Discurso durante a 82ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Homenagem a memória do Senador Jefferson Peres, pelo transcurso do primeiro ano de sua morte.

Autor
Jefferson Praia (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: Jefferson Praia Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem a memória do Senador Jefferson Peres, pelo transcurso do primeiro ano de sua morte.
Aparteantes
Osmar Dias.
Publicação
Publicação no DSF de 27/05/2009 - Página 19605
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • HOMENAGEM, ANIVERSARIO DE MORTE, JEFFERSON PERES, EX SENADOR, SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, PRESENÇA, SENADO, ELOGIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, DEFESA, ETICA, DEMOCRACIA, CIDADANIA, NECESSIDADE, PARTICIPAÇÃO, MOBILIZAÇÃO, POPULAÇÃO, GARANTIA, SOBERANIA NACIONAL.
  • LEITURA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, AUTORIA, JEFFERSON PERES, EX SENADOR, CRIAÇÃO, FUNDO DE DESENVOLVIMENTO, REGIÃO AMAZONICA, PARALISAÇÃO, TRAMITAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, SOLICITAÇÃO, AGILIZAÇÃO, APROVAÇÃO, MATERIA.
  • LEITURA, PROPOSTA, EMENDA CONSTITUCIONAL, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, A CRITICA, ESTADO DO AMAZONAS (AM), AUTORIA, JEFFERSON PERES, EX SENADOR, APERFEIÇOAMENTO, ORGANIZAÇÃO POLITICA, ALTERAÇÃO, LEGISLAÇÃO, SUPLENTE, SENADOR, APRESENTAÇÃO, SUGESTÃO, EFICACIA, ATUAÇÃO, GOVERNANTE.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, meu querido amigo Deputado Federal pelo Estado do Amazonas, Marcelo Serafim, meu querido amigo e companheiro de Partido, Vice-Prefeito do Rio Preto da Eva, Paixão, há um ano, a paisagem humana brasileira se empobrecia irremediavelmente. Há um ano, a política nacional sofria um dos mais rudes golpes de que poderia ter sido vítima. Há um ano, a ética na vida pública via partir seu mais emblemático defensor e o mais legítimo representante. Há um ano, este Senado ficava menor, apartado de um integrante com o qual, nos 183 anos de existência da Casa, poucos poderiam equiparar-se. Há apenas um ano, morria Jefferson Péres.

O fulminante enfarte daquela manhã de 23 de maio de 2008 não ceifava apenas uma vida: privava o Amazonas e o Brasil de um homem singular. Advogado por formação, Jefferson Péres descobriu no magistério superior a possibilidade de disseminar conhecimento e valores. Provavelmente, dessa experiência docente nascia, ou se desvelava nele, a certeza de que outros caminhos estariam abertos à pregação dos valores que considerava fundamentais ao fortalecimento da democracia e das autênticas práticas de cidadania entre nós.

Cidadão na mais perfeita acepção da palavra, ele sabia da importância da participação cívica como essencial à defesa da soberania da Pátria e à construção de uma sociedade menos desigual, mais igualitária. Já nos anos 1950, ainda jovem, Péres engrossava as fileiras dos que, nas ruas das cidades brasileiras, desfraldavam a emblemática bandeira de “O petróleo é nosso”.

Em plena maturidade, a voz de Jefferson Péres se fez ouvir, límpida e firme, em meio ao clamor nacional pelo fim do regime autoritário. Sem ódio, mas sem medo, lá estava ele a exigir o retorno do Estado democrático de direito. Não por mera coincidência, a primeira eleição na qual disputara o voto popular, em 1988, ocorre no mesmo contexto histórico em que a Nação via promulgada a “Constituição Cidadã”.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, não vou estender-me em considerações acerca do grande homem público a quem o destino me fez suceder, na honrosa cadeira do Amazonas, neste Senado Federal, muito menos pretendo reiterar o que o consagrou em sua trajetória política: o símbolo maior da ética na vida pública. Desnecessário seria lembrar aqui a figura de aparente fragilidade física que se agigantava toda vez em que em jogo estivessem os valores morais que tão bem resguardava.

Não vou insistir na grandeza cívica de Jefferson Peres. Outros o farão certamente com mais brilho e proficiência do que eu. Assim, malgrado reconhecer-lhe todas as virtudes que fizeram dele o grande timoneiro da luta por escoimar da vida pública processos e procedimentos incompatíveis com os padrões de moralidade e de ética que dignificam a vida das sociedades, opto por enfatizar, neste momento, a clarividência intelectual e o espírito público desse homem extraordinário, recorrendo a três textos de sua autoria (dois deles legislativos e o terceiro jornalístico). Para tanto, não terei constrangimento de abrir aspas generosas, para evocar a palavra viva, sempre objetiva e elegante do nosso saudoso Senador Jefferson Péres.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o primeiro é testemunho eloquente de sua permanente preocupação com o futuro ambiental e o desenvolvimento humano do nosso Estado e da nossa Região como um todo. Trata-se do preâmbulo explicativo à sua Proposta de Emenda à Constituição nº 19, de 2000, que cria o Fundo de Desenvolvimento da Amazônia Ocidental, alterando o Ato das Disposições Constitucionais Transitórias.

Jefferson Péres, com seu primoroso didatismo, assim divide o preâmbulo de fundamentação da sua proposta:

I - Pressupostos éticos.

1.1 - O ecossistema amazônico tem grande importância para o mundo, em razão da rica biodiversidade e da função que desempenha na purificação da atmosfera, com efeito planetário.

1.2 - A preservação desse ecossistema impõe restrições à exploração dos seus recursos naturais, o que implica uma onerosa renúncia econômica.

1.3 - Essas duas premissas dão às populações amazônicas o direito de exigir das comunidades extra-amazônicas, nacionais e estrangeiras, que lhe assegurem, como estímulo e compensação, investimentos a fundo perdido e abertura de mercados para os seus produtos certificados.

II - Razões Legais.

2.1 - Esse imperativo ético justifica plenamente a criação de um fundo público de desenvolvimento, a ser feito via Constituição, por dois motivos. Primeiro, por força de óbices constitucionais, que só podem ser superados no corpo da própria Constituição. Segundo, para resguardar o projeto futuramente, colocando-o a salvo de atropelamento por medidas provisórias, decretos e portarias ministeriais.

III - Autossustentabilidade Financeira.

O Fundo tem a singularidade de não transferir recursos de outras regiões do País para a Amazônia, pois é constituído por tributos arrecadados pela União no Estado do Amazonas. Trata-se, portanto, de retenção no local de poupança hoje remetida para o Tesouro Nacional e, indiretamente, para as demais regiões. E sua aplicação tem uma conotação de generosidade, ao beneficiar não apenas o Estado do Amazonas, onde é gerado, mas também os nossos vizinhos, Rondônia, Acre e Roraima.

IV - A Equação Irresolúvel

4.1 - A Amazônia Ocidental, e, em particular, o Estado do Amazonas, depara-se com um presente difícil e um futuro incerto, a nos desafiar com uma equação aparentemente irresolúvel, na forma de um trinômio composto por variáveis que não se articulam e às vezes se repelem. São as seguintes as variáveis: (A) uma instituição, a Zona Franca; (B) uma questão, o meio ambiente; (C) uma situação, a exclusão social.

4.2 - A instituição Zona Franca se defronta com os seguintes problemas: (A) limitação temporal; (B) concentração espacial; (C) rejeição nacional.

4.3 - A questão ambiental enfrenta as seguinte dificuldades: (A) renúncia econômica; (B) resistência política; (C) controle precário; (D) cobrança internacional.

4.4 - A situação dramática decorrente da exclusão social depara-se com os seguintes obstáculos: (A) restrições ambientais; (B) falta de alternativas; (C) escassez de recursos.

V - A Solução Proposta.

5.1 - Transformar o trinômio num triângulo com os vértices ligados e articulados mediante a (1) criação de um fundo com recursos gerados na Zona Franca, (2) condicionado à preservação do meio ambiente e (3) destinado a eliminar a exclusão social no interior.

VI - Efeitos Colaterais.

6.1 - Como consequência natural, quase certa, serão criadas as condições políticas e psicológicas que nos assegurarão: (A) a prorrogação dos incentivos da ZF por mais um período; e (B) a abertura dos mercados no exterior para os nossos produtos certificados.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, já aprovada pelo Senado da República, encontra-se a PEC parada, há anos, na Câmara dos Deputados.

Estou mais uma vez tocando nesse assunto e fazendo com que nós possamos ter, é claro, naquela Casa, a tramitação com a maior rapidez possível.

O segundo texto, Sr. Presidente, reflete a permanente preocupação ética de Jefferson Péres quanto ao aperfeiçoamento de nossas instituições políticas de modo a fortalecer sua legitimidade e representatividade.

Refiro-me à PEC 8, de 2004, que altera uma das instituições cada vez mais controvertidas e criticadas da política brasileira que é a figura do suplente de Senador. Pela PEC 8, o suplente apenas substituirá o titular da cadeira, sem, no entanto, vir a sucedê-lo.

Quero dizer desde já que, apesar de ter sido beneficiado pelas disposições ora vigentes, sou totalmente favorável à mudança, preconizada pelo meu saudoso amigo Jefferson Péres.

Volto a abrir aspas para ele, que, na “justificação” da sua proposta afirma:

A presente proposição tem o objetivo de alterar o regramento constitucional referente à investidura de novo titular no cargo de Senador, na hipótese de haver vacância no transcurso do mandato.

Com efeito, pelas normas hoje vigentes (art. 56 da Lei Maior) se o Senador falecer, renunciar ou perder o mandato, ou seja, se o cargo ficar vago, será convocado suplente para sucedê-lo.

Ademais, se não houver suplente por ocasião da vacância, far-se-á eleição específica para preencher a vaga, se faltarem mais de quinze meses para o término do mandato (art. 56 §2º). A contrario sensu depreende-se que se o lapso restante for menor de quinze meses, a vacância permanecerá até a posse dos eleitos nas próximas eleições gerais para o Senado.

A nossa intenção ao apresentar a proposta que ora justificamos é ampliar a representatividade do Senado.

Assim, pelo novo regramento que ora estamos propondo, a substituição ou a sucessão de Senador observará o seguinte: primeiro, o suplente será convocado para substituir o titular, sem sucedê-los, nos casos de vaga, de investidura em funções previstas no art. 56 ou de licença superior a cento e vinte dias; segundo, ocorrendo vaga e faltando sessenta dias, ou mais, para a realização das eleições gerais, sejam federais, estaduais ou municipais, haverá pleito para sucessão, devendo o eleito cumprir o restante do mandato, com posse em 1º de fevereiro do ano seguinte; terceiro, ocorrendo vaga e faltando menos de sessenta dias para realização de eleições gerais, o pleito para sucessão ocorrerá nas eleições gerais subsequentes.

Outrossim, [continua o Senador Jefferson Péres] o suplente só será titularizado no cargo de Senador quando a vaga ocorrer nos últimos trinta meses do mandato de oito anos. Isso em razão de que o lapso de dois meses nos parece o tempo mínimo necessário para que se possa garantir sequencialmente: 1) um processo de escolha de candidatos pelos partidos; 2) um período mínimo de campanha e propaganda eleitoral; 3) uma vez realizada a escolha, um prazo mínimo para que a justiça eleitoral faça a devida adequação de seus programas com os nomes dos novos candidatos.

Por conseguinte, como já observado acima, ressalvada a eventualidade de haver vacância nos últimos dois anos e seis meses de mandato, o suplente não será titularizado no cargo, sendo apenas convocado para exercer o cargo até que o novo titular seja eleito democraticamente para completar o mandato de oito anos.

Ademais, cabe lembrar que, com a alteração sugerida, diferentemente do que dispõe a norma hoje vigente, poderá também haver eleição para o Senado conjuntamente com eleições municipais, o que nos parece positivo.

Enfim, o que não nos afigura adequado e democrático é, de acordo com o regramento em vigor, o suplente de Senador ganhar praticamente muitos anos de mandato sem o voto popular, circunstância que tem acontecido quando a vaga ocorre logo no início do mandato do titular.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a caminho de concluir esta homenagem ao estadista amazonense, peço sua licença para abrir-lhe aspas, pela terceira vez, e relembrar um artigo que publicou anos atrás, em sua coluna dominical no jornal A Crítica, de Manaus. A esta altura, ele soa como a síntese de seu ideário, um verdadeiro testamento cívico a todos nós que detemos qualquer parcela - por menor que seja - de responsabilidade pelos destinos do nosso País.

O título do artigo é Os doze mandamentos do (bom) governante. Aqui estão eles:

1 - Colocar o interesse público acima de todas as coisas. O governo não deve ser, jamais, um condomínio de parentes, amigos, correligionários e apaniguados.

2 - Honrar o juramento de cumprir a Constituição e as leis. O governante não está acima da lei. Ao contrário, deve ser o primeiro a cumpri-la, para dar exemplo.

3 - Não roubar e não deixar roubar. Tolerância zero com todos os atos de corrupção, grandes e pequenos, sem a mínima transigência.

4 - Ter a mente aberta a sugestões e críticas que ajudam e fechada à bajulação que cega.

5 - Nomear os Ministros ou Secretários pelo critério da competência e probidade. Querê-los altivos, não sabujos, e dar-lhes liberdade de ação, mas sendo implacável na cobrança de resultados.

6 - Ser humilde para reconhecer erros. Nunca procurar justificá-los, mas admiti-los imediatamente, mandar corrigi-los e pedir perdão por havê-los cometido.

7 - Ser absolutamente transparente. Todos os atos de governo devem ser públicos e levados amplamente ao conhecimento da população.

8 - Não fazer propaganda do governo, nem promoção do governante. Toda verba de publicidade deve ser gasta exclusivamente em campanhas educativas.

9 - Tratar bem a todos. Ninguém tem o direito de dar patadas, muito menos um governante. Grosseria humilha quem a recebe e diminui quem a pratica. A arrogância é atributo dos tolos, não dos sábios.

10 - Dar atenção a todos, mesmo que se tenha de mobilizar uma equipe de assessores para isso. Pessoas humildes, muitas vezes, procuram o governante para uma súplica, em desespero, merecem ao menos a atenção.

11 - Cumprir compromissos com pontualidade. Parece pouca coisa, mas não é. Governante que aplica chá de cadeira revela duas deficiências: falta de competência para organizar o seu tempo e falta de respeito pelos outros.

12 - Não perder a compostura jamais. O governante deve ser simples, não vulgar, porque ele não é um cidadão qualquer, mas representa uma instituição.

Senador Osmar Dias, V. Exª. deseja um aparte?

O Sr. Osmar Dias (PDT - PR) - Senador Jefferson Praia, apenas para cumprimentar V. Exª., porque faz uma descrição muito perto daquilo que nós conhecemos aqui do Senador Jefferson Peres, que deixou uma enorme saudade. Mas eu também vou pedir a minha inscrição para falar como orador. Apenas para registrar no seu pronunciamento a minha concordância com todos os elogios feitos ao Senador Jefferson Peres, que são muito tímidos ainda diante da figura que todos nós aprendemos a respeitar no Senado Federal. Obrigado.

O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador Osmar Dias.

No último parágrafo, Sr. Presidente, Jefferson Péres, político maduro e realista, mostra que nunca abriu mão do seu compromisso com a esperança, ponderando nos seguintes termos:

            Céticos, alguns me perguntarão se acredito mesmo que, na vida real, algum político seja capaz de cumprir estes mandamentos. Respondo que, certamente, não, dado a imperfeição da natureza humana. Mas o ponto não é esse, é outro. O que distingue o mau governante do bom governante é que o bom procura cumprir esses mandamentos, já o mau, descumpre-o deliberadamente.

            Srª. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, quero que me desculpem se os cansei com essas três longas citações. Mas, no meu modesto e sincero entender, faz muito bem à mente e ao coração ouvir mais uma vez a voz de Jefferson Péres, que, lá onde se encontra hoje, do outro lado da vida, continua a desafiar a nossa consciência, a consciência do Amazonas, da Amazônia e de todos os brasileiros.

            Srª Presidente Serys Slhessarenko, encerro agradecendo a oportunidade de ter aqui falado um pouco do que nos deixou o nosso grande Senador Jefferson Péres. Eu continuo aprendendo com o Senador Jefferson Péres, Senador Mozarildo, buscando todas as informações que foram por ele deixadas. Sou um aprendiz e espero, com a graça de Deus, cumprir esse papel, terminando o mandato do nosso grande Senador Jefferson Péres.

            Para os jovens políticos, acredito que nós temos aí muitas informações e muitas coisas boas para os jovens políticos mergulharem, como temos, aqui também, de muitos Senadores e de muitos políticos brasileiros. Quero agradecer ao meu amigo Marcelo Serafim, Deputado Federal, ao meu companheiro e amigo Paixão, de Rio Preto da Eva.

            Muito obrigado, Srª Presidente, por neste momento estarmos aqui. É um momento triste, mas eu tenho certeza de que o Senador Jefferson Péres está feliz. Ele não quer que choremos mais por ele; ele quer apenas que nós possamos cumprir o que ele muito bem pregou ao longo de sua vida.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 27/05/2009 - Página 19605