Discurso durante a 116ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem a memória do Maestro Sílvio Barbato, que estava no voo 447 da Air France, no dia 31 de maio de 2009.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL.:
  • Homenagem a memória do Maestro Sílvio Barbato, que estava no voo 447 da Air France, no dia 31 de maio de 2009.
Publicação
Publicação no DSF de 10/07/2009 - Página 31159
Assunto
Outros > HOMENAGEM. POLITICA CULTURAL.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, REGENTE, COMPOSITOR, VITIMA, ACIDENTE AERONAUTICO, ELOGIO, CONTRIBUIÇÃO, MUSICA ERUDITA, BRASIL, ESPECIFICAÇÃO, TRABALHO, EDUCAÇÃO, AUDIENCIA.
  • COBRANÇA, MELHORIA, POLITICA CULTURAL, INCENTIVO, MUSICO, MUSICA ERUDITA, COMBATE, EMIGRAÇÃO, SUGESTÃO, CRIAÇÃO, PROGRAMA, MINISTERIO DA CULTURA (MINC), PROMOÇÃO, SETOR, AMBITO, LEGISLAÇÃO, CULTURA, DENOMINAÇÃO, HOMENAGEM, REGENTE.
  • SUGESTÃO, SERVIÇO SOCIAL DO COMERCIO (SESC), DESTINAÇÃO, RECURSOS, PROMOÇÃO, MUSICA ERUDITA, BRASIL, EXTENSÃO, HOMENAGEM, REGENTE.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Senador Marconi Perillo, Vice-Presidente deste Senado e que preside esta sessão; meu caro Senador Adelmir Santana, a quem cumprimento pela iniciativa desta homenagem; Exmo Sr. Dom Lorenzo Baldisseri, Núncio Apostólico em Brasília; Srª Silviane Barbato; demais familiares; Diretor Regional do Sesc/DF, José Roberto Macedo; Sr. Mathias Barbato Bloch, que é sobrinho do Maestro Silvio Barbato; Bruno Barbato Bloch, também sobrinho do Maestro; Sr. Gerente das Unidades Operacionais; minhas senhoras, meus senhores, meus caros amigos e amigas que aqui estão, a saída do Maestro Barbato da nossa convivência, usando o tratamento dado pelo Senador Geraldo Mesquita, a saída do Silvio Barbato de nossa convivência é uma metáfora. Ele morreu, saiu de nossa convivência, como centenas de outros músicos regentes fazem, indo para o exterior, pela impossibilidade de sobreviverem aqui.

            O Silvio ia e voltava. O destino fez com que ele não voltasse. Centenas de outros vão. O destino permite que voltem, mas eles têm que ficar lá por falta de apoio do Brasil à música erudita. O Silvio, pelo talento, pela persistência, pelo patriotismo e por outras circunstâncias, conseguiu ter um pé lá e um pé cá. O destino não deixou que ele voltasse, não deixou que a sua convivência continuasse. Ele foi tragado pelas águas frias do Atlântico, enquanto os outros são enviados, expulsos até e tragados pelas ofertas que recebem no exterior.

            Por isso, Presidente, Senador Adelmir, eu acho que a homenagem a um regente, sobretudo na qualidade do Silvio Barbato, não devia ter fala, devia ter apenas música. Para que falar, quando a gente pode ouvir os anjos, que falam através dos instrumentos, graças à tradução simultânea que faz o maestro, o regente? Mesmo assim, Senador Adelmir, mesmo achando que a homenagem devia ser melhor com música do que com falas de políticos, eu me sinto bem estando aqui para usar esta metáfora da falta de convivência que nós temos com o Silvio, a partir de agora, na posição de um político, para cobrar de todos nós que dirigimos este País uma política para incentivar a promoção e a manutenção no Brasil de todos aqueles que praticam a música erudita. Tenho conversado com músicos jovens que me dizem da dificuldade de continuarem aqui, diante da falta de apoio e dos atrativos, Srª Embaixadora - que eu não falei antes - que recebem do exterior. Não faz sentido isso.

            Por isso, a homenagem que eu gostaria de prestar aqui não pode ser feita através da voz dos anjos, mas através da fala da política. E quero propor, Senador Adelmir Santana, duas coisas: uma de médio prazo e outra imediata.

            De médio prazo: tentar fazer com que, neste País, a gente tenha um programa específico, Senador Adelmir, no Ministério da Cultura de apoio à música erudita no Brasil, uma espécie de Lei Rouanet da música erudita especificamente; uma espécie de programa dentro da Lei Rouanet para cuidar especificamente da promoção e manutenção aqui daqueles que se dedicam a nos ligarem com os anjos, que nos permitem ouvirmos os anjos. Esse programa ou essa lei não devia ter nome de nenhum político e sim de Silvio Barbato. A lei ou o programa Silvio Barbato seria dirigido especificamente para que não aconteça com os outros o que aconteceu com ele. De uma maneira metafórica: deixar o Brasil para sempre, pela morte, simbolizando o que os outros são obrigados a fazer, deixando, pela vida, porque aqui não conseguem sobreviver.

            E, de maneira imediata, Senador Adelmir Santana, porque sei que essas coisas nem sempre se consegue dos governos, eu queria fazer uma proposta: que o Sesc, com a agilidade que tem, que já é um dos maiores patrocinadores do balé e da música no Brasil, reserve uma parte de seus recursos para fazer um programa Silvio Barbato da promoção e manutenção no Brasil dos nossos músicos e maestros da arte erudita. Fica aqui a sugestão para o senhor como um importante líder da categoria empresarial do Brasil e do Sesc. E fica aqui o convite para que juntos, nós dois, aqui de Brasília, conversemos com o Ministério da Cultura, elaboremos um projeto de lei, nós dois juntos, em homenagem a Silvio Barbato, para servir ao Brasil inteiro.

            Isso não poderia ser dito com música. Se pudesse, acho que hoje não deveria ter falas aqui. Isso teve que ser dito com palavras. Mas já que estamos falando com palavras, queria dizer um pouco mais. Quero dizer que ouvir falar do Silvio Barbato, pela primeira vez, por meio do meu amigo Claudio Santoro. E, por coincidência, na hora em que falo, vemos entrar aqui a Gisele. Foi o Santoro, uma vez, conversando sobre o futuro da música erudita no Brasil e perguntando a ele em que a gente podia se apegar para encontrar talentos, que disse: “Aqui mesmo temos um”. E citou o Silvio.

            Depois, eu tive a oportunidade de ouvi-lo, de vê-lo. E ele trazia algo que não são todos que trazem, porque, além de um regente, ele era um educador. A relação dele com o público não era a relação de um simples regente distante, ligado e comandando os músicos; ele era um regente que falava com o público, não apenas pela música, que dizia o que era aquela música, que dizia quem foi o compositor. Ele era o maestro que eu vi fazer algo que talvez outros façam - eu nunca vi -: chamar crianças para o palco, junto da orquestra. Ele era um maestro e um compositor que conseguiu fazer com que sua música fosse local e fosse de toda a humanidade.

            O Silvio nasceu no Rio, mas era brasiliense. Ele nasceu no Brasil, mas ele era um compositor, um regente da humanidade inteira. Ele estava lá e estava cá. Ele conseguiu isso que Villa-Lobos conseguiu, que Santoro conseguiu, que Carlos Gomes conseguiu, mas que nem todos conseguem, porque ou ficam brasileiros demais e se distanciam dessa maravilha que é a humanidade inteira ou se envolvem com a humanidade inteira por irem para outros países dos quais também não conseguem ser nacionais e se distanciam do local, do específico.

            Ele foi uma pessoa que fez tanto, que esteve em tantas partes e de maneiras tão diferentes, como poucos fizeram no mundo inteiro. Ele esteve em tantas partes, ele fez tantas coisas e de maneiras tão especiais, que é por isso que merece a nossa homenagem. Mas não uma homenagem apenas simbólica de uma manhã, mas, sim, a homenagem que eu gostaria que prestássemos como políticos, como líderes, dirigentes, para ele permanente: a criação um programa específico para promover a música erudita no Brasil e segurar aqui - e segurar aqui - esses heróis, que não conseguem sobreviver aqui e, para sobreviver, vão embora. Ele, que conseguiu viver aqui, terminou, metaforicamente, por sair da nossa convivência no momento em que ia embora por alguns dias e o destino colocou-o tragado nas águas do Atlântico.

            Não deixemos que os nossos outros jovens músicos deste País sejam tragados pelos apoios, incentivos e atrações que existem lá fora, expulsos do Brasil por aquilo que a gente não lhes dê.

            Essa é a homenagem que eu gostaria que iniciássemos aqui nesta manhã, meu caro Adelmir, graças a sua iniciativa, de fazermos uma Lei Silvio Barbato, de apoio à música, aos músicos, aos regentes e aos dançarinos, Gisele, eruditos no Brasil.

            Alguns podem dizer que seja um preconceito contra as outras músicas. Absolutamente, e seria impossível ser uma homenagem a Barbato se houvesse qualquer preconceito por qualquer tipo de música, porque a última vez que o ouvi tocando num evento - creio que do Sesc também - lá na Torre de Televisão, ele trouxe instrumentos absolutamente populares para dentro do palco. Ele falava todos os idiomas musicais. Então, sem nenhum preconceito com os outros, mas, falemos com franqueza, os outros não precisam de tanto apoio quanto aqueles que, como Silvio Barbato, como Cláudio Santoro, insistem, persistem em criar aqui, no Brasil, o que é do mundo inteiro.

            Silvio foi um homem do mundo inteiro, por isso ele terminou deixando a convivência conosco longe do Brasil, mas, diferentemente de muitos outros, não por estar indo embora do Brasil, mas por estar indo levar o Brasil lá fora. O destino não o deixou voltar, mas cabe a nós não deixar que outros saiam.

            Isso, Sr. Presidente, é o que tenho a dizer, parabenizando e dizendo do meu sentimento para todos os familiares e amigos que vão sentir não apenas saudades, vão sentir um grande vazio. Muitas pessoas vão e deixam saudades, outras deixam um vazio ao redor, aos seus amigos e familiares; mas poucos deixam um vazio tão grande para tanta gente como o maestro da qualidade de Silvio Barbato. Até porque o vazio que fica não é só o vazio de a gente não poder ir amanhã assistir a um espetáculo comandado por ele. O vazio que fica é pensar o que ele não teria feito se vivesse mais trinta anos, em plena atividade, como seria possível. Se ele não pôde ficar mais trinta anos conosco, não deixemos que os outros sejam obrigados a ir embora. Vamos apoiar a música erudita como uma homenagem a Silvio Barbato. (Palmas.)


Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/07/2009 - Página 31159