Discurso durante a 186ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com a violência registrada no Rio de Janeiro e defesa de um Estado forte atuando na prevenção, repressão do crime e do tráfico de drogas. Questionamentos sobre a chegada clandestina ao Brasil de armamentos pesados de uso privativo das Forças Armadas.

Autor
Renato Casagrande (PSB - Partido Socialista Brasileiro/ES)
Nome completo: José Renato Casagrande
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Preocupação com a violência registrada no Rio de Janeiro e defesa de um Estado forte atuando na prevenção, repressão do crime e do tráfico de drogas. Questionamentos sobre a chegada clandestina ao Brasil de armamentos pesados de uso privativo das Forças Armadas.
Aparteantes
Gerson Camata.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/2009 - Página 53939
Assunto
Outros > SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • APREENSÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, AUMENTO, VIOLENCIA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), DERRUBADA, HELICOPTERO, MORTE, POLICIAL MILITAR, FORMA, CRIMINOSO, TRAFICANTE, DESVALORIZAÇÃO, PODER PUBLICO.
  • DEFESA, NECESSIDADE, EFICACIA, ATUAÇÃO, ESTADO, PREVENÇÃO, REPRESSÃO, CRIME, TRAFICO, DROGA, MELHORIA, TRABALHO, POLICIAL, RESPEITO, ETICA, EXERCICIO, FUNÇÃO, APERFEIÇOAMENTO, TREINAMENTO, AUMENTO, EQUIPAMENTOS, GARANTIA, SEGURANÇA, POPULAÇÃO, RESGATE, CIDADANIA, ATENÇÃO, JUVENTUDE, COMUNIDADE, FAVELA, VITIMA, DISCRIMINAÇÃO, PRIORIDADE, COMBATE, IMPUNIDADE.
  • QUESTIONAMENTO, AUTORIDADE, PODER PUBLICO, CLANDESTINIDADE, ENTRADA, BRASIL, ARMAMENTO, USO PRIVATIVO, FORÇAS ARMADAS.
  • REGISTRO, DADOS, SECRETARIA DE SEGURANÇA PUBLICA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), CONFIRMAÇÃO, SUPERIORIDADE, NUMERO, MORTE, AUMENTO, PARTICIPAÇÃO, PESSOAS, TRAFICO, DROGA, CRIME ORGANIZADO.
  • ELOGIO, EMPENHO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, REDUÇÃO, POBREZA, BRASIL, DEFESA, NECESSIDADE, COMBATE, EXCESSO, CONCENTRAÇÃO DE RENDA, PAIS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Presidente, pela sua consideração na permuta que fizemos com a Senadora Ideli. Aos estudantes que estão aqui participando juntamente conosco, muito obrigado pela visita, bem como aos que estão nos acompanhando pela TV Senado.

            Senadora Ideli, a COP 15, a reunião da Dinamarca, no final do ano, vai ser uma reunião importante.

            Ontem, fiz um aparte à Senadora Serys, que anunciou que estaremos agora, neste final de semana, em uma reunião preparatória dos Parlamentares, do G8+5, que a instituição, a ONG, Globe International promove todo ano, para que levemos uma posição dos Parlamentos desses países aos Chefes de Estado e às comissões que vão representar os países na COP 15, pela importância da conferência que vai discutir mudanças climáticas no final do ano na Dinamarca. Então, é um assunto que interessa a todos nós. Depois, quero falar mais a respeito desse assunto.

            Mas, inicialmente, quero tratar de um assunto que começamos a abordar aqui ontem. Eu, pelo menos, comecei a tratar ontem, em um aparte que fiz ao Senador Jefferson Praia, que falava da PEC 300, e nós acabamos discutindo segurança pública.

            Os eventos e os fatos que nós tivemos, Senador Flávio Torres, no Rio de Janeiro, nos últimos dias, não são, na verdade, fatos que têm sido novidade no Brasil, não só no Rio de Janeiro. Ali de forma mais veemente, até porque a cena de um helicóptero pegando fogo e fazendo um pouso forçado, pegando fogo e matando policiais militares é uma cena que choca a todos nós. A imagem fala muito mais do que aquilo que, de fato, nos é informado por meio apenas do som. Então, com a imagem, nossos olhos conseguem captar muito mais os efeitos de um fato. E aquela cena marcou, porque nós estávamos vivendo, no Rio de Janeiro, ainda uma certa euforia com o anúncio da cidade como sede das Olimpíadas de 2016. E isso teve uma repercussão internacional muito forte também. Isso tudo acaba jogando luz nesse episódio. Mas voltamos, de fato, a conviver com essas imagens de violência, especialmente nas favelas, nas comunidades mais carentes do Rio de Janeiro, que abrigam milhares de famílias em comunidades pouco ou nada assistidas pelo Estado.

            Derrubar helicóptero e matar policiais mostram a que ponto chegou a criminalidade na sua atitude de enfrentar e desmoralizar o Poder Público. São cenas que revelam a esquizofrenia sociológica e antropológica de uma relação mal resolvida do Estado com as comunidades carentes do Rio de Janeiro e do Brasil, e que já se vão tornando banais, em que pese o lado impactante das imagens e sua repercussão externa.

            Qual seria o próximo passo dessa guerra que não é exclusivamente da Cidade do Rio, mas que se manifesta em batalhas isoladas, embora refletindo o mesmo contexto social de injustiça, nas regiões metropolitanas das grandes cidades e até em cidades de porte médio do País? Qual seria, então, esse próximo passo da criminalidade? A resposta poderia ser a constatação de que os governos, nos seus três níveis de Poder... É importante que reconheçamos que esta é uma falha dos três níveis de Poder Público do Estado brasileiro: não encontrar uma maneira de dizer, efetivamente, àquelas comunidades que a situação está mudando. Apesar dos investimentos feitos, as comunidades não sentem na pele, nas suas famílias as mudanças que são tão necessárias, de um volume tão grande e de uma intensidade tão grande.

            As obras de infraestrutura e as políticas sociais levadas às comunidades carentes pelo Governo Federal, em parceria com os governos locais, no curto prazo, podem passar a impressão de paliativo, muito embora, no longo prazo, todos nós estejamos consciente de que serão de extrema importância para a melhoria da qualidade de vida daquelas pessoas.

            Então, enquanto aqueles cidadãos esperam as obras serem concluídas, a bem do resgate da cidadania, o que devem fazer as autoridades?

            A resposta é levar o Estado àquela gente, mas um Estado forte, que passe segurança, que atue na repressão e na prevenção ao crime. Inicialmente, sufocando a ação de comandos do tráfico de drogas; depois, pela depuração da qualidade do trabalho do contingente policial, no que diz respeito a um comportamento ético no exercício da função e afastando os maus dos bons policiais. E, por fim, com melhoria do equipamento, com treinamento adequado para enfrentar e inibir estratégia de enfrentamento do tráfico.

            Uma terceira ação representaria atenção especial aos jovens dessas comunidades, que se sentem discriminados pelo asfalto e que passam a enxergar no traficante um ídolo, um anti-herói, a oportunidade de ascensão social que ele não vislumbra por uma série de razões, como discriminação social e racial, por razões geográficas, como o estigma que carregam por morarem em favela e em regiões mais carentes.

            Sabemos que é difícil convencer do contrário crianças e adolescentes, que veem o traficante desfilando na sua frente em carrões do último tipo e esbanjando o gasto com supérfluos, numa clara e ilusória demonstração de que o crime compensa - até porque o modelo atual é o de que quem mais consome é o mais feliz; e o que não consome é infeliz, é uma pessoa que não teve sucesso.

            O crime não compensa e não compensará, mas, para que ele de fato não possa compensar no futuro, é fundamental que se combata a impunidade. Isso é o que o governos precisam demonstrar, aumentando o risco da prática do crime, porque, do jeito que está hoje, a impunidade é tanta que o risco fica pequeno, com o movimento da sociedade organizada, com ações concretas, visando a amparar os milhares de meninos e meninas que vivem em situação de risco. 

            O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Permite V. Exª um aparte?

            O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Senador Gerson Camata, com muito prazer, concedo-lhe um aparte.

            O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - Senador Renato Casagrande, muito lúcida a visão que V. Exª expõe sobre o problema...

            O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Obrigado!

            O Sr. Gerson Camata (PMDB - ES) - ...da segurança, até com suas implicações do lado psicológico, do consumismo, porque, realmente, isso está enganando a juventude, que acaba indo por um desvio, até levado por fantasias, por ilusões. Mas acho que o problema da segurança é continental hoje, quer dizer, não é um problema do Brasil. Por exemplo, V. Exª se lembra quando o Brasil foi fazer aquele acordo com o Paraguai - estamos dando US$400 milhões a mais para o Paraguai -, sugeri ao Ministério das Relações Exteriores pedir ao Paraguai: “Vamos dar os US$400 milhões, mas controlem as armas que vocês estão mandando para o Brasil; controlem a maconha que vocês estão mandando para o Brasil; não persigam os “brasiguaios” que vocês estão perseguindo; tenham um gesto de retorno em relação àquilo que estamos fazendo.” Deram os 400 milhões para o Paraguai, não cobraram nada do Paraguai. Do Sr. Evo Morales, da Bolívia, a mesma coisa. Tomou as refinarias, o Brasil pagou, não pediu nada em troca. Ontem, prenderam um caminhão: 30 fuzis vindos da Bolívia e sendo mandados para o Brasil. Tinha que exigir que a polícia deles tomasse conta também e ajudasse a polícia brasileira. Com a Colômbia, assinamos, antes de ontem, um contrato US$640 milhões. Não pedimos nada à Colômbia. Então, veja V. Exª que há necessidade de uma ação continental. Cadê o Itamaraty, para impor a esses países que ajudem o Brasil? Um outro problema que vejo: estamos preocupados com o litoral. Agora é submarino, avião a jato para vigiar o litoral. Isso é do tempo colonial! O Brasil está sendo invadido pela fronteira seca. Temos que mudar a visão da segurança nacional e deslocar quartéis e Forças Armadas ao longo dessa fronteira seca. É por aí que o Brasil está sendo invadido. Outra coisa: R$34 bilhões para comprar submarino e avião?! O Brasil não corre ameaça, ninguém está ameaçando o Brasil. Agora, os brasileiros estão ameaçados de sequestro, de tiroteio, de morte, a todo momento. Por que o Governo não pega esses R$34 bilhões, em vez de comprar submarino e avião, e entrega para cada Estado R$1 bilhão, para melhorar a penitenciária, melhorar o serviço de inteligência, para fazer programas sociais nas favelas e nos morros? Aí, sim, daríamos segurança aos brasileiros, que estão ameaçados. Ninguém está ameaçando o Brasil, mas os brasileiros estão sendo ameaçados. Cumprimento V. Exª. Temos que ter uma visão continental desse problema, senão vamos patinar nele por muitos anos.

            O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Obrigado, Senador Camata. V. Exª apenas antecipou a outra parte do meu pronunciamento. Agradeço-lhe pelo enriquecimento.

            As autoridades federais, as estaduais e as municipais precisam responder como é que o armamento pesado, de guerra, fabricado em outros países ou de uso privativo das Forças Armadas, está chegando ao Brasil. Como é que esses armamentos estão chegando ao Brasil, passando pelas fronteiras, transitando pelas ruas das grandes cidades e subindo morros sem nenhuma interferência? Isso é inconcebível; caracterizaria conivência de integrantes do Poder Público. É o mesmo que subestimar a nossa capacidade de entender que só pela participação direta de alguns inescrupulosos agentes públicos se alcança sucesso nessas operações comerciais. Vai droga para lá e vem armamento pesado para cá, numa via de mão dupla.

            Os números da criminalidade são assustadores e caracterizam estado de guerra. As estatísticas do Instituto de Segurança Pública, órgão da Secretaria de Segurança Pública do Rio de Janeiro, mostram que, nos últimos quatro anos, desapareceram, mensalmente, em média 406 pessoas...

(Interrupção do som.)

            O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - ...perfazendo um total aproximado de quase 20 mil em quatro anos.

            De acordo com estudos de segurança pública, os autos de resistência alcançam algo próximo a 100 pessoas - traficantes/delinquentes - por mês ou quase cinco mil em quatro anos. São homens e mulheres, jovens e adultos que se envolveram numa verdadeira guerra com o narcotráfico e com o crime organizado.

            É missão difícil para o Poder Público reverter essa situação. São cerca de mil favelas na cidade do Rio de Janeiro; muitas delas convivendo com traficantes e milícias que rivalizam pelos pontos de distribuição de drogas e de outros serviços, que chegam a trocar tiros em plena luz do dia.

            O anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública revela que o total de gastos realizados pelos governos estaduais em segurança pública subiu de R$24 bilhões para R$33,5 bilhões de 2005 a 2008.

            V. Exª poderia me conceder mais dois minutos, Sr. Presidente? Encerro meu pronunciamento em dois minutos.

(Interrupção do som.)

            O SR. RENATO CASAGRANDE (Bloco/PSB - ES) - Essa é uma leitura que pode revelar que esses investimentos ainda são insuficientes para atingir seu objetivo - aumentaram, mas são insuficientes.

            Sr. Presidente, o Governo do Presidente Lula tem tomado medidas para reverter o quadro de pobreza no Brasil. Os programas sociais e as políticas públicas de inserção resultaram numa queda de 31,8%, em 2002, para 23,5%, em 2007, o percentual dos domicílios abaixo da linha da pobreza - reduziu esse percentual dos domicílios. Mas ainda lidamos com uma concentração excessiva de renda no País. Aproximadamente 60% da riqueza está nas mãos de 20% das pessoas mais ricas.

            São distorções que vão sendo enfrentadas, mas que revelam ainda uma dívida social enorme, que certamente está na raiz dos fatos ocorridos no Rio.

            Não gosto da abordagem que se faz sobre a violência no Brasil e sobre os interesses políticos e comerciais da realização da Copa do Mundo e dos jogos olímpicos. É bom que tenhamos essas duas atividades na nossa agenda nos próximos anos. Elas exigirão altos investimentos em infraestrutura para sua realização. Isso representará geração de renda e emprego.

            Mas o problema da violência no Rio e no Brasil é para antes e para depois dos eventos esportivos internacionais. É uma questão que o Estado brasileiro precisa responder com políticas públicas, justiça social, distribuição de renda e acesso aos direitos constitucionais para todos. Não há mais espaço para maquiagem social, recolhimento de mendigos e policiamento ostensivo do Exército para dar aparente impressão de normalidade.

            Desde já, é preciso ficar claro que, posteriormente à Copa do Mundo e aos jogos olímpicos, o País não pode regressar ao estado de barbárie. Deve, sim, o Estado de direito assumir a sua responsabilidade, que é a de assegurar direitos públicos e privados e acesso à cidadania a todos, não como situação emergencial ou circunstancial, mas uma ação permanente.

           Obrigado, Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/2009 - Página 53939