Discurso durante a 119ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Reflexão sobre dados do IBGE, registrando a extrema desigualdade no acesso ao saneamento básico no Brasil.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA SANITARIA.:
  • Reflexão sobre dados do IBGE, registrando a extrema desigualdade no acesso ao saneamento básico no Brasil.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 14/07/2009 - Página 32012
Assunto
Outros > ATUAÇÃO PARLAMENTAR. POLITICA SANITARIA.
Indexação
  • ANALISE, PERDA, QUALIDADE, POLITICA NACIONAL, INFERIORIDADE, REPUTAÇÃO, POLITICO, FALTA, INCENTIVO, ENGAJAMENTO, VIDA PUBLICA, ANUNCIO, TENTATIVA, REELEIÇÃO, SENADO, REITERAÇÃO, ISENÇÃO, ORADOR, MOTIVO, ALTERAÇÃO, EXERCICIO PROFISSIONAL, MEDICINA, COMPROMISSO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL.
  • ANALISE, DADOS, INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATISTICA (IBGE), INSTITUTO DE PESQUISA ECONOMICA APLICADA (IPEA), DESIGUALDADE REGIONAL, SANEAMENTO BASICO, BRASIL, INFERIORIDADE, ACESSO, POPULAÇÃO CARENTE, PREJUIZO, SAUDE PUBLICA, MEIO AMBIENTE, REPUTAÇÃO, PAIS, CRITICA, FALTA, PRIORIDADE, INVESTIMENTO, EXCLUSIVIDADE, VALORIZAÇÃO, LUCRO, MANIPULAÇÃO, CAMPANHA ELEITORAL.
  • ANALISE, POSSIBILIDADE, REVERSÃO, SITUAÇÃO, SANEAMENTO BASICO, NECESSIDADE, COMPROMISSO, CLASSE POLITICA, CONTINUAÇÃO, INVESTIMENTO, REMOÇÃO, OBSTACULO, IMPLEMENTAÇÃO.

            O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Sr. Senador Mozarildo, quero, mais uma vez, dizer que V. Exª fez um pronunciamento que realmente expressa aquilo para o que precisamos estar atentos, sobre essas questões do Executivo, que são muito sérias, questões que vão passando, e para as quais se dá pouca importância, pouco lemos nos jornais, como no caso da matéria que V. Exª viu na revista IstoÉ e em mais um jornal, dando notícia de um termo aditivo em uma obra de R$78 milhões. Para reformar o Palácio do Planalto, pede-se um termo aditivo de ...

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - De R$118 milhões.

            O SR. PAPALÉO PAES (PSDB -AP) - De R$118 milhões. Isso foge a qualquer lei da construção civil no sentido de aditamento de valores. E eu não sei que obra estão fazendo com quase R$200 milhões. Outro dia, queriam construir uma passarela aqui, e foi o maior escândalo nesta Casa, feito por nós mesmos aqui.

            Então, eu não quero nivelar por baixo, absolutamente, mas quero chamar a atenção, visto que a opinião pública fica... Já há essa antipatia pelos políticos. Já existe naturalmente e não é de hoje. Já há uma tentativa de fazer com que as pessoas desacreditem nos políticos mesmo. Por quê? Isso é tudo programado, tudo calculado. Quanto mais se desacredita nos políticos, mais aquelas pessoas do bem, pessoas que poderiam assumir cargos importantes e começar um movimento de reformulação desse espírito do exercício da cidadania, em que o representante do povo é parte importante, mais essas pessoas se afastam da política.

         Então, fica para quem? Para aqueles que precisam do mandato para se proteger, para se escudar, que precisam do mandato para fazer seu pé-de-meia, que precisam do mandato para fazer corrupção, para vender seu voto. Na maioria, vão ficando os maus representantes do povo.

            Senador Mozarildo, estou chamando a atenção porque, quando vamos votar em alguém, ninguém conhece o passado desse alguém. E não se pode dizer que, porque é político, é safado, é sem-vergonha. Absolutamente. Ele não fica safado e sem-vergonha aqui não. Ele já vem safado e sem-vergonha. Porque ele sabe muito bem, em um palanque, enganar o povo, sabe muito bem trapacear, sabe muito bem o objetivo dele. E aqueles que vêm para cá para defender suas idéias, seus ideais, suas teses e que têm bom berço, que tiveram uma família bem estruturada para lhes dar uma boa orientação, que receberam sempre bons exemplos, esses serão bons políticos. Mas, infelizmente, esses aí ficam escondidos. Sempre o fanfarrão aparece muito mais. E, lamentavelmente, a gente vê que, a cada dia, vai se perdendo o estímulo para vir para cá lutar por aqueles que nos elegeram.

E nós, V. Exª, Senador Mozarildo, que não é político profissional, V. Exª, Senador Mão Santa, da mesma forma, que entrou na política por acaso, como eu entrei, não fomos para banco de escola de partido para aprender como é que se deve fazer. Não, nós viemos para cá com aquilo que a medicina nos ensinou, pelo nosso relacionamento médico-paciente.

            Então, há três médicos aqui. Três médicos - porque eu me acho na responsabilidade, como V. Exª, Senador Mão Santa, de, todas as segundas-feiras, estar aqui. Nós nos achamos com a responsabilidade de estar respondendo pelo lado social. Nossa preocupação é muito pelo lado social, e vejo que a nossa doutrinação de médicos nos impõe o respeito ao povo, impõe-nos o respeito aos que são menos favorecido socialmente, impõe-nos o respeito àqueles que nos elegem. Senador Mão Santa, gosto de repetir isto, que as pessoas sempre dizem: quantos milhões se vão gastar numa campanha?

            Outro dia estava aqui o presidente dos mototaxistas do Amapá; estava aqui presente, contando para outros mototaxistas, nos corredores, como era a minha campanha. Havia outro candidato a Deputado Estadual, no outro quarteirão. À porta de casa não ia ninguém, mas, lá na do outro, eram dezenas, centenas de pessoas, que, naturalmente, poderiam estar sendo enganadas. Fui eleito o Senador mais votado do Amapá, com mais votos do que o Governador que tinha acabado de sair do Governo; e eu estava fora da política há seis anos - fui Prefeito e depois resolvi abandonar e ficar só na minha atividade profissional de médico, porque sou médico militante.

            Então, Senador Mozarildo, vejo que o seu discurso foi extremamente importante. Não podemos ficar aqui impossibilitados, por questões partidárias ou por manobras de Governo, de dar a nossa opinião. Não deixo de dar a minha opinião, não. A minha opinião é o que coleto junto aos meus eleitores, com as pessoas com quem convivo lá no meu Estado; trago para cá e dou a minha opinião.

            Para o ano há uma eleição, vou tentar a minha reeleição. Se o povo achou que fui bem aqui, vai me fazer voltar; senão, o que posso fazer?

            Tenho a minha atividade médica, sou funcionário público federal, por isso não me submeto a muitas coisas a que aqueles que fazem da política partidária uma profissão - quer dizer, se não tivessem esse emprego, perderiam o salário - se submetem.

            Então, são essas considerações. Às vezes temos vontade de desabafar, e aproveito esta oportunidade, considerando que estão aqui três médicos. O Senador Geraldo Mesquita também estava presente, já está retornando. Realmente, temos em nossa consciência esse dever.

            Mas, Sr. Presidente, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a repartição da rede nacional de saneamento básico do País é extremamente desigual e coloca em evidência as profundas desigualdades regionais que caracterizam o nosso desenvolvimento.

            Cerca de 64,1% dos domicílios brasileiros possuem o que o IBGE chama de saneamento adequado. Todavia, a má distribuição da água encanada, dos esgotos sanitários, das fossas sépticas, da coleta e do tratamento correto do lixo coloca o Brasil em posição desconfortável nas estatísticas da Organização das Nações Unidas. Por outro lado, elas destacam igualmente as deficiências de nossa política social, que não se mostra capaz de universalizar a oferta desses equipamentos.

            O IBGE assinala que as disparidades regionais do Brasil se acentuam, quando o rendimento per capita do domicílio é relacionado aos serviços de saneamento. Assim, as casas miseráveis de São Paulo, por exemplo, são melhores que as do Norte e Nordeste do País, cujas condições de habitação são extremamente precárias.

            Segundo dados de 2005, divulgados pela Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios apenas 6,7% dos domicílios existentes na Região Norte, Senador Mão Santa, com renda per capita de até meio salário-mínimo, tinham acesso ao saneamento classificado como adequado. Na faixa de renda per capita de mais de cinco salários-mínimos, 28,5% dos domicílios estavam ligados a esse serviço de utilidade pública. De uma maneira geral, no que se refere aos domicílios existentes nos Estados do Amapá e Rondônia, somente 5% e 5,1% deles, respectivamente, estavam ligados à rede de saneamento.

            Em contrapartida, na Região Sudeste, 71,5% dos domicílios situados na faixa de renda per capita de até meio salário-mínimo estavam ligados ao sistema de saneamento, e cerca de 97% dos que se situavam na faixa de mais de cinco salários-mínimos gozavam do mesmo benefício. Aí vemos o tremendo disparate entre o País mais adiantado, mais rico, e o País mais pobre, ou seja, o Sul/Sudeste e o Norte/Nordeste.

            Por outro lado, em 2007, mais de 90% da população urbana do Sudeste tinha acesso ao saneamento básico. No entanto, a Região Norte apareceu com os piores índices do País. Como podemos verificar, as disparidades são grandes no interior de cada região e maiores ainda entre as duas regiões citadas, que apresentam níveis de desenvolvimento econômico e social muito desproporcionais.

            Convém acrescentar que a mesma realidade caracteriza o conjunto do País. A título de exemplo, em toda Região Norte, apenas 11,5% dos domicílios estão ligados à rede de saneamento básico - 11,5% no Norte! -, contra 90% só em São Paulo. Segundo a PNAD, o acesso ao saneamento na Região Norte do Brasil é inferior ao de Burkina Faso, com 12%, ao de Níger, com 12%, e ao de Guiné, com 13%, países africanos que se enquadram entre os mais pobres do mundo.

            No final de 2008, o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) divulgou números mais atualizados da Pnad, colhidos em 2007. Em relação à Região Norte, os indicadores mostraram que, entre 1992 e 2007, a melhoria na distribuição do saneamento básico, dos serviços de água e de coleta de lixo foi tímida. Apenas 63,2% da população urbana colhiam os benefícios desses serviços naquele período. Segundo esse levantamento, mais de 54 milhões de brasileiros viviam em residências sem infraestrutura, consideradas pelo Ipea como unidades habitacionais inadequadas. Nas áreas rurais do País, somente 23,7% das pessoas tinham acesso à água canalizada de rede geral.

            Na avaliação do Ipea, moradias inadequadas são basicamente aquelas que não dispõem de rede coletora de esgoto ou fossa séptica, não possuem acesso à água canalizada, são localizadas em áreas de favelas ou em locais de alto risco de acidentes, apresentam irregularidades fundiárias, situam-se em zonas de grande concentração populacional, abrigam mais de três pessoas por dormitório, são construídas com materiais de baixa qualidade, não dispõem de banheiros e de outros equipamentos domésticos elementares como pias e instalações elétricas convenientes.

            De acordo com o Instituto, em 2007, unicamente nas regiões urbanas do País, cerca de 25% dos brasileiros habitavam nessas condições que podem ser consideradas como abaixo do nível da pobreza.

            No quesito “adensamento excessivo por unidade habitacional”, o maior índice foi registrado na Região Norte, com 15,3%, e o menor na Região Sul, com 3,99%,

            Sr. Presidente, os dados que acabei de apresentar mostram que temos um sério déficit de acesso a serviços de saneamento básico. Sem dúvida, tal realidade prejudica enormemente as metas desejadas de desenvolvimento, compromete a imagem do País no exterior e impede que o Brasil assuma um papel de maior importância e seriedade no cenário mundial.

            Além de tudo, as condições inadequadas de saneamento básico são altamente prejudiciais às políticas de saúde pública, oneram os seus custos, degradam o meio ambiente e favorecem a proliferação de doenças que se desenvolvem basicamente em locais onde as condições de higiene e de infraestrutura são deficientes.

            É importante destacar, Sr. Presidente, que cerca de 80% das doenças e 65% das internações hospitalares no País estão correlacionadas com a falta de saneamento básico e com a sua má distribuição.

            Por outro lado, alguns estudos mostram que cada real investido em saneamento básico gera R$2,50 de economia em saúde pública.

            De acordo com diversos especialistas em políticas públicas, as disparidades de acesso e o déficit de serviços de saneamento básico no Brasil estão diretamente relacionados com o perfil de renda dos consumidores, ou seja, com a precária situação econômica em que vive a maioria da população brasileira e com a existência de economias de escala e de densidade do setor. Segundo eles, existe maior interesse em ampliar os serviços em grandes concentrações urbanas, uma vez que, nessas áreas, a expansão e a manutenção dos equipamentos são menos onerosas mesmo levando em conta o aumento da população a ser atingida.

            Em síntese, Sr. Presidente e Senador Mozarildo Cavalcanti, estima-se que os investimentos realizados ao longo das últimas décadas no saneamento brasileiro foram motivados muito mais pela possibilidade de retorno econômico mais imediato do que pela expectativa de retorno social de longo prazo que esses serviços inevitavelmente proporcionam.

            Com a palavra o Senador Mozarildo Cavalcanti.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Papaléo, primeiramente, eu queria comentar a introdução do seu pronunciamento, quando V. Exª. falou da questão do político profissional. Na verdade, há pessoas que fazem da política uma profissão, não no sentido elevado da profissão, como, por exemplo, um apaixonado pela política por entender que a política é a forma de fazer mudanças na sua região. Eu, por exemplo, enveredei pela política para mudar a realidade do meu Estado, que, na época, era um território federal. E consegui, como Constituinte, junto com os Deputados do Amapá e os Deputados de Roraima, que Amapá e Roraima saíssem da condição de território federal - portanto, uma espécie de colônia - para a de Estado-Membro da Federação; assim como, por exemplo, consegui criar uma universidade, uma escola técnica por projeto de minha iniciativa. Então, quando a política é olhada como profissão nesse sentido, é excelente, mas, quando é olhada no sentido de uma profissão em que a pessoa usa para tirar proveitos próprios, aí, viver dela, nesse sentido, é condenável.

            O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Exatamente o que eu quis dizer.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Entendi exatamente isso. Aí que eu quero dizer à população: nós temos, no ano que vem, uma eleição. É muito importante o que V. Exª. colocou aí: alguém não chega aqui e se corrompe, não; já chega corrompido, e utiliza tanto o fato de ser Deputado Federal ou Senador para ampliar seu espaço de corrupção. Então, é uma oportunidade para que os eleitores vejam aqueles que vão disputar a eleição em 2010, procurem fazer um levantamento da sua vida e ver se eles merecem voltar ou não para o Câmara ou para o Senado. Então, o eleitor tem que ver que ninguém, na verdade, vem para cá por decreto de nomeação, vem por eleição. Se é uma eleição, digamos assim, corrompida por processos de muito dinheiro - é o que vemos, e V. Exª. colocou aí -o eleitor tem que estar atento. Quando ele vê que alguém vai gastar, em uma eleição, mais do que vai receber durante todo o período do mandato dele, é aquela história, dá para desconfiar, só dá para desconfiar. Aliás, é preciso ter certeza de que essa pessoa não quer exercer com seriedade o mandato. Um segundo ponto, Senador Papaléo - e V. Exª. mencionou um ponto que é fundamental -, é que, no Brasil, se dá pouca ênfase à saúde preventiva, tanto na questão da vacinação, como principalmente na do saneamento básico, que V. Exª. colocou muito bem. Se realmente houvesse investimento no saneamento básico, milhões de pessoas deixariam de adoecer. Não se investe por quê? Primeiro porque são obras que não aparecem. Costuma-se dizer que obra que é enterrada mau político não gosta. Mas, com certeza, se houvesse uma obrigatoriedade, já no orçamento federal, de aplicação de x por cento em saneamento básico, essa situação se reverteria. Infelizmente a gente vê órgãos como o BNDES, que fica encastelado, não vai atrás. Por exemplo, o BNDES deveria ser um órgão pró-ativo, que fosse atrás das prefeituras. “Ah, mas não tem projeto!” O BNDES deveria fazer projeto para essas prefeituras pequenas, para investir em saneamento básico, para os Estados mais pobres e para os próprios bancos regionais. O Basa, por exemplo, o Banco do Brasil e a Caixa Econômica investem muito pouco nessa questão e, quando investem, o fazem sempre em desfavor do mais pobre. Então, é preciso realmente que haja uma mudança de paradigmas, de parâmetros, no trato da coisa pública no Brasil, principalmente no que tange à saúde. Saúde não é só, portanto, ambulatório e hospital, não; tem que começar na origem, no saneamento básico. V. Exª. faz muito bem em abordar aqui esse tema. 

            O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP) - Muito obrigado, Senador Mozarildo. V. Exª. também fez uma referência a essa questão de obras enterradas. Eu fui Prefeito de Macapá, de 1993 a 1996, e tive a seguinte decisão. Foi muito difícil a administração, porque não havia Lei de Responsabilidade Fiscal. Encontrei uma Prefeitura que, só com despesa de pessoal e repasse para a Câmara, comprometia o orçamento financeiro em 76%. Restavam 24% para fazer a manutenção de toda a cidade de Macapá, que concentra 60% da população. Mas tomamos uma decisão. Eu sou médico, mas gosto muito dessa parte que envolve construção, engenharia. Tomamos uma decisão. Quando digo “tomamos” é porque havia um corpo técnico muito competente. Mas o que eu desejava sempre perguntava se tecnicamente era possível. Nós fabricávamos na própria prefeitura a manilha, porque não tínhamos dinheiro para comprá-la. Passei por dois governadores e nenhum deles deu uma gota de água para o Prefeito, o primeiro porque nós derrotamos o candidato dele que concorria comigo; o segundo não sei por que, já que eu tinha subido no palanque dele. Mas isso é passado e acabou fazendo até bem para nós, que passamos a fazer um trabalho muito na garra, mostrando que os servidores da Prefeitura de Macapá tinham capacidade de trabalho. E não tínhamos terceirização de obra nenhuma, era administração direta.

            Então, o projeto foi o seguinte: todas as ruas - principalmente as grandes vias - que fôssemos asfaltar ou trocar o asfalto, iríamos fazer drenagem profunda de água pluvial, água de chuva - não de esgoto sanitário, porque nós não tínhamos condições de fazer.

            E passamos a fazer isso. Mas o que eu fui criticado - não abertamente - por alguns políticos não foi brincadeira: “Papaléo, rapaz, vai acabar a tua administração e vão ver pouca coisa. Estás enterrando tubo, e tubo ninguém enxerga!”.

            Então é exatamente isso de que V. Exª fala, é uma obra que não se enxerga, que não dá visibilidade, o povo não vai ver. “Olha, enterrei tubo aqui”. “Onde?”.

            A outra foi logo quando foi aberto, já era habitado inclusive, um bairro loteado, um bairro novo, o bairro do Zerão. Uma das primeiras vistas que eu fiz como prefeito foi lá. Era um bairro que já estava grande, já tinha muitos moradores, mas era o maior sofrimento, Senador Mão Santa: era só poeira, as crianças doentes por causa da poeira; quando chovia, era tanta lama que eles eram impedidos de ir para as escolas, porque eles tinham de caminhar, e ônibus não entrava.

            Então, a primeira coisa que fiz foi asfaltar o Zerão. Fizemos um asfalto no bairro do Zerão que possibilitou destinarmos uma via de ônibus para lá, transporte urbano.

            Um dia fui mostrar a grande obra no bairro escondido, da periferia - bem escondido mesmo, quem quer entrar no bairro vai só em direção a ele mesmo. Alguns políticos estavam comigo, e eu, todo entusiasmado, fui mostrando. Aí, um veio no meu ouvido e disse assim: “Papaléo, tu vieste esconder asfalto aqui, foi? Se tu colocas isso no centro da cidade, todo mundo ia ver, tua popularidade ia aumentar”. Isso é para você ver: esses maus políticos têm essa idéia de que nós temos de fazer o superficial.

            Ouvi também: “E outra coisa, com o dinheiro que tu enterraste esses tubos, tu asfaltavas um monte de ruas, muitas ruas no final do teu governo”. Eu disse: “É, mas em janeiro, quando viesse a água, ia ser uma inundação danada”. Ele disse: “Mas em janeiro já não é mais você. Você já deixa para o outro, o outro é que vai ser dono das enchentes, dos buracos, de tudo mais”.

            Isso choca porque não é essa a nossa intenção. Sempre tivemos prazer em resolver as questões.

            Senador Mão Santa, no município de Macapá, onde fui Secretário de Saúde, fui o primeiro a construir um centro de saúde. Na Prefeitura também foi assim. Nós inauguramos o primeiro centro de saúde da Prefeitura na minha gestão como Prefeito e inauguramos o primeiro centro de saúde de Macapá na minha gestão, em 1984, como Secretário de Saúde do então Território.

            Volto ao meu pronunciamento.

            Como acabei de fazer referência, o maior erro dessa política é que ela agrava as deficiências sociais do País e obriga o Sistema de Saúde a gastar recursos que são escassos com o tratamento de doenças do subdesenvolvimento, como a diarréia, as verminoses, a tuberculose, a hanseníase, a doença de Chagas, a dengue e outras enfermidades que já deveriam estar plenamente controladas.

            Levando em conta as nossas potencialidades, o tamanho de nossas riquezas, a nossa capacidade técnica, a dimensão de nossa economia, o nosso Produto Interno Bruto (PIB) de quase US$1,5 trilhão, alguns analistas afirmam que grande parte das nossas carências sociais poderia ser resolvida em um período de duas décadas.

            Segundo estimativas, em dez anos, mesmo levando em conta a demanda futura, com investimentos globais de cerca de US$200 bilhões a preços de hoje, ou seja, com o empenho de US$15 bilhões a US$20 bilhões anuais, sem interrupção no período, teríamos condições de alcançar os países do chamado Primeiro Mundo em acesso domiciliar aos serviços de saneamento básico. Porém, para que esse projeto seja realizado, os nossos governantes precisariam, em primeiro lugar, assumir o compromisso de levar a sério o esforço político e econômico que precisa ser feito.

            Em seguida, Sr. Presidente, e já concluindo meu pronunciamento, seria necessário remover inúmeras barreiras institucionais e operacionais que sempre impedem o andamento das ações públicas. Entre elas, podemos citar a burocracia, a corrupção, a baixa eficiência operacional e financeira dos prestadores de serviços, as regras fiscais, as metas de superávit, os limites de endividamento, o contingenciamento de crédito ao setor público e a alta tributação. Uma vez afastados esses obstáculos, o Governo teria todas as condições de resolver esse velho problema, melhoraria o atendimento de saúde, diminuiria os seus custos e elevaria significativamente as condições de vida da maioria dos brasileiros.

            Era o que eu tinha a dizer, Sr. Presidente.

            Muito obrigado.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 14/07/2009 - Página 32012