Discurso durante a 76ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Justificação pela posição contrária ao ingresso da Venezuela no MERCOSUL.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA. POLITICA INTERNACIONAL.:
  • Justificação pela posição contrária ao ingresso da Venezuela no MERCOSUL.
Publicação
Publicação no DSF de 20/05/2009 - Página 18227
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA. POLITICA INTERNACIONAL.
Indexação
  • ANALISE, DETERIORAÇÃO, DEMOCRACIA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, PROJETO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, CONTINUAÇÃO, PODER, REPETIÇÃO, REELEIÇÃO, CONSTRUÇÃO, DITADURA, APROPRIAÇÃO, ESTATIZAÇÃO, EMPRESA, ESPECIFICAÇÃO, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, MANIPULAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, DESRESPEITO, LIBERDADE DE IMPRENSA, DIREITO DE PROPRIEDADE.
  • LEITURA, TRECHO, DECLARAÇÃO, PRESIDENTE, CONFERENCIA, BISPO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, DENUNCIA, OMISSÃO, AUTORIDADE, CRESCIMENTO, VIOLENCIA, CRIME ORGANIZADO, RISCOS, DEMOCRACIA, ESTADO DE DIREITO, CRITICA, CARACTERISTICA, SOCIALISMO, AUTORITARISMO.
  • JUSTIFICAÇÃO, CLAUSULA, DEMOCRACIA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), OPOSIÇÃO, INGRESSO, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não é segredo que o regime democrático há um bom tempo está em deterioração na Venezuela. Uma vez aprovado seu projeto de reeleição indefinida, o presidente Hugo Chávez deu início a um processo de radicalização que terminará com a criação de uma nova Cuba na América Latina. Enquanto se fala em distensão nas relações entre a ditadura que governa a ilha caribenha e os demais países das Américas, na Venezuela ergue-se uma ditadura em que o Estado se apropria dos meios de produção por meio de decisões arbitrárias, amparado numa Constituição feita para servir aos seus propósitos, além de investir com fúria contra a liberdade de imprensa.

Devido à escassa divulgação que recebeu, tanto entre os venezuelanos, por motivos óbvios, quanto no restante das Américas, vale reproduzir trechos da mensagem divulgada pela Conferência Episcopal da Venezuela durante a última Semana Santa. Na declaração, encabeçada pela assinatura de seu presidente, dom Ubaldo Santana Sequera, arcebispo de Maracaibo, os bispos do país dizem que a situação vivida pelos venezuelanos “contradiz, de modo evidente, a sua condição de povo cristão”.

Os prelados da Venezuela referem-se à violência crescente, contra a qual as autoridades não tomam providências, permitindo que “seqüestradores, assassinos, narcotraficantes e contrabandistas continuem atuando impunemente”. Mas denunciam também os graves riscos que corre o sistema democrático, praticamente destroçado pelo chamado “socialismo do século 21”.

Dizem os bispos:

A promoção de um ambiente de aguda polarização política, a exclusão por causas ideológicas, a desqualificação moral dos adversários, a eliminação de uma positiva descentralização e a crescente concentração de poder no Executivo deterioram o Estado de Direito, despojam as instâncias nacionais, regionais e municipais de sua legítima autonomia e põem em grave risco de colapso o sistema democrático.

Pode-se dizer que, diante das últimas medidas anunciadas pelo governo venezuelano, o sistema democrático, se não morreu, sobrevive de maneira tão precária que seu sepultamento é questão de tempo - de muito pouco tempo. O “socialismo bolivariano” já expropriou, total ou parcialmente, 60 empresas do setor petrolífero que operam no Lago de Maracaibo, assumindo o controle de 90% das suas operações. É interessante assinalar que a estatal Petróleos de Venezuela devia quase US$4 bilhões a essas empresas, que eram suas fornecedoras.

Ainda este mês, o governo pretende apresentar na Assembléia Nacional o Congresso da Venezuela, onde existem apenas 8 deputados opositores, um projeto de lei que permitirá ao Executivo declarar de “propriedade social” todos os “bens e serviços de origem pública ou privada, considerados necessários para o desenvolvimento da economia socialista”.

Trata-se de uma lei que dá ao presidente poderes sem freios - como se ele já não os tivesse em quantidade suficiente -, para simplesmente eliminar a propriedade privada no país. Qualquer coisa pode ser declarada de “interesse público” e desapropriada. É um processo que, aliás, já começou. Na semana passada, o Estado apoderou-se de 10 mil hectares no Estado de Barinas, onde nasceu o presidente-ditador. Antes, já tinha tomado terras de uma produtora de arroz norte-americana, de uma plantadora de eucalipto irlandesa e até mesmo desapropriado um estacionamento de caminhões da Coca-Cola em Caracas. Também já está decidida a estatização do Banco de Venezuela, nome adotado pelo grupo bancário espanhol Santander no país.

Hoje em dia, o aparato estatal venezuelano é gigantesco, controlando desde supermercados a shopping centers, de indústrias a canais de televisão. É contra a imprensa que Chávez voltou suas baterias nas últimas semanas. O governo já anunciou que iniciará “inspeções em emissoras de rádio e televisão locais”, feitas por fiscais que disporão de poderes praticamente ilimitados. Eles poderão “solicitar as informações que julgarem necessárias” e pedir o auxílio de forças policiais para desempenhar seu trabalho.

Não é necessário muito esforço para adivinhar o que se esconde por trás desse repentino zelo fiscalizatório. O propósito é silenciar as poucas vozes, entre os veículos de comunicação da Venezuela, que ainda se opõem ao autoritarismo. Nem mesmo Chávez esconde que o objetivo principal é silenciar o canal de televisão Globovisión, a exemplo do que fez há algum tempo com outra emissora que o incomodava, a Rádio Caracas Televisión, que teve sua concessão cassada.

Da ofensiva contra a Globovisión fazem parte três processos abertos pela Comissão Nacional de Telecomunicações, um deles por ter noticiado a ocorrência de um terremoto em Caracas “sem a permissão das autoridades”. Ou seja, na prática a censura à imprensa vigora há tempos no país, embora alguns ingênuos insistam em dizer que os meios de comunicação têm ampla liberdade para divulgar o que quiserem...

Os sindicatos autônomos desaparecem pouco a pouco, substituídos por “conselhos de trabalhadores”, submetidos ao controle governamental. Os opositores do regime são objeto de uma guerra sem trégua. Ex-ministro da Defesa, o general Raul Isaías Baduel está preso desde 2 de abril, embora não exista acusação formal contra ele. O prefeito de Maracaibo, Manuel Rosales, pediu asilo ao Peru. O general Francisco Usón, ex-ministro das Finanças, foi condenado a cinco anos de prisão por “ultraje às Forças Armadas”. E o jornalista Teodoro Petkoff foi acusado de sonegação de impostos, 35 anos depois de ter recebido uma herança. Três governadores oposicionistas, além de vários políticos regionais e locais, vivem sob a ameaça de processos.

Esta é a “democracia” venezuelana, em que o coronel Hugo Chávez trabalha com uma pressa cheirando a desespero para construir um “socialismo bolivariano”, eufemismo para ditadura. O desespero provém principalmente da queda nos preços do petróleo, que agravou a crise econômica e secou boa parte de suas fontes de recursos. A previsão do Fundo Monetário Internacional é de que a taxa de inflação no país deve subir para 36,4% este ano e para 43,5% no ano que vem, frente aos 30,4% de 2008. Faltam gêneros alimentícios essenciais, há filas nos supermercados e o câmbio negro de mercadorias prospera.

Esta é a Venezuela que pleiteia seu ingresso no Mercosul - ao mesmo tempo em que ameaça deixar a OEA, Organização dos Estados Americanos, por ter sido condenada pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, devido à perseguição de defensores dos direitos humanos e jornalistas. A economia de mercado está desaparecendo no país, e sua entrada no Mercado Comum proporcionaria a um presidente que pretende se perpetuar no poder uma nova e abrangente tribuna para pregar suas confusas e perigosas teorias totalitárias.

Nosso compromisso com a cláusula democrática do Mercosul teria que ser jogado no lixo para concretizar a admissão de um país que a cada dia se afasta mais dos valores que tanto prezamos, inscritos em nossa Constituição.

Era o que eu tinha a dizer.

Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 20/05/2009 - Página 18227