Discurso durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Indignação com a falta de repercussão no Governo Federal e na sociedade com notícia veiculada em artigo do jornalista Demétrio Weber, intitulado "Brasil na série B da educação", no jornal O Globo de ontem.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Indignação com a falta de repercussão no Governo Federal e na sociedade com notícia veiculada em artigo do jornalista Demétrio Weber, intitulado "Brasil na série B da educação", no jornal O Globo de ontem.
Publicação
Publicação no DSF de 20/05/2009 - Página 18122
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, O GLOBO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DIVULGAÇÃO, INFERIORIDADE, AVALIAÇÃO, EDUCAÇÃO, BRASIL, DECISÃO, ORGANISMO INTERNACIONAL, REFORMULAÇÃO, EXAME, FACILITAÇÃO, ALUNO, BRASILEIROS, QUESTIONAMENTO, ORADOR, AUSENCIA, MANIFESTAÇÃO, AUTORIDADE, IMPRENSA, DIFERENÇA, COMPARAÇÃO, FUTEBOL.
  • REPUDIO, ATUAÇÃO, BANCADA, GOVERNO, RETIRADA, ASSINATURA, REQUERIMENTO, AUTORIA, ORADOR, CRIAÇÃO, COMISSÃO PARLAMENTAR DE INQUERITO (CPI), INVESTIGAÇÃO, PRECARIEDADE, EDUCAÇÃO, BRASIL, FRUSTRAÇÃO, OBSTACULO, IMPORTANCIA, DEBATE, PROTESTO, TRAIÇÃO, NEGLIGENCIA, FUTURO, PAIS, PERDA, PRIORIDADE, CRIANÇA, FALENCIA, MODELO ECONOMICO, EXPORTAÇÃO, PRODUTO PRIMARIO, FALTA, INVESTIMENTO, CIENCIA E TECNOLOGIA, REGISTRO, COMPROMISSO, EFETIVAÇÃO, PREPARAÇÃO, RELATORIO.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs Senadores, Srªs Senadoras, senhores visitantes que eu vejo em grande número aqui, visitantes que representam os políticos mais ligados ao povo, que são os vereadores.

Sr. Presidente, ontem o jornal O Globo, em uma matéria assinada pelo jornalista Demétrio Weber, trouxe uma matéria que, por incrível que pareça, passou despercebida. Imaginem se saísse uma matéria dizendo que o Brasil, de tão ruim no futebol, teria levado a Fifa a criar uma outra Copa para o Brasil disputar, porque o Brasil não teria condições de disputar na primeira Copa. Imaginem isso! Pois foi o que aconteceu ontem com a educação brasileira no mundo. Se tivesse acontecido isso com o futebol, não tenho dúvida de que o técnico seria demitido na hora, que os jogadores seriam execrados nas ruas e que, imediatamente, o Presidente da República convocaria uma reunião de urgência para discutir a segurança nacional e decidir como recuperar a vergonha causada pelo futebol brasileiro.

Mas isso não aconteceu com o futebol, isso aconteceu com a educação. E, sendo com a educação, não houve demissão de técnico, não houve convocação de reunião, não houve execração de ninguém!

Essa matéria, de um jornalista tão respeitado como Demétrio Weber, fica como algo natural. A manchete dessa matéria diz: “Brasil na série B da educação”. É da educação, não faz mal. Se fosse do futebol, aí sim, haveria uma conturbação nacional.

         Ele diz, nessa matéria, que o baixo desempenho do Brasil obrigou a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a chamada OCDE, a reformular a prova que é aplicada aos alunos do mundo inteiro para saber que nota dar à educação do seu país. Ele diz: “O teste, que no Brasil será aplicado na próxima semana, terá questões mais fáceis”. Imaginem se, no futebol, o Brasil tivesse que jogar com dois goleiros, e os outros times, com um goleiro só, Senador Efraim. Ninguém iria aceitar, mas se aceitam questões mais fáceis para o Brasil.

O objetivo é traduzir melhor o desempenho de quem vai mal no teste, separando estudantes que praticamente não sabem nada dos que demonstram um mínimo de conhecimento.

Em 2000, o Brasil amargou o último lugar em leitura, entre 32 nações.

         Quando colocaram outras nações, o Brasil caiu para a 39ª posição entre 43, atrás da Indonésia, da Romênia, do México, do Uruguai e do Chile.

         E o executor do teste diz: não é que o teste vai ser mais fácil apenas. O que queremos é descrever melhor o desempenho dos alunos com menos habilidade. Ou seja, nós somos um País de menos habilidades e ninguém se mexe, ninguém se mobiliza.

Nós precisamos lembrar, inclusive, que, nesses exames, não entram os que estão fora da escola, não entram as sessenta crianças que, por minuto, abandonam a escola no Brasil. Apenas as que estão dentro. Mesmo entre essas, nós estamos tão mal que foi preciso fazer um teste especial, Senadora Rosalba, para que os alunos do Brasil possam, pelo menos, não ficar de fora da lista.

E, apesar disso, uma CPI que estava convocada há quase dois anos, para analisarmos o chamado apagão intelectual brasileiro, para descobrir por que nós estamos nessa posição, quais as consequências dessa posição e o que fazer para sair dessa posição, foi eliminada na sexta-feira, porque o Governo conseguiu dez assinaturas para suspendê-la. E eu cheguei a pensar, Senador Efraim, que podia ser uma represália porque eu retirei a minha assinatura da CPI da Petrobras, como expliquei aqui as razões. Mas não foi, porque eu retirei às 6 horas e eles entregaram os dez pedidos quase à meia-noite. Por que este Governo tem medo de uma CPI do apagão intelectual, que não é dirigida exatamente ao Governo, mas a todos nós, brasileiros, que somos responsáveis ao longo de cinco séculos? Por que este Governo não se preocupa em fazer essa avaliação para corrigir daqui para frente? Não ele, porque só tem dezoito meses de Governo, mas os próximos Governos, até porque não haverá solução para isso em um Governo apenas. Por quê?

É aí que dá para se imaginar por que se tem medo da CPI da Petrobrás, por que se tem medo dessa CPI, que não é dirigida ao próprio Governo, que não é dirigida a este momento da história, que visa analisar todo o conjunto das forças sociais brasileiras, que visa analisar toda a história brasileira. Mesmo assim o Governo manda dez pedidos de retirada de assinaturas - que não conseguiram para a Petrobrás dez, só duas - e mata o momento em que a gente ia poder fazer uma reflexão no Senado sobre as causas, as conseqüências e as soluções, para a vergonha nacional.

Alguns dizem: não precisava de CPI. Mas eu queria ver as pessoas dizendo pela televisão aos pais: se os seus filhos não estudarem não terão futuro. Não há mais futuro para quem não estudar. Eu queria ver isso sendo dito todos os dias por uma CPI, até chegar na cabeça de todas as pessoas deste País, para que as pessoas se revoltem contra o Governo que não dá educação.

Porque nós estamos nos revoltando contra reformas na poupança, nós nos revoltamos contra buracos nas ruas, nós nos revoltamos contra o preço das mercadorias, e nós não nos revoltamos contra aquilo que mais importante há hoje para decidir o futuro do País e o futuro de cada criança, que é uma educação de qualidade. Eu queria ver uma CPI para poder colocar na televisão essa tragédia. Imagino que o título do relatório final seria: uma nação em perigo. Não é um governo culpado. Não, nada disso. É uma nação em perigo.

Estamos em perigo grande de perder o futuro do Brasil, de o País ficar sem futuro, porque daqui para frente o recurso fundamental de qualquer país é a inteligência do seu povo. Não é a terra, como foi no começo da colonização. Não é a mão-de-obra, como foi nos anos 50. O futuro está na inteligência, na capacidade de invenção, de criação. Não temos futuro porque hoje, Senador Praia, tudo o que a gente importa, o conteúdo de inteligência, mesmo naquilo que é fabricado no Brasil, vem de fora. Esse microfone aqui na frente está cheio de produtos importados lá dentro, de chips que não fabricamos. Precisamos de cinco mil caminhões de laranja para comprar um chip. Precisamos, se não me engano, de 40 toneladas de ferro para comprar um chip, mas comemoramos a exportação do ferro, da soja, da laranja e não lembramos que esse dinheiro está indo embora todinho para comprar equipamento médicos, que não são feitos no Brasil, para comprar os chips, para comprar as peças dos computadores que, mesmo montados aqui, recebem peças de fora.

Este País está em perigo e é preciso uma CPI para analisar o risco que este País vive. Além do risco do País, é o risco de cada pessoa, porque sem a educação o País fica atrasado, sem educação o País fica dividido socialmente.

É pena que a CPI tenha sido cancelada por determinação do Governo Federal. É uma pena. Uma pena e uma vergonha muito grande. Mas quero dizer que, junto com o grupo de pessoas, nós vamos, sim, levar adiante este processo. Não vai ser uma CPI passando pela televisão. Não vai ser audiência trazendo pessoas para que aqui nos falem. Mas hoje a gente já sabe - e todos neste País - o que está acontecendo. Já há informações suficientes. Elas serão juntadas e se transformarão em um relatório final. Não vai se chamar CPI, mas pelo menos vai ficar aqui algum documento de que este Senado, neste ano de 2009, disse ao País: o Brasil está correndo um sério risco, e esse risco vem do abandono da educação. Abandono esse que quer ser acobertado proibindo uma CPI que nem objetivava o Governo, objetivava todo o sistema, toda a história nacional. Mas, mesmo assim, o Governo quis encobrir a verdade de que o Brasil está em risco. E o nome disso é traição. Estão traindo o Brasil, o Brasil está sendo traído. Em qualquer outro país - e a gente sabe que até aqui mesmo - traição é o mais grave dos crimes, punido até com a pena de morte. O Brasil está sendo traído pelo abandono que estamos dando à construção do grande recurso que este País poderia ter e não tem, porque se dedica a incinerar os cérebros das nossas crianças, ao expulsá-los da escola.

Nós vamos fazer este documento, Senador Tuma. Nós vamos cumprir o papel da gente, com ou sem CPI.

O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Senador, V. Exª me permite um segundinho para eu me dirigir a V. Exª? Ontem, eu ouvi atentamente V. Exª falar em uma investigação ou uma CPI clandestina. Eu proporia uma comissão externa para fazer o levantamento que V. Exª quer, porque não tem nada de clandestinidade, porque tem objetividade e deseja reestruturar a educação para melhorar o País por inteiro.

Provavelmente, uma comissão externa, presidida por V. Exª, tem toda a legalidade. Não há necessidade de clandestinidade. Clandestinidade é o que estão fazendo, acabando com o ensino.

O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Presidente. O sentido da clandestinidade é dizer que vão impedir que a televisão transmita. É apenas isso. Mas vai ser pública, transparente. É isso.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/05/2009 - Página 18122