Discurso durante a 132ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Preocupação com matéria publicada na Folha On line de ontem, intitulada "Bolívia expulsará vinte famílias da fronteira". Intenção de convocar o Embaixador da Bolívia para prestar esclarecimentos sobre o tema na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA EXTERNA.:
  • Preocupação com matéria publicada na Folha On line de ontem, intitulada "Bolívia expulsará vinte famílias da fronteira". Intenção de convocar o Embaixador da Bolívia para prestar esclarecimentos sobre o tema na Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 15/08/2009 - Página 36196
Assunto
Outros > POLITICA EXTERNA.
Indexação
  • LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, INTERNET, DECLARAÇÃO, AUTORIDADE, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, ANUNCIO, DESPEJO, FAMILIA, BRASILEIROS, ASSENTAMENTO RURAL, DISTRITO, PROXIMIDADE, FRONTEIRA, QUESTIONAMENTO, ORADOR, VIOLENCIA, DESRESPEITO, RECIPROCIDADE, TRATAMENTO, ESTRANGEIRO, RESIDENCIA, BRASIL, COMENTARIO, CONSTITUIÇÃO ESTRANGEIRA, CRITERIOS, OCUPAÇÃO, FAIXA DE FRONTEIRA.
  • MANIFESTAÇÃO, RESPEITO, SOBERANIA, GOVERNO ESTRANGEIRO, APRESENTAÇÃO, REQUERIMENTO, COMISSÃO DE RELAÇÕES EXTERIORES E DEFESA NACIONAL, CONVOCAÇÃO, EMBAIXADOR, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA, ESCLARECIMENTOS, NOTICIARIO.
  • COMENTARIO, INFORMAÇÃO, ITAMARATI (MRE), DESTINAÇÃO, RECURSOS, REMANEJAMENTO, BRASILEIROS, EXPECTATIVA, ORADOR, AUSENCIA, AGRESSÃO, FAMILIA, RECONHECIMENTO, TRABALHO, TERRAS, PAIS ESTRANGEIRO, BOLIVIA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, digno representante do grande Estado do Piauí; Srs. Senadores presentes, no último dia 6 do corrente mês, eu vim à tribuna, Senador Mozarildo, registrar os 107 anos do início da revolução acreana. Fiz também, com muito prazer, uma saudação especial ao povo boliviano. Esta data, 6 de agosto, é a data nacional da Bolívia.

            Infelizmente, para conquistarmos, para fazermos do Acre um território brasileiro, pegamos em armas contra a Bolívia, contra o povo boliviano - digo infelizmente.

            Fiz questão de fazê-lo em respeito ao povo boliviano, em respeito àquele grande país fronteiriço. Mas há fatos, Senador Mozarildo, que me vêm preocupando. Vou ilustrá-los com matéria produzida pelo jornal Folha de S.Paulo. Uma delas, publicada no Folha Online de ontem: “Bolívia expulsará 20 famílias brasileira da fronteira, diz Vice-Ministro.”

            A matéria é curta:

O Ministério de Terras da Bolívia anunciou nesta quinta-feira que irá despejar 20 famílias de brasileiros que moram no povoado de San Ignacio de Velasco, no departamento (Estado) de Santa Cruz, no leste do país. Conforme o governo boliviano, elas se assentaram ilegalmente em território boliviano [...].

“Os assentamentos de brasileiros em Velasco, Santa Cruz serão despejados muito em breve. Em uma ou duas semanas, será pela força”, declarou o vice-ministro de Terras boliviano, Alejandro Almaraz, em entrevista a rádio boliviana Erbol.

            Não sei se tem procedência essa afirmação da autoridade boliviana, mas, se tiver, pergunto: por que tanta truculência, Senador Mozarildo? Por que essa truculência? Por que essa disposição para a truculência, para a violência?

            No Brasil, abrigamos milhares e milhares de bolivianos; com muito prazer, com muita satisfação. São homens e mulheres, crianças, jovens, velhos, que estão aqui, vivendo, trabalhando e merecendo o respeito do Governo brasileiro e do povo brasileiro. Milhares e milhares.

            Portanto, já começo a me preocupar e ressalto aqui a possibilidade de a autoridade não ter dito isso, não ter se expressado dessa forma, porque, às vezes, a imprensa colhe manifestação e se equivoca na tradução dessa manifestação. Mas, se ela for procedente, pergunto daqui: por que a manifestação de truculência? Vinte famílias serão despejadas, e a autoridade boliviana está dizendo que pela força.

            Senador Mozarildo, quando falamos em brasileiros na Bolívia, alguém pode dizer: “É gente que está lá há um mês, há um ano.” Não! Há brasileiro hoje, Senador Mozarildo, que é mais boliviano do que brasileiro. São milhares de pessoas e de famílias que estão lá há 30, 40, 50 anos. E até mais. Fixaram-se por ali, nas franjas da fronteira. Alguns adentraram mais um pouco e estão vivendo, tentando contribuir, inclusive, com a Bolívia, produzindo alimentos, colhendo seringa, colhendo castanha, enfim, envolvidos em atividades produtivas.

            A notícia da Folha vai mais além, no sentido de esclarecer o que está se passando na Bolívia.

            Diz o Folha Online:

Há uma semana, Brasil e Bolívia coordenam com a Organização Internacional de Migrações (OIM) a mudança de outras cerca de 1.500 famílias brasileiras que vivem perto da fronteira entre ambos os países na região de Pando, na Amazônia boliviana, fronteira com o Brasil. O plano prevê o assentamento destas famílias em terras no interior da Bolívia ou no Brasil e será executado entre outubro e dezembro próximos.

A medida responde ao novo texto constitucional boliviano promulgado em fevereiro passado, segundo o qual nenhum estrangeiro pode adquirir ou ter propriedades em território nacional sob usufruto em uma faixa de 50 km a partir da fronteira.

            Digo logo, aqui, com a maior tranquilidade: é um direito do povo boliviano estabelecer, na sua Constituição, aquilo que acha adequado do ponto de vista da ocupação territorial, inclusive em faixa de fronteira. Agora, que preocupa, preocupa, Senador Mozarildo, a forma como as coisas podem vir a acontecer. Temos notícias preocupantes. Pessoas que ocupam pequenas propriedades na Bolívia têm recorrido a autoridades estaduais em meu Estado e federais também no sentido de buscar amparo, para que isso tudo ocorra sem traumas, sem violência, sem truculência.

            O povo boliviano tem todo o direito de fixar o que entende acerca da ocupação do seu espaço territorial, mas precisamos sempre estar em sintonia com o princípio da reciprocidade, com o princípio da convivência pacífica. Repito aqui, para que as pessoas saibam do que estamos falando: não se trata de 1,5 mil famílias que estão ali há 1 mês, há 6 meses, há 1 ano. São 1,5 mil famílias que estão ali, Senador Mão Santa, há 30, 40, 50 e até mais anos, produzindo inclusive, contribuindo para o progresso e o desenvolvimento da Bolívia. São pessoas que, hoje, são mais bolivianas do que brasileiras. Então, toda a sua vida naquele espaço territorial.

            Senador Mozarildo, concedo a V. Exª um aparte.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Geraldo Mesquita, V. Exª traz aqui uma denúncia, posso chamar assim, porque, embora diga que não acredita na afirmação da autoridade boliviana, é uma coisa gravíssima. Aliás, estamos assistindo, com complacência do nosso Governo, a episódios de xenofobia ao nosso redor que vão se agravando. Eu me lembro, alguns anos atrás, quando era vivo ainda o Governador Ottomar Pinto, que fomos à Venezuela. O Governador levou uma pauta para fazer uma abertura de diálogo com o Presidente Chávez. Ele nos recebeu muito bem, cortês, chamando o Governador de “meu general”, porque nosso Governador era Brigadeiro do Ar, da Aeronáutica; e ele, coronel. Mas foi muito cortês com todo mundo. Fui acompanhando; foram deputados estaduais, e o Governador foi levar essa pauta de reivindicações. E ele fez uma observação, no meio de muitas aulas que ele deu de História e de Geografia, disse para o Governador: “Sei que V. Exª é de um partido contrário ao de Lula, mas fale para Lula se esforçar para mudar a imagem do Brasil junto aos seus vizinhos, que veem o Brasil como um império. Aliás”, disse Chávez, “o Brasil já foi um império mesmo, não é?” Para amenizar e dizer que foi um império no sentido de ter tido um regime imperial, no período de D. Pedro I e de D. Pedro II. Mas esses casos estão, devagarzinho, ao nosso redor, agravando-se. Recentemente, foi com os “brasiguaios”, lá no Paraguai. Com pessoas que estavam lá há várias gerações. Agora, é na Bolívia. Como é que se chamam lá os brasileiros? “Brasilivianos”? É uma mistura de brasileiros e bolivianos. Essas pessoas que foram para lá não foram como bandidos, foram para lá para se instalarem e produzirem. Como vi, no caso do Paraguai - e não sei se é exatamente a mesma coisa lá -, foram primeiramente do Rio Grande do Sul, do Paraná, levaram suas máquinas e começaram a produzir. Como disse V. Exª, de repente, o país pode mudar de idéia, mas uma Constituição, qualquer lei, aliás, não pode retroagir para prejudicar uma situação de fato, de direito, que já existia. Então, tem de haver um tratamento de respeito. Como não tem havido, por parte do Governo brasileiro, que se inspira na cabeça do Sr. Marco Aurélio, que é o assessor e que substitui o Itamaraty, na verdade, para assuntos internacionais, e que nós sabemos, inclusive...

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - É o Itamaraty do b, não é?

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Eu diria que é até o Itamaraty do a, porque fala primeiro do que o Itamaraty. Quando há um problema, o Lula o manda falar sobre os assuntos, depois é que vem o Ministro Celso Amorim. Então, queria sugerir a V. Exª que convidássemos o Embaixador da Bolívia para vir à Comissão de Relações Exteriores, da qual V. Exª é Vice-Presidente e de que tenho a honra de ser membro, para nos explicar uma coisa que diz de perto ao Estado de V. Exª, mas que tem uma importância muito grande para o Brasil. O Governo do Brasil tem sido muito condescendente. Quando a própria Bolívia resolveu invadir... Com a Petrobras, aqui, eles fazem um auê, uma coisa que ninguém pode tocar, ninguém pode investigar. Quando Evo Morales invadiu a base da Petrobras na Bolívia, o Governo brasileiro não fez nada, absolutamente nada. Aumentou o preço do gás, e o Governo brasileiro aceitou. Está importando gás liquefeito para transformar em gás de consumo, para continuar comprando gás caro da Bolívia. Então, acho que temos uma responsabilidade, aqui, como representantes da Federação de fato, de não deixar esses casos passarem em branco. De repente, a atitude de um aqui, de outro acolá: “Ah, é com a Colômbia, não tem nada a ver com a gente”; “Ah, é com a Venezuela, não tem nada a ver com a gente”; “É com Honduras, não tem nada a ver com a gente”. Daqui a pouco, isso causa um efeito dominó. O Governo brasileiro aceitando transgressões quando são de companheiros deles, mas condenando quando não é feita por companheiros deles. Então, quero, como brasileiro, como Senador da República, dizer a V. Exª que gostaria de me colocar à disposição de V. Exª para que convidássemos o Embaixador da Bolívia para vir explicar esse fato. Porque não fizemos isso com o Embaixador do Paraguai. Precisamos ter um diálogo. Espero que o Embaixador não tenha a mesma atitude que teve o Embaixador da Venezuela, que mandou uma carta malcriada para a Comissão de Relações Exteriores, que resultou num protesto nosso de devolver a carta para o Embaixador. Então, espero que o Embaixador da Bolívia seja uma pessoa preparada, educada e venha à Comissão prestar esclarecimentos. Nós não estamos intimando o Embaixador, mas convidando-o para que ele venha prestar esclarecimentos à Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal.

            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC) - Senador Mozarildo, agradeço muito o seu aparte e V. Exª me deixa muito confortável, numa situação muito confortável, porque, ao final da minha fala, eu ia anunciar exatamente o meu propósito de protocolar, na nossa Comissão de Relações Exteriores, um requerimento para que o Embaixador boliviano seja convidado a comparecer à nossa Comissão e prestar esclarecimentos, civilizadamente. E quero aqui dizer, Senador Mozarildo, que a minha fala, a expressão da minha preocupação aqui, de forma alguma, deve significar tentativa de ingerência nos assuntos internos da Bolívia. Não se trata disso. Agora, nós temos o dever de olhar para os nossos concidadãos brasileiros que estão em território brasileiro e fora dele. Nós temos o dever de zelar pela integridade deles em qualquer parte, onde eles estejam. No caso aqui, existem milhares de brasileiros na Bolívia numa situação que começa a preocupar, com ameaças inclusive de uso da força para desalojar pessoas que estão há dezenas de anos produzindo em território boliviano. Essa é a minha preocupação, Senador Mão Santa. De forma alguma, advogo aqui a necessidade de ingerência nos assuntos internos da Bolívia. Pelo contrário, respeito muito o povo boliviano, nosso vizinho na fronteira com o Acre. Institucionalmente, temos também a necessidade de olhar com respeito para o Governo boliviano, que foi eleito pelo povo boliviano.

            Agora, não podemos, de forma nenhuma, admitir que fatos dessa natureza tomem vulto, tomem corpo, sem que haja uma providência de parte do Governo brasileiro, do Poder Público brasileiro, no sentido de resguardar a integridade de cidadãos e cidadãs que estão em território boliviano, como eu disse, não traficando, não exercendo atividade bandida, mas produzindo, Senador Mão Santa. E são pequenos produtores. Aliás, fico de orelha em pé quando se trata de pequenos produtores, seja na Bolívia, seja em nosso País. São pessoas que, ultimamente, são tratadas até com certo preconceito. Até com certo preconceito!

            Portanto, aproveitando a sugestão que deixa aqui o Senador Mozarildo, Senador Mão Santa, eu quero anunciar à Casa que, semana que vem, vou protocolar um requerimento, na Comissão de Relações Exteriores, para que o Embaixador da Bolívia seja convidado a vir a essa Comissão, a esta Casa, prestar esclarecimentos sobre o que está acontecendo. Tenho notícia, de parte do Itamaraty, de que o Governo brasileiro destinou recursos para que a movimentação, o reassentamento de brasileiros, seja na Bolívia, seja no Brasil, seja feito de forma a não traumatizar, de forma a não causar maiores problemas a essas famílias; se for o caso até com indenizações pelos serviços prestados, pelo trabalho já realizado.

            O que não pode é pessoas que trabalham e lutam no dia a dia, brasileiros que estão em território boliviano, serem tratados como se fossem o quê? Ora, não é possível. Temos de ter grandeza, temos de ter consideração com pessoas.

            A Constituição boliviana estabeleceu novos parâmetros, estabeleceu a necessidade de reocupação de forma distinta da sua faixa de fronteira? Que seja. Mas isso não pode resultar em agressão ou em violência contra famílias de brasileiros que estão lá preocupadas com o seu futuro, com a sua sorte. Os Governos do Brasil e da Bolívia precisam se entender no sentido de resguardar, primeiro, a integridade dessas pessoas e, segundo, levar em consideração o que elas fizeram nestas últimas dezenas de anos.

            Não é possível jogar fora, Senador Alvaro Dias, uma vida inteira de trabalho e de labuta ladeira afora. Essas pessoas precisam, no trato dessa questão, levar em consideração isso. Não são pessoas que estão traficando lá na Bolívia. São pessoas que estão trabalhando, dando duro, inclusive contribuindo para o progresso e o desenvolvimento daquele país.

            Portanto, quero anunciar aqui o propósito de, na semana que vem, protocolar um requerimento na Comissão de Relações Exteriores para que o Embaixador da Bolívia seja convidado e, talvez seja o caso também de representantes do Itamaraty, a fim de que possamos, no âmbito da Comissão, esclarecer essa questão e, quem sabe, contribuir para que esse processo seja o mais cristalino, o mais tranquilo possível, sem traumas, sem confusão e sem agressão aos brasileiros e brasileiras que estão em território boliviano.

            Senador Mão Santa, era o que eu tinha a dizer e trazer a esta Casa no dia hoje. Agradeço a consideração de V. Exª.


Modelo1 5/18/242:21



Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/08/2009 - Página 36196