Discurso durante a 186ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Análise da decisão do Ministro Guido Mantega, da Fazenda, de taxar ingressos de capital estrangeiro, na forma do imposto sobre operações financeiras, da ordem de 2%.

Autor
Eduardo Suplicy (PT - Partido dos Trabalhadores/SP)
Nome completo: Eduardo Matarazzo Suplicy
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.:
  • Análise da decisão do Ministro Guido Mantega, da Fazenda, de taxar ingressos de capital estrangeiro, na forma do imposto sobre operações financeiras, da ordem de 2%.
Publicação
Publicação no DSF de 22/10/2009 - Página 54024
Assunto
Outros > POLITICA ECONOMICO FINANCEIRA.
Indexação
  • AVALIAÇÃO, EFICACIA, DECISÃO, MINISTRO DE ESTADO, MINISTERIO DA FAZENDA (MF), IMPOSIÇÃO, TAXAS, IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CREDITO CAMBIO SEGURO E SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS A TITULOS E VALORES MOBILIARIOS (IOF), INGRESSO, CAPITAL ESTRANGEIRO, BRASIL, OPORTUNIDADE, SUPERIORIDADE, VALORIZAÇÃO, REAL, DIFICULDADE, SITUAÇÃO, EXPORTADOR, ESPECIFICAÇÃO, INDUSTRIA, AGRICULTURA, MANUTENÇÃO, EXPANSÃO, EXPORTAÇÃO, DEFESA, NECESSIDADE, SIMULTANEIDADE, AUMENTO, VOLUME, RESERVAS CAMBIAIS, GARANTIA, ESTABILIDADE, ECONOMIA NACIONAL, REDUÇÃO, JUROS.
  • COMENTARIO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), DEFESA, NECESSIDADE, IMPOSIÇÃO, PERCENTAGEM, IMPOSTO SOBRE OPERAÇÕES DE CREDITO CAMBIO SEGURO E SOBRE OPERAÇÕES RELATIVAS A TITULOS E VALORES MOBILIARIOS (IOF), CAPITAL ESTRANGEIRO, INGRESSO, BRASIL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. EDUARDO SUPLICY (Bloco/PT - SP. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador João Pedro, eu gostaria de fazer uma análise da decisão do Governo do Presidente Lula, em especial do Ministro da Fazenda, Guido Mantega, de instituir sobre os ingressos de capital estrangeiro, não propriamente de investimentos, mas aqueles de aplicação em títulos, que, na entrada, passem a recolher um imposto na forma do imposto sobre Operações Financeiras da ordem de 2%.

            Avalio, Sr. Presidente, que se trata de uma medida adequada neste momento em que se observa uma valorização acentuado do Real, dificultando a situação para exportadores, especialmente da indústria, mas, também, os exportadores agrícolas, que tenham o grau de competitividade para manter e expandir as suas exportações.

            Trata-se de uma medida que muito provavelmente precisará ser acompanhada de outras, tais como o aumento do volume de reservas externas para se assegurar maior tranquilidade ao Governo brasileiro e a todos no que diz respeito à estabilidade de nossa economia e possivelmente também a diminuição da taxa de juros.

            O Conselho de Política Monetária, o Copom, na tarde de hoje, depois de dois dias de reunião, resolveu manter a taxa de juros Selic ao nível de 8,75%, a taxa de juros que vem sendo mantida desde julho.

            Avalio, Sr. Presidente, que podemos caminhar numa direção de diminuição da taxa de juros como uma medida complementar a esta do aumento ou da instituição desta taxa de 2% de IOF sobre o ingresso de capitais financeiros no País. Além do aumento, portanto, do acúmulo de reservas e da diminuição da taxa de juros, essa medida de aumento do IOF estará sendo complementada. Avalio como didático e oportuno para os interessados nessa área os três artigos publicados pelo jornal Folha de S.Paulo a respeito da taxação do capital externo - se ela será ou não eficaz.

            Antonio Corrêa de Lacerda, professor doutor do Departamento de Economia da PUC de São Paulo, observa que o IOF “é um paliativo necessário”.

“Impor um IOF de 2% sobre os movimentos de capitais é algo que não resolve, por si só, a grave questão da apreciação cambial no Brasil.

           No entanto é um paliativo necessário, que combinado com outras medidas, como uma maior intervenção no mercado por meio de compras de reservas e diminuição da diferença entre as taxas reais de juros domésticos e internacionais, por exemplo, vai reduzir o espaço para arbitragem na taxa de câmbio brasileira.

Mas isso é apenas o começo. O desafio é que a economia brasileira terá que rever todo o aparato regulatório e da política cambial, que historicamente foi concebido para conviver com a escassez e não com a abundância de divisas, que é a situação atual e muito provavelmente futura da economia brasileira.

As enormes oportunidades advindas do pré-sal, de eventos esportivos previstos - a Copa do Mundo de 2014 e a Olimpíada de 2016 no Rio de Janeiro -, assim como as demandas para novos investimentos, associados ao ‘investment grade’ e à maior percepção de oportunidades, deverão continuar impulsionando a entrada de capitais externos para o Brasil nos próximos anos.

Isso implica uma mudança de paradigmas não apenas no que se refere à política cambial em si, mas das políticas monetária e fiscal.

É preciso repensar as políticas macroeconômicas para o cenário pós-crise, que contempla profundas mudanças conjunturais e estruturais na produção, preços relativos e papel do Estado, entre outros aspectos importantes.

Vale ainda destacar que a leitura da nova realidade com o olhar ainda voltado para paradigmas superados pode levar a equívocos graves de interpretação, não apenas no que se refere ao câmbio.

           É, por exemplo, absolutamente apressada a interpretação de que um crescimento econômico do país de 5% no próximo ano levará inexoravelmente à elevação da taxa básica de juros.

           O tal PIB (Produto Interno Bruto) [conclui Antonio Corrêa de Lacerda] potencial terá que ser novamente revisto.”

           Já Alexandre Schwartsman, colunista da Folha de S.Paulo, que é do Grupo Santander Brasil, doutor em Economia pela Universidade da Califórnia, que foi diretor do Banco Central, pergunta: “Acelerar investimento ou o aumento do juro? E avalia:

“O que de melhor poderia acontecer com o retorno do IOF sobre investimentos estrangeiros é que, a exemplo do ocorrido em 2008, ele não consiga atingir os fins a que se propõe. Apesar das justificativas acerca dos receios associados à possível formação de uma “bolha” no mercado acionário, pouco se fez para disfarçar que o objetivo da medida é mesmo reverter o processo de apreciação do real. Entretanto, para que isso aconteça, é necessário que o IOF consiga, de fato, impedir a entrada de capital estrangeiro, o que pode gerar implicações não tão agradáveis.

Ao contrário da experiência anterior, desta vez o IOF passou a ser cobrado sobre ingresso de estrangeiros em Bolsa de Valores. Assim, caso a medida tenha sucesso, espera-se que a entrada de recursos nesse mercado caia. Isso, porém, significa privar empresas de recursos que poderiam obter por meio do aumento do seu capital, tipicamente associado ao financiamento do investimento.

Os efeitos negativos, porém, não param por aí. Preços mais elevados para ações representam um poderoso incentivo de investimento, pois o aumento do preço do estoque de capital existente torna mais atraente a criação de novo capital, a própria definição de investimento.”

            Peço que seja transcrito na íntegra, mas vou ler o parágrafo final.

“De forma equivalente, a restrição à entrada de capitais implica fazer com que a expansão da demanda doméstica tenha que ficar mais próxima do limite dado pelo crescimento potencial. Assim, o aumento de juros pode ocorrer antes do que seria necessário. Irônico, não?”

            E assim conclui Alexandre Schwartsman, que tem, portanto, uma visão não favorável. Mas eu quero concluir, Sr. Presidente, com a leitura daquele artigo com o qual eu tenho maior afinidade de pensamento, ou seja, o do Professor Fernando Cardim de Carvalho, professor titular do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro e que é um grande estudioso de John Maynard Keynes, de Paul Davidson, de James Tobin, uma pessoa pela qual eu tenho tido o maior respeito.

            Diz Fernando Cardim de Carvalho:

“O Governo Lula finalmente decidiu-se a intervir na limitação da entrada de capitais financeiros no país, que estava levando o dólar a níveis não apenas inimagináveis, mas também, e principalmente, suicidas para a economia brasileira. A reação de analistas ligados ao setor financeiro não é de surpreender. Alguns se referem a um “saco de maldades” do governo. Maldades para quem?

A valorização excessiva do real, que não parecia conhecer limites, já está tendo efeitos visíveis sobre a pauta de exportações brasileiras e sobre o perfil da indústria doméstica. O Brasil se transforma em exportador de produtos primários, como se o esforço de industrialização tivesse sido apenas um hiato equivocado da história do país.

O pré-sal ainda vinha reforçar as expectativas daqueles que imaginam a economia brasileira ideal com dois setores: produção de matérias-primas para exportação e bancos.

O dólar está se desvalorizando em todo o mundo, realmente, mas o real se valoriza ainda mais e não apenas com relação ao dólar. Há um óbvio excesso de liquidez na economia internacional, resultado das medidas excepcionais de intervenção contra a crise financeira e do temor das instituições financeiras em se comprometer com qualquer iniciativa mais arriscada ou investimento mais durável. Nessas condições, a perspectiva de ganho rápido e fácil em mercados emergentes tende a atrair aplicadores financeiros interessados em obter ganhos de capital e mover-se para a próxima oportunidade disponível. O impacto desses fluxos de capital é enorme, fazendo subir as cotações da Bolsa, por exemplo, e alimentando bolhas, porque o capital entrante, pequeno que é em relação aos mercados financeiros internacionais, é muito grande em relação ao mercado local.

A entrada de capitais se autoalimenta: fazendo subir as cotações, atrai mais especuladores, que fazem as cotações subirem ainda mais, e assim por diante, até o colapso inevitável. E para quê?

A intervenção é correta e devia ter sido feita antes. Teria sido melhor uma alíquota maior e escalonada com relação ao tempo de permanência, mas 2% é bem melhor que nada.”

            Conclui Fernando Cardim de Carvalho.

            Quero expressar, portanto, que estou de acordo com a medida anunciada pelo Ministro Guido Mantega, da Fazenda.

            Quero cumprimentá-lo por sua decisão, que, avalio, poderá ser complementada com outras medidas, visando à diminuição progressiva da taxa de juros Selic nos próximos meses, bem como à expansão da compra de reservas, para que o Brasil possa estar mais bem preparado com respeito a eventuais desequilíbrios da economia internacional.

            Muito obrigado, Sr. Presidente.

 

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DOCUMENTO A QUE SE REFERE O SR. SENADOR EDUARDO SUPLICY EM SEU PRONUNCIAMENTO.

(Inserido nos termos do art. 210, inciso I e § 2º, do Regimento Interno.)

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Matéria referida:

            “A taxação do capital externo será eficaz?”, matéria publicada na Folha de S.Paulo.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 22/10/2009 - Página 54024