Discurso durante a 175ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Associação aos votos de pesar pelo falecimento da cantora Mercedes Sosa. Manifestação sobre a conquista do Brasil em sediar as Olimpíadas de 2016. (como Líder)

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM. ESPORTE.:
  • Associação aos votos de pesar pelo falecimento da cantora Mercedes Sosa. Manifestação sobre a conquista do Brasil em sediar as Olimpíadas de 2016. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 06/10/2009 - Página 49325
Assunto
Outros > HOMENAGEM. ESPORTE.
Indexação
  • HOMENAGEM POSTUMA, CANTOR, PAIS ESTRANGEIRO, ARGENTINA, IMPORTANCIA, CONTRIBUIÇÃO, ARTES, CULTURA, AMERICA LATINA.
  • SAUDAÇÃO, ESCOLHA, BRASIL, SEDE, OLIMPIADAS, ANALISE, PACTO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, GOVERNO, SUCESSÃO, IMPORTANCIA, PLANEJAMENTO, LONGO PRAZO, SUPERIORIDADE, INVESTIMENTO, GARANTIA, AUSENCIA, AUMENTO, DEFICIT, SETOR PUBLICO, PREVENÇÃO, DESVIO, VERBA, SETOR, POLITICA SOCIAL, RETORNO, INFLAÇÃO.
  • SUGESTÃO, PACTO, AUMENTO, NUMERO, MEDALHA, ATLETAS, BRASIL, CONCLAMAÇÃO, INVESTIMENTO, ESPORTE, IDENTIFICAÇÃO, AMBITO, EDUCAÇÃO BASICA, COBRANÇA, PRIORIDADE, APLICAÇÃO DE RECURSOS, ESCOLA PUBLICA, EXPECTATIVA, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), JULGAMENTO, AÇÃO DE INCONSTITUCIONALIDADE, APLICAÇÃO, PISO SALARIAL, PROFESSOR.
  • PROPOSTA, DEFINIÇÃO, PRAZO, OLIMPIADAS, ERRADICAÇÃO, ANALFABETISMO, MELHORIA, QUALIDADE, EDUCAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO, SAUDE PUBLICA, SEGURANÇA PUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pela Liderança. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, antes mesmo de minha fala, quero me associar ao Senador Eduardo Suplicy com referência à cantora Mercedes Sosa.

            Orgulho-me de ter sido o veículo que a trouxe aqui - veículo no sentido político-administrativo. Quando eu era Reitor da Universidade de Brasília e promovi aqui um grande Festival Latino-americano de Arte e Cultura, Mercedes Sosa foi uma das grandes figuras presentes. Sua perda, realmente, foi muito grande para a arte e a cultura do nosso continente.

            Sr. Presidente, venho a esta tribuna para falar de um assunto que está encantando todos os brasileiros, desde o final desta última semana, que é a conquista, pelo Brasil, do direito a sediar as Olimpíadas de 2016.

            Não podemos deixar de começar parabenizando aqueles que fizeram isso possível. Eu sei como deve ter sido difícil vencer os países que disputaram, apesar de eles terem contra eles o fato de que foram sede dos jogos olímpicos, em passado muito recente, tanto a Espanha quanto os Estados Unidos. Ao mesmo tempo, quero dizer que, como brasileiro, fiquei orgulhoso de ver o desempenho do Presidente Lula, do Nuzman, do Governador Cabral e de centenas de outras pessoas que fizeram isso possível. Desejo parabenizá-los por essa última conquista.

            Mas eu vim aqui olhando o futuro. E o futuro para mim, Sr. Presidente, é lembrar que, na hora em que o Brasil quer, ele consegue fazer um pacto que atravessa governos. O que nós conseguimos com as Olimpíadas de 2016 foi construir um pacto que vai envolver três governos diferentes: o governo do Presidente Lula, do seu sucessor e do sucessor do seu sucessor. Nós conseguimos um pacto que atravessa governos, o que é muito raro no Brasil, em que cada governo só pensa em si e a oposição só pensa contra o governo atual. E aí se uniram o Governador do PMDB, o Presidente do PT, a sociedade inteira e fizemos um pacto para que o Brasil mostre ao mundo que, aqui, a gente tem sucessão de presidentes, de governos, mas o País é um só, o País continua.

            O País se dispôs, através dos seus líderes, a gastar R$26 bilhões - é o que se prevê -, para realizar essas Olimpíadas. São governos se sucedendo com o mesmo objetivo.

            Diante disso, quando eu soube da notícia, eu pensei: e por que não fazermos outros pactos? Por que nós conseguimos fazer um pacto para uma grande festa, que vai ser a realização das Olimpíadas no Rio de Janeiro, e não fazemos outros pactos além da festa? Quando eu digo festa, não é no sentido negativo. É a festa que nos traz auto-estima, orgulho. Vai ser muito bom para o Rio e vai ser muito bom para o Brasil. Mas por que não fazemos outros pactos também?

            Por exemplo, o primeiro pacto diz respeito ainda às Olimpíadas. E são dois pactos na verdade. Um deles, dizendo respeito às Olimpíadas, é garantir ao povo brasileiro que nós vamos realizar essas Olimpíadas sem aumentar o déficit público, sem deixar que volte a inflação e sem tirar dinheiro de outros setores importantes da sociedade e da economia brasileira para financiar os jogos olímpicos.

            Se as Olimpíadas vierem para o Brasil à custa de uma redução nos gastos com educação, saúde, segurança e transporte urbano das outras cidades que não o Rio de Janeiro, essas Olimpíadas estarão enganando. Elas farão parte do circo que os governos às vezes utilizam para manter o povo satisfeito naquele momento. Mas nós não queremos uma olimpíada que seja apenas circo, como os romanos já faziam há mais de dois mil anos, para manterem o povo quieto, calado, contente, iludido. Nós queremos uma olimpíada que vá além da festa, que se transforme num evento do qual ninguém se arrependa. E haverá, sim, arrependimento se o financiamento das Olimpíadas for feito à custa do aumento do déficit público, o que trará inflação inevitavelmente, ou à custa de sacrifício de outros setores.

            O Governo tem que encontrar uma engenharia financeira para que esses R$26 bilhões, que serão gastos no Rio de Janeiro, não tragam sacrifícios para setores essenciais da nossa sociedade nem tragam de volta a inflação.

            O segundo pacto - e peço um pouco de paciência, já que estamos sozinhos aqui hoje nesta tarde - que ainda diz respeito às Olimpíadas é o pacto para que não sejamos apenas a sede, mas sejamos protagonistas das Olimpíadas em número de medalhas.

            Eu fui olhar os outros países. Todos os outros países que sediaram Olimpíadas passadas tiveram um bom número de medalhas em proporção aos seus habitantes. O Brasil é o que tem menos. Nós não podemos chegar ao final das Olimpíadas orgulhosos da festa, do circo, mas não orgulhosos da sua substância, que é o número de medalhas. E, para ganharmos medalhas, temos que começar agora a identificar os talentos e a investir nesses talentos. O Governo que foi capaz de liderar o Brasil para sediar o evento tem que ser capaz de liderar o Brasil para trazer as medalhas.

            E eu temo que isso ainda não faça parte das preocupações. Estou trazendo aqui uma sugestão. E as medalhas só virão se identificarmos talentos e investirmos nele. E o lugar de identificar e até de investir, no primeiro momento, é a escola.

            O que vão dizer lá fora quando souberem que o País que é capaz de sediar as Olimpíadas não tem quadras esportivas nas suas escolas? Porque é rara a escola pública que tem quadra esportiva. O que vão dizer quando souberem que não tendo quadras esportivas não identificamos talentos e não temos medalhas? E teremos feito uma grande festa para os outros.Não fizemos uma grande festa para nós. A festa será para nós se, além da festa, do circo, a gente fizer uma festa da substância, das medalhas de ouro que aqui fiquem depois que as Olimpíadas terminem.

            Esses são dois pactos relacionados às Olimpíadas. Os outros pactos não estão relacionados às Olimpíadas, mas aproveitando as Olimpíadas, aproveitando essa força que o Brasil demonstrou no cenário internacional, a liderança que demonstrou o Presidente Lula, para a gente fazer um pacto, como, de certa maneira, o Senador Suplicy mencionou aqui, para que até a data das Olimpíadas não haja adulto que não saiba ler no Brasil. Até porque nós somos um dos raros países do mundo que têm na bandeira um texto escrito. Portanto, nós somos um dos raros países do mundo em que nossos adultos, muitos deles, não são capazes de reconhecer plenamente a própria bandeira.

            Uma pessoa que não sabe ler pensa que verde, amarela e azul é a bandeira, mas a bandeira é verde, amarela e azul, com aquelas formas e com o lema “Ordem e Progresso”.

            Imaginem, lá fora, a mídia internacional dizendo, no dia da abertura, com uma imensa bandeira do Brasil tremulando: esse país que é capaz de dar esta festa tem 14 milhões de adultos que não reconhecem a sua bandeira. Isso porque a bandeira brasileira tem um...

(Interrupção do som.)

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - (...) porque a bandeira brasileira tem um lema escrito e esse lema não é compreendido por todos.

            Sete anos são mais do que suficientes, Senador João Pedro, para erradicarmos o analfabetismo no Brasil. Mais do que suficientes! Em quatro anos, se quisermos, conseguimos fazer isso. E, no primeiro ano do Governo Lula, estava-se caminhando nessa direção. Havia uma meta de quatro anos, havia um programa de mobilização social. Esse programa foi interrompido. Manteve-se o mesmo nome, “Brasil Alfabetizado”, mas se deixou de usar a meta porque se passou a acreditar que não existe meta de erradicar analfabetismo, existe apenas um processo de alfabetização que já temos desde D. Pedro II.

            Vamos fazer essa meta! Por que o Presidente Lula, que foi capaz de convencer os cem delegados do mundo inteiro a votarem no Brasil, não é capaz de convencer os brasileiros a cada um alfabetizar um conhecido que não saiba ler? A dar dinheiro, se for preciso, para contratar professores no seu bairro, na sua quadra, na sua rua, no seu prédio! Por que ele não é capaz de liderar a gente nessa campanha? É mais simples do que trazer as Olimpíadas e mais permanente do que a festa das Olimpíadas.

            Esse é o pacto que eu gostaria de ver o Presidente Lula liderando. E vou dizer mais: se ele não fizer, com o seu carisma e com a sua força, será difícil que outro consiga fazer esse pacto.

            Outro pacto é não parar na alfabetização. Vamos fazer um pacto para que o piso salarial seja implantado neste País. O Presidente Lula sancionou o projeto. Chamemos os 11 Ministros do Supremo e digamos para eles: este País fez um pacto com 200 países do mundo. Façamos um pacto com os 11 juízes do Supremo para que eles votem finalmente essa proposta indecente de dizer que o piso salarial é inconstitucional. Eu considero indecente um Governador - e foram quatro ou cinco - pedir a inconstitucionalidade de um piso de R$950,00 por mês, quando, na semana passada, aumentamos o teto salarial dos juízes. Por que não fazemos um pacto com os Ministros do Supremo para que finalmente se diga que este País vai pagar R$950,00? Novecentos e cinquenta, gente! Não estou dizendo nove mil e quinhentos, que deveria ser o salário de um professor neste País. Mas R$950,00!

            Façamos um pacto pelo piso salarial. Vamos fazer com que os professores comemorem as Olimpíadas não porque ela será aqui, mas porque ela lhes trouxe algo permanente. Não apenas comemorar o circo, mas comemorar também a substância desse pacto pelo salário dos professores.

            Agora, não fiquemos aí. É preciso que os professores se dediquem. É preciso que as escolas sejam bonitas. É preciso que as escolas sejam equipadas. É preciso que as escolas sejam em horário integral, porque é mentira dizer que uma coisa é escola se não for em horário integral. É falsa a escola; é uma quase escola; é semiescola. Parece escola, mas não é escola, se a criança ficar apenas poucas horas dentro dela.

            Façamos um pacto. Não fizemos um pacto para realizar as Olimpíadas, um pacto de três Governos? Isto é motivo de tanto orgulho quanto ter aqui a sede, ou seja, saber que este País é maior que seus Governos; que um Presidente é capaz de conquistar, fazer esforço para trazer aqui uma sede e que ele possivelmente não estará como Presidente na época; que o seguinte vai ter que cumprir e que outro vai ter também que cumprir. Façamos isso pela educação das nossas crianças. Façamos um pacto para que não haja fila nos hospitais quando chegar 2016, data das Olimpíadas. Façamos um pacto neste País para que possamos dizer que, no Brasil, não apenas somos capazes de realizar a grande festa das Olimpíadas, mas somos capazes também de transformar o nosso País.

            Imaginem se D. Pedro II tivesse trazido as Olimpíadas para cá, se naquela época elas já existissem outra vez, e aqui houvesse escravidão. Imaginem a gente fazer as Olimpíadas em um país onde houvesse escravos! É tão diferente assim hoje, quando a gente vê uma elite privilegiada e uma massa excluída recebendo pão e agora recebendo circo, mas sem ter a substância da transformação nacional?

            Senador João Pedro, a minha proposta, e aí encerro... Vai concluir o tempo e peço um minuto.

            O SR. PRESIDENTE (João Pedro. Bloco/PT - AM) - Terá dois… Quinze minutos.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Vamos fazer um pacto olímpico neste País, mas olímpico não do esporte apenas; olímpico na vontade nacional, olímpico no compromisso de um, dois, três, quatro, cinco, dez governos daqui para frente levarem adiante projetos para que não tenhamos nenhuma criança fora de escola de qualidade em horário integral. Façamos um pacto para que, dentro de alguns anos, o filho do trabalhador estude na mesma escola do filho do seu patrão; o filho dos eleitos estude na mesma escola do filho dos seus eleitores; os filhos dos pobres na mesma escola dos filhos dos ricos. Esse é o pacto olímpico que precisamos fazer. Esse é o pacto olímpico que o Presidente Lula precisa fazer para coroar o seu período no Governo. Se foi capaz de trazer a sede para cá, por que não é capaz de transformar isso aqui, de fazer disso aqui a sede de uma grande transformação social? Fazer do Brasil sede não só das Olimpíadas do esporte, mas sede das olimpíadas da justiça social, sede das olimpíadas da educação de qualidade e igual para todos, sede da olimpíada de uma nação que se orgulhe não apenas de ser sede das Olimpíadas - o que é uma razão de orgulho -, mas de um país que se orgulhe do próprio país, um país onde todos saibam ler a sua bandeira, onde todos tenham oportunidades iguais, onde não haja fila nos hospitais, onde se possa andar tranquilamente nas ruas, em qualquer época do dia, do ano, com ou sem Olimpíadas.

            Fica aqui a sugestão de que o Presidente Lula e nós todos que somos líderes neste País façamos um pacto, um pacto olímpico pelo Brasil.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 06/10/2009 - Página 49325