Pronunciamento de Marina Silva em 21/10/2009
Discurso durante a 186ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal
Registro de visita à aldeia indígena dos índios guaranis-kaiowás, próxima ao município de Dourados, em Mato Grosso do Sul, e o relato dos problemas encontrados. Apelo para que se encontrem soluções para socorrer essa comunidade.
- Autor
- Marina Silva (PV - Partido Verde/AC)
- Nome completo: Maria Osmarina Marina Silva Vaz de Lima
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
POLITICA INDIGENISTA.
DIREITOS HUMANOS.:
- Registro de visita à aldeia indígena dos índios guaranis-kaiowás, próxima ao município de Dourados, em Mato Grosso do Sul, e o relato dos problemas encontrados. Apelo para que se encontrem soluções para socorrer essa comunidade.
- Aparteantes
- Eduardo Suplicy.
- Publicação
- Publicação no DSF de 22/10/2009 - Página 53980
- Assunto
- Outros > POLITICA INDIGENISTA. DIREITOS HUMANOS.
- Indexação
-
- REGISTRO, VISITA, ORADOR, REPRESENTANTE, COMISSÃO, DIREITOS HUMANOS, COMUNIDADE INDIGENA, PROXIMIDADE, MUNICIPIOS, DOURADOS (MS), ESTADO DO MATO GROSSO DO SUL (MS), COMPROVAÇÃO, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, CONCENTRAÇÃO, SUPERIORIDADE, NUMERO, INDIO, OCORRENCIA, HOMICIDIO, CONFLITO, SUICIDIO, RESISTENCIA, INTEGRAÇÃO, DIFICULDADE, INTERFERENCIA, PROCESSO, COLONIZAÇÃO, DESRESPEITO, DISCRIMINAÇÃO, DIREITOS.
- DEFESA, NECESSIDADE, EMPENHO, BUSCA, SOLUÇÃO, PROBLEMA, COMUNIDADE INDIGENA, GARANTIA, EXPECTATIVA, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, VALORIZAÇÃO, RESPEITO, INDIO.
SENADO FEDERAL SF -
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A SRª MARINA SILVA (PV - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão da oradora.) - Muito obrigada, Sr. Presidente. Eu quero também agradecer ao amigo Senador Eduardo Suplicy por essa permuta. Obviamente eu tenho um compromisso daqui a pouco e, em função disso, ele está aqui me socorrendo, fazendo essa mudança na ordem de fala.
Sr. Presidente, vou tratar aqui de uma questão bastante complexa, obviamente muito delicada, não de fácil solução. Por isso mesmo merece toda atenção por parte das autoridades locais, das autoridades estaduais, do Governo Federal e do Congresso Nacional.
Eu tive a oportunidade de visitar, recentemente, no Estado de Mato Grosso do Sul, próximo ao Município de Dourados, a comunidade dos índios guaranis-kaiowás, numa reunião que eles fazem anualmente. Nessa reunião, eles praticam suas rezas e discutem os problemas que estão vivendo, e eu pude observar que os problemas que vivem são de natureza muito grave e muito difíceis de serem resolvidos. Mas há que se ter uma solução para o problema, porque não podemos, em hipótese alguma, aceitar que seja impossível resolvê-lo.
Os índios guaranis-kaiowás estão distribuídos em comunidades, em reservas demarcadas, em pelo menos 23 acampamentos à beira das estradas federais que atravessam a região de Mato Grosso do Sul.
Na reserva de Dourados, o principal exemplo de superconcentração populacional guarani-kaiowá, são treze mil indígenas que habitam 3.500 hectares. Essas pessoas vivem em uma espécie de confinamento na reserva de Dourados, o que promove uma série de mazelas, entre elas, assassinatos, disputas constantes entre os próprios índios e com o entorno, suicídios. A média de suicídio para cada dez mil habitantes é em torno de 24,5. Na população guarani-kaiowá, para cada cem mil habitantes, são 145 suicídios. Esse é o maior índice de suicídio do mundo, e está situado nessa população.
Pelo que se pode observar, esses suicídios acontecem em uma faixa de idade em que as pessoas são muito jovens, dos 13, 15 anos aos 27, 30 anos. Por que acontece nessa faixa de idade? Por uma ausência muito acentuada, no entendimento dos especialistas, daquilo que chamam de sensação de pertencimento. Eles não têm um lugar no mundo dos brancos e não têm um lugar no mundo dos índios.
No mundo dos índios, eles já têm dificuldades de ter as suas próprias práticas sociais, culturais e econômicas; e no mundo dos brancos, eles também não têm nenhuma aceitação.
Pelo que pude observar, também não há interesse, porque eles têm uma resistência muito grande, até heróica. Eles falam sua língua, praticam suas rezas. Ainda que já exista - pelo que pude observar, sem nenhuma pretensão de falar como especialista, não sou antropóloga - até um certo sincretismo. E também uma assimilação política. Boa parte dos caciques é chamada de “capitão”, em vez de ser chamada apenas de cacique. Então, há uma introdução de uma série de novas práticas graças ao processo de colonização.
Há uma discussão que, muitas vezes, no meu entendimento, provoca uma apartação dessas comunidades, como se não fossem brasileiros. Temos quase que um apartheid social dentro do Estado de Mato Grosso. São cerca de 45 mil indivíduos, que, como qualquer cidadão, como qualquer pessoa, merecem a atenção e o cuidado das autoridades e da sociedade brasileira. Os direitos dos índios não são apenas deles, são os direitos de todos os brasileiros. Quando temos nossos direitos assegurados, esses são os direitos de todos os brasileiros, como no que se refere ao idoso, à infância, à vida. Também deve ser parte dos nossos direitos que as comunidades indígenas possam viver com dignidade.
Há uma série de mitificações que são feitas em relação a essas comunidades, Sr. Presidente, que deriva da falta de entendimento dos conceitos.
E aí eu já quero entrar numa polêmica que até criaram com a minha fala. Eu fui como Senadora; a Comissão de Direitos Humanos foi convidada e, infelizmente, o Senador Cristovam já tinha uma atividade, não pôde comparecer. Eu desmarquei uma atividade e compareci à reunião. Pedi o apoio do Exército brasileiro para poder chegar até à comunidade e fui muito bem acolhida pelo Exército brasileiro. Agradeço profundamente ao General Enzo, nosso Comandante do Exército brasileiro, e a toda a equipe que me deu suporte durante essa operação: o Capitão Rezende e sua equipe, que me levaram até o local da assembléia dos índios; o General Carbonel, da 4ª Brigada de Cavalaria de Dourados; o Tenente-Coronel Artur José Sólon, da Assessoria Parlamentar do Exército, que fez toda essa mediação aqui; o Tenente-Coronel José Eduardo; o Comandante Militar do Oeste, General Renato Joaquim Ferrarezi, de Mato Grosso do Sul. E ao nosso Comandante do Exército eu já fiz o agradecimento.
Foi muito interessante, Senador Romeu Tuma, porque, quando vieram nos convidar, eles gostariam que alguns parlamentares estivessem na Aty Guasu, que é o nome da reunião, da assembléia que eles fazem anualmente; mas, dada até mesmo a situação difícil, poucas pessoas puderam comparecer. Mas eles me fizeram um relato: antigamente, quando havia Aty Guasu, muitos parlamentares compareciam e eles se sentiam valorizados - havia deputados estaduais, deputados federais, vereadores -; mas, ultimamente, ninguém mais comparece às reuniões deles. E ele até, sem fazer muita distinção se eu agora estou no PT ou no PV, disse: “Antes de vocês ganharem o Governo, pelo menos aquele Deputado Zé (João) Grandão comparecia. Agora, nem mais o Zé (João) Grandão comparece”. E aquilo me tocou muito profundamente porque ele dizia: “Nenhuma pessoa importante das autoridades quer ir mais à nossa reunião”.
E, obviamente, nesse mesmo momento, estava acontecendo a visita à obra do rio São Francisco. E havia um monte de autoridades importantes. Sem entrar no mérito aqui da antecipação do uso eleitoral, obviamente é importante que as autoridades visitem obras estratégicas de interesse para o País. Eu não estou questionando isso. É que existem obras que estão sendo inauguradas e existem obras para serem inauguradas. E talvez a reparação social, cultural e histórica é uma obra para ser inaugurada. E eu fui para essa obra para ser inaugurada não como pré-candidata, mas como Senadora da República pela Comissão de Direitos Humanos. E até porque estava ali com a estrutura logística do Exército, fiz questão de não fazer nenhum tipo de reunião político-partidária, absolutamente nada. Tive que fazer um esforço muito grande, porque tenho muito medo de avião, e o retorno foi em um helicóptero do Exército, à noite, tendo que utilizar um binóculo infravermelho ou a laser, não sei como é, em que vemos tudo verde. Para V. Exª ter noção do quanto foi um processo difícil para uma pessoa quase traumatizada com avião.
Mas eu o agradeço profundamente, Senador Cristovam, porque V. Exª me delegou, como membro da Comissão, para representá-la. Eles ficaram muito felizes com a minha presença e a presença do Exército. Eles estavam sendo valorizados, porque foi dado um avião, um helicóptero, para que uma autoridade se deslocasse até lá, tão grande é o sentimento de exclusão e de falta de pertencimento.
Eu fiz uma fala que, no meu entendimento, até os frustrou um pouco, porque eu disse que era o momento de usarmos de toda a diplomacia guarani e de toda a diplomacia das pessoas que eram aliadas, e que nós deveríamos apostar na organização, na resistência, mas que fosse um processo pacífico, porque é uma questão complexa e difícil.
Por que estou falando isso? Porque há uma guerra e uma confusão em relação aos conceitos. Quando se fala em terras tradicionalmente ocupadas, não se está falando em terras memorialmente ocupadas, o que é diferente. E eu falei que era fundamental todo um esforço para que pudéssemos fazer um resgate histórico, social e cultural, para que esses índios pudessem ter acesso às suas terras tradicionalmente ocupadas. E alguém colocou isso como se eu estivesse dizendo, porque era uma recuperação imemorial de todo o Brasil para os índios. Obviamente que tem o problema dos conceitos, e as pessoas às vezes não se atêm aos fatos e vão para as versões, mas eu tive a oportunidade de esclarecer. Minha fala está, na íntegra, no site do Senado, e as pessoas podem ter a oportunidade de ler o que foi dito. Obviamente, eu também não acho que quem fez a matéria falando assim... Pelo menos na primeira versão, tinha um único jornalista de O Estado de S.Paulo, e eu sei que ele estava ali de boa vontade, até porque deve ter sido muito difícil chegar até lá também. Não creio que tenha feito qualquer coisa de maldade. O problema foi como, depois, o assunto foi repercutido por outros canais, que, no meu entendimento, fizeram uma confusão conceitual em relação àquilo que foi dito.
Agora, uma coisa não podemos deixar de considerar: nós precisamos dar uma solução para um problema com essa gravidade. Ali havia centenas de crianças, pessoas idosas, pessoas sem qualquer esperança. E diante da falta de qualquer expectativa, as pessoas vão para a última coisa que jamais poderiam ir, que é a eliminação da vida. Mas como podemos julgar? É muito fácil falar isto daqui. Difícil é suportar o que, às vezes, eles suportam: o preconceito, a exclusão, sem ter nenhum lugar.
Então, Senador Suplicy, durante minha presença ali, eu disse: “Não vim aqui prometer nada, mas vim dizer que sou solidária e que estou me alistando, ainda que seja de forma oferecida, para fazer parte da diplomacia que vai trabalhar para tentar resolver um problema com essa complexidade”. E me comprometi a fazer um relato e mandar ao Presidente Lula e pedir uma audiência com o Ministro Tarso Genro. Acho que é preciso que haja um encontro, um diálogo entre os diferentes segmentos e interesses.
Existe um agronegócio que é altamente promissor. Dá para se ver quando se sobrevoa de avião. As pessoas foram assentadas por políticas de governo. E acho até que, nesse caso, de fato, a reivindicação de que devem ser indenizados é legítima. No entanto, não se pode criar uma guerra contra os índios e um olhar como se eles não existissem. Eles existem, são cerca de 45 mil índios, e nós brasileiros não podemos conviver com essa situação de apartação social, em pleno século XXI.
Não é fácil, é difícil. Mas, no meu entendimento, é possível que cada um ali possa se sentar para buscar um caminho, ou, pelo menos, uma nova maneira de caminhar. E a nova maneira de caminhar é o diálogo, é a busca do entendimento.
Concedo um aparte ao Senador Eduardo Suplicy.
O Sr. Eduardo Suplicy (Bloco/PT - SP) - Prezada Senadora Marina Silva, ainda não tive a oportunidade de conhecer no Mato Grosso os índios guaranis-kaiowás. Volta e meia, lemos nos jornais notícias muitas vezes tristes a respeito daquilo que V. Exª aqui nos relata: um alto índice de suicídio que ocorre nessa comunidade. E eu perguntaria a V. Exª, que diz que são cerca de 45 mil, para que possamos compreender melhor: quais são as principais atividades econômicas? A razão do alto índice de suicídio decorre mais da dificuldade de sobrevivência, pela dificuldade de eles encontrarem algum tipo de atividade que lhes propicie um adequado rendimento ou é de uma natureza mais complexa? Precisaria haver que tipo de solução? Nessa comunidade, por exemplo, as famílias com rendimento conforme a definição do Programa estão sendo contempladas com o Bolsa Família? A municipalidade tem tido atenção para efetivamente fazer com que todos que, pela lei, teriam o direito à inscrição... São os rendimentos do Programa Bolsa Família considerados ainda muito modestos para a finalidade de, eventualmente, propiciar a eles um primeiro passo de sobrevivência para poderem ter outros caminhos? Há ali alguma entidade governamental, um banco oficial, seja do município ou do Governo do Estado, em cooperação com os três níveis de Governo que porventura esteja ali a propiciar mecanismos de microcrédito ou de crédito para atividades agrícolas típicas do que essa comunidade realiza? Avaliaria que, numa comunidade como essa, poderia haver uma eventual experiência de uma renda básica incondicional para todas essas 45 mil pessoas como forma até de se iniciar uma Renda Básica de Cidadania? Poderia o Governo Federal, o Ministério do Desenvolvimento Social, diante dessa circunstância, que já vem de há alguns anos, porque o que V. Exª foi visitar é algo que temos lido, ao longo dos últimos anos, como um fenômeno recorrente... Seria uma solução que poderia ser experimentada em uma comunidade como essa?
São perguntas de quem quer aprender mais sobre o problema que V. Exª foi conhecer de perto. E por isso a cumprimento e também à Comissão de Direitos Humanos, que, conforme V. Exª colocou, presidida pelo Senador Cristovam Buarque, resolveu abraçar essa causa, se interessar e se solidarizar, pelo menos em um primeiro passo, para conhecer o problema e tentar encontrar caminhos alternativos. Inclusive, do ponto de vista das oportunidades educacionais, em que medida está essa comunidade indígena recebendo oportunidade de educação, seja desde o primeiro ciclo e os demais, tendo em conta a sua cultura? Em que medida a educação provida ali pelas instituições de ensino leva em conta as tradições da cultura guarani-kaiowá, como elementos importantes para a preservação e o desenvolvimento dessa comunidade indígena?
A SRª MARINA SILVA (PV - AC) - Senador Eduardo Suplicy, eu agradeço o aparte de V. Exª. V. Exª fez uma pergunta em relação à natureza desses suicídios e já arrolou uma série de perguntas que têm a ver com a realidade social e cultural em que essas pessoas vivem.
Quanto à natureza desses suicídios, existe uma série de estudos sendo feitos. Obviamente, é colocado o fenômeno a partir de um conjunto de fatores, e obviamente os índios também têm a sua forma de elaborar as perdas, de elaborar o sofrimento, a tristeza. Enfim, são questões de natureza profunda e complexa. Mas, com certeza, têm base na realidade material precária em que essas populações vivem. A gente fala “falta de pertencimento”, mas isso se traduz em questões práticas, por exemplo: nesses vinte e três acampamentos ao longo da estrada, vivem cerca de cem a duzentas pessoas indígenas, de diferentes origens, à beira das barrancas das estradas.
O SR. PRESIDENTE (Romeu Tuma. PTB - SP) - Senadora Marina, queria só interromper um segundo para prorrogar a sessão por uma hora.
Considero a sessão prorrogada por uma hora para assegurar a palavra aos demais inscritos.
A SRª MARINA SILVA (PV - AC) - Obrigada, Senador.
São barracas improvisadas com galhos secos, lonas de plástico, uma série de coisas. Às vezes, não os deixam ter acesso à água dos igarapés ou dos rios. Em alguns casos, é ateado fogo, segundo relatos do próprio Ministério Público, dos antropólogos que os acompanham. As crianças, uma boa parte dessa população toda, cerca de 12 mil crianças em condições muito precárias, sem atendimento de saúde, sem acesso a educação e escola, com problema de desnutrição. São distribuídas 12 mil cestas básicas para o atendimento a essas populações em situação de degradação social extrema. E o que resolve é buscarmos o acesso à terra para que eles possam viver com dignidade. Algumas terras já foram demarcadas.
Eu estive lá agora pela segunda vez, mas, em 1999, eu estive na comunidade do Panambizinho, no Municípios de Dourados. A comunidade de Panambizinho foi demarcada. Só que é uma área pequena para uma quantidade muito grande de índios guaranis.
Então, há um esforço que precisa ser feito e que não se resolve apenas com cestas básicas, ainda que seja importante, e com alguma transferência de renda como um direito para todas as pessoas, como V. Exª defende, o que seria muito bem-vindo. Essa questão só se resolve com um lugar, um lugar para um labor, um lugar para se fazer culturalmente, porque, para os índios, a relação do sujeito com o território é o que constitui a sua cultura e o seu lugar no mundo. Quando eles não têm território, seja quando são nômades - e os Guaranis já foram nômades -, seja quando são sedentários, o lugar que os constitui é o território, com seus símbolos, com seus cemitérios, com suas áreas. Obviamente, como eu disse, não se está falando sequer de cem anos atrás; está-se falando de uma situação em que o Estado cometeu um erro porque distribuiu a terra dos índios, titulou a terra dos índios e agora tem de dar uma solução. Não é fácil a solução, reconhecemos, mas ela precisa ser dada. Então, o que podemos fazer, talvez na Comissão de Direitos Humanos ou em outras comissões, é ver, junto com o Ministério da Justiça, como contribuir para buscar um caminho que envolve uma série de questões.
Houve uma cena muito comovente. Eles ali não me conheciam e, quando eles começaram a falar - eu ouvi pelo menos uns catorze ou quinze relatos antes de falar -, pelo menos uns dois ou três me chamavam de Senadora Marisa Serrano, porque é a Senadora do Estado. E os outros tentavam dizer para eles que eu era Marina Silva. Mas chegou um momento em que eu pedi para parar e deixar, porque não fazia diferença; o importante é que estivesse ali uma autoridade que estava tentando ajudar. E por que foi comovente? Porque eles sabem quem são as suas autoridades, quem são os seus representantes e, talvez inconscientemente, eles estivessem ali dizendo que gostariam que a professora Marisa Serrano estivesse ali, que. enfim, é uma pessoa por quem tenho muito carinho, muito respeito. Então pedi que os deixassem falar do jeito que estavam falando.
De sorte que, nós aqui, os Senadores do Mato Grosso, o Ministério da Justiça, todos temos que fazer um processo que eu espero envolva duas coisas: a capacidade de nos comprometermos eticamente em resolver o problema para que possamos ter um horizonte; e, talvez, a capacidade de perdoar e se perdoar. Porque historicamente o Brasil tem que fazer esse resgate, mas também tem que ter uma atitude generosa de não disseminar o ódio: muitas vezes as falas são feitas no sentido de desconstruí-los, de achar que são preguiçosos, de achar que são feios, de achar que são ignorantes. Não é isso. É outra cultura, outra forma de pensar, outra forma de ver. E nós, que reivindicamos ser culturalmente mais avançados, talvez não saibamos conviver com a diferença e exercitar a alteridade. E eu acho que vamos precisar desse exercício com muita força.
Eu não tenho uma fórmula. Não acredito que qualquer atitude violenta resolva o problema, mas eu acredito no princípio ético de que não devemos ter um apartheid social em pleno século XXI num País que tem oito milhões de quilômetros quadrados.
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