Discurso durante a 205ª Sessão Não Deliberativa, no Senado Federal

Antecipação de voto e trechos do relatório que S.Exa. vai apresentar na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania, ao projeto do Senador Valdir Raupp, que autoriza a criação do Ministério da Amazônia.

Autor
Geraldo Mesquita Júnior (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/AC)
Nome completo: Geraldo Gurgel de Mesquita Júnior
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
DESENVOLVIMENTO REGIONAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.:
  • Antecipação de voto e trechos do relatório que S.Exa. vai apresentar na Comissão de Constituição Justiça e Cidadania, ao projeto do Senador Valdir Raupp, que autoriza a criação do Ministério da Amazônia.
Publicação
Publicação no DSF de 10/11/2009 - Página 57819
Assunto
Outros > DESENVOLVIMENTO REGIONAL. ADMINISTRAÇÃO PUBLICA.
Indexação
  • DEFESA, PROJETO, AUTORIA, VALDIR RAUPP, SENADOR, RELATOR, ORADOR, AUTORIZAÇÃO, CRIAÇÃO, MINISTERIO, VALORIZAÇÃO, REGIÃO AMAZONICA, IMPORTANCIA, RIQUEZAS, BIODIVERSIDADE, APRESENTAÇÃO, VOTO FAVORAVEL, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO JUSTIÇA E CIDADANIA, LEITURA, TRECHO, RELATORIO, EXPOSIÇÃO, DADOS, POPULAÇÃO, ECONOMIA, EXPLORAÇÃO, MEIO AMBIENTE, IMPACTO AMBIENTAL, POLUIÇÃO, NECESSIDADE, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, COMBATE, VIOLENCIA, POBREZA, CONCLAMAÇÃO, OPINIÃO PUBLICA, INTELECTUAL, APOIO, PROPOSTA.
  • NECESSIDADE, DEBATE, SENADO, UNIÃO, BANCADA, SENADOR, ESTADOS, REGIÃO NORTE, VOTAÇÃO, APROVAÇÃO, PROJETO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. GERALDO MESQUITA JÚNIOR (PMDB - AC. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Caríssimo amigo, Senador Papaléo, é um prazer conviver com V. Exª nesta tarde de segunda-feira, quero cumprimentar a Senadora Serys, os demais Senadores presentes na Casa. E, pegando o gancho aqui da Senadora Serys, já que não pude aparteá-la, eu diria que quem tem de ser expulsa é a Universidade do rol de entidades educativas, Senador Paim, porque uma universidade que trata uma questão dessa natureza dessa forma não merece o título de universidade, sequer de uma entidade educativa. Acho que ela é que deveria ser expulsa do rol de entidades educativas do País. Depois, a gente voltaria a conversar sobre o assunto.

            Senador Papaléo, em outras oportunidades, trouxemos aqui à Casa, com a sua participação, com a participação do Senador Mozarildo, enfim de Parlamentares lá da Amazônia, um debate que está aí sempre aberto sobre a nossa grande região, a Amazônia. No final do ano, haverá uma grande reunião em Copenhague e os países e seus representantes irão discutir questões de extrema importância para o mundo. O meio ambiente estará no centro da questão, a queima do carbono. Enfim, são questões que merecem, digamos, um concílio desse.

            Coincidentemente, Senador Papaléo, tive o privilégio de ser designado relator de um projeto do nosso companheiro Valdir Raupp. É um projeto autorizativo. Tudo bem, o Senado tem um entendimento, com lastro inclusive em um parecer antigo do Senador Josaphat Marinho, de que projeto autorizativo tem sim - por que não? - espaço para tramitar e ser aprovado. É como um encaminhamento de sugestão ao Poder Executivo para que faça isso ou aquilo.

            No caso, o projeto do Senador Valdir Raupp autoriza a criação do Ministério da Amazônia. O tema é, de fato, complexo, polêmico, mas precisamos encarar com muito realismo porque, em torno dele, situam-se questões de fundamental importância para o nosso País. Na Amazônia, vivem cerca de 25 milhões de pessoas. A Amazônia é uma área - já dito e repetido tantas vezes que chega até a cansar algumas pessoas, mas a mim não cansa -, é um repositório de recursos naturais do qual não temos a menor idéia da dimensão, do volume, da quantidade, da importância. Sabemos que todos esses recursos existem, mas, ao longo dos anos - e bote anos nisso, Senador Papaléo -, creio que jamais operamos devidamente com relação ao levantamento, ao inventário a ser feito a respeito de todos esses recursos naturais, para que pudéssemos, após esse inventário, esse levantamento, fazer diagnósticos, fazer indicações do que deve ser feito.

            Não deve ser uma coisa única. As pessoas olham para a Amazônia e vêem uma coisa única. Não é, Senador Paim! A Amazônia de Roraima é diferente da Amazônia do Acre; a Amazônia lá do Mato Grosso da Senadora Serys é diferente da Amazônia do Pará. É uma diversidade incrível! Ela tem de una apenas a denominação Amazônia. Mas é de uma riqueza extraordinária, díspare e bem diversificada.

            O que primeiro devemos compreender acerca da Amazônia é que não se trata de uma coisa só. Não se trata de um espaço ou de um bioma só, Senador Papaléo. V. Exª, que vem do Amapá, sabe disso.

            Eu vou apresentar um parecer favorável na Comissão de Constituição e Justiça, onde sou Relator. Infelizmente, lamentavelmente, esse projeto já passou pela Comissão de Meio Ambiente da Casa e foi rejeitado, com voto inclusive de Parlamentares da Amazônia, que aqui não cito porque eles não estão presentes. Se estivessem, eu citaria para suscitar o debate. Mas, a mim, causou espécie um projeto dessa natureza receber um voto contrário de Parlamentares da Amazônia, inclusive.

            Eu vou apresentar um voto favorável na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Eu quero aqui antecipar trechos do relatório que vou apresentar. Em cima dele, vou fazer comentários. Eu começo dizendo aqui o seguinte:

       Em que pese a competência específica da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania de se manifestar sobre a constitucionalidade e a juridicidade de qualquer proposta, essa circunstância não nos impede de considerarmos alguns outros aspectos dessa proposição específica. Ao referir-nos à Amazônia, estamos tratando de uma região que inclui 60% do território nacional e apenas 12,6% da população do país. Em números absolutos, a Amazônia conta com 25 milhões de habitantes. A política de valorização regional, iniciada no Governo do Presidente Juscelino Kubitschek, com a criação da Sudene e posteriormente com a instituição da Sudam, foi, sem dúvida, um passo decisivo para despertar o país para as fragilidades institucionais do Nordeste e o enorme desafio de prover a Amazônia dos instrumentos políticos, econômicos e sociais que promovam o conhecimento e o aproveitamento de sua extraordinária fonte de recursos naturais, seu desenvolvimento e sua preservação.

       A população da Amazônia padece de uma secular incúria dos poderes públicos e de impulsos ocasionais e iniciativas governamentais que têm como característica principal valorizar mais a repercussão de sua publicidade, do que as exigências de suas necessidades. Está neste caso a rodovia transamazônica, projeto que um dia poderá ligar Cabedelo, na Paraíba, a Benjamin Constant, no Amazonas, cortando nada menos do que 111 municípios de sete Estados das regiões Norte e Nordeste. O percurso, mais que um desafio, é, até hoje, uma autêntica epopéia. A natureza daquela região parece ter sido criada para dificultar a ação predatória do homem na avidez da sua busca pelo lucro a qualquer preço e a qualquer custo. Se naquela imensidão que já foi totalmente verde e rica em sua diversidade, sempre conviveram em harmonia durante alguns séculos, os naturais de suas diversas regiões, os que a povoaram e os que lá nasceram continuam a padecer de males decorrentes da falta de assistência adequada e dos preconceitos, para não referir-nos à inércia e à falta de iniciativa de muitos dos seus governantes.

       O balanço do estado de higidez física de seus habitantes e das condições sanitárias com as quais grande parte deles tem que conviver é triste, para não dizermos trágica. Enquanto 51% dos brasileiros são atendidos por rede de esgotos, na Amazônia essa proporção é de apenas 9,7%. A média de incidência de tuberculose na região,[Senador Papaléo Paes, V.Exª que é médico] é de 46 para 100.000 habitantes, 20% maior que a média nacional. Enquanto a proporção brasileira de ocorrência da hanseníase é de 26,2 por 100.000 habitantes, a média de número de casos na Amazônia é de 69,4 para a mesma quantidade de pessoas. Mais do dobro da média brasileira. De acordo com o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia, 10% das crianças em idade pré-escolar na Estado do Amazonas são desnutridas enquanto no interior esse número é mais do que o dobro, atingindo 26%, ou seja, mais do que um em cada quatro jovens. Um terço dos 100 municípios com o maior número de homicídios do país encontra-se na Amazônia, número que dá idéia da expressão dos que são vítimas de mortes violentas, na região que abriga menos de 13% da população brasileira.

       Embora o potencial de aproveitamento energético da região seja incalculável com as tecnologias atuais, as 260 termelétricas em funcionamento, em 6 Estados amazônicos, queimam 6,3 milhões de litros de óleo por dia, Senador Alvaro Dias, o que implica na emissão de 6 milhões de toneladas de gás carbônico por ano, quantidade equivalente ao dobro das emissões de poluentes de toda a frota de veículos de São Paulo. A situação fundiária, por sua vez, é razão não só do número de conflitos que vitimam muitos dos brasileiros residentes na Amazônia, como também da insegurança dos que ocupam pacificamente suas terras, uma vez que só 4% de suas terras possuem títulos de propriedade válidos. O conflito de Eldorado de Carajás é apenas um dos trágicos testemunhos dessa realidade. Nos últimos vinte anos, foram desmatados 370.000 km2 de terras na Amazônia, para permitir a realidade de hoje, caracterizada pelo fato de abrigar nada menos que 36% do gado bovino existente no país. São 75 milhões de cabeças de gado, para uma população de 25 milhões de habitantes, proporção que deve ser das maiores, se não for a maior, de todo o país.

       O modelo de desenvolvimento aplicado nos últimos cinquenta anos, no maior patrimônio natural do país, tem sido lastreado na devastação e na ocupação desordenada de seu território, violentando-se a vocação natural da área que, seguramente, é uma das mais ricas e ao mesmo tempo menos conhecida cientificamente do Brasil. Conhecemos a potencialidade mineral de seu subsolo. Sabemos ser o maior patrimônio de espécies vegetais e depositária de recursos fitossanitários sabidamente úteis, mas pesquisados apenas em ínfima parte. Em suma, possuímos um patrimônio cuja expressão não conhecemos e de cuja extensão não temos a menor idéia.

       Há anos nos referimos e utilizamos, mais como um slogan do que como precaução, à expressão da “cobiça internacional”, título, por sinal, de uma obra clássica de um dos maiores conhecedores e o maior defensor da Amazônia, que se chama Arthur Cezar Ferreira Reis. A bibliografia sobre aquela região não é só rica e variada, é vasta e diversificada, o que demonstra o interesse que sempre despertou não só entre os intelectuais brasileiros, mas também no seio de inúmeros pesquisadores e intelectuais estrangeiros. Alguns como Gastão Cruls, Charles de La Condamine, Emílio Goeldi e Alexandre Rodrigues Ferreira ombreiam-se com brasileiros como Aureliano Cândido Tavares Bastos e Leandro Tocantins, cuja obra-prima “O rio comanda a vida”, despertou em muitos de nós o sentido de nossa responsabilidade histórica para com o destino e o futuro da Amazônia. Se já despertamos a cobiça e o interesse internacional, está na hora de despertarmos também o interesse e, se necessário, a cobiça dos brasileiros pelo patrimônio coletivo de todos nós, que a persistência dos desbravadores revelou e a obstinação de seus habitantes preservou.

       Todos concordamos que não queremos ser um país dentro de outro país. Mas também não desejamos ser um apêndice do país a todos pertencemos e que a nós cabe cultuar, preservar, proteger e desenvolver. A Amazônia não é só promessa e quimera. É realidade estuante de vida e conquistas como a Zona Franca, que, vencendo a adversidades, descrença e incredulidade, proporciona ao país um faturamento anual de 60 bilhões de reais, gerando renda, emprego e tecnologia. Mas não podemos depender só de iniciativas estrangeiras, como a de visionários empreendedores como Henry Ford e sua Fordlândia, o projeto Jari de Daniel Ludwig e a Icomi, em Serra do Navio. A criação de um Ministério da Amazônia, ou do Desenvolvimento Regional, centrado no desenvolvimento sustentável da Amazônia e do Nordeste, não pode ser encarada como um órgão a mais como foram a Sudene e a Sudam, criadas, extintas e recriadas por impulsos momentâneos ou soluções ocasionais.

            Sou ardoroso defensor da criação desse Ministério.

            Eu disse, em pronunciamento anterior, Senador Paim, que no País em que há quarenta e tantos Ministérios, um a mais ou um a menos não faria falta. E aqui há uma grande diferença: esse seria um Ministério importante, pois faria com que as ações a serem pensadas, articuladas e desenvolvidas na Amazônia fossem centradas num organismo, Senador Papaléo. Hoje, a Amazônia é pensada por diversos Ministérios que pensam também a realidade e a situação de diversas outras regiões do País. Ela é uma região diferenciada, é uma região importante.

            Tanto assim que é ela que aparece nos grandes debates e nos grandes embates, internacionais inclusive. E, quando o Brasil surge nessas grandes discussões, e a preocupação com ela, é a situação da Amazônia que gera tanta discussão, tanto embate, tanto debate. Portanto, eu acho que nada mais justo do que...

            Já pensou o Presidente Lula chegar em Copenhague, se ele for de fato, e anunciar uma iniciativa como essa? Acho que teria um peso incalculável. Seria de uma relevância imensa, Senador Papaléo, o Presidente da República anunciar, primeiro, para os brasileiros, e, posteriormente, para a comunidade internacional, que a sua preocupação é tanta com a Amazônia, com quem vive ali, com o presente e com o futuro da Amazônia, e, principalmente, o de quem vive ali, que ele resolvera constituir um ministério, mesmo que extraordinário, mesmo que temporário, para centralizar tudo o que possa dizer respeito a iniciativas a serem tomadas naquela região, Senador Papaléo.

            Aí, sim, eu passaria a acreditar que alguma coisa de concreto, de positivo, poderia acontecer naquela região, porque, até agora, o que tem sido feito, Senador Paim, primeiro, peca pelo defeito da desarticulação. São ações desarticuladas, nenhuma tem a ver com a outra; são ações que levam em conta o interesse de pequenos grupos - pequenos, talvez, numéricos, mas grandes na sua magnitude; interesses pontuais, e o interesse mesmo da sociedade que vive ali na Amazônia. Essa preocupação, esse interesse passa pelas pessoas que vivem na Amazônia como avião de carreira: passa lá em cima e as pessoas ficam olhando, Senador Papaléo, sem saber exatamente de que bandeira é aquele avião.

            Portanto, esse é o parecer que vou defender na Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania. Estou aqui antecipando, estou aqui quase que já pedindo a compreensão e o voto das Senadoras e dos Senadores que fazem parte daquela importante Comissão. Acho que é uma oportunidade enorme de, aqui no Senado, discutirmos essa questão, ou a rediscutirmos. Essa questão não pode ser encerrada, requer discussão permanente. Toda vez que aqui a gente esquece um pouco a Amazônia, os predadores, os devastadores, os criminosos aproveitam esse silêncio, essa certa omissão, para avançarem mais um pouco na sua sanha de devorarem aquilo que estiver pela sua frente da forma mais desarticulada que possa existir e, por vezes, da forma mais criminosa que possa ocorrer.

            Portanto, Senador Papaléo, obrigado pela concessão do tempo. Eu queria deixar esta mensagem hoje: que a gente jamais corra o risco de esquecer a Amazônia, aqui, neste Senado Federal. Que a gente jamais cometa o pecado da omissão. Que a gente jamais negligencie os interesses de 25 milhões de habitantes, brasileiras e brasileiros que vivem ali, em grande parte, a grande maioria em situação de penúria, de miséria, de abandono, de sofrimento, tentando sobreviver, aos trancos e barrancos, convivendo com a omissão, com a incúria, com a negligencia, muitas das vezes do Estado brasileiro, daqueles que poderiam, de fato, se tivessem vontade política, se tivessem vergonha na cara inclusive, voltar a sua preocupação e, quando nada, o seu amor patriótico para aquela região.

            Portanto, pela criação do Ministério da Amazônia, vou defender essa tese no Senado, vou continuar defendendo. Parabenizo o Senador Raupp pela iniciativa tomada e concito, convoco, principalmente os Parlamentares da minha região, para que a gente não deixe essa discussão no abandono, para que a gente permaneça aqui falando da Amazônia porque é um assunto que precisa repercutir, repercutir e repercutir na sociedade brasileira.

            Muito obrigado, Senador Papaléo.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 10/11/2009 - Página 57819