Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Expectativa sobre o ingresso da República Bolivariana da Venezuela no MERCOSUL, analisando aspectos jurídicos, políticos e econômicos envolvidos na questão.

Autor
Jefferson Praia (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: Jefferson Praia Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Expectativa sobre o ingresso da República Bolivariana da Venezuela no MERCOSUL, analisando aspectos jurídicos, políticos e econômicos envolvidos na questão.
Aparteantes
Eduardo Suplicy.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2009 - Página 22099
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • EXPECTATIVA, EMPRESARIO, ESPECIFICAÇÃO, ZONA FRANCA, MUNICIPIOS, MANAUS (AM), ESTADO DO AMAZONAS (AM), SÃO PAULO (SP), ESTADO DE SÃO PAULO (SP), ENTRADA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), DETALHAMENTO, DADOS, IMPORTANCIA, COMERCIO EXTERIOR, CRESCIMENTO ECONOMICO, BRASIL.
  • APREENSÃO, CIRCUNSTANCIAS, FORMA, DIREÇÃO, PROCESSO, ENTRADA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), CRITICA, PROPOSTA, DIFERENÇA, TRATAMENTO, LIBERAÇÃO, PRODUTO, ESTADOS MEMBROS, COMENTARIO, POSSIBILIDADE, GOVERNO ESTRANGEIRO, CRIAÇÃO, DIFICULDADE, ACORDO, COMERCIO, MOTIVO, POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA, EXCESSO, ESTATIZAÇÃO.
  • QUESTIONAMENTO, DEMOCRACIA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ANTAGONISMO, GOVERNO ESTRANGEIRO, PARCEIRO, EXCESSO, INVESTIMENTO, PRODUÇÃO, ARMA, APREENSÃO, OCORRENCIA, CONFLITO, OBSTACULO, IMPLEMENTAÇÃO, EFICACIA, POLITICA, COMERCIO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).
  • COMENTARIO, CRISE, ECONOMIA, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, REDUÇÃO, PREÇO, PETROLEO, DIFICULDADE, CONTROLE, GASTOS PUBLICOS.
  • DEFESA, AMPLIAÇÃO, DEBATE, POSSIBILIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, ENTRADA, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Paulo Paim, Srªs e Srs. Senadores, nos círculos empresariais da Zona Franca de Manaus, de São Paulo e de outras regiões do Brasil, é grande a expectativa em relação ao ingresso da República Bolivariana da Venezuela no Mercosul.

Nada mais compreensível, tendo em vista o crescimento acelerado do fluxo comercial bilateral, que, no ano passado, bateu recorde de US$6 bilhões.

Com efeito, em 2008, exportamos US$5,1 bilhões e importamos apenas US$538 milhões em produtos venezuelanos. O saldo da balança comercial, favorável ao Brasil, foi, portanto, de quase US$4,6 bilhões.

Se compararmos esse valor com o superávit alcançado pelo nosso País em 2002, verificamos que o saldo cresceu surpreendentemente 2.583% nos últimos seis anos.

O motivo mercantil é o principal entre os numerosos argumentos mobilizados pelo Itamaraty em defesa da aprovação, por este Senado da República, do protocolo que estabelece a adesão da Venezuela ao Mercosul, firmado em Caracas em 4 de julho de 2006 e enviado pelo Presidente Lula ao Congresso Nacional em 2007.

Todos aqui testemunhamos a diligência e admiramos a eloquência com que o nosso Embaixador Simões, nas frequentes visitas com que nos tem brindado, brandiu estatísticas e realçou dados para comprovar a tese de que tal adesão corresponde ao mais alto interesse nacional.

Sr. Presidente, como me referi no início de minha fala, alguns industriais da Zona Franca de Manaus compartilham entusiasticamente esse ponto de vista. Numa avaliação preliminar, eles parecem estar com a razão.

Afinal, em 2008, as exportações do polo industrial de Manaus à Venezuela alcançaram a marca dos US$181,475,483.00.

Entre os meses de janeiro e abril do corrente ano, as vendas de Manaus ao país governado pelo Presidente Hugo Chávez já chegaram a US$35,457,059.00.

Nesses dois períodos, somente a participação dos insumos para o preparo de bebidas da pauta de exportações manauaras à Venezuela foi de US$53,118,947.00 e de US$18,720, 287.00, respectivamente.

É claro que nem só de comércio vivem as relações internacionais, mas estou certo de que muitos entre nós, cientes da tradição diplomática brasileira de escrupulosa não intervenção nos assuntos domésticos de outros países, nos abstivemos de questionar mais profundamente o nosso Ministério das Relações Exteriores acerca de determinados aspectos jurídicos, políticos e até mesmo econômicos que poderiam inspirar cuidados e preocupações.

Peço vênia para comentar rapidamente alguns desses pontos, senão de interrogação, ao menos de incerteza.

Assim, por exemplo, a meu ver, pouco se debateu o ritmo dessa decisão. O Protocolo determina que o Brasil e a Argentina liberalizem todo o seu comércio com a Venezuela até junho de 2010, com exceção de produtos considerados “sensíveis”, cujo prazo de desgravação total é fixado para janeiro de 2014.

Em contrapartida, a Venezuela se obriga a liberalizar seu comércio para produtos brasileiros e argentinos apenas em janeiro de 2012 (ou 2014, no caso de produtos sensíveis).

O Protocolo prevê também que, desde a data da sua assinatura, a Venezuela já passa a integrar a delegação mercosulina nas negociações com terceiros países.

É óbvio que não se questiona a importância de fortalecer e ampliar o Mercosul e de se estreitar relações com a Venezuela (assim como com os demais países andinos), principalmente quando se considera o interesse estratégico de garantir a integração regional no arco norte da América do Sul, em benefício evidente dos Estados que compõem a Amazônia brasileira.

No entanto, Sr. Presidente, confesso aos nobres colegas que me preocupam as circunstâncias com que está se dando a entrada da Venezuela no Mercosul e a forma como esse processo vem sendo conduzido.

Apesar disso, repito, pouco se debateu acerca dos potenciais problemas decorrentes de certas posições assumidas pela Administração atual daquele país, em razão do seu forte antagonismo ante alguns parceiros comerciais importantes para o Bloco.

Será que a postura antagônica de enfrentamento assumida frequentemente pelo Governo Chávez (e de imediato me vem à lembrança o rompimento de contratos internacionais entre a estatal petrolífera PDVSA e a Exxon Mobil, a francesa Total e a italiana Eni), será que essa postura, repito, não poderia atrapalhar a implementação de uma política comercial realmente pragmática por parte do Mercosul? É preciso, nesse ponto, lembrar que as decisões do Bloco devem ser adotadas por consenso.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, confesso que eu preferiria nem pensar nas consequências funestas do uso do Mercosul como palanque político-ideológico para a pregação da revolução socialista bolivariana.

Se, antes mesmo de ingressar no Mercosul, Hugo Chávez chegou a fazer ameaças ao Congresso brasileiro, que, em sua opinião, atende aos interesses imperialistas dos Estados Unidos, não precisamos de muita imaginação para antever as possíveis dificuldades adicionais que ele poderá criar para a construção de consensos a partir da entrada da Venezuela no bloco. Mas não podemos ser tão preconceituosos, não é verdade?

         E notem as Srªs e os Srs. Senadores que me abstenho rigorosamente de colocar em dúvida as credenciais democráticas do regime bolivariano. Mesmo assim, não podemos olvidar que o Protocolo de Ushuaia, texto fundacional do Mercosul, em seu art. 1º determina: “A plena vigência das instituições democráticas é condição essencial para desenvolvimento dos processos de integração entre os Estados partes do presente protocolo”. Os arts. 2º e 3º também enfatizam a importância da manutenção da democracia entre os países membros, prevendo que a ruptura da ordem democrática é fundamental para sanções por parte do bloco.

         Ora, a experiência sangrenta do século passado ensina que um regime não pode ser plenamente classificado como democrático tão somente por adotar, com regularidade, os rituais das eleições e das consultas populares.

É igualmente indispensável que a regra da maioria se abstenha de destruir direitos das minorias. Sabemos que alguns dos maiores tiranos da História, como Hitler e Mussolini, chegaram ao poder por via eleitoral, apenas para golpear mortalmente a democracia no momento seguinte.

Que bom, Sr. Presidente, que a nossa já referida tradição de não- ingerência e respeito à soberania dos outros países nos exime de preocupações angustiantes com a evidente fragilidade da política interna venezuelana! Uma fragilidade que se torna tanto mais óbvia à medida que se revela que os caprichos da vontade do seu dirigente máximo são a pedra de toque das mudanças políticas e constitucionais por que tem passado a Venezuela.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, é melhor também não pensar muito nos riscos que o aventureirismo do regime de Chávez traz para a segurança continental, mas o fato é que seu governo desencadeou uma corrida armamentista regional, aumentando em 55% o orçamento militar - US$3,4 bilhões em 2007, Senador Fernando Collor. Como se isso fora pouco, Chávez ofereceu o território venezuelano para a instalação de bases russas!

Ora, os Estados Unidos não poderiam esperar pretexto mais cômodo para ressuscitar o projeto da quarta frota de sua Marinha, destinada a intensificar o patrulhamento de nossos mares, arrastando, assim, a América do Sul para conflitos militares com que nunca tivemos nada a ver.

Mas por que deveríamos esquentar a cabeça com esses pequenos detalhes, não é mesmo?

Ainda que, em nome do não-intervencionismo, da solidariedade sul-americana e de outros valores extremamente importantes, façamos vista grossa a diversas inconveniências e incertezas que cercam a entrada da Venezuela no Mercosul, ainda assim - repito -, a própria lógica mercantil, que tem sido o fundamento maior para as exortações do Governo a que votemos pela aprovação do protocolo, até mesmo essa lógica - repito, mais uma vez - começa a trincar ao choque com a realidade.

Sim, minhas caras e meus caros colegas Senadores!

Um número crescente de empresas brasileiras, dentro e fora do Distrito Industrial de Manaus...

(Interrupção do som.)

O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Sr. Presidente, obrigado pelo tempo para concluir.

Um número crescente de empresas brasileiras, dentro e fora do Distrito Industrial de Manaus, reclama do bloqueio imposto pelo Governo Chávez aos pagamentos pelos bens e serviços exportados à Venezuela.

A motivação para tais arbitrariedades é cristalina: a economia venezuelana sofre o efeito da queda livre dos preços internacionais do petróleo, que em pouco tempo caíram do opulento patamar dos US$150.00 o barril para menos de US$40.00.

A grande imprensa econômica e financeira internacional aponta que, por trás das recentes ocupações pela guarda nacional da Venezuela de dezenas de poços de petróleo, instalações portuárias e navios operados por empresas petrolíferas privadas (estrangeiras e nacionais), está a dificílima situação do erário daquele país.

Já no final do ano passado, a PDVSA devia o equivalente a US$14 bilhões aos seus fornecedores.

A estatal petroleira, que o regime chavista instrumentaliza para implementar o seu socialismo no século XXI, hoje é obrigada a administrar fazendas desapropriadas, construir conjuntos habitacionais e financiar programas de alfabetização. Seu quadro de pessoal mais que dobrou nos últimos cinco anos. A companhia é credora de US$24 bilhões, em grande medida por causa da insistência do Presidente da República em fornecer petróleo a custo quase zero a parceiros ideológicos como Cuba e Nicarágua. Ao mesmo tempo, conforme dados de setembro do ano passado, a PDVSA ostenta uma dívida total de US$70 bilhões. Detalhe: em 2006, essa dívida era de apenas US$30 bilhões!

Trocando em miúdos: a bonança dos primeiros anos da revolução transformou-se em estrangulamento da capacidade de o país honrar seus compromissos.

Por isso, os exportadores brasileiros vendem, os importadores venezuelanos pagam, recolhem o valor desse pagamento ao Banco Central, mas o Governo não autoriza a remessa de dólares ao Brasil.

Assim, o que, até pouco tempo atrás, era considerado pelo Governo brasileiro um horizonte praticamente infinito de grandes oportunidades comerciais agora é motivo de justas angústias e preocupações por parte dos empresários que acreditaram nessa perspectiva e agora colhem amargos prejuízos.

Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, concluo. Nosso compromisso com o verdadeiro interesse nacional nos obriga a levar em conta essa realidade no momento de decidir sobre o protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul.

Eram essas, Sr. Presidente, as preocupações...

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - V. Exª me permite um aparte?

O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - É com muito prazer que o ouço, Senador Eduardo Suplicy.

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezado Senador Jefferson Praia, V. Exª aqui tece diversas considerações sobre os cuidados que nós Senadores devemos ter neste momento importante de decisão sobre o ingresso da Venezuela no Mercosul. Por sugestão do Senador Fernando Collor, vamos realizar mais um debate na próxima semana. Acredito que está marcado para o dia 10, de manhã, na terça-feira, ou melhor, terça-feira, dia 9, acho que de manhã, às 10 horas, a que virão o Ministro Celso Lafer, o Dr. Ives Gandra da Silva Martins - não sei se ele pôde confirmar -, mas também - os dois confirmaram - o Embaixador do Brasil na Venezuela, que está muito a par dos fatos, e acho que a Srª Professora de uma das instituições de ensino superior do Rio de Janeiro que tem estudado em profundidade o assunto. Eu quero lhe informar que, diante de diversas dúvidas que os Senadores têm, eu conversei com o Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, Secretário Executivo, que testemunhou o diálogo entre os Presidentes do Brasil e da Venezuela, Luiz Inácio Lula da Silva e Hugo Chávez, em recente encontro de Salvador, na Bahia. Pois bem. Nesse encontro...

(Interrupção do som.)

O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Nesse encontro, segundo o Secretário Executivo, Samuel Pinheiro Guimarães, foram tomadas as providências por parte da Venezuela para responder os diversos passos que os inúmeros Senadores estavam demandando a respeito de atender a certas solicitações importantes. Isso, obviamente, será objeto do esclarecimento por parte, sobretudo, do Embaixador do Brasil na Venezuela, e acredito que isso será muito significativo. Ressalto que a Constituição da Venezuela e a brasileira colocam como objetivo fundamental de seus respectivos países e povos a integração com a América Latina, e isso deve ser considerado. Meus cumprimentos.

O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Muito obrigado, Senador...

(Interrupção do som.)

            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM) - Encerro, portanto, dizendo que eram essas as preocupações que eu, neste momento, gostaria de compartilhar com todos, até porque estou analisando como votarei nessa questão relacionada à Venezuela. Por mais que eu perceba importância como parceiro comercial, tenho muitas dúvidas ainda quanto à decisão que teremos de tomar com relação à entrada da Venezuela ou não no Mercosul.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2009 - Página 22099