Discurso durante a 168ª Sessão Especial, no Senado Federal

Comemoração dos 10 anos da Lei da Compra de Voto.

Autor
Augusto Botelho (PT - Partido dos Trabalhadores/RR)
Nome completo: Augusto Affonso Botelho Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
LEGISLAÇÃO ELEITORAL.:
  • Comemoração dos 10 anos da Lei da Compra de Voto.
Publicação
Publicação no DSF de 30/09/2009 - Página 47654
Assunto
Outros > LEGISLAÇÃO ELEITORAL.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, SESSÃO ESPECIAL, HOMENAGEM, ANIVERSARIO, LEGISLAÇÃO, COMBATE, CORRUPÇÃO, ELEIÇÕES, IMPORTANCIA, VALORIZAÇÃO, VOTO, CIDADANIA.
  • DEPOIMENTO, EXPERIENCIA, ORADOR, PARTICIPAÇÃO, POLITICA, ESTADO DE RORAIMA (RR), QUALIDADE, MEDICO, REPUDIO, DESVIO, RECURSOS, MEDICAMENTOS, CANCER, CAMPANHA ELEITORAL, INCENTIVO, POVO, REJEIÇÃO, CANDIDATO, OFERTA, DINHEIRO, MANIPULAÇÃO, VOTO, ELOGIO, MOVIMENTAÇÃO, ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL (OAB), CONFERENCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL (CNBB), ASSOCIAÇÕES, MAGISTRADO, APERFEIÇOAMENTO, DEMOCRACIA, SAUDAÇÃO, APRESENTAÇÃO, CAMARA DOS DEPUTADOS, PROJETO DE LEI, INICIATIVA, PROIBIÇÃO, CANDIDATURA, REU, PROCESSO JUDICIAL, SOLICITAÇÃO, ANEXAÇÃO, DADOS, TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL (TSE).

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR) - Muito obrigado, Sr. Presidente. Sei que V. Exª está dizendo essas palavras porque me considera bastante.

            Primeiramente, queria parabenizar V. Exª pela iniciativa de fazer esta sessão, pois é importante ressaltar a relevância do voto de cada pessoa. Muitas pessoas vão votar e pensam: “Mas meu voto é só um voto”. Mas é um voto que coloca uma pessoa num mandato e é um voto que tira essa pessoa do mandato. Então, o voto, apesar de parecer uma coisa pequena no contexto geral dos votos, é muito importante para estabelecer a democracia.

            A Senadora Marina falou agorinha sobre isso, de você colocar uma pessoa que tenha um pensamento parecido com o seu pensamento. Uma pessoa que se guie, no seu trabalho, pelos princípios que orientam a sua vida também.

            Mas aqui a gente está comemorando os dez anos da lei que tornou crime a compra de votos no Brasil. Eu fui eleito num Estado onde, infelizmente, esse procedimento ainda é corriqueiro. E, infelizmente, nós todos sabemos que os recursos usados pra comprar os votos são recursos tirados da própria população: da saúde, da merenda escolar, das pontes, das obras e das estradas.

            Esses recursos, perto da eleição, são oferecidos ao eleitor como se fossem uma dádiva. “Estou lhe dando esse dinheiro aqui da parte do candidato tal.” É um preposto que vai, não é o candidato que vai dar o dinheiro para as pessoas, é um representante dele que chega e oferece o dinheiro.

            Eu, como sou um candidato “duro”, sou um Senador da parte dos “duros”, dos que não têm dinheiro para fazer campanha; a minha campanha é feita no gogó e no mocotó, como eu falo lá em Roraima e como eu faço realmente. Eu ando muito, e o pessoal anda muito também. Então, eu conversei com um padre, lá em Roraima, e com um pastor, porque eu queria fazer uma proposta.

            Eu me meti na política na campanha em que fui eleito Senador. Eu sempre tive posição política definida. Meu pai foi Deputado Federal por dois mandatos, mas eu fiquei trinta anos no meu Estado trabalhando, sem me meter em candidatura política, mas sempre com posição bem definida e bem clara.

            Mas eu resolvi conversar com o padre e com o pastor porque eu queria fazer a seguinte proposta para os eleitores: “Quando alguém for te oferecer um dinheiro, for dizer que vai te dar um dinheiro...”. Porque o indivíduo que está sem ter o que comer em casa...

            A política me ensinou outra coisa também. Em Roraima, eu trabalhava como médico no hospital, tinha contato com muitas pessoas, mas não costumava ir às casas das pessoas mais pobres perto de meio-dia ou na hora da janta. Com a política, eu comecei a fazer isso, parei de dar plantão - dei plantão até o último dia antes de sair em campanha - e comecei a ir à casa das pessoas nesses horários. Então, eu vi que, perto da minha casa, a vinte quilômetros da minha casa, a dez quilômetros da minha casa, havia pessoas que não tinham o que comer.

            Eu também resolvi entrar na política porque um dia, num plantão, tive uma experiência que me marcou. Uns dois anos antes de eu tomar a decisão de ser candidato, em plantão no hospital - eu dava plantão às segundas-feiras, 24 horas, de segunda para terça -, vivi algo que me marcou.

            Havia várias pessoas com câncer na enfermaria - eu gosto de hospital -, e aquelas pessoas estavam sentindo dor porque não havia um remédio chamado Dolantina - a Dolantina é uma morfina que se usava para dor. Não havia no hospital esse remédio. A gente tinha de consegui-lo em outros hospitais, pedir em hospital particular para resolver o problema. Como a Secretaria é bem pertinho do hospital, nesse dia eu saí e fui conversar com o Secretário. Disse: “Ô rapaz, como é que pode faltar Dolantina? Tem um monte de gente com câncer, com dor no hospital, morrendo, fora de possibilidades terapêuticas, pessoas para as quais já não há mais esperança de cura, pessoas que só querem aliviar sua dor”. Ele disse: “Não, mas eu comprei dez mil ampolas de Dolantina na última licitação”. Eu disse: “Eu quero ver isso aqui”. Ele pegou e me mostrou o papel que mostrava que o medicamento tinha realmente sido comprado e que tinha dado entrada no almoxarifado uns três meses antes, quatro meses. Então, quando vi que as pessoas estavam roubando dinheiro de remédio para dor, eu decidi que tinha de tomar uma posição política. Essa foi uma das razões que me fizeram entrar na política lá no meu Estado.

            Voltando para a compra do voto. Falei com um padre e com um pastor - sou católico - e perguntei se era pecado a gente falar desta forma que eu falei, e falo, para os meus eleitores em Roraima: “Quando alguém for te oferecer dinheiro em troca do teu voto... Sei que tu podes estar em dificuldade, sem ter o que comer na tua casa. Então, tu tens que pegar aquele dinheiro porque ele não está te dando dinheiro, ele está devolvendo o dinheiro que roubou de ti, esse dinheiro é teu. Agora, quando pegar o dinheiro, olha bem o número do candidato e não vota nele, porque ele vai roubar muito mais por causa disso”. Passei a dizer isso na minha campanha.

            Ainda agora o Padre Henrique lembrou uma frase que os beneditinos usavam. É uma frase latina, é uma tese que não é muito justa, não é muito correta, mas que se justifica por causa do objetivo final. Ele usou uma frase latina, mas não estou me lembrando no momento qual é porque a primeira vez que a ouvi foi ainda agorinha, conversando com ele ali. 

            Então, essa lei nasceu no seio das pessoas, decorreu de iniciativa da OAB, da Conferência Nacional dos Bispos e da Associação dos Juízes para a Democracia. Aliás, foram essas mesmas entidades que começaram um outro movimento que está sendo agora lançado no plenário da Câmara dos Deputados - é a respeito dos fichas-sujas. Esse tipo de movimento, para ser aprovado nestas Casas, tem de partir da população mesmo. Grande número de pessoas aqui tem problemas envolvendo processos e não vai votar a favor de uma lei dessas, mas, como o povo começa a querer mostrar a sua força, essas leis podem passar e podem trazer mudanças. Exemplo disso é a Lei de Responsabilidade Fiscal, que trouxe mudanças e melhorou a gestão dos Municípios e dos Estados brasileiros.

            Gostaria de parabenizar mais uma vez o Senador Valadares pela iniciativa e reafirmar aos ouvintes da Rádio Senado e àqueles que assistem a esta sessão que temos de mudar as pessoas que elegemos, temos de eleger pessoas que pareçam com seus eleitores, pessoas que vivam do seu trabalho, que vivam de seus recursos.

            Não existe meio de eu entrar na política com um patrimônio determinado e multiplicar esse meu patrimônio, ficar rico. Era o que acontecia lá na minha terra: os caras entravam na política e ficavam ricos logo depois. Mas, felizmente, está havendo mudanças neste País, alguns corruptos já são presos neste País, respondem processos, e essas mudanças ocorrem dentro desta Casa e por pressão popular.

            Sr. Presidente, eu fiz uma coletânea baseada numa reportagem que aparecem em um texto do TSE. Gostaria que fosse dado como lido esse meu texto, que fosse parte do meu discurso, porque eu não quero mais prolongar esta sessão - já é quase meio-dia!

            Parabéns mais uma vez pela iniciativa e parabéns às pessoas que apoiam essas iniciativas. Continuem fazendo isso, porque assim a gente consegue mudar este País.

            Muito obrigado. (Palmas.)

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, DISCURSO DO SR. SENADOR AUGUSTO BOTELHO.

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            O SR. AUGUSTO BOTELHO (Bloco/PT - RR. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, fico feliz de poder comemorar hoje daqui da tribuna do Senado este dia, 28 de setembro, como um dia que se transformou num divisor de águas na luta contra a corrupção eleitoral no Brasil, marcando um momento importante para a democracia brasileira.

            Foi nessa data, há exatos dez anos, que foi sancionada a Lei nº 9.840/99, norma que promoveu alterações na legislação eleitoral para combater a compra de votos e o uso da máquina administrativa durante o período eleitoral.

            Além de introduzir os valores da ética e do equilíbrio nos costumes eleitorais brasileiros, valores que se incorporaram à nossa realidade, quero destacar que essa lei foi possível devido a uma grande mobilização popular que reuniu diversas entidades civis.

            Em 1997,a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Associação de Juízes para a Democracia foram às ruas e conseguiram recolher mais de um milhão de assinaturas de brasileiros e brasileiras para que o texto fosse apresentado ao Congresso Nacional. 

            A idéia dos encabeçadores do movimento era fechar o cerco contra políticos que enganavam os eleitores para conseguir se eleger. Isso porque antes dessa norma a legislação eleitoral não punia a compra de votos.

            O dispositivo fez duas alterações pontuais na Lei nº 9.504/97: acrescentou o artigo 41-A, que pune com a perda do registro (ou do diploma) e multa de até R$53,2 mil os candidatos que comprarem votos, e alterou o parágrafo 5º do artigo 73, punindo candidatos que se beneficiem com o uso da máquina administrativa, prevendo a cassação e, novamente, a aplicação de multa - até R$ 106, 4 mil.

            Segundo dados do Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE), de 2000 a 2008, mais de 660 políticos, em todo o Brasil, perderam seus mandatos com base nesses dois dispositivos adicionados pela Lei 9.840/99 à Lei Eleitoral. Apenas em 2008, segundo relatório do movimento, foram 238 prefeitos cassados.

            De acordo com a artigo 41-A, a compra de votos se caracteriza quando desde o registro de sua candidatura até o dia da eleição, para tentar garantir o voto do eleitor, o candidato oferece em troca dinheiro ou qualquer “bem ou vantagem pessoal de qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública”. A pena prevista na lei é de multa de até R$ 53,2 mil, e cassação do registro ou do diploma.

            O art. 73, §5º da Lei nº 9.504/97 já proibia, com ressalvas, que durante o período eleitoral agentes públicos fizessem transferência voluntária de recursos, promovessem publicidade institucional, e fizessem pronunciamento em cadeia de rádio e televisão fora do horário eleitoral gratuito.

            Com a Lei nº 9.840, passaram a ser passíveis de punição, também, candidatos que se beneficiam destas práticas, mesmo não sendo agentes públicos. A norma passou a punir com cassação e multa de até R$106,4 mil, as condutas previstas nos incisos I, II, III, IV do artigo 73: ceder ou usar para fins eleitorais bens móveis ou imóveis pertencentes à administração direta ou indireta da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Territórios e dos Municípios, ressalvada a realização de convenção partidária; usar materiais ou serviços público; ceder ou usar servidor público em comitês de campanha eleitoral durante o horário de expediente normal, salvo se o servidor ou empregado estiver licenciado; fazer ou permitir uso eleitoral de distribuição gratuita de bens e serviços de caráter social custeados ou subvencionados pelo Poder Público.

            Era o que eu tinha a dizer.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 30/09/2009 - Página 47654