Discurso durante a 130ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Discordância dos termos da palestra proferida pelo ex-presidente americano Bill Clinton, em São Paulo, sobre os desafios do etanol brasileiro.

Autor
Gerson Camata (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/ES)
Nome completo: Gerson Camata
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA.:
  • Discordância dos termos da palestra proferida pelo ex-presidente americano Bill Clinton, em São Paulo, sobre os desafios do etanol brasileiro.
Publicação
Publicação no DSF de 13/08/2009 - Página 35745
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA.
Indexação
  • COMENTARIO, CONFERENCIA, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), AUTORIA, EX PRESIDENTE, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), CONTESTAÇÃO, DECLARAÇÃO, NECESSIDADE, BRASIL, COMPROVAÇÃO, AUSENCIA, PREJUIZO, MEIO AMBIENTE, PRODUÇÃO, COMBUSTIVEL ALTERNATIVO, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS CARBONICO.
  • DETALHAMENTO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, BRASIL, PRODUÇÃO, ALCOOL, ORIGEM, CANA DE AÇUCAR, AMPLIAÇÃO, PRODUTIVIDADE, UTILIZAÇÃO, BIOMASSA, ELOGIO, PESQUISADOR, FINANCIAMENTO, MINISTERIO DA CIENCIA E TECNOLOGIA (MCT), REGISTRO, PESQUISA, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA), COMPROVAÇÃO, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS CARBONICO, COMENTARIO, PIONEIRO, PROGRAMA NACIONAL DO ALCOOL (PROALCOOL), BUSCA, FONTE ALTERNATIVA DE ENERGIA, DESENVOLVIMENTO, FLEXIBILIDADE, MOTOR, CRITICA, ORGANISMO INTERNACIONAL, AUTORIDADE, QUESTIONAMENTO, SETOR, DESCONHECIMENTO, SITUAÇÃO, OCULTAÇÃO, PROTECIONISMO, MUNDO, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA).

                          SENADO FEDERAL SF -

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            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GERSON CAMATA (PMDB - ES. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, sou um antigo admirador do ex-presidente americano Bill Clinton, não só por seu carisma e simpatia inegáveis, como também pela competência e talento que demonstrou nos 8 anos de seu governo - não é à toa que foi um dos períodos mais prósperos dos Estados Unidos. Mas não posso deixar de discordar dos termos da palestra que proferiu há uma semana, em São Paulo, sobre os desafios do etanol brasileiro.

            Ao discorrer sobre o futuro do etanol de cana, o ex-presidente afirmou que o Brasil precisa provar para o mundo que pode produzir combustível proveniente de fontes renováveis sem prejudicar o meio ambiente. Ou seja, que conseguirá reduzir as emissões de gás carbônico do mundo sem afetar sua própria sustentabilidade. “O Brasil”, disse ele, “terá de resolver este problema interno, para depois tentar resolver o problema global".

            Ora, a questão da sustentabilidade é justamente uma das razões que levaram nosso País a optar por uma política de estímulo à produção de etanol, e ao desenvolvimento de pesquisas que tornem mais eficiente a obtenção do combustível.

            Para citar apenas um exemplo, está em desenvolvimento uma técnica que permitirá extrair etanol da biomassa da cana-de-açúcar, o bagaço e a palha, permitindo aumentar a produtividade das usinas em cerca de 37 por cento. Apesar de ainda em caráter experimental, ela provavelmente será utilizada em escala industrial num prazo relativamente curto, de 3 anos.

            Com o aproveitamento das sobras, pode-se fazer com que o rendimento por tonelada de cana cresça de 80 litros para 110 litros de etanol. Como não há país algum produzindo etanol extraído de biomassa em escala industrial, o avanço dos estudos realizados no Brasil coloca-nos em posição de vanguarda, já que teremos condições de atingir o objetivo com maior rapidez.

            É uma tecnologia complexa, e devemos o seu desenvolvimento a pesquisadores brasileiros, que trabalham em 15 laboratórios universitários e centros de pesquisa, integrantes da Rede Bioetanol, financiada pelo Ministério da Ciência e Tecnologia.

            A coordenadora científica da Rede Bioetanol, Elba Bon, ressaltou recentemente 2 aspectos importantes da extração do etanol de biomassa. O primeiro é que ele possibilitará a geração de empregos para pessoas melhor qualificadas, e também estimulará a qualificação de técnicos que trabalham atualmente na cadeia do etanol. O segundo é que a capacidade de produção aumentará mais, sem que seja preciso expandir as áreas de cultivo, preservando o ecossistema e os mananciais de água do País.

            Não custa lembrar que, há pouco mais de 2 meses, a Embrapa, Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária, divulgou um estudo comprovando que a produção de etanol pode reduzir de forma expressiva as emissões de gases causadores do efeito estufa.

            O estudo demonstrou que, incluindo todas as etapas do processo de produção, do plantio da cana-de-açúcar à comercialização do combustível, o etanol brasileiro reduz em 73 por cento a emissão total de dióxido de carbono, do óxido nitroso presente no nitrogênio de fertilizantes, e do gás metano liberado pela queima da palha na atmosfera.

            O que nos credencia a dar lições ao mundo a respeito do etanol, além da continuidade das pesquisas destinadas a aprimorar os métodos de produção, é o nosso pioneirismo, já que a tecnologia do etanol começou a ser desenvolvida aqui no início da década de 1970, pouco tempo depois da crise que fez os preços do petróleo subirem à estratosfera.

            Quando, anos depois, ele se tornou novamente um combustível economicamente viável, não só devido à preocupação com a preservação do meio ambiente, mas também diante da perspectiva do esgotamento das fontes tradicionais de energia, já estávamos na dianteira. E continuamos na frente, tanto em volume de produção quanto em tecnologia, como demonstra o surgimento dos carros com motor flex, capazes de funcionar com álcool ou gasolina.

            A primeira das mentiras a ser propagada quando o etanol se tornou alvo das atenções do mundo foi a de que éramos responsáveis, em parte, pela crise mundial de alimentos, já que, ao plantar cana-de-açúcar, estávamos roubando espaço ao cultivo de grãos.

            De pouco adiantou comprovar que a superfície ocupada pelas lavouras de cana corresponde a apenas 2 por cento dos quase 3 milhões de quilômetros usados pela agropecuária, nem argumentar que a expansão da área canavieira acontece normalmente pela conversão de pastagens.

            Não faz muito tempo que assistimos a uma ofensiva de grandes proporções contra o etanol, como se fosse ele, e não a composição da matriz energética mundial, dependente em sua quase totalidade dos combustíveis fósseis, o responsável pelos males do mundo. O então relator especial da ONU para o Direito à Alimentação, o suíço Jean Ziegler, chegou ao cúmulo de classificar a produção de biocombustíveis de “crime contra a humanidade”. Na época, o presidente Lula, com razão, apontou a causa do encarecimento dos alimentos: os subsídios agrícolas de norte-americanos e europeus, "uma droga que entorpece e vicia seus próprios produtores".

            Faltou dizer que a expansão canavieira, ao contrário do que alegou o ex-relator da ONU, não reduz a produção de alimentos, mas até faz com que cresça. Ele com certeza desconhece que, para plantar cana-de-açúcar, é necessária a rotatividade de culturas. Calcula-se que 15 por cento das áreas de canaviais são renovadas com outras lavouras, como a de feijão e a de soja. Ou seja, a tendência é de que a cultura de cana aumente a oferta de alimentos, e não o contrário.

            O físico José Goldemberg, autoridade mundial em fontes alternativas de energia, é um dos especialistas que lutam contra a persistência dos mitos a respeito do etanol de cana-de-açúcar. O ponto nevrálgico da questão, que o ex-presidente Clinton não abordou em sua palestra, é o protecionismo do mercado americano em relação ao nosso etanol.

            Nos Estados Unidos, a fonte do etanol é o milho. Ele produz, de acordo com Goldemberg, apenas uma e meia unidade de energia renovável para cada unidade de energia fóssil. Já o etanol de cana rende 8 unidades. Ou seja, é 5 vezes mais eficiente para substituir os combustíveis que agravam o aquecimento global.

            Americanos e europeus têm visões catastróficas da Floresta Amazônia sendo devastada para dar lugar a imensos canaviais. É esta a visão que parece ter contaminado o ex-presidente Clinton. Ele deveria atentar para o fato de que o cultivo do milho, além de consumir muito mais água que a cana, necessita de grandes quantidades de fertilizante, mais especificamente o nitrogênio, que tem potencial para contaminar fontes de água. Por último, o custo de produção só torna viável a existência dessa indústria de etanol de milho graças a um subsídio do governo que atinge uma quantia astronômica, 4 bilhões e 100 milhões de dólares por ano.

            Não são, portanto, os brasileiros que devem provar a sustentabilidade do etanol de cana. São os europeus, que produzem o combustível principalmente a partir de beterraba e trigo, e os americanos, que optaram pelo milho - é o mundo desenvolvido que precisa provar que, com seus programas de desenvolvimento de etanol, não está tirando alimento da boca de um ser humano. O Brasil optou pelo caminho certo, mas está pagando o preço que pagam todos aqueles que assumem a liderança.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 13/08/2009 - Página 35745