Discurso durante a 178ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a classificação do Brasil em septuagésimo quinto lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), sobretudo no que se refere à educação infantil.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
EDUCAÇÃO.:
  • Preocupação com a classificação do Brasil em septuagésimo quinto lugar no Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), sobretudo no que se refere à educação infantil.
Aparteantes
Osvaldo Sobrinho, Rosalba Ciarlini.
Publicação
Publicação no DSF de 09/10/2009 - Página 50707
Assunto
Outros > EDUCAÇÃO.
Indexação
  • RECONHECIMENTO, COMPETENCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, AVALIAÇÃO, CRISE, ECONOMIA INTERNACIONAL, MEDIDA DE EMERGENCIA, INCENTIVO, CONSUMO, ECONOMIA POPULAR, QUESTIONAMENTO, PARALISAÇÃO, DESENVOLVIMENTO SOCIAL, PAIS, REGISTRO, DADOS, RELATORIO, ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS (ONU), INFERIORIDADE, INDICE, POSIÇÃO, BRASIL, ORADOR, CONCENTRAÇÃO, PROBLEMA, EDUCAÇÃO PRE-ESCOLAR, ANALFABETISMO, ADULTO, CONCLAMAÇÃO, PROVIDENCIA, GOVERNO.
  • DEFESA, APROVEITAMENTO, OPORTUNIDADE, OLIMPIADAS, CAMPEONATO MUNDIAL, FUTEBOL, OCORRENCIA, BRASIL, INVESTIMENTO, ERRADICAÇÃO, ANALFABETISMO, COBRANÇA, MELHORIA, DISTRIBUIÇÃO, SERVIÇOS PUBLICOS, EDUCAÇÃO, SAUDE, TRANSPORTE.
  • AVALIAÇÃO, NEGLIGENCIA, IMPRENSA, SOCIEDADE CIVIL, GOVERNO, GRAVIDADE, AUMENTO, ANALFABETISMO, COMPARAÇÃO, FRAUDE, EXAME, AMBITO NACIONAL, ENSINO MEDIO, REDUÇÃO, QUALIDADE, ENSINO, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

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            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado pela gentileza, Senador Mão Santa.

            Srªs e Srs Senadores, o Presidente da República, o Presidente Lula, quando falou há alguns meses que essa crise seria uma “marolinha”, ninguém acreditou. De fato, a impressão que se tem, tudo indica que a crise não será como se esperava. E teremos de reconhecer: em grande parte, graças a uma série de políticas do tipo que muitos achavam antiquada, a chamada keynesiana, que manteve a demanda, sobretudo pela base, Senador Osvaldo Sobrinho, o que dinamizou a economia. Nesse ponto, temos que respeitar o Presidente Lula pela sua visão e, ao mesmo tempo, pela sua ação.

            Agora, hoje eu vim falar - não sei se existe - numa marolona. Existe uma marolona no Brasil, que é o social.

            De fato, na economia, retomamos o crescimento, mas no social estagnamos. Estagnamos como mostram os indicadores das Nações Unidas, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano). O Brasil não saiu da mesma posição, a vergonhosa 75ª posição. Ou seja, 74 países estão na frente do Brasil.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Argentina, Chile, Uruguai, todos. Nós só ganhamos do Paraguai, do Bispo reprodutor.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Mas, veja bem, 74 países é um número muito grande. Os que ficam para trás de nós são países diminutos, pobres, da África. No mais, estamos atrás. E mais grave: nós estamos atrás sem mudar de posição, sem melhorar, porque se estivéssemos hoje em 75º, mas da outra vez estivéssemos em 80º, poderíamos dizer: “subimos cinco”. Não. Nós até subimos ligeiramente o índice, mas os outros subiram mais do que nós. Coisa que venho dizendo aqui, Senadora Rosalba Ciarlini, há muito tempo: o Brasil até melhora, mas menos do que os outros; até melhora, mas menos do que as exigências de um mundo moderno exigem.

            Nós temos uma marolona no social, mesmo que na economia tenha sido uma marolinha. E todos os indicadores e estudos mostram que o problema brasileiro está, sobretudo, no que se refere à educação das nossas crianças. Não está nas universidades; não está no ensino técnico; está no ensino de base, na educação de base. Primeiro, porque entra na medição do índice a educação de base; e, segundo, porque com a educação de base, como a Senadora Rosalba Ciarlini sempre diz, os outros indicadores podem melhorar: a saúde melhora com a educação - todo mundo sabe disso -, a renda melhora com a educação - todo mundo sabe disso. São dois indicadores fundamentais que entram na formação desse Índice de Desenvolvimento Humano. A redução do analfabetismo entra na melhora do índice, e aí é que vem a tragédia nossa. De 2007 para 2008, é surpreendente: aumentou o número de analfabetos adultos no Brasil. Aumentou em 111 mil o número de analfabetos.

            Gente, não estou falando que diminuiu pouco, estou falando que aumentou o número de brasileiros adultos que, quando veem a Bandeira do Brasil, não são capazes de reconhecer, porque não sabem que está escrito “Ordem e Progresso”. Eles vêem o verde, o amarelo e o azul e pensam que já é a bandeira.

            O Sr. Osvaldo Sobrinho (PTB - MT) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Um minutinho só, Senador.

            Então, temos uma marolona no social. Mas, independente desse aumento de analfabetos de 2007 para 2008, se a gente tomasse o número, em 2007, de alfabetizados, que foi de 255 mil, levaríamos 56 anos para eliminar o analfabetismo, supondo que não aumente, como aumentou de 2007 para 2008. O que diminuiu de 2006 para 2007 foram 255 mil. Eram 14,391 milhões e diminuiu para 14,136 milhões. Hoje, estamos em 14,247 milhões. Acima de 14 milhões. Nesse ponto, somos quase que um recorde, talvez tirando a Índia e a China, porque têm sete vezes mais população do que nós.

         Como é que pode um País com o desenvolvimento brasileiro, um País que passa por uma crise econômica como se fosse uma simples marolinha explicar ao mundo inteiro que o número de analfabetos aumentou? Imagino no dia da abertura da Copa, em 2016, os jornais do mundo dizendo: “aquela bandeira imensa do Brasil tem um texto escrito ‘Ordem e Progresso’”...

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Em 2014. Em 2016 serão as Olimpíadas.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Olimpíadas, desculpe. Tanto na Copa quanto nas Olimpíadas, 2014 e 2016, eu imagino o mundo inteiro dizendo: “aquela Bandeira do Brasil tem algo que as outras bandeiras não têm, porque raras bandeiras têm texto escrito”. E dizer: “no Brasil, 14 milhões não são capazes de reconhecer a própria bandeira, porque não sabem ler o que está escrito nela”.

            Isso, Sr. Presidente, exige de nós aproveitar o momento de Olimpíadas e de Copa, porque foram conquistas grandes do Governo Lula e de outras entidades, como CBF e o COB, e fazer um pacto também para erradicar o analfabetismo. Fazer um pacto também para aumentar o número de pessoas que concluem a educação. Porque a razão pela qual o número de analfabetos não reduz - e até aumenta, como neste ano - não é a falta apenas de programas de alfabetização, mas, sim, porque a torneirinha que fabrica analfabetos adultos continua aberta, a torneirinha da escola básica sem qualidade capaz de preparar os alunos para saberem ler.

            Então, estamos alfabetizando alguns aqui e jogando mais analfabetos adultos aqui. Temos que fechar essa torneirinha e, ao mesmo tempo, alfabetizar mais aqui. Se fechássemos a torneirinha, pelo menos, a biologia resolvia o problema. Mas a torneirinha aberta, produzindo mais adultos que não sabem ler, é uma tragédia nacional, é uma marolona que este País precisa enfrentar o mais rápido possível. E não estamos enfrentando, Senador Valdir Raupp, como deveríamos.

            A renda melhorou, mas não melhorou a educação. A desigualdade na distribuição especificamente da renda até melhorou, mas não melhorou a distribuição na saúde, não melhorou a distribuição na educação, não melhorou a distribuição na segurança, não melhorou a distribuição no transporte, e a gente não quer cuidar disso.

            Eu passo a palavra ao Senador Osvaldo Sobrinho, que pediu primeiro o aparte.

            O Sr. Osvaldo Sobrinho (PTB - MT) - Senador Cristovam Buarque, eu sei que é um crime, com 20 minutos apenas para V. Exª falar, pedir um aparte.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - É um prazer ouvi-lo.

            O Sr. Osvaldo Sobrinho (PTB - MT) - Sei que atrapalha o seu discurso, mas é que, quando V. Exª fala sobre esse tema, na verdade comove a todos nós, porque é um tema ao qual nós dedicamos a nossa vida, ao tentar ajudar a resolver. E, portanto, quando aqui se fala, principalmente nessas lidas sociais que temos, é bom lembrar... E V. Exª lembrou bem a figura da torneira: quando se fecha a torneira para recursos em educação, abre-se uma torneira enorme para a prostituição, para a miséria, para o analfabetismo, para a desgraça social, para abrir mais cadeias, para a marginalização. Lastimavelmente, ainda não se entendeu, neste País, que a educação é a única - e não tem outra - solução que nós temos para sairmos dessa situação que aí está. É necessário se pensar em educação cedo, à tarde e à noite. Investir em educação! Está provado. Não é preciso mais “descobrir a roda”. O mundo que investiu em educação se salvou, melhorou, virou potência, fez tecnologia, fez riqueza, distribuiu riquezas e o seu povo ficou mais feliz. Se não fizer isso - e V. Exª insiste nesse tema todos os dias aqui e me orgulha muito por isso -, se não se fizer isso em educação, perderemos mais uma grande oportunidade grande e toda uma geração fica perdida. Portanto, vai aumentar o analfabetismo? Vai, em nível municipal, estadual e nacional, porque, na verdade, os recursos para a educação estão sendo poucos. Mas podem aumentar, sim. Tirem de outras coisas. O Estado tem de voltar à sua função principal: segurança, saúde e educação. É isso que se precisa fazer. Senador Cristovam Buarque, congratulo-me com V. Exª. Aliás, ouvi-lo é sempre um prazer renovado, é uma alegria, porque passamos a sentir que nem tudo está perdido e que as coisas podem melhorar. Muito obrigado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador, muito obrigado mesmo.

            Senadora Rosalba.

            A Srª Rosalba Ciarlini (DEM - RN) - Senador Cristovam, também quero parabenizá-lo por ir à tribuna mais uma vez - o senhor tem sido de uma persistência que entusiasma a todos nós e impressiona-nos - colocar a questão da educação como prioridade, como necessidade maior no nosso País. Os dados que o senhor nos traz hoje comprovam, dão um certificado, podemos dizer, não um bom certificado, de que o sistema educacional realmente não está conseguindo melhorar a vida das nossas pessoas. Vou lhe dizer por quê: porque não tem a prioridade, o investimento necessário no começo, como sempre tenho colocado. Se não oferecermos a Educação Infantil para todas as crianças, não apenas para aquelas que são privilegiadas, mas para todas as crianças, para as mais pobres e as mais carentes, e qualidade no Ensino Fundamental, se não tivermos essa prioridade, o número de analfabetos vai continuar aumentando. O que justifica, de um ano para outro, ter aumentado o número de analfabetos? A única coisa que justifica é que, infelizmente, as escolas não estão conseguindo fazer com que todos os brasileiros, todas as nossas crianças, possam avançar pelos caminhos da educação. É necessário que isso chegue ao Ministério da Educação, aos Secretários Estaduais e Municipais para que eles façam uma reflexão. O Rio Grande do Norte, o meu Estado, continua tendo um déficit imenso na área educacional: não conseguimos reduzir o analfabetismo e, quanto à qualidade de ensino, estamos, infelizmente, entre os últimos colocados. Isso é muito triste, mas é tratando desse problema, colocando o dedo na ferida, dando o nosso grito, que as questões tratadas na educação serão realmente priorizadas. Acima de qualquer assunto neste País deveríamos ter a educação, porque é pelo caminho da educação que um povo realmente pode se libertar da fome, do desemprego, da falta de avanços tecnológicos, enfim, buscar o desenvolvimento e a justiça social.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigada, Senadora.

            Eu quero concluir, Senador Mão Santa, dizendo que não podemos deixar passar em branco essa crise mostrada nos indicadores das Nações Unidas.

            O Presidente da República já deveria ter convocado todos os seus Ministros para discutir o que acontece que, ao longo dos oito anos do seu Governo, o Brasil não sai da mesma posição. O que acontece que ele consegue fazer de uma crise econômica uma marolinha e do social, uma tempestade, um tsunami, e passa como se não tivesse acontecendo? Se o Produto Interno Bruto caísse um ponto, este País pegava fogo. O índice de analfabetismo, o número de analfabetos aumenta e este País não considera isso uma crise?

            Sr. Presidente, o Senado precisa despertar para essa realidade, e, ao mesmo tempo, nós precisamos perceber que alguma ação o Brasil precisa tomar rapidamente.

            Eu concluo, Sr. Presidente, falando de um tema que tem tomado conta dos jornais nos últimos dias, que é a chamada fraude do Enem. Mas, para chamar a atenção, Senador Arthur Virgílio, de uma fraude que não estão vendo. É que, mesmo que não houvesse essa fraude, mesmo que ela nem acontecesse, aqueles que estão sendo aprovados no Enem estão sendo aprovados com notas insuficientes para que possam enfrentar a realidade do século XX.

            Nós temos uma fraude maior do que a fraude: é a fraude da realidade, da péssima educação que nós temos no nosso País. O Brasil está jogando para baixo todas as exigências para quem entra na universidade, porque hoje há mais vagas do que candidatos, e aí estão entrando na universidade sem o preparo de cumprir um curso universitário, como deveria ser.

            Nós temos que parar com essa fraude visível - e não se pode nem colocar a culpa no Ministério, embora a pressa em fazer essas provas tenha gerado, sim, um risco maior de fraude -, mas temos que falar da verdadeira fraude, a fraude que não estão vendo, a fraude de um ensino que não é ensino suficiente, que é uma aparência de ensino, que é um ensino que não está colado, que não está sintonizado, que não está do tamanho de que o Brasil precisa para entrar no mundo moderno.

            Sr. Presidente, agradeço o tempo que me concedeu, mas eu não poderia deixar passar em branco esse relatório recente das Nações Unidas sobre o IDH brasileiro, que não sai de onde está há tanto tempo, em uma posição vergonhosa em comparação com países muito menores e mais pobres do que nós e chamar a atenção para o que todos os técnicos estão dizendo: o problema está na educação. O problema não está na renda. O problema não está nos outros indicadores. O índice que leva o IDH a cair é o índice educação. E a prova é que o analfabetismo aumenta; a prova é que, mesmo os exames para ver quem entra nas universidades toleram notas baixas e provas que não requerem a real dimensão de conhecimento que o mundo moderno exige.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - V. Exª coloca o Senado como o conselheiro do Poder Executivo. O Presidente Luiz Inácio devia reviver a história de Pedro II - sábio estadista, que governou este País por 49 anos, conceito mundial de cultura -, que deixava a coroa e o cetro para ouvir os Senadores da época. Na época, no passado, não havia Senador tão brilhante como o Professor Cristovam Buarque. V. Exª oferece ao Poder Executivo o rumo do sonho que todos nós temos por um Brasil educado, civilizado e melhorado.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senador.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 09/10/2009 - Página 50707