Discurso durante a 155ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Registro de matéria da Folha de S.Paulo, edição de hoje, intitulada "Verba da saúde paga almoço de preso e farda", sobre denuncia de desvio de verbas destinadas à saúde. Defesa da aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto que regulamenta a Emenda Constitucional 29.

Autor
Antonio Carlos Valadares (PSB - Partido Socialista Brasileiro/SE)
Nome completo: Antonio Carlos Valadares
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SAUDE.:
  • Registro de matéria da Folha de S.Paulo, edição de hoje, intitulada "Verba da saúde paga almoço de preso e farda", sobre denuncia de desvio de verbas destinadas à saúde. Defesa da aprovação, pela Câmara dos Deputados, do projeto que regulamenta a Emenda Constitucional 29.
Publicação
Publicação no DSF de 15/09/2009 - Página 43324
Assunto
Outros > SAUDE.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, VITORIA, DEMOCRACIA, DEBATE, APROVAÇÃO, EMENDA CONSTITUCIONAL, OBRIGATORIEDADE, DESTINAÇÃO, PERCENTAGEM, MATERIA, EXPECTATIVA, VOTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROPOSIÇÃO, AUTORIA, TIÃO VIANA, SENADOR, LEITURA, TRECHO, ARTIGO, REGISTRO, ATUALIDADE, FALTA, CRITERIOS, GESTÃO, CONTABILIDADE, RECEITA, DEFINIÇÃO, GASTOS PUBLICOS, SAUDE PUBLICA.
  • GRAVIDADE, OCORRENCIA, ABUSO, ESTADOS, APLICAÇÃO DE RECURSOS, SAUDE, FALTA, PUNIÇÃO, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), LEITURA, TRECHO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DENUNCIA, DESVIO, AREA, SEGURANÇA PUBLICA, CONCLAMAÇÃO, URGENCIA, VOTAÇÃO, BENEFICIO, POPULAÇÃO, PRECARIEDADE, ATENDIMENTO, HOSPITAL, POSTO DE SAUDE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ANTONIO CARLOS VALADARES (Bloco/PSB - SE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srs. Senadores, a Emenda Constitucional nº 29 nasceu de uma luta travada no meio da sociedade, uma mobilização nacional que foi feita e que traduziu, afinal, com a sua aprovação, uma das maiores vitórias do segmento social do Brasil.

            No que diz respeito à saúde, a Emenda nº 29 foi uma conquista que será para sempre lembrada como um passo decisivo para que os governos, em todos as esferas, se compenetrassem do seu papel de responsabilidade para o financiamento público da saúde, envolvendo milhões e milhões de brasileiros que não disponham das mínimas condições de pagar o seguro saúde - Unimed, etc. -, que exige um aporte de recursos com que a maioria da população não tem condições de arcar.

            Fui relator da Emenda nº 29, de 2000, que destina ao Fundo Nacional de Saúde recursos oriundos do Poder Público - União, Estados e Municípios - em percentuais definidos. A Emenda foi aprovada pelo Congresso Nacional, promulgada, mas, ao longo dos anos, vem sendo postergada. Ela vem sendo atingida nos seus objetivos, principalmente por alguns governos estaduais que se aproveitaram das brechas da não regulamentação e fazem aplicações que, apesar de não serem da saúde, contabilizam como se o fossem. Essa falta de regulamentação, Sr. Presidente, leva os diferentes gestores a adotarem critérios diferenciados na contabilização das receitas vinculadas e na conceituação sobre o que é saúde e o que não é saúde.

            Em virtude dessa ausência de regulamentação, o Senador Tião Viana, do Partido dos Trabalhadores, apresentou uma proposta, definindo critérios de utilização dos recursos oriundos do Fundo da Saúde, que foi aprovada aqui no Senado Federal. Eu fui relator na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania e o Senador Augusto Botelho foi relator na Comissão de Assuntos Sociais. Ela está lá na Câmara dos Deputados desde maio ou abril do ano passado. Já está na pauta, aguardando tão somente um acordo de lideranças, a obtenção de um consenso, para que ela finalmente seja votada.

         Enquanto isso, Sr. Presidente, os governos estaduais abusam dessa falta de regulamentação. Ainda há pouco eu estava conversando com o Senador Mão Santa, que, tenho certeza, vai se debruçar sobre esse assunto logo depois de mim, ele que é médico, um dos defensores da saúde do Brasil, e faz parte, como eu, do grupo parlamentar da saúde.

         Nós estávamos lendo, hoje, na Folha de S. Paulo, um noticiário cuja manchete traduz a irresponsabilidade de alguns governos estaduais: “Verba da saúde paga almoço de preso e farda.” Isto é, almoço de preso e despesa de farda são considerados por alguns governadores como verbas da saúde. Falta, então, regulamentação.

            Quais são os Estados, Sr. Presidente, que não estão cumprindo o que determina a Emenda nº 29? Aqui existe uma relação enorme: 16 Estados. Quem não está cumprindo a nossa Constituição? São os Governos de Rondônia, Santa Catarina, Mato Grosso, Rio de Janeiro, Alagoas, Pernambuco, Espírito Santo, Paraná, Mato Grosso do Sul, Maranhão, Goiás, Ceará, Piauí, Paraíba, Minas Gerais e Rio Grande do Sul.

            O médico João José Cândido da Silva, Professor da Universidade Federal de Santa Catarina e Secretário da Saúde de Florianópolis, na mesma reportagem escrita pela Folha, da alçada do jornalista Ricardo Westin, diz o seguinte:

Os Prefeitos, como são mais fracos, cumprem a lei. Os Tribunais de Contas são mais duros com eles do que com os Governadores. E o Tribunal de Contas da União não tem nenhum mecanismo para aplicar sanções sobre o Governo Federal. É por isso que a saúde brasileira está mergulhada no caos.

            São R$3,6 bilhões, Sr. Presidente, o total da verba sonegada, que deveria ser direcionada única e exclusivamente para a saúde.

            Por que a regulamentação evitaria essa distorção? Porque, segundo rezam vários artigos do PLS nº 121, que na Câmara se transformou em PL nº 306, vários artigos falam como deve ser corretamente aplicado o recurso da saúde.

            O art. 17, por exemplo, diz:

Para os efeitos desta lei [...], considerar-se-ão despesas com ações e serviços públicos de saúde aquelas de custeio e de capital, compreendidas nestas as despesas de investimento, financiadas por qualquer das três esferas do governo, relacionadas a programas [...]

I - sejam destinadas a ações e serviços de acesso universal;

II - estejam em conformidade com objetivos e metas explicitados nos planos de saúde de cada ente da Federação;

III- sejam da responsabilidade específica do setor saúde, não se aplicando a despesas relacionadas a outras políticas públicas (...)

Art. 18. Observadas as disposições do art. 17, somente serão consideradas despesas com ações e serviços públicos de saúde aquelas voltadas para promoção, proteção, recuperação e reabilitação de saúde que se enquadrarem em quaisquer dos seguintes campos de atuação do Sistema Único de Saúde (SUS).

vigilância em saúde, incluído a epidemiológica e a sanitária;

atenção integral e universal à saúde em todos os níveis de complexidade, incluindo a assistência terapêutica e a recuperação de deficiências nutricionais;

capacitação do pessoal de saúde do SUS. [...]

         O que é proibido e não pode constar como despesa da saúde? Está aqui relacionado no art. 19, que está lá na Câmara dos Deputados para ser votado e que é projeto de autoria do Senador Tião Viana, que teve o cuidado de regulamentar a matéria, de que fui relator - Emenda nº 29.

Art. 19. Não constituirão despesas com ações e serviços públicos de saúde, para fins de apuração dos percentuais mínimos de que trara esta Lei, aquelas decorrentes de:

I - pagamento de aposentadorias e pensões, inclusive dos servidores da saúde;

II - pessoal ativo da área da saúde quando em atividade alheia à área;

III - assistência à saúde que não atenda ao princípio do acesso universal;

IV - merenda escolar e outros programas de alimentação (...);

V - saneamento básico financiado ou que vier a ser mantido com recursos provenientes de taxas, tarifas ou preços públicos;

VI - limpeza urbana e remoção de resíduos;

VIII - assistência social. [...]

            Sr. Presidente, há gestores que estão aplicando recursos em saneamento básico, como limpeza de lagoa, limpeza de rio, retirada de detritos ou de resíduos de manancial, e essa despesa é relacionada na prestação de contas daquele gestor público como se fosse uma aplicação em saúde. Na realidade, esse projeto de regulamentação que está na Câmara proíbe essa condição.

            Portanto, Sr. Presidente, vamos torcer ou, digo melhor, vamos trabalhar para que, ainda antes do término deste semestre, a Câmara dos Deputados coloque em votação o projeto que trata da regulamentação dos recursos e do financiamento da saúde pública, porque, se fizermos isso, iremos melhorar a saúde do mais pobre, iremos trabalhar pelos desassistidos com mais eficiência. Os hospitais, cujos corredores estão abarrotados, teriam um melhor tratamento, teriam recursos para melhorar as condições de atendimento da população mais pobre. Novos hospitais poderiam ser erguidos, postos de saúde.

            Enfim, quem ganharia com isso seria a população brasileira, porque, como disse o jornal, Senador Mão Santa - e V. Exª leu: “Quase R$4 bilhões foram desviados em aplicações que nada têm a ver com a saúde pública do povo brasileiro.”

            Por isso, a minha palavra aqui é a de que a Câmara dos Deputados dê continuidade, o mais rápido possível, ao trabalho do Senado Federal. Aqui nasceu a primeira proposta de regulamentação do financiamento público da saúde por meio de uma PEC da minha autoria, que, depois, por iniciativa do Senador José Agripino, Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania, foi apensada a outra que veio da Câmara. E finalmente eu me tornei relator.

            Com essa relatoria, pude receber aqui instituições do Brasil inteiro. Na época, o Presidente era o Senador Antonio Carlos Magalhães, do Estado da Bahia, já falecido. Ele colocou a matéria em votação depois de seis meses apenas de tramitação no Senado Federal. Na Câmara, ela passou sete anos sendo discutida. No Senado, passamos apenas seis meses. Em seis meses, entregamos ao povo brasileiro essa possibilidade de financiamento de um dinheiro certo, um recurso certo e determinado, destinado exclusivamente para a saúde do povo brasileiro.

            Ao encerrar as minhas palavras, Sr. Presidente, quero dizer que acho que no Brasil as coisas precisam estar bem claras. Infelizmente, aqui a lei tem que colocar os pingos nos ‘is’, colocar vírgulas, acentos e ponto final; do contrário, determinados gestores públicos que não têm compromisso com a população desviam os recursos argumentando que a legislação não foi muito clara, porque faltou uma vírgula, porque faltou um acento, porque faltou um ponto e vírgula, porque faltou uma expressão mais clara que defina o que é recurso da saúde e o que não é recurso da saúde.

            Agora, Sr. Presidente, pagar almoço de preso e fazer farda e colocar como despesa da saúde, isso é um absurdo. Só no Brasil.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 15/09/2009 - Página 43324