador Cristovam Buarque, a vida pública brasileira e particularmente o Senado Federal.

Senador Suplicy, vou dar uma resposta a V. Exª que talvez o surpreenda.

(O Sr. Presidente faz soar a campainha.)

O SR. ARTHUR VIRGILIO (PSDB - AM) - Peço a V. Exª tempo para concluir, Sr. Presidente.

Talvez o surpreenda. Eu não tenho dúvida alguma - e digo de coração - de que o Presidente Lula não quer o terceiro mandato. Eu acho que não quer mesmo, tenho convicção. Eu acho que desserve à própria imagem do Presidente quem quer que seja ficar remoendo uma ideia que não é boa.

Eu votei a favor da reeleição naquele episódio, e o que vou dizer não é nem de leve unanimidade no meu Partido, mas considero, sim, o Presidente Fernando Henrique, a meu ver muito honestamente, entende que foi bom, porque o raciocínio do segundo mandato era: tenho pouco tempo líquido para governar, tenho reformas a fazer. Tenho uma eleição um ano depois da posse e tenho outra dois anos depois da primeira eleição, terei o tempo líquido de mandato para fazer reformas que exigem três quintos das duas Casas, em cada Casa, reformas que mudaram o País. Ele aceitou a proposta que lhe foi feita por alguns companheiros, de procurar salvar o máximo de tempo líquido para implementar reformas.

Entretanto, estou convencido de que não foi uma coisa boa. Estou convencido de que o melhor para o Brasil é cinco anos de mandato sem direito à reeleição. Ou melhor, no máximo, num outro período, poderia voltar para mais uma e depois não mais. Duas, acabou. Sou a favor disso, porque vejo alguns inconvenientes na reeleição. Vejo a possibilidade de formação de oligarquias municipais. Isso é de uma gravidade que a gente, às vezes, aqui do Planalto, não percebe! Vejo a possibilidade de formação de oligarquias regionais. É praticamente impossível um governador perder uma eleição se ele resolver manipular a máquina pública. Não perde uma reeleição, sobretudo nos Estados do Norte e do Nordeste; não perde. É exceção perder, a regra é ganhar. E vejo que nós, de certa forma, gastamos uma brutal energia.

Àquela altura, se a gente quisesse até olhar pelo lado prático, o Presidente Fernando Henrique teria feito seu sucessor com maior tranquilidade e poderia ter voltado, inclusive, depois, nessa época de bonança que foi dirigida pelo Presidente Lula. Ele, com muita coerência, até por que acredita na ideia, insiste que foi uma coisa boa. Eu, que respeito, como todos sabem, demais o Presidente, tenho por ele uma amizade que é incomum, amizade, gratidão por tudo o que ele fez de positivo na minha biografia, amizade, realmente, pessoal, uma admiração por ele muito grande, reservo-me o direito de dizer que, para mim, a experiência não foi boa. Por mim, partiria para uma negociação ampla que acabasse com essa história, sobretudo pensando... Não tenho medo tanto do Presidente da República, seja ele quem venha a ser. O Brasil tem instituições muito sólidas para enfrentar o Presidente da República.

Mas, por incrível que pareça, o Brasil não tem instituições sólidas para enfrentar o que quer ser oligárquico municipal ou oligárquico estadual em Estados como o meu. Não tem. Então, são sobretudo eles que me preocupam. Nós iremos ver eleições que são eleições que viram verdadeiras fantasias, porque, eu repito, é virtualmente impossível um governador que resolva usar a máquina que seja menos escrupuloso um pouquinho perder uma eleição.

Portanto, eu agradeço a explicação de V. Exª e imagino que o Presidente Collor vai refletir e perceber que uma pessoa sofrida como ele, que passou por tantos dissabores e que tem dado tantas voltas na vida; o Presidente Collor haverá de entender que, se tem um mérito que eu reconheço nele - é uma pena que ele não esteja presente -, em nenhum momento eu estava reclamando hoje de direcionamento das investigações, se tem uma coisa que a gente tem que reconhecer no Presidente Collor e elogiar, isso me foi dito por um homem que eu respeito e que estimo como Jarbas Passarinho... Jarbas Passarinho comunicou a ele como a coisa estava grave, determinado assunto que mexia de perto com a família dele inclusive. Ele disse: “Mande investigar, Ministro”. Aí o Ministro disse: “Mas chega perto de uma pessoa”. Ele disse: “Mande investigar, Ministro”. Aí ele disse que ficou surpreso, e, se a gente se lembra do episódio, ele não cerceou o Congresso, não procurou construir maiorias, não procurou...

(Interrupção do som.)

O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Ele deixou o julgamento do seu próprio impeachment sair naturalmente, sem grandes pressões.

Eu creio que, se outro dia eu tive daqui desta tribuna, e o Senador Mão Santa também teve o mesmo gesto, eu reconheci que foi muito importante a participação de Paulo Maluf como adversário até o final de Tancredo, porque se ele sai, talvez houvesse uma tentativa de golpe militar, porque ia ser difícil aceitar um candidato único das oposições.

Então, esse serviço, eu que tenho muitas críticas a fazer a sua atuação pública e tenho feito essas críticas, reconheço que esse serviço à democracia ele prestou, como prestou um grande serviço à democracia também nesse outro episódio a outra figura a quem eu me refiro. O Presidente Collor, quando não fez nenhuma tentativa de barrar as investigações, ele se portou com uma distância que foi, do ponto de vista republicano, elogiável. E eu quero fazer o registro. Entendo que, proporcionalmente a essa grandeza, foi muito infeliz a idéia de vir falar em terceiro mandato, se nós todos acreditamos - eu acredito - que o Presidente Lula seria o primeiro a recusar uma aventura que não faz bem ao País.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 08/05/2009 - Página 16275