Pronunciamento de Arthur Virgílio em 03/06/2009
Discurso durante a 88ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Homenagem ao grande poeta popular Patativa do Assaré, pelo centenário de seu nascimento.
- Autor
- Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
- Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.:
- Homenagem ao grande poeta popular Patativa do Assaré, pelo centenário de seu nascimento.
- Aparteantes
- Cristovam Buarque.
- Publicação
- Publicação no DSF de 04/06/2009 - Página 21658
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM.
- Indexação
-
- SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, PARENTE, ARTISTA, PRESENÇA, SESSÃO, HOMENAGEM, POETA, COMPOSITOR, ESTADO DO CEARA (CE), ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, LITERATURA, MUSICA POPULAR, VALORIZAÇÃO, CULTURA, REGIÃO NORDESTE, LUTA, JUSTIÇA SOCIAL.
- COMENTARIO, MIGRAÇÃO, POVO, REGIÃO NORDESTE, ESPECIFICAÇÃO, DESTINO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), ESTADO DO ACRE (AC), SAUDAÇÃO, CRIATIVIDADE, POPULAÇÃO, ESTADO DO CEARA (CE).
SENADO FEDERAL SF -
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O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, Exmº Sr. Ministro César Asfor Rocha, Presidente do Superior Tribunal de Justiça, um cearense dos mais ilustres; Exmº Sr. Ministro Ubiratan Aguiar, igualmente ilustre e diligente Presidente do Tribunal de Conta da União (TCU); Exmº Sr. Senador Inácio Arruda, primeiro signatário da moção que pediu e obteve, à unanimidade do Senado, esta homenagem tão justa a Patativa do Assaré; Senador Tasso Jereissati, prezado companheiro, dileto amigo, admirador que já me relatou tantas histórias e tantas passagens de Patativa - e isso é misturado com amor que Tasso inegavelmente e imorredouramente tem pelo seu Estado do Ceará; Sr. Geraldo Gonçalves, filho do Patativa do Assaré, mostrando que essa coisa de genética funciona - acabei de ver que funciona a genética -, porque transmitiu o talento, a simplicidade e a musicalidade da poesia, da criação de seu pai; Exmº Sr. Evanderto Almeida, Prefeito de Assaré, no Ceará; eu gostaria muito de saudar um querido amigo, parceiro de Patativa, e que é uma figura reconhecida pela sua irreverência como intelectual e pelo seu talento como compositor, como intérprete, que é o meu querido amigo Raimundo Fagner; saúdo a todos os convidados e com muita ênfase o ilustre Senador argentino, que, ao lado de pessoas como Marisa Serrano, como Aloizio Mercadante, vai criando e consolidando essa boa e necessária idéia que é o Parlamento do Mercosul.
Muito bem, o que fica para mim, Fagner, o que fica para mim, Senador Tasso, da vida de Patativa do Assaré, é que ele sempre se me afigurou como muito espontâneo, musical, ritmado, irônico e, ao mesmo tempo, profundamente popular; e um popular que despertava e desperta a atenção dos eruditos, porque estudado e reestudado nas academias, porque cantado em verso e prosa nos cursos de literatura deste País.
Rivaliza com o pássaro: “fulano de tal fala como uma patativa” - às vezes, não sei se se refere ao pássaro ou se se refere ao poeta, ao homem do Nordeste, ao homem que cantava o seu povo, e cantava o seu povo de maneira universal. Porque eu divido as figuras de criação em dois tipos - e não estou diminuindo o primeiro tipo: o primeiro tipo seria o que criava ou que cria e que é muito compreendido, Deputada Vanessa Grazziotin, pelo seu povo, pelos seus próximos, pelos seus vizinhos - eu não diminuo esta primeira categoria -, como alguém que escreve genialmente e é muito compreendido pelos que estão à sua vizinhança; e o outro seria o que escreve de maneira simples sobre a sua terra, sobre a sua vizinhança e é compreendido pelo mundo inteiro. Tenho a impressão de que, se alguém traduzisse Patativa para o russo, ele seria entendido por eles, que, pela obra dele, mergulhariam na alma brasileira, na alma cearense, mais talvez do que se lessem dezenas de compêndios sobre a história do Ceará, sobre o sofrimento de um povo resistente, sobre o sofrimento de um povo criativo, sobre o sofrimento de um povo que produz figuras exponenciais da cultura brasileira, como Fagner, como Tom Cavalcante e como Patativa do Assaré.
O Fagner exagera quando diz que joga futebol perto do Zico. É um exagero visível, mas tem direito. Há uma passagem que para mim revela muito o que é o Ceará. O meu Estado, que é o mesmo da Deputada Vanessa Grazziotin, é muito marcado pela presença nordestina, e a presença nordestina mais forte é a cearense. Hoje há uma mistura muito maior, a partir da consolidação do Pólo Industrial de Manaus, a partir da implantação de certos projetos mais para o sul do Amazonas; há, assim, uma benéfica e benigna mistura muito maior, porque, quanto mais misturar, melhor. O Brasil é o País mesmo, por excelência, da miscigenação. Mas nós temos uma presença muito forte. Há 30, 40 anos, quem não fosse filho de cearense era neto de cearense ou, então, seria filho ou neto de alguém do Nordeste. Mas a presença cearense foi muito forte na conquista do Acre, e nós temos, portanto, uma necessidade de nos comunicarmos com aqueles que representam essa tradição tão bonita.
Há um Município, Senador Tasso Jereissati, que é Parintins - eu já disse a V. Exª: chegou uma época em que Câmara de Vereadores desse Município - à época, com nove Vereadores - tinha cinco cearenses. Então, era algo que mostrava a capacidade que havia de se organizarem eles, de vencerem eleições e de se fazerem poder.
Muito bem. Eu, então, faço esta homenagem a Patativa do Assaré - e tenho muita felicidade em encontrar Geraldo Gonçalves aqui. Lamentei muito porque o Senador Suplicy prometeu que cantava, mas não cantou. Pelo menos, eu não tive notícias de que tivesse consumado esse ato tão bom e tão criativo. Fiquei feliz com o Fagner. E esta é uma homenagem que faço também ao meu povo, que é um povo que descende da fibra do cearense, que descende da história que o Ceará soube construir e que descende dessa veia poética. Se eu falava que, por um lado, Parintins já teve cinco Vereadores em nove, Senador Inácio Arruda, eu lhe digo que Parintins é uma terra de absoluta criatividade, de absoluta criação.
Hoje, quase todos os carnavalescos do Rio de Janeiro ou são de Parintins ou se socorrem da criatividade daqueles que fazem o boi-bumbá em Parintins. Então, o sangue de Patativa do Assaré corre nas veias daquelas figuras tão geniais.
Quando fazemos campanha política - a Deputada Vanessa sabe disso muito bem -, em qualquer lugar, em qualquer Município do Estado, as pessoas fazem boas, abnegadas e idealistas pichações. Lá fazem murais. Lá concorrem para ver quem faz o melhor mural, o mural mais bonito. Isso não deixa de ser a criatividade que nos faz perguntar onde estão os grandes nomes da alta costura. Há muita gente do Ceará. Os grandes cozinheiros, os grandes chefs de cozinha do mundo, uma parte substancial deles é gente que veio do Ceará. Essa é uma capacidade que tem o Ceará de passar uma tão multifacetada cultura que começamos a entender quando vemos a qualidade dos seus representantes no Senado, a qualidade dos seus representantes na Câmara.
Quando lemos a história do Ceará, recolhemos exemplos de altivez. Um deles é o grande Conselheiro Saraiva, homem de dois metros de altura numa época em que todo mundo era de baixa estatura. Num entrevero com José de Alencar, cearense ilustre, grande romancista, Saraiva faz referência à baixa estatura de Alencar, e Alencar responde: “Eu tenho uma vantagem em relação ao senhor, Conselheiro Saraiva: baixo como sou, na estatura e não na moral, eu não tenho de vergar a minha coluna. As pessoas maiores talvez precisem; eu não preciso”. Estava ali toda a altivez de um povo que não se rende diante da seca, que não se rende diante das dificuldades, que não rende diante da ironia das cheias e que não se rende diante de tantos obstáculos na sua vida, que fizeram dos cearenses aqueles que mais migraram, que mais saíram do Ceará para outros pontos do País e até para outros pontos do mundo. Aí, vejo o Tom Cavalcante fazendo o sucesso que faz; vejo o Fagner se eternizando como o que ele é, um compositor consagrado, com um público que pertence a ele em todos os Estados do País - no Amazonas, com muita força e com muita ênfase -; vejo os meus companheiros, os meus colegas de Senado Federal. E eu vejo no Geraldo a veia poética, a veia do cantador, a veia do contador dos “causos” e das histórias do seu povo, mostrando que temos muito o que reverenciar neste momento, não só o Ceará e o seu povo tão resistente, tão bravo, não só o que o Ceará espalhou e semeou de coisa tão boa pelo País inteiro; estamos aqui dizendo que temos um erudito que há pouco tempo se foi, mas um não erudito, um poeta popular que há pouco tempo se foi e que tanto intriga, tanto instiga, tanto desperta no debate, no calor da tentativa de interpretarem o que ele próprio é: o Patativa do Assaré.
Os intelectuais que estudaram tanto procuram entender Patativa. Patativa sem estudar quase o que os outros precisavam estudar, entendia os intelectuais muito bem, entendia sobretudo o seu povo. Ele conseguia fazer aquilo que é obrigação dos intelectuais. O intelectual que não quer estar em uma torre de marfim tem, sobretudo, que saber falar a linguagem do seu povo. Ele tem que saber transmitir a linguagem do seu povo, porque foi para isso que ele estudou, para isso que seu povo lhe custeou os estudos. E o Patativa não precisou estudar muito para falar melhor que os intelectuais sobre as agruras do seu povo.
E quando ele fala das agruras, da beleza e da luta de seu povo, ele fala melhor do que todo mundo e fala pelo meu povo também. Sinto-me contemplado por seus versos e me sinto encantado por sua música.
Senador Cristovam Buarque, ouço V. Exª com muita honra. (Palmas)
O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Senador Arthur Virgílio, em primeiro lugar, quero dizer que, durante nove anos, fiquei fora do Brasil, e uma das maiores companhias que tive nesses nove anos foi exatamente a música e a poesia de Patativa. Não só eu, mas todos aqueles com os quais eu convivia, sobretudo os nordestinos, como eu. Se havia alguma coisa que nos dava saudade, mas que nos dava esperança, que mantinha a gente acesa e ligada, era ouvir as poesias e as músicas que ele fazia. Por isso, sinto-me muito emocionado de poder, aqui no Senado, agora, depois de tantas trajetórias desde aqueles nove anos, prestar essa homenagem, graças a Senadores como o senhor. Ao mesmo tempo, tive a maior satisfação de, como Governador, ter trabalhado ao máximo com a nossa Casa do Cantador. Aqui no Distrito Federal, talvez pouca gente saiba, Senador Tasso, há um belo prédio, construído ainda pelo Governador José Aparecido de Oliveira, onde permanentemente se faz cantoria - aqui estão, inclusive, alguns deles; hoje muitos já moram aqui em Brasília. Mas lá há, permanentemente, concursos para os quais vêm cantadores de todas as partes do Brasil. Eu diria, sem nenhum medo de errar, que Brasília hoje, quando comparada a todas as cidades do Brasil, é um dos mais importantes centros de cantadores do Nordeste. Por isso, Senador Inácio Arruda, muito obrigado por ter dado essa emoção a cada um de nós que cresceu ouvindo as músicas e ouvindo as poesias desse grande cearense que foi Patativa do Assaré.
O SR. PRESIDENTE (Inácio Arruda. PCdoB - CE) - Eu é que agradeço a V. Exª, que, saindo das terras do Exu para o Distrito Federal, acolhe não só o povo de Exu como o povo de Iguatu, que une o Ceará e Pernambuco no Distrito Federal.
Voltemos a palavra a Arthur - não é para combinar com Exu nem com Iguatu!
O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM) - Agradeço, Sr. Presidente Inácio Arruda. Sem fazer rima e sem fazer cantação, veja: o Ceará é tão diferente e tão mágico que Exu lá é uma palavra divina.
Sr. Presidente Inácio Arruda, Senador Tasso Jereissati, Geraldo, encerro dizendo algumas coisas bem simples: se se exigia sensibilidade social, temos uma obra que criticava as condições de injustiça vividas pelos mais pobres no Ceará; se se exigia altivez, temos uma obra que não perdoava os governantes injustos; se nós exigimos beleza, exigimos senso estético, temos uma poesia que é irrepreensível num homem que - disse-se isso tempos atrás o Senador Tasso Jereissati quando falávamos desta sessão que aconteceria - não dizia “experiência”, dizia “isperiença”. Mas essa “isperiença” dele lhe dava tanta cultura, que a gente tem que compreender, de uma vez por todas, que uma coisa é aquela cultura erudita, de se ler muito livro, de se informar muito com muitos dados para cá e para acolá, e outra é uma cultura que vem da vida, que vem do talento, e essa sobrava em Patativa do Assaré.
É por isso que eu hoje tenho absoluta convicção, Fagner, quando abraço todos os presentes nesta sessão, de dizer que, há sete anos - se não em engano, foi em julho de 2002, quando se mudou daqui para o céu Patativa do Assaré -, se as pessoas se queixavam de alguma monotonia no paraíso, tenho a impressão de que, quando ele se juntar outra vez a Luiz Gonzaga, essa monotonia com certeza se terá acabado.
Muito obrigado.
Era o que tinha a dizer. (Palmas.)
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