Discurso durante a 125ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a tolerância à corrupção no Brasil. Registro de pesquisa do sociólogo Alberto Almeida, reproduzida no livro "A Cabeça do Brasileiro".

Autor
Jefferson Praia (PDT - Partido Democrático Trabalhista/AM)
Nome completo: Jefferson Praia Bezerra
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SENADO.:
  • Preocupação com a tolerância à corrupção no Brasil. Registro de pesquisa do sociólogo Alberto Almeida, reproduzida no livro "A Cabeça do Brasileiro".
Publicação
Publicação no DSF de 07/08/2009 - Página 34716
Assunto
Outros > SENADO.
Indexação
  • ANALISE, TRABALHO, SOCIOLOGO, REALIZAÇÃO, PESQUISA, OPINIÃO PUBLICA, TOLERANCIA, CORRUPÇÃO, APREENSÃO, ORADOR, RESULTADO, DEFESA, NECESSIDADE, AMPLIAÇÃO, EMPENHO, ATUAÇÃO, FAMILIA, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, COMUNIDADE, FORMAÇÃO, ETICA, MORAL, INFANCIA, JUVENTUDE.
  • EXPECTATIVA, ANALISE, LIVRO, SOCIOLOGO, INCENTIVO, EFICACIA, TRABALHO, INVESTIGAÇÃO, IRREGULARIDADE, ADMINISTRAÇÃO, SENADO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JEFFERSON PRAIA (PDT - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Sr. Presidente.

            Por que será, embora todos concordem em que a corrupção é uma praga a ser urgentemente extirpada da nossa sociedade, da nossa política, por que será, repito, é tão difícil combatê-la e puni-la neste País?

            Finalmente, nós brasileiros temos a oportunidade de enfrentar essa questão com apoio em evidências factuais sistematicamente quantificadas pelo sociólogo Alberto Almeida, autor do livro A Cabeça do Brasileiro, que, como ele próprio faz questão de sublinhar, tem por ponto de partida teórico as visões de notáveis explicadores do Brasil do presente e do passado, a exemplo de Roberto DaMatta, de Carnavais, Malandros e Heróis, Sérgio Buarque de Holanda, de Raízes do Brasil, e Gilberto Freyre, de Casa-Grande & Senzala e Sobrados & Mucambos.

            No questionário idealizado pelo Professor Almeida, os entrevistados foram confrontados com perguntas sobre a diferença entre jeitinho e corrupção.

            Para começo de conversa, ampla maioria já admitiu ter dado algum jeitinho em benefício de si mesmo ou em proveito de algum parente e amigo.

            O que os respondentes classificam, sem sombra de dúvida, como corrupção? São situações como: um político, um juiz ou alto funcionário público usar o cargo para ficar rico; driblar a Receita para pagar menos imposto que o devido; pagar propina ao guarda de trânsito, para não ser multado, por estacionar o carro em local proibido; trabalhar num único lugar, mesmo tendo dois empregos; ganhar bolsa de estudo em tempo integral e, mesmo assim, trabalhar sem o Governo saber.

            E o que foi carimbado como inocente jeitinho inclui comportamentos como: usar da amizade com o gerente do banco ou com a funcionária do posto médico para furar fila; o mesmo para garantir vaga para o filho na escola pública; dar gorjeta ao garçom para passar à frente na fila e conseguir mesa no dia em que o restaurante ou bar está muito cheio; conseguir de amigo ou parente no cartório a liberação rápida de uma certidão que leva dias para sair.

            A conclusão do sociólogo é: quanto mais distante do dia a dia das pessoas comuns, maior a probabilidade de elas tacharem um comportamento como corrupção. Afinal, não é todo mundo que tem chance de fraudar uma licitação, ou tem a oportunidade de possuir dois empregos ou mesmo dirigir carro próprio.

            Ao mesmo tempo, as situações classificadas como jeitinho estão ao alcance de qualquer um.

            Trocando em miúdos, a concepção ética e a conduta moral de muitos de nós estão plantadas na areia movediça do relativismo: uma regra é violada, mas o que é corrupção para um não é considerado assim pelo outro; ou o que está errado numa situação é certo e aceitável em outra.

            Ora, a partir das revoluções burguesas, como a inglesa, no século XVII, a americana e a francesa, no século XVIII, os filósofos apontam que a convivência civilizada em uma sociedade moderna precisa estar alicerçada em uma moral de tipo consensual, onde todos os cidadãos sejam iguais perante a regra universalmente conhecida e aceita.

            Quando isso não ocorre, o que temos é o retorno à lei da selva, à guerra de todos contra todos, em que a preocupação de cada indivíduo exclusivamente em “se dar bem” acaba prejudicando a todos.

            Como sempre fazia questão de lembrar o meu saudoso e estimado antecessor, Senador Jefferson Péres:

“A universalização da cidadania depende de um firme consenso da sociedade acerca das regras que diferenciam o certo do errado”, [pois], “sem leis efetivamente válidas para todos, se o certo e o errado variam de acordo com as circunstâncias de cada um, fica muito difícil reclamar e obter tratamento impessoal e equânime aos cidadãos. As pesquisas já comprovaram que quanto maior é a aceitação do jeitinho, maior, também, é a tolerância à corrupção”. [Afinal, concluía o Senador Jefferson Péres nesta mesma tribuna], “Entre furar uma fila e roubar dinheiro público, a diferença é de gravidade, mas não de natureza das ações, pois em ambos os casos, regras ou leis foram violadas”.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, uma das observações do estudo que mais me angustiam é a seguinte: foi detectado que, entre os jovens, a aceitação de comportamentos corruptos sob o disfarce aceitável do jeitinho é maior do que entre as pessoas mais velhas entrevistadas.

            O que será do Brasil das próximas gerações se essa tendência não for vigorosamente combatida na família e na escola?

            E concluo, Sr. Presidente, com o desafio proposto, antes de mim, pelo referido Senador Jefferson Péres, o meu pranteado amigo que simbolizou brilhantemente as melhores aspirações éticas da nacionalidade. O Senador, que hoje, de onde estiver, tenho certeza, acompanha com atenção o tratamento que dispensamos ao seu nobre legado, assim disse:

“Todos nós, detentores de maior ou menor parcela de responsabilidade no processo de formação da opinião pública, somos agora desafiados a dar exemplo à sociedade brasileira. Chega de autoilusão, pois existe um elo íntimo e fatal entre o jeitinho nosso e a corrupção dos outros. Quem se atreverá a cortar esse nó?”

         Sr. Presidente, eu me atrevo a responder dizendo: a família, na formação do caráter dos filhos; a escola, na transmissão de valores éticos e civis às crianças e aos jovens; a comunidade em que se vive e trabalha, bem como todas as demais instituições.

            Espero que esta reflexão nos inspire a prosseguir nas investigações para o esclarecimento das denúncias e suspeitas de sérias irregularidades em que mergulhou esta Casa, numa das piores crises de credibilidade e legitimidade perante a opinião pública.

            Também não terá sentido, Sr. Presidente, perseverarmos nessas investigações, mas continuarmos insistindo nos mesmos e velhos erros, nas mesmas e velhas práticas. Daqui para frente, o nosso desafio consiste em colocar a Lei sempre acima das conveniências pessoais de quem quer que seja.

            Concluo, Sr. Presidente, com uma sugestão para reflexão. Gostaria, depois, de ouvir os demais Senadores. A sugestão que faço, Senador Heráclito Fortes, V. Exª. que é o 1º Secretário, aproveitando a sua presença, é que tenhamos, pelo menos uma vez por mês, uma reunião neste plenário, para percebermos todas as ações que estão sendo feitas de correções, de erros, de investigações, de exposição, por V. Exª. ou pelo Presidente desta Casa, para que possamos, ao mesmo tempo, acompanhar e dar sugestões.

            A sugestão, então, é essa, como o fez ontem o Presidente com a sua exposição, a sua defesa muito bem estruturada: acredito que poderíamos ter, Senador Tião Viana, aqui, uma vez por mês, para percebermos, repito, as ações que estão sendo feitas em tais e tais situações.

            Dessa forma, Senador Romeu Tuma, nós vamos ter a oportunidade de contribuir, de acompanhar. A imprensa, por sua vez, também terá melhor percepção das ações que estão sendo feitas aqui. Porque uma coisa é certa: não vai dar para caminharmos no sentido de não avançarmos na correção das ações, não avançarmos na correção de erros admitidos no passado.

            Acho que neste ponto, Senador Heráclito Fortes, estamos num divisor de águas, entre o Senado do passado e o Senado do presente e do futuro, que não pode ser jamais o Senado do passado.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


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