Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Dentre as linhas principais do pré-sal, expostas pelo Presidente da República, destaque de S.Exa. para a ideia da criação de um fundo social para ser usado em educação, em ciência, em tecnologia, na cultura e na luta contra a pobreza. Discordância das diretrizes propostas pelo Governo para utilização desses recursos.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ENERGETICA. EDUCAÇÃO.:
  • Dentre as linhas principais do pré-sal, expostas pelo Presidente da República, destaque de S.Exa. para a ideia da criação de um fundo social para ser usado em educação, em ciência, em tecnologia, na cultura e na luta contra a pobreza. Discordância das diretrizes propostas pelo Governo para utilização desses recursos.
Aparteantes
Heráclito Fortes, Jarbas Vasconcelos, Marisa Serrano, Mozarildo Cavalcanti.
Publicação
Publicação no DSF de 02/09/2009 - Página 40196
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO. POLITICA ENERGETICA. EDUCAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, PRONUNCIAMENTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, LANÇAMENTO, PROGRAMA, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL, PROPOSIÇÃO, SISTEMA, PARTILHA, CRIAÇÃO, EMPRESA ESTATAL, FUNDO SOCIAL, DESTINAÇÃO, EDUCAÇÃO, CIENCIA E TECNOLOGIA, CULTURA, LUTA, COMBATE, POBREZA, ADVERTENCIA, POSSIBILIDADE, VITORIA, RISCOS, INSUCESSO.
  • RECONHECIMENTO, ANTERIORIDADE, PROGRAMA, EXPLORAÇÃO, AÇUCAR, OURO, CAFE, BORRACHA, INDUSTRIALIZAÇÃO, INSUCESSO, RESULTADO, MANUTENÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, INFERIORIDADE, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, INEFICACIA, DESENVOLVIMENTO CIENTIFICO, DESENVOLVIMENTO TECNOLOGICO, BRASIL.
  • DEFESA, PROJETO DE LEI, AUTORIA, ORADOR, TASSO JEREISSATI, SENADOR, PROPOSIÇÃO, VINCULAÇÃO, RECURSOS, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL, EDUCAÇÃO, PAGAMENTO, SALARIO, PROFESSOR, EQUIPAMENTOS, MELHORIA, ENSINO, ESTABELECIMENTO DE ENSINO, ATRAÇÃO, ALUNO.
  • ADVERTENCIA, NECESSIDADE, ADAPTAÇÃO, PROJETO, CRIAÇÃO, FUNDO SOCIAL, GARANTIA, VITORIA, EFICACIA, CARATER PERMANENTE, RESULTADO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, SOCIEDADE, BRASIL.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador) - Sr. Presidente, Senador Papaléo, Srs. Senadores, ontem o Brasil assistiu a um evento que pode ficar na história deste País, quando o Presidente Lula lançou o chamado programa do pré-sal. Mas ele disse, naquele momento, que o pré-sal, ou seja, essa imensa reserva que - supõe-se - há no fundo do mar, pode ser uma dádiva ou uma maldição.

            Eu felicito o Presidente da República por ter esclarecido à opinião pública que essas coisas podem ser boas ou podem ser más, dependendo de como nós as usamos. Na verdade, não houve no passado, mas poderia ter havido, um encontro como esse, Senador Paim: no lugar do Presidente Lula, o Duarte Coelho Pereira falando do açúcar lá em Pernambuco, prometendo, Senador Flávio, que, graças ao açúcar, o Brasil seria um país muito rico.

            Poderia ter acontecido uma solenidade como aquela, liderada pelo Primeiro-Ministro de Portugal na época, Pombal, dizendo que, graças ao ouro de Minas Gerais, o Brasil seria o país mais próspero e rico do mundo inteiro.

            Poderia ter havido, em algum momento lá no Pará, Senador Flexa, algum barão da borracha dizendo: “Graças a essas maravilhas que nós temos na Amazônia, nós poderemos ser um dos países com maior bem-estar, riqueza e prosperidade do mundo”. Poderíamos, mais recentemente, ter ouvido de um Presidente - aliás, de certa maneira, ouvimos de Juscelino Kubitschek - a promessa de que, graças à industrialização, o Brasil seria um país sem pobreza, educado, sem violência, civilizado.

            Mas esses, que não fizeram essas promessas, se as tivessem feito, hoje poderíamos dizer que eles fracassaram. Fracassaram, porque nós tivemos o açúcar, tivemos o ouro, tivemos o café, tivemos a borracha, tivemos a industrialização, fomos bem sucedidos em todos esses, Senador Eurípedes, mas os resultados não deixaram a nossa nação na ponta do mundo das nações civilizadas. Continuamos um país onde há uma desigualdade assustadora, onde há um nível de educação dos mais baixos do mundo, onde há uma dependência científica e tecnológica quase absoluta, onde há um sistema político, e privado também, cheio de corrupção, um país do qual não se pode dizer que atingiu os graus de civilização que os nossos recursos teriam permitido se tivessem sido bem utilizados.

            Nesse sentido, concordo com o Presidente quando ele fala que ali pode estar uma dádiva ou uma maldição, dependendo de como for usado. E ele propôs quatro grandes linhas. Primeiro, um sistema de partilha, que creio ser um sistema eficiente, na medida em que combina o setor público e o setor privado. Depois, a criação de uma fundação, a Petrosal, sobre a qual não quero emitir juízo ainda porque ainda não me convenci de que a Petrobras não pode, ela própria, fazer o trabalho. Posteriormente, ele prometeu um aporte de capital para a Petrobras. Aí, a gente precisa saber de onde vai sair esse dinheiro, de onde virá o dinheiro para dar esse aporte, que se calcula em R$100 bilhões ou US$100 bilhões, para a Petrobras. E, finalmente, onde quero me concentrar e que para mim é um ponto alto do projeto: a ideia da criação de um fundo social formado pelos recursos do pré-sal para ser usado em educação, em ciência, em tecnologia, na cultura e na luta contra a pobreza.

            Aqui quero emitir minha posição sobre essa ideia.

            Em primeiro lugar, a ideia do fundo é positiva, mas a maneira como vem sendo pensado, a meu ver, pode levar a um fracasso total, pode levar a uma maldição. A ideia que está no documento do Presidente é a de que esse dinheiro vá para um fundo e, aí, as pessoas entrem com pedidos de projetos - Governos e Estados - e cada um abocanha um pedaço. Se for assim, o risco que a gente tem é o de um imenso desperdício de recursos sem consequência para o que nos propusemos.

            A meu ver, as diretrizes mais adequadas para a utilização desses recursos já estão à disposição do Presidente nesta Casa sob a forma de um projeto assinado pelo Senador Tasso Jereissati e por mim, projeto que propõe a vinculação dos recursos do pré-sal, quando eles chegarem, à educação. Esse fundo não deveria funcionar a partir de projetos soltos e isolados; deveria ser um fundo casado, Senador Heráclito, com a ideia de aplicação direta na educação através de um processo em que casaríamos a federalização da educação com os recursos do pré-sal. O Governo Federal, ele próprio, diria: “Nós assumimos o patrocínio da educação de base neste País, e os recursos para isso virão do chamado pré-sal”.

            Aí, não haverá desperdício de recursos; aí, o recurso vai sair transformando o petróleo, que é uma lama, em cérebros, que são a grande energia do futuro. O petróleo acaba, mas a competência de um povo aumenta a cada ano. Cada barril de petróleo que queimamos é um barril de petróleo a menos; para cada criança que educamos, podemos contar como mais quatro educadas, que serão os seus filhos. A educação se espalha; o petróleo se queima. É uma diferença tão óbvia, tão brutal, que é difícil entender como os países árabes tiveram de esperar tantos anos, queimar tanto dos seus recursos para, agora, de fato, transformar petróleo em cérebros, a energia da lama do petróleo na energia da inteligência de um povo.

            A maneira, eu não a vejo em um fundo, mas no compromisso do Governo Federal de que, em seu Orçamento, entrem os recursos que sairão desse petróleo para, diretamente, pagar o salário dos professores, equipar as escolas, manter as crianças estudando. Esse é o caminho; devemos evitar a velha, batida e surrada experiência de fundos que terminam sendo apropriados, abocanhados por projetos soltos que não têm coerência entre si, que não têm metas em comum.

            O Presidente, com a ideia do fundo, apresenta uma sugestão positiva, que é orientar os recursos que dali virão, mas está trazendo uma posição equivocada, que é tratar isso como mais um dos fundos que foram criados neste País ao longo de nossa história, fundos que não dão resultados por falta de coerência, por falta de harmonia entre os recursos que virão dessa lama e os recursos que chegarão aos cérebros das pessoas.

            Por isso, creio ser um equívoco a análise do projeto em regime de urgência aqui. Esse projeto, mais do que quase todos os outros, vai exigir reflexões, debates, audiências, cuidados e até mesmo, eu diria, um redesenho, porque não se pode esperar que o que sai da cabeça dos gênios do Palácio do Planalto e da Esplanada dos Ministérios esteja pronto. A gente vai precisar se debruçar sobre isso aqui. Digo tudo isso, supondo, em primeiro lugar, que existam os recursos lá embaixo da terra - ninguém tem uma prova concreta de suas dimensões, porque por mais científica que seja, ainda é uma questão probabilística a dimensão das reservas de petróleo - e, em segundo lugar, supondo que o preço do petróleo vá permitir a rentabilidade que se imagina. E aí há uma contradição muito forte: se esse petróleo for em grande quantidade, o preço do petróleo cairá e as rendas serão pequenas; se ele for em pequena quantidade, o preço poderá até continuar alto e subindo, mas aí a soma da renda não será tão grande.

            Por isso, ao mesmo tempo em que defendo aqui ideia do uso dos recursos para o social, como o Presidente falou, trago o alerta que ele fez...

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - V. Exª me permite um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Sim, um minuto.

            Trago o alerta que ele fez de que pode ser uma dádiva ou uma maldição. A nossa responsabilidade é impedir que seja uma maldição, inclusive a maldição do efeito do delírio e do sonho propagandístico, é ajustar esse projeto à realidade e fazer com que seus resultados sejam definitivos para a sociedade brasileira, para que não seja um discurso como o que teria feito Duarte Coelho Pereira com o açúcar ou Pombal com o ouro, um barão da borracha ou um dos industriais de São Paulo.

            Finalmente, antes de dar o aparte, vendo a recusa dos Governadores em aceitarem a chamada centralização desses recursos, quero dizer que, conforme a ideia que estou trazendo, Senador Expedito, esses Estados que hoje são os donos do petróleo podem ganhar mais. Não cheguei preparado, ainda não fiz as contas, mas, se imaginarmos que temos vinte milhões de crianças nas escolas nesses Estados e imaginarmos R$4 mil, que é o mínimo para se ter uma boa educação, esse projeto estaria levando para esses Estados o equivalente a R$80 bilhões por ano. O dinheiro volta! Agora, não volta para o Governador fazer o que ele quiser: volta para possibilitar ao Governador ver suas crianças crescerem em boas escolas, escolas federalizadas sob o ponto de vista da responsabilidade, embora municipais sob o ponto de vista da administração - e até mesmo particulares, se for o caso, do ponto de vista da administração.

            Por isso, insisto que esse assunto deve dominar nossas discussões nos próximos meses, que não devemos ter pressa. A pressa significa caminhar para a maldição, alerta feito pelo o próprio Presidente. A pressa pode significar um erro.

            Vamos trazer esse tema aqui para dentro e vamos ver como transformar a riqueza provisória do presente, que é o petróleo, numa riqueza permanente do futuro, que é a inteligência. Esse é o desafio que está diante de nós e que temos, sim, como levar adiante.

            Peço permissão ao Presidente para passar aos três que querem um aparte. Em primeiro lugar, ao Senador Jarbas Vasconcelos, depois, à Senadora Marisa e, depois, ao Senador Heráclito.

            Senador Jarbas.

            O Sr. Jarbas Vasconcelos (PMDB - PE) - Senador Cristovam, V. Exª, com a seriedade costumeira, trata de um tema muito importante.

(Interrupção do som)

            O Sr. Jarbas Vasconcelos (PMDB - PE. Com revisão do aparteante.) - V. Exª que tem sido um defensor intransigente da aplicação de recursos públicos na educação. E agora demonstra uma postura correta, e não poderia ser de outra forma, com relação ao pré-sal. Esta Casa, Senador Cristovam, tem que se conscientizar, independentemente de quem é Governo e Oposição, de que este projeto não pode ser votado de forma açodada. O Governo levou dois anos debruçado sobre esse tema, e obteve todas as informações necessárias, contudo, esta matéria chegou apenas ontem ao Senado, às pressas, para ser apresentado à nação. Imagine o Congresso ter a obrigação de votar esse projeto em noventa dias. Aliás, o Presidente Lula já tinha concordado com a retirada do regime de urgência da tramitação desse projeto.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É verdade.

            O Sr. Jarbas Vasconcelos (PMDB - PE. Com revisão do aparteante.) - Foi o Líder do PMDB, o senador Renan Calheiros, que convenceu o Senado a votar, porque, o ano que vem não se vota nada, porque é ano eleitoral. O ano eleitoral é este em curso. Pois o Presidente Lula o transformou em eleitoral. O ato de ontem foi um ato eleitoral. Basta uma leitura rápida nos principais jornais do País, do Rio ou de São Paulo, para constatar o que nós estamos dizendo. Foi um ato para inflar a candidatura da Srª Dilma Rousseff. De forma que nós temos de ter plena consciência disso. Precisamos abrir um debate e fazer tantas audiências públicas quantas forem necessárias, percorrer este País e não ter nenhum açodamento para votar um projeto dessa grandeza. O Presidente da República quer apenas fazer da exploração do pré-sal, um ato eleitoral, como fez do PAC, como fez do projeto da casa própria. Agora quer usar o petróleo para fazer isso. Nós não vamos deixar. Eu, pelo menos, utilizarei todos os recursos regimentais para que essa matéria não seja discutida e votada no prazo de noventa dias. Meus parabéns a V. Exª.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu agradeço o aparte de V. Exª e creio que o povo brasileiro está esperando isto: que o Senado faça com que o petróleo não seja mais um dos recursos do passado que nós desperdiçamos e dos quais pouco ficou no País.

            Senadora Marisa.

            A Srª Marisa Serrano (PSDB - MS) - Obrigada, Senador Cristovam. Eu concordo com tudo aquilo que V. Exª colocou a respeito dessa pressa, desta dificuldade que teremos aqui: em 45 dias, analisar um projeto que os técnicos levaram quase dois anos discutindo. Nós, que não somos técnicos, vamos ter só 45 dias? Para nós, é completamente abstrato que nós possamos ter uma...

(Interrupção do som.)

            A Srª Marisa Serrano (PSDB - MS) - E aí, Senador Cristovam, eu quero dizer o seguinte quanto ao fundo. Se ele é para a educação, para a ciência e a tecnologia, para fazer crescer a inteligência, melhorar a proficiência do nosso povo, excelente. O que me preocupa, Senador Cristovam, não é o fato dele ser para a educação, para a ciência e a tecnologia, mas a possibilidade de entrar a questão da fome, outras questões - hoje já ouvi falar muito em saúde. Quer dizer, daqui a pouco, o fundo será para tudo e para nada. Ou o concentramos na educação e na ciência e tecnologia ou esse fundo vai virar nada também. Era esse o reparo que queria fazer. Temos de ter muito cuidado com o que vamos votar aqui. Acho que a nossa preocupação tem de ser redobrada. Obrigada.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Agradeço, Senadora Marisa. A senhora traz um problema fundamental: onde é que a gente vai investir para mudar este País? Mesmo ciência e tecnologia, que são fundamentais, não haverá se não investirmos na educação. Enquanto estivermos jogando para fora sessenta crianças por minuto - minutos, digamos, letivos, um ano de duzentos dias e quatro horas por dia -, não teremos uma grande ciência. Então, é preciso focar isso.

            Segundo, se houver dispersão, se os projetos forem soltos, não vamos ter resultados.

            Terceiro: temos de olhar para o futuro mais do que para o presente, porque essa é a grande falha de todos os nossos projetos. Quero dizer até aos aposentados aqui que, ontem, conversando com o Senador Paim, eu disse: “Paim, gostaria de trazê-lo para a luta em defesa dos aposentados do ano de 2040”. É claro que, os de hoje, nós também temos de resolver seus problemas - estou com vocês -, mas se não tomarmos algumas medidas, Senador Couto - que é também outro grande defensor dessa causa -, que permitam colocar as crianças na escola para que amanhã tenham um emprego, produtividade e gerem renda, daqui a trinta anos vão estar outra vez sofrendo com a falta de atenção dos governos aos aposentados do momento. E eu disse: “Senador Paim, vamos trabalhar com os aposentados de hoje e com os do futuro”. Para isso, o pré-sal pode ajudar.

            Além disso, eu quero dizer que não dá para esperar esse pré-sal para começar as mudanças na educação. É um equívoco esperar dez, quinze, vinte anos, sem saber quanto é que tem ali, qual vai ser o preço no futuro e qual vai ser a demanda por esse petróleo.

            Senador Heráclito.

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - Senador Cristovam, o que nós vimos ontem foi, nada mais nada menos, do que um palanque eleitoral. Ninguém tem dúvida disso. O pré-sal é uma perspectiva para o País a médio prazo, a longo prazo, mas o pré-sal não tem nada de concreto para ser resolvido no atual Governo.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - O atual Governo finda no próximo ano. De forma que o que se fez ontem foi um palanque, e é lamentável que assuntos dessa natureza sejam tratados como o de ontem. E veja como este País é um país fadado às injustiças sociais. O que nós vimos? Estados ricos brigando pela primazia do pré-sal, pelos royalties do pré-sal, e Estados pobres, sem nenhuma perspectiva, a olhar a festa dos ricos, uma aliança de São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Se o Presidente Lula tivesse um projeto de governo e não um projeto eleitoral... É preciso que as pessoas comecem a separar o que pensa Sua Excelência. Sua Excelência, desde a sua primeira eleição, vem demonstrando que não tem um projeto de governo, mas um projeto eleitoral. A primeira parte desse projeto foi a reeleição, que teve sucesso; agora, a segundo parte desse projeto eleitoral, é fazer uma sucessora. Se o Presidente Lula tivesse um projeto de governo e não um projeto eleitoral, a primeira coisa que faria era convencer a Nação e, por consequência, esses Estados, de que nós deveríamos inverter os percentuais de distribuição dos royalties. Vamos até admitir que os Estados próximos à costa, de onde o pré-sal será extraído, mereçam uma fatia, mas o restante do bolo arrecadatório deveria ser distribuído para os Estados mais pobres conforme os índices do IDH. Os Estados mais pobres, os Estados mais necessitados, receberiam, dessa outra fatia, a melhor parte. E, aí, concordo exatamente com V. Exª: haveria a obrigação de aplicação na saúde, na educação - eu considero a educação e a saúde quase que siamesas, uma puxa a outra - e também na segurança pública. Um projeto de governo - não um projeto eleitoral - levará qualquer Presidente de bom senso nessa direção.

(Interrupção do som.)

            O Sr. Heráclito Fortes (DEM - PI) - ...levará qualquer presidente de bom senso a caminhar nessa direção. Daí porque me congratulo com V. Exª por essa preocupação. V. Exª está coberto de razões. Nós temos de sair do palanque e temos de administrar, com justiça social, este País cheio de contrastes, este País cheio de bolsões de riquezas e de bolsões, bem maiores, de miséria. O equilíbrio só poderá ser feito com políticas diferenciadas. E quem comanda política diferenciada é Governo. Ninguém mais! Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Eu que agradeço, Senador Heráclito, e quero dizer que o senhor trouxe uma dimensão importante, que é o problema do palanque. Eu creio que é aqui, no Senado, que a gente pode transformar uma proposta de palanque em uma plataforma para o futuro. Este é o desafio da gente: transformar o palanque em uma plataforma para fazer o Brasil prosperar. E, embora saúde e segurança sejam fundamentais, são coisas do presente. Eu acho que a gente deveria investir esse dinheiro, olhando o futuro.

            Por isso, eu acho que deveria ser proporcional ao número de crianças na escola. Pode até fazer um fator de correção pelo IDH, dando um pouco mais ainda às crianças dos Municípios e Estados mais pobres, mas tem de concentrar e não por projetos soltos, que cada um apresenta lá e leva para casa, como se faz hoje com a cultura, por meio da Lei Rouanet. Tem de ser por meio de um programa federal casado e deve estar claro para onde esse dinheiro virá, se ele vier. Quero deixar claro que eu não defendo aqui a ideia de esperar por esse dinheiro para começar esses projetos. Esses projetos têm de começar já, imediatamente.

            Senador Mozarildo.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Cristovam, fica a minha cabeça de médico sem entender a lógica do Presidente Lula. Ele está pedindo urgência para algo que nem nasceu, para algo que nem se sabe quando vai começar a acontecer. Essa mania de tudo resolver por medida provisória faz com que ele peça que um projeto que deveria, como V. Exª defende, ser altamente debatido na Câmara e no Senado, passe como um rolo compressor, como, aliás, foi a lei de aluguel das florestas na Amazônia. Ninguém teve tempo aqui de discuti-lo - e ainda tivemos aqui no Senado treze votos contrários. Na Câmara, praticamente nenhum. Então, não consigo entender. Urgência para mim é quando se tem um problema inadiável a ser resolvido logo. Nesse caso do pré-sal, a galinha acabou de chegar e já estão querendo urgência para o ovo que não veio ainda.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador Mozarildo. Termino dizendo - e o Senador Mão Santa vai gostar disso porque ele costuma dizer que este é o melhor Senado da história do Brasil - que o Presidente, com isso, pode estar ressuscitando o Senado. Se deixar para a Câmara resolver esse problema da partilha, sua formação é proporcional à população. Basta São Paulo, Rio de Janeiro e mais dois Estados e vão resolver em favor deles. Aqui, não. Aqui é o lugar onde a República sente, com três Senadores por Estado, com igualdade de voz e voto para todos os Estados.

            Por isso, de repente, a gente está mostrando o papel do Senado ao povo brasileiro. Para isso, o primeiro passo, Senador Mozarildo, é dizer que não aceitamos a urgência, porque, com a urgência, o Senado, mais uma vez, ficará sem uma função definitiva para encontrar o caminho de que o Brasil precisa.

            Aproveitando a fala do Senador Heráclito, vamos transformar o palanque em uma plataforma para o futuro. Um palanque do presente em uma plataforma do futuro. E isso só se tivermos tempo para analisar.

            Eu dou por concluído, Senador. Gostaria muito de dar o aparte ao Senador Papaléo, mas, pelo visto, há uma ansiedade aqui, o que é muito bom. E eu dou por concluído o meu discurso.

            Vamos aproveitar a chance que o Senado está tendo de mostrar para que nós existimos: para dar equilíbrio à Nação brasileira.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/09/2009 - Página 40196