Discurso durante a 212ª Sessão Especial, no Senado Federal

Homenagem à memória do Professor Hélio Gracie.

Autor
Marcelo Crivella (PRB - REPUBLICANOS/RJ)
Nome completo: Marcelo Bezerra Crivella
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
HOMENAGEM.:
  • Homenagem à memória do Professor Hélio Gracie.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2009 - Página 59532
Assunto
Outros > HOMENAGEM.
Indexação
  • SAUDAÇÃO, AUTORIDADE, PRESENÇA, SESSÃO, HOMENAGEM, PROFESSOR.
  • HOMENAGEM POSTUMA, ATLETA PROFISSIONAL, PROFESSOR, ENSINO, TECNICA DESPORTIVA, DIVULGAÇÃO, LUTA, BRASIL, EXTERIOR, COMENTARIO, HISTORIA, FAMILIA, IMPORTANCIA, ESPORTE, DEFESA, CIDADÃO, AUSENCIA, AGRESSÃO, LESÃO, ADVERSARIO.
  • ELOGIO, EMPENHO, FILHO, PROFESSOR, PRESIDENTE, FEDERAÇÃO, LUTA, ESTADO DO RIO DE JANEIRO (RJ), INCENTIVO, ESPORTE.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. MARCELO CRIVELLA (Bloco/PRB - RJ. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Arthur Virgílio; senhores telespectadores da TV Senado; senhores ouvintes da Rádio Senado; meu querido amigo Deputado Marcelo Itagiba; meu querido amigo Magno Malta; já se retirou o Ministro do STJ Luiz Fux; Sr. Rickson Gracie; quero saudar também o Sr. José Landim, que é representante do Secretário de Esportes do Distrito Federal; quero saudar a Reila Gracie, sobrinha do homenageado - Reila, prazer em te ver -; quero saudar também o professor João Alberto Barreto; o professor Pedro Valente; e o professor Osvaldo Alves.

            Esta sessão ilustre tem como objetivo prestar justa homenagem ao preclaro professor Hélio Gracie, que faleceu em janeiro, um dos maiores símbolos do esporte nacional, considerado o Pai do Jiu-Jitsu brasileiro e que, no exterior, é considerado como “Gracie Jiu-Jitsu”.

            Adolescente franzinho aos 15 anos, proibido de praticar esportes, principalmente de luta, o favorito de toda a sua família, Hélio precisou de um golpe de sorte para entrar no tatame e se tornar um dos mais importantes nessa modalidade mundial originada no remoto Oriente.

            A história supõe que, iniciado na China, há 2.500 anos, foi no Japão do século XVII que o jiu-jitsu logrou popularidade e se expandiu para o mundo.

            A presente sessão especial do Senado Federal homenageia, pois, não apenas um brasileiro conhecido, mas um brasileiro que, por meio de suas aulas e de sua técnica refinada e inovadora, formou o caráter e o civismo de gerações de outros brasileiros - o professor Hélio Gracie.

            A saga da família Gracie no Brasil começa em 1801, quando George Gracie aqui chega, oriundo da Escócia. No começo dos anos 1900, Gastão Gracie, neto de George, morava em Belém do Pará, quando o destino colocou em seu caminho o professor de jiu-jitsu japonês Mitsuyo Maeda. A ligação entre eles deu origem à dinastia Gracie de lutadores e instrutores de lutas marciais. Hélio é filho de Gastão, o caçula de oito irmãos.

            A predestinação da família para o sucesso ficou definitivamente marcada com a ida de Rorion gracie filho mais velho do Professor Hélio, para a Califórnia, onde se fixou e abriu a Academia Gracie de Jiu-Jitsu, em Torrance.

            Em 1993, a família Gracie, sob a inspiradora orientação de Hélio, cria um dos maiores sucessos internacionais no mundo da luta - The Ultimate Fighting Championship, o UFC - hoje visto pela televisão em qualquer país. Os lutadores brasileiros são expoentes nessa modalidade.

            Sr. Presidente, a personalidade e o ideal de Hélio Gracie podem ser resumidos por suas próprias palavras:

O jiu-jitsu que criei foi para dar chance aos mais fracos enfrentarem os mais pesados e fortes ... Gostaria de deixar claro que sou a favor da prática esportiva e da preparação técnica de qualquer atleta, seja qual for a sua especialidade... O objetivo do Jiu-Jitsu é, principalmente, beneficiar os mais fracos, que não tendo dotes físicos, são inferiorizados. O meu jiu-jitsu é uma arte de autodefesa...

            Esse é o espírito que norteou a vida de Hélio Gracie: ajudar aqueles que precisavam adquirir um instrumento de defesa pessoal para usar na vida. Não uma arma de ataque feita do próprio corpo, pronta para agredir, mas uma capacidade de defesa para superar dificuldades no mundo moderno.

            Por isso, o Professor Gracie granjeou o respeito de seus contemporâneos e deixou um legado que permanecerá presente na sociedade pelos seus ensinamentos esportivos e cívicos.

            O Gracie Jiu-Jitsu, senhoras e senhores, no sentido que lhe deu o Professor Hélio, humaniza o praticante, dando-lhe condições de controlar seu adversário sem lhe causar qualquer lesão. É a defesa sem agressão.

            Sua eficácia é tal que é utilizado pelos mais importantes departamentos de polícia dos Estados Unidos da América e por suas agências federais. O Exército Norte-Americano reformulou seu manual de combate corpo a corpo para incorporar as técnicas de Gracie. Mas não é só no mundo dos esportes e policial-militar que a Escola Gracie de Lutas se impôs. Duas outras aplicações são altamente importantes para a sociedade moderna no mundo todo: a primeira dota as mulheres de elementos para se defenderem de ataques sem dependerem de força, velocidade ou coordenação; a segunda, pouco conhecida do grande público, mas exatamente importante para os voos comerciais, é a que ensina pilotos e comissários de bordo a controlarem passageiros indisciplinados no interior de uma aeronave. Esta segunda tem um nome pomposo em inglês: Gracie Air Rage Defense, que significa, em português, Defesa Gracie contra Fúria a Bordo.

            Sr. Presidente, a vida de Hélio Gracie é cheia de peripécias, que vão de lutas que ficaram nos anais do esporte até marcantes criações de técnicas de defesa pessoal que influenciaram o mundo dos esportes e das organizações sociais.

            O exemplo mais contundente de como a técnica de luta de Hélio Gracie é eficaz para melhorar a vida de seus praticantes é o próprio professor.

            Franzino rapaz até 15 anos, sujeito a desmaios nunca diagnosticados, Hélio freqüentava, diariamente, a academia da família, onde seu irmão Carlos dava aulas, no bairro do Flamengo, no Rio de Janeiro. Certa feita, tendo Carlos se atrasado para a aula de um seu aluno, Hélio se ofereceu para substituir o irmão, enquanto este não chegava.

            Mesmo nunca tendo praticado os golpes, Hélio os conhecia todos de cor, por vê-los executados diariamente na academia dos irmãos. O aluno gostou tanto da aula que decidiu continuar seu aprendizado com o novo professor, decisão que comunicou ao Carlos imediatamente.

            De frágil jovem a professor de jiu-jitsu, Hélio Gracie levou o espaço de uma hora. Desse dia em diante sua carreira nunca mais se interrompeu e, misteriosamente, sua doença desapareceu, como que por milagre. O próprio Professor a diagnosticava como algum tipo de insegurança que o debilitava e que a prática da arte marcial o fez desaparecer por completo.

            Meus senhores, minhas senhoras, não poderíamos querer melhor exemplo do beneficio que a prática esportiva de uma luta marcial pode trazer para a saúde física e mental de uma pessoa.

            Quando a intenção é positiva, a resposta também o é!

            Essa máxima se aplica de modo impecável ao que aconteceu com o Professor Hélio e a sua escola do Gracie Jiu-Jitsu.

            Reconhecido mundialmente como inovador e reformulador da prática esportiva de lutas marciais, o Professor Hélio Gracie merece destaque como uma das mais importantes personalidades esportivas do século XX no Brasil e no mundo.

            Seu legado é inestimável não só no campo da técnica esportiva, como na formação do espírito cívico das pessoas, qualquer que seja sua nacionalidade.

            O Brasil pode se orgulhar de ser a pátria desse ícone do jiu-jitsu mundial e do bem que sua escola esportiva tem feito a milhares de alunos que ainda hoje passam por sua academia aqui e no exterior.

            A justíssima homenagem que o Senado Federal presta ao vulto Professor Hélio Gracie, que soube cumprir com grandeza a missão de sua vida, nada mais é do que o reconhecimento da enorme contribuição que ele deu à evolução para melhor da sociedade brasileira por meio da prática esportiva sadia.

            Sr. Presidente, eu não poderia terminar meu pronunciamento - seria um deslize imperdoável - sem citar um outro grande lutador, filho do professor de Hélio Gracie, filho do professor Carlos, Robson Gracie, uma figura muito querida, muito estimada de todos os cariocas. Ele tem sido, no Rio de Janeiro, como Presidente da Federação, um lutador. E essa virtude do jiu-jitsu transpõe os ringues e também o tatame, pelo seu princípio de vencer todos os percalços da vida, superar dificuldades e dar àqueles que hoje, pelas circunstâncias inevitáveis da vida, acabam estando em situação desfavorável nas suas caminhadas, as virtudes mentais e físicas da superação.

            Sem o Robson, o jiu-jitsu, no Rio de Janeiro, estaria, eu diria, golpeado de maneira mortal. Sem ele, aquela Federação teria sido despejada, para a tristeza do Professor Carlos, seu pai, e de seu tio Hélio Gracie. Sem ele, lutador extraordinário, muito mais do que no ringue, na vida, um homem que acredita nos ideais que defende, nós teríamos, no Rio de Janeiro, que tanto precisa, para a juventude da nossa cidade, hoje fascinada, muitos deles, pelas drogas, pela violência, pelo tráfico e pelas atividades à margem da lei, uma perda tremenda.

            Eu acho que não firo a memória de Hélio Gracie ao citar aqui o seu sobrinho ilustre, que, no Rio de Janeiro, é um nome que tem o respeito, a admiração, o apreço e o carinho de todos os cariocas.

            Por fim, eu quero dizer, Itagiba, que há alguma coisa de divina nessa luta do jiu-jitsu. E eu digo isso tirando dos ensinamentos da Bíblia, porque - não sei se os senhores sabem -, Senador Arthur Virgílio, o povo hebreu, que é um povo de grandes lutas e que deixou o seu legado escrito nas Escrituras Sagradas, nasce de um velho e uma mulher estéril, quando ninguém esperava que Abraão e Sara pudessem dar ao mundo uma nação que é um exemplo de superação.

            E todos se lembram do maior demagogo que passou na história do mundo e que tinha na primeira fila do ódio nazista os judeus. Depois viriam os negros, depois viriam os ciganos, depois viriam, talvez, até os sul-americanos como raça misturada entre sangue índio, negro e vermelho, mas estavam lá os judeus na primeira fila do ódio do grande demagogo.

            Pois bem, este princípio de Davi lutar contra Golias, de Moisés à beira do Mar Vermelho, perseguido por um exército do faraó, essa coisa de trazer alento interior de uma fé, uma fé, eu digo, no ideal de que pode, sim, uma pessoa não prestigiada pela força física, lutando motivada por um ardor de justiça, superar um adversário mais forte. Essa coisa tem algo de divino. E acho que as coisas divinas não se apagam.

            Tenho certeza de que o jiu-jitsu, nesse seu princípio de defesa sem causar dano, nesse seu princípio de levar os mais fracos a não serem humilhados diante da força do seu adversário, merece de todos nós um reconhecimento e um aplauso. É isso que vejo no Robson.

            Eu não tive alegria de conhecer o grande campeão, o grande Professor Hélio, mas posso dizer que o conheço, de certa forma, pelo reflexo das atitudes mais simples, do homem da família, do amigo de todos, do servidor do povo, daquele que está sempre tentando levar aos meninos e meninas do Rio de Janeiro a idéia de que não devem ser escravos de suas frustrações, nem aceitar com resignação as imposições da vida, muitas delas injustas, por uma sociedade tão desigual que é a brasileira, mas que poderão superá-las, com certeza, e o exemplo disso é uma luta de jiu-jitsu em que se termina exausto, mas recompensado pela vitória.

            Vejo que aqui, no Senado Federal, vocês têm também grandes representantes, tanto o Magno quanto o nosso Senador da Oposição Arthur Virgílio, dois grandes lutadores.

            O Magno, recentemente, precisou superar um problema na coluna que quase lhe tirou a mobilidade das pernas. Se vocês lerem o livro dele, vão ficar emocionados, porque, numa madrugada, no hospital, ele teve realmente um encontro com Deus. Ele estava desenganado e hoje anda, é um homem normal que comunga comigo dessa mesma fé.

            E tenho certeza de que Arthur, ainda que por caminhos diferentes, também - vi pela sua emoção no discurso - traz como uma chama, eu diria inapagável, essa luta de tentar levar ao povo brasileiro, sobretudo aos mais fracos, a visão da superação e da vitória.

            Muito obrigado. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2009 - Página 59532