Discurso durante a 146ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Leitura e análise de carta aprovada pela trigésima segunda Assembleia de Pastoral Regional da CNBB Norte II, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, realizada nos dias 26 a 28 de agosto. (como Líder)

Autor
José Nery (PSOL - Partido Socialismo e Liberdade/PA)
Nome completo: José Nery Azevedo
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
IGREJA CATOLICA. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.:
  • Leitura e análise de carta aprovada pela trigésima segunda Assembleia de Pastoral Regional da CNBB Norte II, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, realizada nos dias 26 a 28 de agosto. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 02/09/2009 - Página 40728
Assunto
Outros > IGREJA CATOLICA. POLITICA DE DESENVOLVIMENTO.
Indexação
  • LEITURA, CARTA, RESULTADO, ENCONTRO, CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), PARTICIPAÇÃO, DIOCESE, ESTADO DO PARA (PA), ESTADO DO AMAPA (AP), DEMONSTRAÇÃO, APREENSÃO, MODELO, DESENVOLVIMENTO, PAIS, EXCESSO, PROJETO, ESPECIFICAÇÃO, CONSTRUÇÃO, USINA HIDROELETRICA, DESTRUIÇÃO, MEIO AMBIENTE, PREJUIZO, HABITANTE, CONCLAMAÇÃO, AUTORIDADE PUBLICA, CONSCIENTIZAÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AUMENTO, DESIGUALDADE SOCIAL, DESIGUALDADE REGIONAL, OPÇÃO, INCENTIVO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, RESPONSABILIDADE SOLIDARIA, JUSTIÇA SOCIAL.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, Srªs e Srs. Senadores, no ensejo da sessão de hoje, quero divulgar a importante carta aprovada pela 32ª Assembleia de Pastoral Regional da CNBB Norte II, Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, realizada nos dias 26 a 28 de agosto.

            Essas reflexões merecem atenção de todos os Senadores e Senadoras. A carta aberta dos Bispos agentes de pastoral está escrita, Sr. Presidente, nos seguintes termos:

            “Eu sou o Senhor, que na terra estabeleço

            a misericórdia, o direito e a justiça;

            porque é disso que eu gosto, diz o Senhor.”

            Jr 9, 23

         Nós, bispos do Pará e Amapá, coordenadores de pastoral e representantes dos organismos e pastorais que compõem o Regional Norte II da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, reunidos em Belém na 32ª Assembleia de Pastoral Regional, nos dias 26 a 28 de agosto de 2009, refletimos sobre as CEBs - Comunidade de Vida e Missão. Com muita esperança, constatamos que nossas comunidades estão vivas, escutam e meditam a Palavra de Deus e, inspiradas pelo projeto de Jesus, procuram unir fé e vida e enfrentar os desafios provenientes da realidade peculiar sócio-econômica e ambiental da Amazônia. O desrespeito à natureza e a destruição em curso ameaça a sobrevivência humana em nossa região. Assim, decidimos dirigir-nos aos povos da Amazônia para partilhar as angústias que afligem a todos nós. Destacamos os grandes males causados pelo modelo de desenvolvimento adotado que privilegia os que detêm o poder político e econômico, sobretudo nos lugares mais longínquos da região, deixando a população à mercê do narcotráfico e exposta a uma total insegurança. A violência rural e urbana ceifa diariamente a vida de centenas de inocentes. O povo está sendo vilipendiado na sua dignidade e nos seus mais elementares direitos.

Todas essas mazelas vêm junto com uma transformação imposta a nossa sociedade em nome de um desenvolvimento que se tornou um desenvolvimentismo opressor, fazendo ecoar em nossas cidades e nos campos lamentos e clamores dos povos indígenas, das populações ribeirinhas, dos remanescentes dos quilombos e também dos migrantes e trabalhadores, muitos deles em condição de escravidão, dos jovens sem emprego que gritam por socorro. Muitos deles não temem ir à luta para manifestar sua oposição a projetos faraônicos que destroem o meio ambiente e atentam contra a vida, sendo, porém, criminalizados por sua coragem e iniciativa.

Sabemos que cada motosserra que derruba nossa mata, cada barragem que represa os nossos rios ceifam um pouco de vida e destroem esperanças e sonhos de nossa gente. Interrogamo-nos, cada vez mais, qual será o futuro dessa região. Apelamos aos responsáveis na política e economia que tomem consciência da real situação em que essa região se encontra e optem por um desenvolvimento que visem a uma Amazônia sustentável e solidariamente compartilhada. Continuamos lutando contra um modelo de desenvolvimento socialmente injusto e ambientalmente degradante.

Repetimos o que já afirmamos por ocasião do IX Encontro dos Bispos da Amazônia, em Manaus, em 2007: ‘O nosso povo é vítima de uma verdadeira tirania econômica e política. Vive com medo, porque depende dos “empregos” das Prefeituras’. Naquele mesmo documento, também nos referimos ‘ao Estado omisso em manter a soberania da Amazônia, deixando que se transforme num corredor de exportação, de privatização da água, de concessão de florestas, de exploração de minérios e do agronegócio’. “O povo está decepcionado ao perceber que a sua participação, que lhe é pedida na gestão pública, não é respeitada”.

Neste momento, assistimos com muita preocupação aos trâmites em torno da projetada construção da Hidrelétrica de Belo Monte. Mais um grande empreendimento que não leva em conta os verdadeiros anseios da população e atiça apenas a ambição daqueles que apregoam um desenvolvimento que, certamente, será passageiro e destruidor. São previstos 1.522 km² de destruição - 516 km² de área inundada e 1.006 km² de área que secará com o desvio definitivo da Volta Grande do rio Xingu! Depois do turbilhão de dez anos de construção, restarão, talvez, 700 empregos. Que desenvolvimento é esse que destrói inescrupulosamente o habitat dos povos e famílias, a fauna e a flora? Esse megaprojeto, se concretizado, deixará milhares de “projetos de vida” atropelados pelo deslocamento compulsório de inúmeras famílias de suas casas e de suas terras. Como em outros projetos, centenas de infâncias se perderão, vitimadas pela exploração sexual. Milhares de trabalhadores formarão o exército de reserva que se amontoam em abrigos imundos e desumanos nas circunvizinhanças dos canteiros de obras. Os povos indígenas de comunidades tradicionais secularmente perseguidos e dizimados receberão o golpe fatal perdendo seus territórios e recursos naturais - e, sobretudo, a terra querida de seus ritos e mitos, onde sepultaram os seus ancestrais. Ressoa aos nossos ouvidos o grito de um índio Kayapó: “O que será de nossas crianças?!”

Primeiro, Tocantins, Araguaia... Depois, Uatumã, Madeira, Xingu... Na sequência, Tapajós e Trombetas... A Bacia Amazônica, a maior reserva de água doce e de vida do Planeta, penosamente dilacerada pelo represamento dos rios, pelo açodamento desenfreado da busca de riqueza e desenvolvimento a qualquer preço, sob os olhos e o patrocínio dos poderes públicos constituídos que governam, dando as costas aos legítimos anseios do povo e privilegiando uma minoria que sonha auferir polpudas riquezas com a realização de um projeto insano.

Não podemos nos calar diante da ameaça que paira sobre a vida de nossos irmãos e irmãs e diante da imprevidência e da imprevisibilidade que predominam nesses projetos, diante da desinformação que parece acalentar o silêncio de nossa sociedade sobre ações e projetos de tamanha gravidade.

Motivados pelo espírito profético de Jesus e solidários com nosso povo que não é ouvido, rogamos ao Deus da Justiça que nos dê fé, coragem e firmeza para nunca desistirmos de nossa missão.

Cremos que o projeto de Deus de comunhão e participação continua vivo em nossas Comunidades Eclesiais de Base.

Pedimos à Nossa Senhora de Nazaré que interceda por seu povo.

           Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, agradeço pela atenção e espero que a voz dos Bispos possa propiciar alguns minutos de reflexão nesta Casa acerca do modelo de desenvolvimento que continua sendo implantado na Amazônia e em nosso País.

            Sr. Presidente, Srs. Senadores...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Um minuto para concluir e um convite para V. Exª presidir. Faltam João Pedro e eu para usar da palavra. V. Exª concorda?

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Para não ser injusto com V. Exª, vou ficar aí.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PMDB - PI) - Você fica bem.

            O SR. JOSÉ NERY (PSOL - PA) - Para ouvi-lo, dirigi-lo e escutá-lo com toda a atenção e não vou contar o tempo para que V. Exª possa se pronunciar. E, como fazemos aqui desta tribuna, além de discutir os problemas nacionais, os problemas regionais, os problemas do nosso povo bem como as soluções, também façamos daqui um espaço para denunciar as injustiças como faço aqui agora, lendo a carta dos Bispos da Amazônia, especialmente do Regional Norte II, do Pará e do Amapá, que fazem ecoar um grito de justiça, liberdade, respeito aos direitos humanos, ao meio ambiente, às populações tradicionais, à luta contra todo tipo de violência e principalmente contra os grandes projetos que têm levado a Amazônia à destruição, ao subdesenvolvimento e à violência.

            Portanto, Sr. Presidente, encerro também informando que, na última quinta-feira, participei de importante encontro, o 10º Encontro Estadual dos Conselheiros Tutelares do Estado do Pará, que reuniu 58 Municípios, inclusive com representações do Estado do Pará e do Amapá. Importantes questões ligadas à defesa dos direitos da criança e do adolescente foram discutidas como parte de uma plataforma pela inclusão desses direitos nas políticas públicas dos nossos Estados e dos nossos Municípios.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

            


Este texto não substitui o publicado no DSF de 02/09/2009 - Página 40728