Discurso durante a 212ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à memória do Professor Hélio Gracie.

Autor
Arthur Virgílio (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AM)
Nome completo: Arthur Virgílio do Carmo Ribeiro Neto
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória do Professor Hélio Gracie.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2009 - Página 59522
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, ATLETAS, PRESENÇA, SESSÃO.
  • HOMENAGEM POSTUMA, ATLETA PROFISSIONAL, PROFESSOR, RESPONSAVEL, DIFUSÃO, ESPORTE, DESENVOLVIMENTO, TECNICA DESPORTIVA, LUTA, BRASIL, COMENTARIO, HISTORIA, FAMILIA, PRATICA ESPORTIVA.
  • DEFESA, POSSIBILIDADE, COMITE OLIMPICO BRASILEIRO (COB), INCLUSÃO, ESPORTE, LUTA, OLIMPIADAS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. ARTHUR VIRGÍLIO (PSDB - AM. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Presidente, para ser bem sincero, até que já me deu, em alguns momentos, vontade de lutar jiu-jitsu aqui, mas aí quebraria o decoro.

            Eu me dirijo, primeiro, à Mesa, ao ilustre Senador Mão Santa, 3º Secretário do Senado Federal, neste momento presidindo a sessão de homenagem ao inesquecível grande mestre Hélio Gracie; ao Ministro do STJ e faixa preta de jiu-jitsu Luiz Fux; ao Deputado Federal Marcelo Itagiba, também faixa preta de jiu-jitsu; ao grande mestre Oswaldo Alves; ao grande mestre e um dos maiores amigos que Hélio Gracie teve em vida, Prof. João Alberto Barreto; do mesmo modo o mestre e faixa preta e vermelha de jiu-jitsu e um dos maiores amigos com que contou Hélio Gracie ao longo de sua trajetória, Prof. Pedro Valente.

            Dirijo-me ao representante do Secretário de Esportes do Distrito Federal, Sr. José Landim; à Srª Reila Gracie, sobrinha do homenageado e mãe do maior lutador de jiu-jitsu que nós temos hoje no mundo; a dois representantes do judô - o Prof. Ricardo Bittencourt é um grande lutador de judô, mas, na verdade, é um faixa preta de jiu-jitsu do melhor nível - que eu devo aqui homenagear: José Mário Tranquilini, campeão sul-americano, e o Antônio Carlos, o Xuca, que foi campeão brasileiro e campeão carioca por diversas vezes.

            Deixei para o final, saudando as senhoras e os senhores presentes, o Prof. Rickson Gracie, que é bicampeão do Japan Open, lutador invicto em sua trajetória pelos tatames, um exemplo de vida, um líder em sua família.

            Da família Gracie, aqui estão, além do Rickson e da Reila, o Prof. Reyson Gracie, que foi meu professor; a Bianca Gracie; o Prof. Rolker Gracie. Eu teria que citar... Quase todos são familiares.

            Essa figura legendária do Vale Tudo, que é o Euclides Pereira, com quem eu treinei aqui em Brasília quando vim pra cá como Diplomata. O Euclides Pereira fez lutas memoráveis com Carlson Gracie e com Ivan Gomes. E eu sempre, quando me refiro aos treinos que fazia com ele, dizia que ia muito bem quando treinava de quimono com ele. Tirava quimono e já ficava aquele sufoco danado. E depois, eu sentia dor só de vê-lo bater saco. Aí já dava pra doer. Dá pra imaginar o “casca grossa” que ele era e que vai continuar sendo.

            O Professor Wallid Ismail, que hoje é um grande empresário dessa coisa importante que são os MMA(Mixed Martial Arts), e um lutador da melhor cepa, que traduzia as suas lutas pela coragem de arriscar sempre. Todas as lutas de Wallid davam muita agonia, porque dava a impressão de que em algum momento ele poderia cair, mas acabava caindo o outro. E o Prof. Sérgio Barreto, que consolidou um trabalho que vinha sendo feito pelo grande Mestre Armando Wriedt.

            Foi o Prof. Sérgio Barreto, que trouxe o jiu-jitsu para Brasília, e aqui nós temos um jiu-jitsu de bom nível. Aqui há inúmeros atletas do Amazonas. E se levarmos em conta que o Brasil é o maior polo mundial de jiu-jitsu e que o Rio de Janeiro é o principal polo brasileiro, eu diria, sem medo de errar, que o Amazonas é o segundo.

            Aqui, temos o mestre Henrique Machado, que preparou, entre outras pessoas, o Jacaré; o Prof. Paulo Coelho; o Prof. Ednei... Tenho muito medo de citar e fazer omissões, mas estão todos eles tresnoitados, sem dormir. Temos também o Prof. Elvis Damasceno, que é o Presidente da Federação Amazonense de Jiu-Jitsu, enfim...

            Senhoras e senhores, antes de mais nada , eu gostaria de tratar de uma questão muito prática. Estamos às vésperas das Olimpíadas de 2016, que é logo ali, daqui a poucos anos. O Brasil tem que cuidar da segurança pública, o Brasil tem que cuidar da infraestrutura das cidades brasileiras, sobretudo do Rio de Janeiro - temos a Copa antes, que vai ser no Brasil inteiro -, e eu estou muito interessado em buscar coordenar aqui, no Congresso, Senador Mão Santa, um movimento, para que o Brasil não seja exótico, por parte do seu Comitê Olímpico Brasileiro, e não invente... Cheguei a ver, numa revista, que poderiam convocar o rugby, para virar esporte olímpico - isso é dar uma medalha para australiano ou para inglês, e não vejo a menor graça nisso - ou o golfe e aí os Estados Unidos trazem o Tiger Woods e a brincadeira acaba logo antes de começar.

            Eu nem diria que fosse talvez a vez, Rickson, do jiu-jitsu já, por uma porção de razões, mas eu diria que seria de imensa sabedoria que um dos dois esportes que o Comitê Olímpico Brasileiro pode indicar como esportes convidados para participarem da Olimpíada, valendo medalha, seria o Submission Grappling, que seria uma réplica, desde que as regras fossem acertadas...Sei da opinião do Prof. Beto Leitão: as regras teriam de ser acertadas, porque as regras não seriam bem as do Abu Dhabi Combat Club, o famoso ADCC, que é um grande campeonato de luta agarrada, para falar uma linguagem que as pessoas entendem melhor, sobretudo lá fora. Não sei se seriam as regras... Enfim, não seria greco-romana, porque essa já está na Olimpíada. Teria que haver um acerto de regras. Mas se o Brasil convidar essa modalidade, Prof. Tarcísio Moreno, o Submission Grappling, o Brasil pode levar, talvez, oito ou dez medalhas de ouro só aí.

            Então, sou a favor, primeiro, de que o Brasil não seja exótico, não traga nada exótico, nada que não interesse à massa brasileira, e esse é um esporte de massa, haja vista o número de pessoas que aqui se reúnem e o número de pessoas que estão nas web tvs a esta altura mobilizadas para nos ouvir; e, segundo, de evitar trazer esportes coletivos, que, por mais que sejam valorizadíssimos e valorosos, são esportes que, ao se vencer uma competição árdua, dura, se leva uma medalha. Teríamos que privilegiar esportes que fizessem o Brasil cair da situação lamentável de quatro ou cinco medalhas em uma Olimpíada para alguma coisa próxima de vinte medalhas, enfim.

            Eu vi, outro dia, uma revista especializada em jiu-jitsu, a Tatame, dizendo que o Brasil teria caído da 24ª posição na última Olimpíada para a 8ª posição se, por exemplo, valesse a modalidade, Prof. Wallid, do Grappling.

            Então, essa é uma luta que vamos fazer de maneira muito prática, procurando chamar aqui o Dr. Carlos Arthur Nuzman e mostrar a ele que não há nada mais correto do que fazer um simples feijão com arroz. E feijão com arroz manda trazer medalha. Trazer medalha é trazer medalha no campo do Brasil.

            O Brasil não vence os Estados Unidos no basquete profissional. Não vence! Nós não vamos produzir nunca boxeadores como Cuba produz, como os Estados Unidos produzem. E nós temos os melhores lutadores de jiu-jitsu. Nós somos uma potência no judô. Nós somos uma grande potência, hoje em dia, no muay thai. Estou muito convencido disso. Está por aqui o meu professor Dídimo. Não sei se o Reyson sabia, mas estou fazendo muay thai e estou muito apaixonado por essa arte bonita que completa demais o jiu-jitsu. Então, temos todas as condições de reunir um grupo de atletas que, a começar pelo filho da Reila, pelo Roger, traria medalhas de ouro para o Brasil, e daríamos a esses atletas a oportunidade de realizarem o sonho olímpico, o sonho de disputarem uma olimpíada e de realizarem um belo trabalho pelo País. (Palmas.)

            Eu gostaria de citar ainda a presença do Saulo Ribeiro, pai do professor Saulo Ribeiro, que fundou a universidade de jiu-jitsu em Chicago e é irmão de um dos grandes campeões e um dos grandes rivais do Roger, que é o Xande Ribeiro, Alexandre Ribeiro.

            Não vou citar mais ninguém. Vou simplesmente fazer a minha fala, porque quero homenagear todos na pessoa do professor Tarcísio Moreira.

            Eu dizia à Reila que vi, há dias, uma foto do professor Carlos Gracie junto com o professor Pedro Hemetério na praia. O professor Carlos Gracie tinha, mais ou menos, o corpo do Reyson. Era impossível alguém acreditar que aquele homem pudesse obter resultados práticos no confronto com quem quer que fosse. E eu me lembro dele, já com 74, 75 anos de idade, saltando de uma altura de quatro metros, protegido por ligamentos e por joelhos que eu não tenho e a maioria dos senhores aqui certamente não têm. Eu o via pular de uma sacada na sua casa em Teresópolis e cair feito um gato, amortecendo sua queda com a flexibilidade que ele recebera de Deus e cultivara ao longo de tanto tempo de ginástica e prática de jiu-jitsu, enfim.

            A vida do jiu-jitsu começou com Carlos Gracie, aluno de Conde Koma, e passou para Hélio Gracie o jiu-jitsu que aprendera com o intrépido japonês que eles, paraenses, conheceram em Belém do Pará.

            Hélio Gracie depois desenvolveu - e foi passando para seus alunos, que foram, por sua vez, desenvolvendo também - outras técnicas. O jiu-jitsu é uma ciência, e ciência não tem limites. Hélio Gracie desenvolveu as bases do que hoje chamamos de Brazilian Jiu-Jitsu, uma coisa tão respeitada no mundo. Reuniu um grupo de professores e alunos: o principal deles está aqui, o professor João Alberto Barreto; também o professor Hélio Vigio, que infelizmente não pôde estar presente; o professor Haroldo Brito; o professor Reyson Gracie; o professor João Carlos Ataíde; o professor Sérgio Barreto; o professor Álvaro Barreto, que também não pôde vir, pois tem compromisso neste momento fora do País, e fez época com a sua academia, no centro da cidade do Rio de Janeiro, na Avenida Rio Branco. Fez época!

            O jiu-jitsu, em função da grande explosão do judô, que se tornou uma luta muito apreciada e muito difundida, ficou restrito a um grupo pequeno de pessoas que o praticavam. Isso era uma coisa boa, por um lado, se falarmos egoisticamente, pelo fato de dominarmos uma arte que era muito pouco conhecida das demais pessoas, o que nos dava um grande privilégio em termos de segurança pessoal, em termos de conhecimento. Ou seja, cada membro daquela seita se sentia um super-homem e, de certa forma, o era. Isso, até o momento em que o jiu-jitsu explodiu, e explodiu ganhando paulatinamente público no Rio de Janeiro, Manaus, que foi um polo para o qual contribuíram muito os professores Osvaldo Alves e Reyson Gracie. E o filho mais velho de Hélio Gracie, Rorion Gracie, vai para os Estados Unidos e idealiza essa coisa que hoje é o octagon. Ou seja, a ideia de uma luta em que, diferentemente do ringue, não houvesse espaço para o oponente que estivesse em desvantagem escapar do combate frontal.

            E Rorion, com muito tino empresarial e com muita persistência, depois de passar por momentos muito difíceis nos Estados Unidos, transforma aquilo numa luta profissional, o UFC, Ultimate Fighting Championship, que depois ele vende para os irmãos Fertitta. Os irmãos Fertitta vendem para o Dana White, que hoje está pelo menos muitas vezes milionário com um esporte que compete com o basquetebol e com o beisebol nos Estados Unidos, quando se trata de pay-per-view, quando se trata de afluência aos estádios.

            Aí, as pessoas perceberam que houve dois momentos: o primeiro momento, em que o jiu-jitsu surpreendeu a todos, quando o Royce Gracie, que foi um herói tricampeão do UFC, com 80 quilos - e não é só ter 80 quilos, tinha uma figura franzina e tem uma figura franzina -, enfrentou e derrotou os homens mais fortes do planeta: Ken Shamrock, Dan Severn e, o que era pior, sempre por golpe e sempre dando aos leigos espectadores norte-americanos a ideia de que ele ia perder e terminava braço ou pescoço.

            Veio depois uma fase em que as pessoas começaram a aprender um pouco de jiu-jitsu. Não precisava saber muito. Bastava saberem um pouco para sustentarem aquela coisa do ground and pound: ficar na guarda, não precisar sair da guarda, não precisar saber passar a guarda; bastava serem fortes, levantar e começar a socar o que estava em baixo.

            Essa fase foi uma fase dura, de readaptação dos lutadores do jiu-jitsu. Não quero falar só deles. Eu quero falar de Hélio Gracie no final. Essa fase foi muito dura. Apareceram aqueles grandes wrestlers; houve a luta do Fábio Gurgel, com 90 e poucos quilos, contra um homem de 130, muito forte, um grande wrestler; uma luta que Fábio Gurgel aturou heroicamente. Houve uma luta do Murilo Bustamante contra um outro cidadão que pesava 150 quilos, uma coisa heróica também. Mas compreendemos ali também que duas coisas precisavam acontecer: aprofundar, no lutador de jiu-jitsu, outras técnicas, já que os outros praticantes estavam aprendendo jiu-jitsu, e, por outro lado, dividir essa coisa por peso, porque está chegando a um ponto, dizia para Reila ainda há pouco, que as pessoas eram mais fracas antes, eram menores.

            O Carlson fez o que fez. Quero aqui homenagear o grande mestre Carlson Gracie, meu professor e um herói. Ele fez o que fez, pesando 76 quilos. Euclides pesava mais ou menos isso. Waldemar Santana, que era tido como um animal de forte, enfrentou o Hélio Gracie por 3 horas e 42 minutos na ACM, Associação Cristã dos Moços, no Rio de Janeiro, com vitória para ele. Mas ele tinha 25 anos, 88 quilos; Hélio Gracie tinha 63 quilos, 45 anos. Três horas e quarenta e dois minutos de luta seguida. Waldemar era tido como homem excepcionalmente forte. As pessoas hoje são muito fortes. Hoje qualquer menino chega a 100 quilos com muita facilidade, desde que bem alimentado. Por isso, quero louvar o Tranquilini por fazer esse belo trabalho social que ele faz como professor de judô que é, mas faz, sobretudo, como homem comprometido com o seu País, que é também.

            E aí nasceram as MMA, Mixed Martial Arts. Foi o Royce assustando todo mundo nos Estados Unidos, e o Rickson fazendo a mesma coisa no Japão, enfrentando seis adversários muito duros, inclusive o principal ídolo japonês, dizimando esse moço e mostrando a superioridade de sua luta. Mas, hoje, os lutadores de jiu-jitsu fazem o que sempre souberam fazer e são muito completos, também - como os demais procuram ser completos.

            E percebo que esse refinamento do chão é sempre uma vantagem muito grande, embora nós não encontremos mais ninguém que ouse pisar em um tatame, ou melhor, em um ringue - perdão - ou em um octagon sem conhecer chão. É uma temeridade. É uma temeridade, realmente, quando se trata dessa luta - que eu não chamaria de vale-tudo, porque não é uma luta violenta; é uma luta com regras, muito mais leve do que essa covardia contra cidadãos desarmados nas ruas, muito mais leve do que uma pessoa preparada bater em uma pessoa que não é preparada. Ali são pessoas iguais, pesos parecidos, assistência médica, juiz que sabe a hora de mandar parar. É um entertainment. É uma grande indústria que dá emprego a milhares de brasileiros: para quem carrega o balde, para quem carrega a cadeira para o lutador descansar; dá emprego para lutadores - e o Wallid hoje é um grande promotor -; dá emprego para técnicos das várias modalidades; dá emprego para os preparadores físicos, específicos - o preparador físico de natação é uma coisa, o preparador físico de jiu-jitsu é outra coisa, pois têm que preparar certos músculos para os momentos de explosão, para os momentos de resistência. Então, hoje em dia nós temos um grande espetáculo de entertainment.

            Fui a Los Angeles ver a luta de Lyoto Machida com Maurício Shogun e percebi, inclusive, um desejo danado de Shogun levar a luta para o chão. Percebi que, apesar de faixa preta e bom lutador, Machida não queria ir par ao chão. Ele sabia que o chão seria, talvez, uma coisa decisiva para o outro e foi levando a luta de um jeito que eu não gostaria de ter sido juiz daquela luta, de jeito nenhum.

            Eu sou a favor, Rickson, de que se acabe com essa história de, no vale-tudo, no MMA, se dar a vitória ao atual campeão. Numa corrida de cavalos, um nariz define a favor do cavalo que tinha o nariz na frente; na natação, se o Cielo ficar um dedinho atrás do outro, quem ganha é o outro. Então, sou a favor de que vença aquele que venceu a luta, aquele que realmente derrotou o outro, que fez mais, que somou mais pontos, que foi superior, enfim. Esse é um esporte que adoro, que amo, que admiro muito, mas para mim é um vício que o boxe tem dizer que é preciso vencer muito flagrantemente um campeão para tomar do campeão. Não entendo que seja assim. Entendo que a obrigação do campeão é vencer flagrantemente o outro para se manter campeão.

            Esta sessão nasceu de um desejo que eu tinha - e transmiti isso ao Royler, que é talvez o lutador com mais títulos no jiu-jitsu de quimono, além de ter sido um bravo lutador de MMA, com um belo currículo no Japão e muitas lutas pelo Brasil afora. Uma vez ele veio aqui me visitar e conversamos muito. Falei para o Royler que nós tínhamos de fazer uma homenagem ao pai dele. Eu gostaria de ter feito uma homenagem ao Professor Carlos Gracie. O Senado vivia em crise. Gostaria de ter feito uma homenagem ao Carlson. O Senado vivia em crise e não tinha clima para que fizéssemos isto que estamos fazendo hoje. Mas, com ou sem crise, não era possível deixar passar o falecimento de Hélio Gracie. Tive ocasiões de declarar isso.

            Fiz uma entrevista outro dia para uma Web TV que há aqui em Brasília - dizem eles que têm 200 mil telespectadores, pelo menos, no mundo inteiro -, e estava ao meu lado aquele faixa preta que fez aquele belo trabalho de abrir o jiu-jitsu, Pedrinho, para os Emirados Árabes. Conquistou o Xeque Tahnoon, e hoje o jiu-jitsu é um esporte obrigatório - coisa que não é ainda no Brasil - nos Emirados Árabes. Estávamos lá falando e, de repente, houve uma declaração do notável, fantástico lutador Anderson Silva. A meu ver, temos que ter noção de humildade. Grande lutador, pequeno lutador, todo mundo deve ser humilde; não se deve pisar de salto alto. Mas Anderson Silva, referindo-se, se não me engano, ao Rickson, disse uma coisa do tipo: os Gracie passaram. Eu disse: longe de mim desmerecer o lutador Anderson Silva, que é um lutador excepcional, um lutador fantástico, que eu admiro, vibro com as lutas dele - não sei se vou vibrar tanto quando ele enfrentar o Vítor Belfort -, mas a humildade deveria fazê-lo não questionar os Gracie; deveria, ao contrário, pagar royalties das bolsas dele. De cada luta, ele deveria pegar um percentual e depositar na conta da família Gracie, porque ele não teria jamais despontado como despontou para o estrelato mundial se não fosse o que recebeu de oportunidades. (Palmas.)

            Lembro-me aqui do Rolls, que era um fenômeno. Jamais vi uma pessoa tão habilidosa usando um quimono. E também, quando fazia boxe, aquele estilo dele, no centro do ringue, parecia o lutador Jack Dempsey - me lembrava muito aquilo -, mas, infelizmente, a natureza não deu a ele o vigor físico que deu ao Rickson, que é outro fenômeno e, sem dúvida, uma figura absolutamente imbatível quando se trata de luta de quimono. Não tenho nenhuma dúvida de que, se quisesse prosseguir por mais tempo na sua carreira, continuaria sem perder, porque jamais perdeu e não haveria de aprender a perder agora.

            Eu me lembro do Professor Reyson Gracie. Magrinho como é, jamais vi uma pessoa utilizar tão bem a sua nenhuma força física. E já vi momentos de muita explosão do Reyson. Jamais vi alguém utilizar tão bem a sua notável força física.

            Mas eu queria falar do Professor Hélio Gracie. Primeiro, uma figura que era um exemplo. Segundo, uma figura muito dura no trato. Eu mesmo muitas vezes fui admoestado por ele; ele me tratava como se fosse um filho e, na hora em que tinha que brigar com os outros, brigava comigo também. E o meu maior contencioso com ele, Reyson, foi uma época em que ele saía de casa às cinco da tarde para ir a um sítio que ele tinha perto de Itaipava. E Rolls, eu e uma porção de outros entrávamos na casa dele, que era uma casa enorme, e fazíamos festas memoráveis lá. E ele odiava aquilo. Ele tinha ódio daquilo. E um dia ele chamou o Rolls e disse: “Vocês não podem continuar com essa bagunça, com essa palhaçada, com essa desmoralização aqui na casa”. E disse que nós tínhamos que parar com aquilo. E como nós não paramos, ele disse: “Eu vou travar com vocês uma luta: vou ficar aqui, não saio mais daqui, vou prejudicar minha saúde - eu quero viver muito e não quero ficar aqui na poluição do Rio de Janeiro -, mas vou ficar aqui e vocês não vêm para cá”.

            Essa luta nós vencemos porque ele aguentou três meses. Chamou o Rolls, que jurou de pés juntos que nunca mais faria aquilo. Assim que ele virou as costas, nós descumprimos a palavra, entramos e fizemos uma belíssima festa na casa dele. Então, havia momentos em que ele ficava realmente abespinhado conosco. Mas quantas lições de integridade moral, quantas lições de determinação... Eu me comovo... (Palmas.)

            Lutador de jiu-jitsu chora também. (Palmas.)

            Não é só o Hélio Gracie. Eu duvido que qualquer uma das pessoas que vá falar aqui não se emocione também.

            À influência do jiu-jitsu na minha vida eu devo muito, talvez tudo que sou.

            Muito obrigado. (Palmas.)


Modelo1 8/16/247:18



Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2009 - Página 59522