Discurso durante a 89ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Críticas ao texto da medida provisória que trata da regularização fundiária de terras na Amazônia, aprovado, ontem, no Senado Federal.

Autor
João Pedro (PT - Partido dos Trabalhadores/AM)
Nome completo: João Pedro Gonçalves da Costa
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA FUNDIARIA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. ESPORTE. POLITICA DE TRANSPORTES.:
  • Críticas ao texto da medida provisória que trata da regularização fundiária de terras na Amazônia, aprovado, ontem, no Senado Federal.
Publicação
Publicação no DSF de 05/06/2009 - Página 22201
Assunto
Outros > POLITICA FUNDIARIA. POLITICA DO MEIO AMBIENTE. ESPORTE. POLITICA DE TRANSPORTES.
Indexação
  • COMENTARIO, APROVAÇÃO, SENADO, MEDIDA PROVISORIA (MPV), REGULARIZAÇÃO, ORGANIZAÇÃO FUNDIARIA, REGIÃO AMAZONICA, DEFESA, VETO PARCIAL, CLAUSULA, REDUÇÃO, CONTROLE, TERRA PUBLICA, AMPLIAÇÃO, GRILAGEM, POSSIBILIDADE, AQUISIÇÃO, PROPRIEDADE RURAL, PRODUTOR RURAL, AUSENCIA, RESIDENCIA, LOCAL, IMPORTANCIA, GARANTIA, POSSE, PEQUENO PRODUTOR RURAL, GRATUIDADE, RECEBIMENTO, DOCUMENTO.
  • SOLICITAÇÃO, CONGRATULAÇÕES, FEDERAÇÃO INTERNACIONAL DE FUTEBOL ASSOCIATION (FIFA), DECISÃO, INCLUSÃO, MUNICIPIO, MANAUS (AM), ESTADO DO AMAZONAS (AM), SEDE, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL.
  • DEFESA, RECUPERAÇÃO, RODOVIA, VIABILIDADE, ACESSO, MUNICIPIOS, CAPITAL DE ESTADO, ESTADO DO AMAZONAS (AM), PORTO VELHO (RO), ESTADO DE RONDONIA (RO), ESCLARECIMENTOS, AUSENCIA, IMPACTO AMBIENTAL, CUMPRIMENTO, EXIGENCIA, MINISTERIO DO MEIO AMBIENTE (MMA).

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


O SR. JOÃO PEDRO (Bloco/PT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, apresento um requerimento, na forma do art. 222 do Regimento Interno do Senado, solicitando voto de aplauso à Federação Internacional de Futebol, a Fifa, por ter escolhido a nossa querida cidade, a capital do meu Estado, o Amazonas, com uma das doze capitais para a Copa do Mundo de 2014.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - A Executiva aqui informa que já foi encaminhado o requerimento a que V. Exª deu entrada ontem, o que traduz a eficiência do Secretário...

O SR. JOÃO PEDRO (Bloco/PT - AM) - Da nossa Secretaria.

O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - ... Executivo João Pedro, que é o nome de V. Exª.

O SR. JOÃO PEDRO (Bloco/PT - AM) - Eu quero dizer que o requerimento foi assinado também pelo Senador Arthur Virgílio, Senador do Estado do Amazonas.

Sr. Presidente, eu gostaria de refletir sobre a decisão tomada ontem pelo Senado, pelo Congresso Nacional, acerca da Medida Provisória nº 458, que regulariza terras públicas na Amazônia.

É bom lembrar que quando estamos falando de Amazônia estamos falando de 5,1 milhões de Km2 de território. Cinco milhões de quilômetros quadrados são mais de 60% do território nacional. São 11 milhões de quilômetros de fronteiras, 23 milhões, 25 milhões de brasileiros.

Foi uma tarde/noite histórica porque envolveu os Senadores. Está aqui a Senadora Lúcia Vânia que fez uma fala ontem - e lembro-me da fala de S. Exª - chamando a atenção para alguns aspectos da medida provisória. A polêmica traduziu, refletiu, esse território especial da nossa Nação, do Estado brasileiro.

Quero dizer que, na tarde de hoje, ainda tratando de Amazônia, estive presente, ao lado do Senador Cristovam Buarque, da Senadora Ideli Salvatti, da atriz Christiane Torloni, do ator Vitor Fasano, do Ministro Carlos Minc, do Meio Ambiente, na tarde de hoje, às 16h, com o Presidente Lula, quando os líderes desse movimento “A Amazônia sempre Viva” entregaram ao Presidente Lula mais de um milhão de assinaturas em defesa da preservação da Amazônia.

A atriz Christiane Torloni, na audiência, fez uma fala muito bonita. Lembrou para o nosso querido Presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, que uma pesquisa da DataFolha revela que 92% de entrevistados querem a preservação da Amazônia e a punição rigorosa de quem agride esta região.

A atriz Christiane Torloni e o autor Victor Fasano reivindicaram aquilo que alguns Senadores externaram no dia de ontem no debate: a necessidade de o Presidente Lula vetar proposituras, artigos, parágrafos, que comprometem um compromisso mais rigoroso com o bem público, com a terra pública, ou com as terras públicas.

O Presidente Lula ouviu esse pleito, Senador Lúcia Vânia - e claro, não tem ainda a medida provisória com as suas modificações, alterações -, mas disse que, nesses quinze dias que tem, vai analisar as preocupações, vai analisar, com certeza, a carta que tenho aqui da minha companheira de Partido, a Senadora Marina Silva, uma militante dos movimentos sociais, uma cidadã da Amazônia, uma brasileira conhecida internacionalmente pela sua luta em defesa da questão ambiental. Após a leitura dessa carta, com certeza, ao lado dos pleitos e da análise que a Presidência da República vai fazer, eu espero que a conclusão seja de que o Presidente possa vetar principalmente dois artigos que foram emblemáticos na noite de ontem. Em uma votação de 23 votos, contra os dois destaques, contra 21, perdi a votação; eu perdi. O Senador Arthur Virgílio perdeu. O Senador Mão Santa perdeu. V. Exª perdeu. Perdemos. E, se eu entendi, o Senador Marconi Perillo chegou aqui já no final e declarou o seu voto referentes aos dois destaques.

Dois destaques que me fazem refletir mais uma vez aqui - fiz esse debate ontem. Mas o destaque, a forma como veio da Câmara, reduziu a cláusula resolutiva que está em vigor hoje, de dez anos para três anos, para se repassar o lote de terras, o título definitivo e para quem tem até 1.500 hectares de terra regularizados. Essa é uma mudança que facilita, que diminui o rigor do zelo de uma política pública de Estado para com as terras públicas da Amazônia. Abre, sim, precedente para a negociação das terras, do lote titulado. Por que é que são dez anos? A gente acabou não discutindo. Por que são dez anos? Porque, em dez anos, tem-se a obrigação, a contrapartida para desenvolver o compromisso social, econômico e ambiental. E como é que se pode negociar, passar em frente a terra, sem esperar, por exemplo, o resultado de culturas perenes? Qualquer cultura perene, dará fruto a partir de três anos e meio, cinco anos. Se não se observar por que são dez anos, faz-se o que foi feito ontem: diminui para três anos. Ou seja, se posso vender o meu imóvel daqui a três anos, regularizado, não vou ter a preocupação de plantar, não vou ter a preocupação de cultivar. Eu vou aguardar sem investir, sem produzir, sem gerar renda e passar à frente a terra pública. Vira negociata.

Temos que ter responsabilidade com a terra pública - nós, homens públicos, mulheres públicas. O Estado tem que ter um padrão de rigor com a terra pública. Perdi, mas espero que esse item, esse capítulo, o Presidente Lula possa vetar.

Srªs e Srs. Senadores, nós aprovamos ontem, contra os nossos votos, que o preposto pode ficar ali na terra. Exemplificando, posso estar em Brasília, ter uma atividade em Brasília, e pagar o salário para o Sr. Raimundo, para a D. Antônia - estou idealizando uma figura -, dar um salário-mínimo para um cidadão ou uma cidadã, e o Incra ou o Ministério do Desenvolvimento Agrário regularizarem a terra. Este é o preposto: alguém que está ali, que não é dono e fica ali por conta de um salário, por conta de um almoço; enquanto eu, que estou aqui em Brasília, vou ter o título definitivo daquela gleba, daquele lote, daquela terra. Nós não podemos concordar com isso. Essa é a lógica de dividir a terra sem olhar outros componentes que fazem parte desse território, que é a Amazônia, como a sua água doce, como a sua biomassa, como os seus minerais e o seu povo.

Por que a terra tem que estar em nome de alguém? Porque a regularização fundiária cumpre dois princípios: o econômico e o social. Então, por que vou regularizar terras para uma pessoa jurídica? Para uma empresa? Que empresa?

Srªs e Srs. Senadores, a medida provisória tem aspectos positivos. Primeiro, o Estado garante a regularização fundiária para a pequena propriedade. Está ali. Esse é o lado bom. E a Ministra Marina Silva foi muito feliz quando disse que não seria contra isso, mas contra as brechas que estão na medida provisória, e as brechas darão fôlego àquele setor da sociedade que trabalha ainda, em pleno século XXI, com a concepção, com o procedimento, com o comportamento da terra arrasada, sem respeitar as culturas, as diversas culturas na Amazônia. É contra isso, por conta da decisão que tomamos, que aqui faço mais essa reflexão. A questão fundiária tem história na nossa Amazônia. Os limites, a linha invisível, mas que impõe a posição de Estado ou da sociedade. Lembrei-me ontem que, quando os europeus chegaram aqui, os portugueses, já havia uma linha: Tordesilhas. “Vocês podem chegar até aqui. Desta linha, invisível, para lá pertence ao domínio espanhol.”

A história do Estado brasileiro começa com Tordesilhas, com as Capitanias Hereditárias mais à frente um pouco, com a primeira lei de regularização fundiária de Sesmaria, em 1850. O Estatuto da Terra, nos anos 60; o Decreto Lei nº 1.164, do Regime Militar, que puxou para si todas as terras públicas da Amazônia. Esse decreto dizia que a faixa de 100 quilômetros a partir de cada margem da BR pertencia à União. Pertencia à União e acabou. Aquilo foi injusto porque nos 100 quilômetros de cada margem da BR havia amazônidas, ribeirinhos, povos indígenas. Aquele foi um momento muito duro.

E esta agora. Esta regularização tem lados positivos, principalmente pelo fato de o Estado regularizar os pequenos módulos de forma gratuita. Correto, porque isso vai beneficiar as populações amazônidas.

Ouvi atentamente a carta do meu querido companheiro da Amazônia. Ele leu a carta de entidades. E a carta diz, o Senador José Nery diz, que a BR-319 é uma medida eleitoreira do Ministro Alfredo Nascimento, dos Transportes.

Gostaria de fazer um reparo. A BR-319 foi construída, uma BR de quase 800 quilômetros, que liga duas capitais da Amazônia, Manaus/Porto Velho e Porto Velho/Manaus, duas cidades referenciais da nossa Amazônia. Ele diz que recuperar é um projeto eleitoreiro do Ministro. Não é. É simplificar.

Primeiro, é uma proposta do Presidente Lula, do nosso governo, recuperar a BR-319. É um desejo da bancada do Amazonas, sem exceção. Estou falando aqui, neste segundo, como coordenador da bancada, Senador Arthur Virgílio. A BR-319 é um desejo de todos os Deputados Federais e de todos os Senadores, na política, entendendo a importância da BR.

Mas é um desejo maior das populações que vivem na BR-319, ao longo desses anos. Pequenas comunidades, escolas, hospitais, Municípios como o Município de Humaitá, o Município de Beruri, o Município de Canutama, o Município do Careiro Castanho, o Município de Careiro da Várzea. São Municípios que tem uma dinâmica social, econômica e cultural. São essas as populações que precisam da BR-319.

            O Ministro, o Governo tem que recuperar a estrada, sim. Mas quero dizer que não estou aqui defendendo a recuperação da BR-319 para servir à grilagem, ao crime ambiental. E é possível, sim, cumprir todas as exigências do Ministério do Meio Ambiente, das regras vigentes, como, por exemplo, a criação de unidades de conservação no entorno da BR-319. Foram criadas as unidades de conservação. Mas, fundamentalmente, Presidente Mão Santa, esse é o desejo das populações que vivem ali, ao longo de 800 km de BR que liga Municípios, projetos de assentamentos, pequenas comunidades; populações que foram regularizadas no final dos anos 70, nos anos 80, pelo próprio Incra. Então, não podemos atribuir isso ao Ministro. O Ministro tem que cumprir, encaminhar, obedecendo, evidentemente, as exigências de um Estado que tem regras. Mas o desejo da BR-319 é o desejo das populações que vivem ali.

Sr. Presidente, eu quero encerrar, dizendo da minha esperança de o Presidente Lula vetar os excessos, de nós termos uma legislação fundiária que possa levar em consideração a justiça social, o componente ambiental. O Estado brasileiro deve a construção de uma política consistente e séria para a Amazônia. Eu espero que o debate realizado na Câmara, no Senado e mais o poder de veto do Presidente Lula possam levar a uma legislação que garanta, com dignidade, de forma exemplar e com respeito às populações que ali vivem, uma política fundiária que possa orgulhar a todos nós que vivemos na Amazônia, que vivemos no Brasil.

É preciso que tenhamos orgulho de uma legislação que compatibilize a ocupação dos amazônidas com o exemplo que o Brasil pode dar, internacionalmente, sobre o desenvolvimento sustentável.

Muito obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 05/06/2009 - Página 22201