Discurso durante a 145ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro das reservas nos campos de exploração do pré-sal. Reflexão sobre as normas de regulamentação da exploração do pré-sal e o relato sobre os projetos de criação de fundos que tratarão dos recursos do pré-sal.

Autor
Aloizio Mercadante (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Aloizio Mercadante Oliva
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ENERGETICA. POLITICA FISCAL.:
  • Registro das reservas nos campos de exploração do pré-sal. Reflexão sobre as normas de regulamentação da exploração do pré-sal e o relato sobre os projetos de criação de fundos que tratarão dos recursos do pré-sal.
Aparteantes
Eduardo Suplicy, Garibaldi Alves Filho, Renato Casagrande.
Publicação
Publicação no DSF de 01/09/2009 - Página 39907
Assunto
Outros > POLITICA ENERGETICA. POLITICA FISCAL.
Indexação
  • REGISTRO, HISTORIA, BRASIL, DESCOBERTA, PETROLEO, CRIAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), REVOLUÇÃO, TECNOLOGIA, PROSPECÇÃO, MAR.
  • APRESENTAÇÃO, DADOS, JAZIDAS, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL, PREVISÃO, ALTERAÇÃO, POSIÇÃO, BRASIL, ECONOMIA INTERNACIONAL, ANALISE, HISTORIA, PAIS ESTRANGEIRO, EXPORTADOR, AUSENCIA, DIVERSIFICAÇÃO, ATIVIDADE ECONOMICA, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, POSSIBILIDADE, PREVENÇÃO, ERRO, IMPORTANCIA, DEBATE, MODELO, EXPLORAÇÃO.
  • ANALISE, LEGISLAÇÃO, CONCESSÃO, SETOR, PETROLEO, ATRAÇÃO, INVESTIMENTO, AVALIAÇÃO, ATUALIDADE, ALTERAÇÃO, CONJUNTURA ECONOMICA, DEFESA, RENOVAÇÃO, MODELO, REGULAMENTAÇÃO, JUSTIFICAÇÃO, SISTEMA, ALTERNATIVA, PARTILHA, MANUTENÇÃO, RESERVA, PATRIMONIO, POVO, COMENTARIO, EXPERIENCIA, PAIS ESTRANGEIRO, INFERIORIDADE, PRIVATIZAÇÃO, JAZIDAS, ELOGIO, PROPOSTA, GOVERNO, DETALHAMENTO, CRIAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, FISCALIZAÇÃO, OPERAÇÃO, GARANTIA, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, LUCRO, ESTADO, PROJETO, CAPITALIZAÇÃO, PETROLEO BRASILEIRO S/A (PETROBRAS), REFORÇO, CAPACIDADE, RESPONSABILIDADE, PERCENTAGEM, DEFINIÇÃO, FUNDO SOCIAL, APLICAÇÃO DE RECURSOS, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, SOLUÇÃO, NORUEGA.
  • IMPORTANCIA, BRASIL, BENEFICIAMENTO, PETROLEO, OBJETIVO, EXPORTAÇÃO, DERIVADOS DE PETROLEO, PREVISÃO, AUMENTO, REFINARIA, GASODUTO, PAIS.
  • IMPORTANCIA, CONGRESSO NACIONAL, DEBATE, DISTRIBUIÇÃO, ROYALTIES, AMPLIAÇÃO, TRANSPARENCIA ADMINISTRATIVA, CONTROLE, VINCULAÇÃO, APLICAÇÃO DE RECURSOS, ANALISE, DADOS, EXCESSO, CONCENTRAÇÃO, MUNICIPIO, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DEFESA, BUSCA, JUSTIÇA, CRITERIOS, INTERESSE NACIONAL, AUSENCIA, DESEQUILIBRIO, ESTADOS, MUNICIPIOS, ATUALIDADE, RECEBIMENTO, NECESSIDADE, INVESTIMENTO, EDUCAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, PREPARAÇÃO, FUTURO.
  • PREVISÃO, PREJUIZO, BRASIL, MANUTENÇÃO, SISTEMA, CONCESSÃO, MOTIVO, INFERIORIDADE, RISCOS, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL.
  • DEFESA, ALTERAÇÃO, ARRECADAÇÃO, IMPOSTO SOBRE CIRCULAÇÃO DE MERCADORIAS E SERVIÇOS (ICMS), BENEFICIO, MUNICIPIOS, PRODUÇÃO, MATERIA-PRIMA, CONCLAMAÇÃO, DEBATE, SENADO.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, Srªs Senadoras, hoje é um dia muito especial e a história o registrará, do meu ponto de vista, dessa forma. Tão especial quanto foram especiais aqueles que se levantaram um dia, lá nos idos de 1953, para dizer, primeiro, que este País tinha petróleo. Os primeiros indícios de petróleo montam a 1930, em Lobato, na Bahia.

            E desde então nós tínhamos assistido a várias descobertas de reservas em terra de petróleo. Em 1953, um grande movimento popular dizia que o Brasil tinha petróleo. Monteiro Lobato teve um papel destacado entre aqueles que lutaram na gloriosa campanha do Petróleo é Nosso.

            Havia aqueles que diziam mais, que o Brasil não só tinha petróleo como tinha que ter uma empresa de petróleo e que essa empresa mudaria a história econômica do Brasil e foi assim lutando contra tantas adversidades e tantos que não acreditavam nessas duas possibilidades que o Brasil criou a Petrobras. Não só criou a Petrobras como desenvolveu uma tecnologia inovadora, revolucionária, de vanguarda para prospectar o fundo do mar. E foi exatamente nas águas do Oceano Atlântico, na nossa costa litorânea que a Petrobras começou a descobrir as suas principais reservas de petróleo.

            E agora não mais apenas na costa, em água rasa, mas em águas profundas e ultraprofundas como é o caso do pré-sal que são reservas entre cinco e sete mil metros de profundidade e, às vezes, com dois mil metros de camada de sal espesso que a Petrobras desenvolveu a tecnologia.

            Foi a primeira empresa na história a chegar lá e descobriu grandes reservas de petróleo que o Brasil não imaginava que pudesse ter. Só as descobertas nos três poços de Tupi, Iara e o Parque das Baleias estamos falando entre 9,5 a 14 bilhões de barris de petróleo. O que tínhamos de 1930 até 2006 era exatamente 14 bilhões de barris de reservas provadas da Petrobras. Portanto, nós, praticamente, só nesses três postos já identificados e quantificados do pré-sal, nós dobramos as reservas de petróleo no Brasil.

            O Brasil é hoje o 16º principal País produtor de petróleo do mundo. Estamos produzindo mais de 2 milhões de barris/dia, e somos o 16º País exportador de petróleo. Mas, com as reservas do pré-sal, o Brasil poderá estar em décima ou até mesmo em sexta principal economia exportadora de petróleo, o que mudará decididamente a nossa história econômica, o nosso balanço de pagamentos, a nossa economia, as nossas relações econômicas e sociais.

            Nós vivemos num mundo em que a produção mundial é de 86 milhões barris/dia, ano passado. A demanda global para 2030 é de 106 milhões de barris. Portanto, praticamente se estima um déficit potencial na produção de petróleo de 75 milhões de barris, ou seja, com as reservas atuais, se não forem feitas novas e importantes descobertas, faltará petróleo no mundo nos próximos vinte anos, numa estimativa da ordem de 75 milhões de barris por dia.

            Portanto, o preço do petróleo deve subir substancialmente. Fontes alternativas de energia estão surgindo. E é muito importante que elas se desenvolvam. Mas o petróleo continuará sendo fundamental como matriz enérgica da economia mundial, seja na indústria, seja nos automóveis. Não há como substituir, num curto espaço de tempo, o papel do petróleo. E o Brasil, ao se posicionar como um grande produtor exportador de petróleo terá um papel absolutamente decisivo no desenvolvimento de sua economia.

            Quando analisamos os países produtores de petróleo, primeiro Arábia Saudita, Iraque, Emirados Árabes, Irã, Líbia, Rússia, Venezuela, que são os países que estarão na frente do Brasil, todos eles forma marcados, primeiro, pela incapacidade de desenvolver com o petróleo as outras atividades econômicas, a chamada doença holandesa. O petróleo aprecia de tal forma a moeda que cria uma cultura parasitária, que a sociedade vive quase que exclusivamente dessa riqueza natural e as outras áreas da economia não se desenvolvem. São países marcados por instabilidade política, por grandes conflitos da sociedade civil, por guerras. Isso, inclusive, foi denominado na literatura como “a maldição do petróleo”.

            O Brasil não tem por que repetir esses erros. Nós já somos a 10ª economia do mundo, um país com a economia diversificada, com uma base industrial, científica e tecnológica, com uma força muito grande no agronegócio. Portanto, o Brasil tem que saber usar essa riqueza com inteligência, aprender com os erros e com acertos de outros países e desenvolver um modelo novo capaz de impedir que a forma de produzir, a forma de se apropriar dessa riqueza e como essa riqueza pode ou não desenvolver o resto da economia seja debatido com muita profundidade, permitindo ao Brasil não viver os erros das grandes potências produtoras e exportadoras de petróleo.

            O primeiro passo para isso é o debate sobre o marco regulatório do pré-sal. E qual é o debate do marco regulatório do pré-sal? No debate aqui, em 1997, o governo anterior fez uma lei do petróleo em um tempo em que a ideologia apontava para o Estado mínimo, que a Petrobras estava extremamente fragilizada, descapitalizada, a ponto de algumas autoridades do governo defenderem a privatização da Petrobras naquela época, defenderem a mudança de nome da Petrobrás para Petromax. E havia um movimento muito forte contrário à ideia de uma empresa estatal num setor tão estratégico quanto é o petróleo.

            Naquele tempo, o barril do petróleo custava US$19 em média. Não havia condições de financiar a economia brasileira. Vivíamos de crise em crise, de instabilidade em instabilidade, com problemas no balanço de pagamento, sem crédito internacional. Apesar de tudo isso, a Lei de Concessões - e é verdade aqueles que dizem - ajudou a atrair investimentos para o Brasil, ajudou a novas descobertas de petróleo e teve o papel adequado para um país naquela condição, com alto risco exploratório e campos de baixa produtividade. É o que nós tínhamos até o pré-sal. O pré-sal muda isso porque o Brasil passa a ter megacampos de petróleo. Tupi e Iara são as mais importantes descobertas de petróleo da última década e estão entre as mais importantes da economia mundial. O Brasil começa a ter grandes campos com alta produtividade em um momento em que a Petrobras é a segunda empresa de petróleo do mundo; é a primeira empresa em valor de bolsa no Brasil e na América Latina; é uma empresa que tem um cronograma de investimentos de US$174,00 bilhões até 2013; é uma empresa que consegue se financiar nessa crise com US$32 bilhões na economia mundial. Portanto, é uma empresa que cria, no seu programa de investimentos, quase 1 milhão de empregos diretos. A Petrobras, sozinha, representa mais de 6% da economia brasileira hoje, enquanto o petróleo representa mais de 12%. Portanto, neste momento, o Brasil pode e deve criar um novo marco regulatório.

            O que é que fundamenta a convicção do Governo de fazer essa alteração? Dos 24 países produtores e exportadores de petróleo, dezoito tem um marco regulatório misto, ou seja, o regime de concessão que nós temos e o regime de partilha ou serviços. 

            Qual é a diferença entre concessão e partilha?

            Na concessão, o Governo licita os blocos de petróleo e essas licitações permitem que as empresas que descobrirem o petróleo passem a ser proprietárias das reservas. Você privatiza as reservas de petróleo. No regime de partilha, não há essa privatização. As reservas ficam sendo patrimônio do povo brasileiro, do Estado brasileiro, da sociedade brasileira. É uma mudança qualitativa fundamental.

            Agora, eu peço àquelas vozes privatizantes que sempre estão presentes neste debate: digam-me por que de todas as reservas no mundo só 7% pertencem às grandes multinacionais do petróleo e 77% das reservas pertencem às empresas nacionais, empresas públicas, empresas estatais? Portanto, mais de dois terços das reservas do mundo pertencem aos estados nacionais. E é por isso mesmo que nesses países há o regime de partilha. A partilha significa que o Estado detentor das reservas contrata uma empresa operadora de petróleo. No nosso caso, será a Petrobrás, a empresa que tem a melhor tecnologia, uma empresa nacional, uma empresa que desenvolve navios, sondas, plataformas no País, que gera submissão de importações, que gera emprego. A Petrobras, em todas as áreas do pré-sal, terá no mínimo 30% dos contratos. Se ela quiser ter mais de 30%, vai ter quer ir à licitação. E qualquer empresa que quiser participar pode participar, vai ter que aumentar o bônus para o Governo. Quanto maior a participação do Estado na partilha, mais chance a empresa tem de vencer a licitação.

            Então, exatamente nessa mudança qualitativa, o Estado brasileiro vai ter a segurança de que o petróleo que produz uma parte é dele. No regime de partilha não há problema de preço, oscilação de preço, está sempre preservada a rentabilidade. A Petrobras vai ter toda informação estratégica do pré-sal, vai controlar a gestão. Para isso, o Governo vai mudar o marco regulatório. Nós queremos que o Congresso Nacional faça essa alteração.

            A segunda alteração importante é que temos que criar uma pequena empresa estatal, 100% estatal, que vai se chamar Petrosal, só formada de técnicos. É uma empresa que não tem orçamento, não tem receita, não investe, não pode ser operacional. O papel dela é trazer todas as informações do regime de partilha para fiscalizar o custo das operações, para poder garantir que aquela parcela da produção que é devida à União, ao Estado nacional está preservada, está assegurada por seu justo valor. Então, é uma empresa de técnicos de altíssimo nível, muito pequena, que não investe, não tem orçamento, não tem receita, não é operacional. Ela simplesmente fiscaliza as operações para dar total transparência na estrutura de custos e garantir o óleo lucro, que é de onde vai sair a participação da União, a participação do Estado no regime de partilha. Portanto, a mudança do regime para partilha, a criação da Petrosal é o segundo projeto de lei que teremos.

            Qual é o terceiro? O terceiro projeto de lei é o projeto de capitalização da Petrobras. Ora, se a Petrobras vai ser responsável por, no mínimo, 30% de todos investimentos no pré-sal, de todas as operações do pré-sal, ela precisa ser fortalecida, precisa de musculatura, precisa de capacidade operacional. Então, o Governo apresenta um projeto de lei para fazer um aporte de capital na Petrobras. Como a Petrobras já é uma empresa de capital aberto, todos os acionistas que quiserem participar desse aporte de capital podem fazer. O Governo pretende aportar até 5 bilhões de barris de reservas a um custo estimado que pode U$5, US$7, US$10, porque o petróleo que está no fundo do mar e ainda não foi explorado, se nós trabalharmos com o custo de 5 dólares, estamos falando de 25 bilhões de dólares, 50 bilhões de reais é o valor do aporte de capital. Se for de 10 dólares o barril, estamos falando de 100 bilhões de reais, aproximadamente 50 bilhões de dólares.

            A ANP, a Agência Nacional do Petróleo, terá de calcular o preço efetivo. Haverá auditorias internacionais para saber exatamente qual é o custo dessas reservas, e a União pretende aportar essas reservas como capital da Petrobras. Como será feito isso? A empresa abre o seu capital, o Governo coloca títulos públicos na ordem de, por exemplo, 100 bilhões de reais, se o preço do barril em média for de 10 dólares. E, ao fazer esse aporte de capital, posteriormente a Petrobras devolve esses títulos para o Governo e recebe reservas de petróleo.

            Portanto, a capitalização da Petrobras não vai aumentar a dívida pública, não tem nenhum impacto fiscal. É uma transferência de reservas, principalmente nas áreas que já foram licitadas, que são de 28% da área total do pré-sal. O pré-sal são 149 mil km2, sendo que 28% já foram licitados no regime de concessão. A área em torno ao poço de Tupi, Iara e o Parque das Baleias deverá ser transformada em aporte de capital para a Petrobras.

            Então, mudar o marco regulatório para partilha, criar a empresa Petrosal para acompanhar, monitorar e gerenciar o processo e, terceiro, fortalecer a Petrobras com esse aporte de capital de até 5 bilhões de reais.

            Qual é o quarto projeto que o Governo encaminha ao Senado Federal e à Câmara dos Deputados? É o projeto que prevê a criação de um fundo social. 

            Outra característica dos países produtores de petróleo, além da instabilidade política, do parasitismo que, às vezes, essa riqueza fantástica gera nas economias, que atrofia as outras áreas da produção, é que na maioria desses países o povo não se beneficiou da riqueza; a riqueza não chega ao povo.

            A criação desse fundo social é para garantir que todo esse recurso que vem do petróleo se transforme num aporte de recurso no fundo para aplicar em infraestrutura, energia, transporte, logística. E o resultado das aplicações desse recursos, inclusive internacional, quando houver a apreciação do real, a apreciação da moeda, seria transformado em política públicas. Quais as áreas? Educação e cultura, com a grande prioridade em educação, que é a melhor forma de nós usarmos essa riqueza para gerações futuras, preparar o Brasil para uma sociedade do conhecimento; ciência e tecnologia; combate à pobreza e meio ambiente, porque o petróleo produz gás carbônico, produz CO2, aumenta a emissão de carbono na atmosfera. E nós precisamos ter um forte programa ambiental compatível com o uso dessa riqueza.

            Então, com essa concepção do fundo social, o Brasil está assegurando, ao mesmo tempo, recursos para investir em infraestrutura e em desenvolvimento, aumentar os investimentos, e fazer políticas sociais nas áreas mais sensíveis.

            Esse modelo talvez seja o mais próximo, apesar de ser um modelo brasileiro, do que a Noruega fez. A Noruega é um dos países que soube usar com inteligência o petróleo, desenvolveu outras áreas da economia, criou um fundo soberano, um fundo semelhante de longo prazo, portanto, fez uma poupança que permitiu dar estabilidade econômica e políticas sociais para melhorar a qualidade de vida do povo norueguês, inclusive na área ambiental - o Brasil mesmo recebe recursos desse fundo -, e é um país exitoso entre tantos que não souberam usar essa riqueza.

            O grande desafio do Brasil é: como é que nós vamos transformar essa riqueza natural numa riqueza econômica, numa riqueza social, e numa riqueza ambiental? Esse é o debate que o Brasil precisa fazer e essa é uma grande discussão.

            Em 2010, já no ano que vem, nós vamos ter um projeto piloto no poço de Tupi, que está agora em fase de testes; a partir de 2013, vamos produzir petróleo, muito petróleo. E o Brasil não quer exportar petróleo. O Brasil quer exportar derivados de petróleo. Ou seja, nós queremos exportar óleo diesel de qualidade e outras substâncias que derivam do petróleo para gerar mais valor agregado, mais emprego, mais impostos, mais desenvolvimento, mais industrialização no Brasil. Por isso as novas refinarias; por isso os novos gasodutos, porque o pré-sal também tem um volume de gás espetacular, e esse é um salto de qualidade histórico muito importante que nós daremos.

            O Governo não encaminhou ao Congresso Nacional propostas de alteração no regime de distribuição dos royalties de petróleo. E, apesar de o Governo não ter encaminhado, esse é um debate que o Congresso brasileiro vai ter que abrir e discutir, porque há uma atrofia muito grande na repartição desses recursos, falta de transparência, falta de controle, falta de vinculação nesses recursos, que é o que o Governo tentar criar com o fundo social.

            Evidente que o royalty é a remuneração por um bem não renovável que a natureza oferece. Então, os Municípios e os Estados impactados por essa riqueza precisam receber o royalty. Os Municípios que têm atividade de transporte - por exemplo, navegação - precisam receber royalties. Os Municípios que têm três equipamentos de petróleo - um gasoduto, uma refinaria, um poço - têm evidentemente que receber participação na riqueza do petróleo. Os Municípios confrontantes têm que receber, como hoje recebem. Só que nove Municípios do Rio de Janeiro hoje ficam com 57% de toda a receita do petróleo. Isso é um equívoco! Não há vinculação, não há transparência, não há preparação do futuro.

            Nós precisamos repensar esse modelo de repartição dos royalties, evitar essa hiperconcentração, e garantir, por meio desse Fundo Soberano, uma repartição mais justa, evidentemente diferenciada para Estados e Municípios impactados pela atividade do petróleo, mas uma visão de Brasil, uma visão de povo, uma visão histórica, uma visão de longo prazo. Nós não podemos ter oásis que se beneficiam com a riqueza, e a pobreza ou ausência de política educacional, de cultura, de ciência e tecnologia ou de meio ambiente; precisamos pensar o conjunto da Nação.

            Então, eu acho que o Governo fez corretamente, para não colocar uma agenda muito complexa, que tumultuaria o debate do marco regulatório. O marco regulatório, a criação da Petrosal, a criação do Fundo Soberano, a capitalização da Petrobras é uma parte da agenda. E nós, com maturidade, com naturalidade, com responsabilidade, sem prejudicar nenhum dos Estados que recebem royalties, nenhum dos Municípios, mas olhando para a riqueza que ainda não foi produzida e olhando para o futuro, vamos discutir um critério mais justo, mais equilibrado regional e socialmente.

            Senador Renato Casagrande.

            O Sr. Renato Casagrande (Bloco/PSB - ES) - Senador Aloizio Mercadante, obrigado pelo aparte. Eu vou me pronunciar sobre o assunto, mas quero me referir primeiro a esse tema da distribuição de royalties e de participação especial. O Governo adotou uma medida inteligente na hora em que retirou do debate esse assunto, mas há ainda um tema que nós precisamos esclarecer. No sistema de partilha, é possível cobrar royalties, não sei se é possível cobrar participação especial. Então, temos um assunto a ser esclarecido aqui, no debate nosso, porque, de fato, é fundamental que essa riqueza do petróleo possa ser distribuída a todos os Estados brasileiros, fazendo com que haja programas de desenvolvimento sustentável e investimento na área social. A única dúvida que ainda me restou do debate durante o dia de hoje, da reunião do Conselho Político e agora do lançamento do programa, é como o Governo Federal vai fazer com que esse compromisso com os Governadores de Estados produtores seja de forma a que eles não ganhem... Perder eles não vão, porque essa é uma riqueza nova. Mas o modo como se vai alterar esse processo ainda é um assunto que temos de responder no debate aqui dentro, para que usemos, com clareza naturalmente, essa relação com os Governadores, que serão importantes na aprovação. No mais, Senador Aloizio Mercadante, a decisão do Governo fortalece a Petrobras, preserva uma riqueza de forma bastante clara para os brasileiros e aponta a direção em que vai ser feito o investimento. Na área ambiental, eu acho fundamental que, como vamos produzir um combustível fóssil, tenhamos uma compensação e até uma forma de capturar - se não for a captura, o sequestro e a captura de forma artificial -, com investimentos em atividades da Petrobras, para que se evite o lançamento, em outras atividades, de gases de efeito estufa. Então, aponta-se claramente para onde vai o recurso dessa atividade do petróleo, do pré-sal. Depois terei oportunidade, mas eu queria só ressaltar o pronunciamento de V. Exª e levantar essa dúvida única que ficou do debate do dia de hoje. Agradeço pela oportunidade.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Agradeço, Senador Renato Casagrande.

            Para concluir, eu gostaria de dizer o seguinte: os Estados produtores de petróleo, especialmente Rio de Janeiro e Espírito Santo, até hoje - um pouco Sergipe, Rio Grande do Norte, amanhã São Paulo -, argumentam que o ICMS é cobrado na origem para quase todos os produtos, mas não o é para o petróleo. Então, são Estados que se prejudicaram na repartição do ICMS, e é verdade. Os royalties foram uma forma de compensação desse prejuízo.

            Então, nós não podemos fazer nenhuma mudança na política de royalties que desestabilize um Ente Federado. Aquilo que os Estados e Municípios recebem tem que ser preservado. Essa é a minha visão. Acho que até o Espírito Santo fez uma legislação que usa melhor a participação do Estado nos royalties, porque reparte, de forma mais justa, entre seus Municípios.

            Agora, veja a distorção.

            O Sr. Renato Casagrande (Bloco/PSB - ES) - Senador...

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Deixe-me só concluir o raciocínio.

            Veja a distorção. No meu Estado, o Município de Paulínia recebe, porque tem uma refinaria, R$8.600,00 per capita ano de ICMS. Dá para você dar uma bolsa de estudos de R$700,00 para cada cidadão só com o ICMS do petróleo. No entanto, Franco da Rocha recebe R$76,00 per capita ano. Cada pessoa não pode receber R$10,00! E são Municípios muito próximos.

            O Sr. Renato Casagrande (Bloco/PSB - ES) - É uma distorção muito grande.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Então, você chega em Paulínia e vê que está sobrando dinheiro, está tendo desperdício, uma coisa absurda! E, no outro Município, faltam as coisas mais elementares.

            O Sr. Renato Casagrande (Bloco/PSB - ES) - Deixe-me só colocar outro tema para V. Exª.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Deixe-me apenas concluir.

            O Rio de Janeiro não é diferente. O Rio de Janeiro não quer este debate, mas eu insisto em falar que não é diferente. O Município de Campos recebe mais de R$1 bilhão ano de royalties. O Município de Belford Roxo recebe R$13,00 per capita ano - praticamente não recebe nada -, e a Capital só recebe porque ganhou na Justiça, em 2005, alguma participação nos royalties. A Baixada Fluminense, onde há o grande problema da violência, e os morros do Rio de Janeiro estão fora da participação dessa riqueza.

            Então, precisamos debater isso com maturidade, sem desestabilizar nenhum Município, sem prejudicar nenhum Estado, mas olhando para o futuro para repartir essa riqueza com mais equilíbrio e com mais justiça, contemplando, evidentemente, os Municípios produtores de petróleo e os Estados. Por quê? Porque o petróleo vai acabar. O que é o royalty? O royalty é para preparar o futuro, a fim de que, quando acabar essa riqueza - e os poços acabam em 23 anos no regime de concessão -, possamos ter uma solução.

            Por último, quero falar de um argumento que, para mim, tem um sentido histórico muito importante neste debate. Quem conheceu Serra do Navio, por exemplo, no Amapá, que produzia manganês, sabe que o manganês acabou. O manganês acabou, acabou a cidade, e não ficou nada. Ficou um buraco lá, sem nenhuma perspectiva de futuro, porque não souberam usar os royalties.

            Então, o debate da vinculação dos royalties - como, por exemplo, à educação, ciência e tecnologia - é uma forma de criar uma economia do futuro, desenvolver novas atividades industriais, novas atividades econômicas, para que não fiquemos dependentes do petróleo ao longo da história.

            Essa é uma grande discussão para o Congresso fazer, sem maiores paixões, sem açodamentos. O critério que está aí é anacrônico, é indefensável, especialmente para os Municípios em mar.

            E termino com isto: no sistema de perpendiculares e oblíquas, que são as linhas que projetam para o mar, os Municípios que são côncavos são altamente favorecidos, e os Estados também. Os que são convexos são totalmente prejudicados. Um vira, como o Paraná, uma fatia de queijo; e outro, como o Rio de Janeiro, um braço aberto para o mar. Um recebe muitos royalties; outro não recebe nada.

            Então, temos de rediscutir isso, principalmente porque o pré-sal está a 250 ou 300 km do litoral e só se enxerga pela curvatura da terra até 30 km. Então, não tem um impacto direto, não prejudica o turismo. É diferente das plataformas que, evidentemente, prejudicam e têm de ter uma compensação muito maior.

            O Sr. Renato Casagrande (Bloco/PSB - ES) - Senador...

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - O último argumento, Senador Renato Casagrande: no regime de concessão, sabe quantas empresas, incluindo a Petrobras, pagaram por todos aqueles blocos licitados, os 28%, 42 mil km, para explorar petróleo? E já descobriram entre 9,5 bilhões e 14 bilhões de barris. A preço de hoje, vamos colocar US$60 dólares o barril. Estamos falando de R$7 trilhões, US$700 bilhões. Sabe quanto pagaram? Apenas R$320 milhões. Isso foi o bônus.

            É evidente que havia risco, mas mostra-se que o regime de concessão é adequado onde há alto risco. Onde há baixo risco... Há risco exploratório? Sim. Há risco de tecnologia? Sim. Há risco de logística? Sim. Há risco até de broca que não bateu no óleo? Sim. Mas o potencial é fantástico. O regime tem de ser de partilha. Precisamos ter uma empresa operadora que coordene isto: a Petrobras, criar a Petrosal, mudar o marco regulatório e o padrão de debate sobre a economia do petróleo no Brasil.

            Senador Renato Casagrande.

            O Sr. Renato Casagrande (Bloco/PSB - ES) - Só mais um ponto relacionado à questão do petróleo. V. Exª disse o seguinte: o Estado produtor de petróleo tem prejuízo, porque não cobra o ICMS na origem; o ICMS é cobrado no destino. É certo. Há dois fatores que ajudam o Município: o royalty, a participação especial, é um; o outro fator que ajuda o Município é a composição do valor adicionado. Quanto ao petróleo extraído na costa do Município capixaba, do Rio de Janeiro ou de São Paulo, na hora em que se emite a nota fiscal, aumenta-se o valor adicionado. A Constituição, no art. 158, estabelece que 75% do valor adicionado, 75% do recurso que vai para o Município é decorrente e equivalente ao valor adicionado. Então, é mais uma distorção que provoca. Eu sou autor de uma PEC que baixa isso paulatinamente para 50% - e V. Exª é relator dessa PEC. Isso pode diminuir um pouquinho a distorção; em vez de 25% do total do ICMS ser destinado de acordo com o critério estadual, passaríamos a ter 50% destinado com critério estadual. Então, gostaria que V. Exª pudesse analisar, para agilizar essa PEC, porque poderia ser uma forma de diminuir a distorção. Essa distorção vai aumentar com o aumento da produção de petróleo na costa de alguns Municípios brasileiros.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Eu tenho todo o interesse em dar prioridade, inclusive porque não é um problema só do petróleo. Por exemplo, com relação às usinas de álcool e açúcar, todo o ICMS fica no Município que tem a usina; os Municípios que plantam a cana ficam sem nada. Na indústria de papel e celulose, o Município que tem a fábrica de papel e celulose fica com todo o ICMS. Os Municípios que produzem a madeira ficam com os cortadores de madeira, têm que atender a saúde, as estradas vicinais todas arrebentadas. São Municípios extremamente pobres.

            Então, nós precisamos fazer com que metade do ICMS fique no Município sede e a outra metade seja repartida por todos os Municípios que participam daquela riqueza. Assim, quem produziu a madeira tem que ter uma participação no ICMS que vai ser cobrado da usina, como também quem plantou a cana, ou quem teve qualquer outra atividade na cadeia produtiva, porque nós teríamos aí uma distribuição mais justa dos recursos.

            Eu acho que esse é o grande debate do Senado. Esta é a Casa para fazer o equilíbrio do pacto federativo, para repartir os recursos com mais justiça, e nós precisaremos nos debruçar sobre essa matéria sem a paixão. É evidente que cada um de nós defenderá o seu Estado, mas, olhando o Brasil, o futuro, a história, acho que nós conseguiremos superar essa dificuldade.

            Senador Garibaldi com a palavra.

            O Sr. Garibaldi Alves Filho (PMDB - RN) - Senador Aloizio Mercadante, V. Exª tocou num ponto que hoje é motivo de grande frustração entre os Estados produtores, principalmente os Estados produtores de petróleo, que é o fato de o ICMS não ser cobrado pela produção por conta de uma vedação constitucional. Eu, quando cheguei ao Senado pela primeira vez, em 1991, apresentei uma emenda à Constituição que eliminava essa vedação. Ela chegou a ser aprovada pelo Senado, mas não foi aprovada pela Câmara. De modo que eu apenas queria relembrar isso. Não é problema de nostalgia; trata-se de relembrar essa frustração que já ocorreu com os Estados produtores de petróleo, que hoje recebem apenas os royalties, quando poderiam receber o ICMS. O Estado do Rio Grande do Norte é um deles, porque ainda é o maior produtor em terra. Eu agradeço a V. Exª.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Eu concordo com a preocupação de V. Exª. Acho que é uma coisa que teremos que corrigir. O problema é que a reforma tributária vem na direção de tudo passar para o destino, e não mais para a origem. Então, a correção seria no caminho inverso: em vez de voltar para a origem, tudo vai para o destino, que é a forma mais justa de repartição da receita do Estado, especialmente o ICMS.

            Ouço o Senador Suplicy, para eu poder encerrar e respeitar os outros inscritos.

            O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Senador Aloizio Mercadante, foi muito importante, conforme V. Exª ressalta, e histórico o dia em que o Presidente Lula, o Ministro Edison Lobão e a Ministra Dilma Rousseff anunciaram as normas de regulamentação da exploração do pré-sal. Avalio que se trata de um conjunto de normas que agora passaremos a examinar, que visam garantir, sobretudo a todo o povo brasileiro, aos 191,5 milhões de brasileiros, o usufruto desta extraordinária riqueza que, conforme o Presidente por vezes disse, Deus ajudou a Petrobras a achar, o pré-sal, ali no oceano Atlântico, em frente a todo o Brasil. Avalio, portanto, que mesmo os Governadores de São Paulo, do Rio de Janeiro, do Espírito Santo, de Sergipe compreenderão que essa riqueza, claro, deve assegurar aos respectivos Estados a devida retribuição para que possam realizar a exploração e amainar quaisquer males decorrentes da atividade econômica, mas, sobretudo, trata-se de uma riqueza que vai beneficiar todos os brasileiros. Muito obrigado.

            O SR. ALOIZIO MERCADANTE (Bloco/PT - SP) - Senador Eduardo Suplicy, quero terminar parabenizando o Governo e o Presidente Lula pela coordenação do trabalho. O Ministro Edison Lobão coordenou o grupo técnico, a Ministra Dilma teve um papel decisivo no desenho dessa proposta, o presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli, com a sua equipe, deu uma contribuição inestimável a toda essa construção.

            Eu passei o último ano defendendo exatamente o que estamos hoje apresentando: a mudança do regime para partilha, defendendo a criação de um escritório técnico de administração das reservas, a Petrosal, uma empresa que não vai ter receita, nem investimento; vai apenas acompanhar, para poder viabilizar o regime de partilha; a criação de um Fundo Soberano com aplicação e vinculação social, como está sendo feito; e a capitalização da Petrobras. Com isso, acho que o Brasil dará um grande passo em direção ao futuro, assegurando que essa riqueza é da Nação, é do povo e tem que ser administrada com inteligência.

            Aprendendo com a história econômica de outros países produtores de petróleo, estamos caminhando para nos transformar numa grande Nação produtora e exportadora de petróleo. E isso vai colocar imensos desafios políticos. Como somos uma democracia, como somos um país contemporâneo, como somos um país que respeita contratos, como somos um país que ganhou credibilidade e prestígio internacional, o Brasil, também na questão do petróleo, caminhará numa nova direção, seguramente muito mais promissora, muito mais consistente, muito mais fundamentada. E hoje é um dia histórico para esse passo fundamental que a Nação brasileira deverá dar.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 01/09/2009 - Página 39907