Discurso durante a 213ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Preocupação com carta recebida do Bispo de Umuarama, no Paraná, relatando a gravidade da situação local, e alerta sobre a possibilidade de um grande conflito, por uma questão inaceitável imposta pela FUNAI, que pretende desalojar cerca de mil proprietários rurais, para entrega das terras aos índios Xetás. (como Líder)

Autor
Osmar Dias (PDT - Partido Democrático Trabalhista/PR)
Nome completo: Osmar Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INDIGENISTA.:
  • Preocupação com carta recebida do Bispo de Umuarama, no Paraná, relatando a gravidade da situação local, e alerta sobre a possibilidade de um grande conflito, por uma questão inaceitável imposta pela FUNAI, que pretende desalojar cerca de mil proprietários rurais, para entrega das terras aos índios Xetás. (como Líder)
Aparteantes
Osvaldo Sobrinho.
Publicação
Publicação no DSF de 18/11/2009 - Página 59609
Assunto
Outros > POLITICA INDIGENISTA.
Indexação
  • LEITURA, CARTA, BISPO, DENUNCIA, GRAVIDADE, SITUAÇÃO, POSSIBILIDADE, CONFLITO, MUNICIPIO, UMUARAMA (PR), ESTADO DO PARANA (PR), DECISÃO, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), DESAPROPRIAÇÃO, PRODUTOR RURAL, NEGAÇÃO, INDENIZAÇÃO, OCUPAÇÃO, MINORIA, TRIBO, SOLICITAÇÃO, INTERVENÇÃO, OPINIÃO, ORADOR, DESRESPEITO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL, AQUISIÇÃO, TERRAS, LEGALIDADE, ESCRITURA, REGISTRO, CARTORIO, NECESSIDADE, AVALIAÇÃO, COMISSÃO DE CONSTITUIÇÃO E JUSTIÇA, EXIGENCIA, ATUAÇÃO, GOVERNO ESTADUAL.
  • COBRANÇA, FUNDAÇÃO NACIONAL DO INDIO (FUNAI), REALIZAÇÃO, REUNIÃO, DISCUSSÃO, BUSCA, SOLUÇÃO, CONFLITO, POSSIBILIDADE, PEDIDO, INTERFERENCIA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, GARANTIA, INTERESSE PUBLICO, SEGURANÇA NACIONAL.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR. Como Líder. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Senador Mão Santa, está ao seu lado o Presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) do Senado, o Senador Demóstenes Torres, o que é oportuno, Senador Demóstenes, porque o que está acontecendo em Umuarama, no Paraná, é algo que precisa ser avaliado até pela CCJ do Senado. Recebi uma carta de D. Vicente, Bispo de Umuarama, que revela a gravidade da situação em que se encontra a cidade de Umuarama, região onde pode ocorrer um grande conflito, por uma questão absolutamente inaceitável que está sendo imposta pela Fundação Nacional do Índio (Funai).

            Uma antropóloga, Presidente Demóstenes, passou pela região para fazer uma tese de mestrado e descobriu que alguns índios passaram por aquela região, os índios xetás. A descoberta dela, a passagem dos índios ali - não é que eles tivessem vivido naquela região -, é de mais de cinquenta anos atrás. Como antropóloga, ela defendeu a tese de que os índios passaram por aquela região e que, então, aquela região poderia ter sido habitada pelos índios xetás. Assim, a Funai, neste momento, está trabalhando para decretar o desalojamento de cerca de mil proprietários rurais - vou repetir, são mil proprietários rurais - localizados na área entre Umuarama e Ivaté, uma área de 12,4 mil hectares, que poderá ser retirada daqueles proprietários rurais para ser entregue aos índios xetás. São sete os índios xetás. Um deles, inclusive, é policial em Curitiba; outro tem uma farmácia em Chapecó. São índios que já deixaram sua cultura há muitos anos, mas a antropóloga achou que aquelas terras têm de ser devolvidas ao índios. Hoje, portanto, há uma situação que pode resultar em conflito na região.

            Ouvi depoimentos de pessoas que vivem lá. Conversei bastante com Lázaro, que é ligado ao Sindicato dos Produtores Rurais de Umuarama e que me disse dos depoimentos já exaltados dos moradores daquela região. Alguns dizem: “Aqui, estou com minha família há mais de cinquenta anos. Aqui, estou com minha família há mais de setenta anos. Daqui não saio e, se for preciso, vou lutar até o fim”. Veja a situação em que essas famílias estão!

            Senador Mão Santa, eles compraram a terra do Estado. O Estado do Paraná vendeu a terra, fez a colonização no início do século passado e vendeu as áreas para aqueles produtores. Aquelas áreas foram adquiridas, não foram doadas, não foram invadidas, não foram tomadas por aqueles que hoje vivem lá com suas famílias. Aquelas áreas foram adquiridas num projeto de colonização, realizado no início do século passado pelo então Governo do Estado do Paraná. As pessoas compraram a terra, com escritura no cartório. Está tudo registrado, e, de repente, a Funai diz que vai tirá-los de lá e que não vai indenizá-los, ou seja, não vai pagar pela terra. Ali eles construíram sua casa, construíram as cercas da propriedade, plantaram suas pastagens, seus pomares, as lavouras de cana-de-açúcar e de soja, que cultivam todos os anos. Ali eles formaram sua família. Já há gente ali que está na terceira geração, e eles estão se sentindo absolutamente inseguros.

            Naquela região, entre Umuarama e Ivaté, nenhum negócio de terra é mais realizado. Sabem por quê? Porque as pessoas não querem comprar algo em que não haja segurança, não querem comprar algo que está sob a ameaça da Funai, que pode tirar a terra para entregar a sete índios xetás, que, repito, passaram pela região.

            Conversei muito nesse fim de semana. Fui à região de Umuarama, ao noroeste do Estado, para discutir a questão e ver o que as pessoas estão pensando e querem para o futuro do Paraná.

            Senador Mão Santa, tomei uma iniciativa. Estou há quinze anos no Senado. Na eleição passada, disputei o Governo do Estado. Por dez mil votos, o resultado não foi a vitória, mas aquilo foi uma lição para mim. Saí dali, dizendo: “Não vou ficar chorando por não ter ganhado por dez mil votos, vou buscar a confiança desses que não confiaram naquele projeto, mas que vão confiar num melhor, porque nós vamos fazer com a população”. Estou fazendo um projeto para o Estado, discutindo cada problema. Vou à região de Umuarama e quero ouvir a população, como a ouvi, e eles me falam sobre o problema dos índios. Vou pegar isso para valer, como Senador, porque esse é meu papel. Um Senador da República não pode se omitir diante disso que está aqui colocado. Mas vou construir, com a opinião das pessoas, um projeto para meu Estado. É isso o que estou fazendo.

            Senador Demóstenes, não podem sete índios que passaram por lá tomar mil propriedades, uma área de 12,4 mil hectares! Não posso admitir isso, não vou admitir isso! E onde for o alcance das minhas forças, levarei a defesa daqueles produtores.

            Até para reforçar o que estou dizendo aqui, quero ler a carta que me enviou o Bispo Diocesano de Umuarama, Dom Vicente Costa:

“Excelentíssimo Senhor,

Vimos à presença de V. Exª para manifestar-lhe nossa sincera e profunda preocupação, como Bispo Diocesano da Diocese Divino Espírito, Umuarama, pela proposta que a Funai pretende encaminhar quanto ao assentamento da população indígena da tribo Xetá, numa área pertencente à minha Diocese.”

            Sr. Presidente, até a área da Igreja estão querendo tirar! Não estão querendo tirar só a dos produtores, não, mas também a área da Igreja, a área da Diocese de Umuarama. Ah, o Bispo não está conformado com isso, não! Dom Vicente não está concordando com isso. Se o Bispo Diocesano não está concordando com que tirem a terra da Igreja, imaginem os proprietários que compraram suas áreas e que estão lá com suas famílias! E, aí, ele escreve mais:

“De fato, no último dia 30 de outubro, nas dependências da Cúria Diocesana, recebi um grupo de aproximadamente cinquenta moradores e proprietários cujas terras estão sendo contempladas para integrar a nova área a ser destinada à tribo Xetá. Como Bispo da Igreja Católica, apoio integralmente a causa indigenista e indígena, ainda mais que a Campanha da Fraternidade de 2002 tratava justamente do tema: “Fraternidade e povos indígenas”, e com o lema: “Por uma terra sem males!”. Inclusive, faço parte da Comissão Episcopal para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e conheço bastante bem a Diocese-Irmã: Humaitá - AM, com a qual a Diocese de Umuarama desenvolve um intenso e profícuo intercâmbio de missionários e experiências missionárias muito marcantes. Portanto, já estive em algumas das aldeias indígenas naquelas terras amazonenses e sei o quanto é fundamental e absolutamente essencial a defesa das nações indígenas [...].”

            Ele discorre sobre a defesa que a Igreja faz das nações indígenas, mas isso reforça ainda mais a tese que estou defendendo aqui, porque a Igreja defende os índios, mas a Igreja não concorda com injustiça. O Bispo Diocesano, Dom Vicente, diz que ele está muito preocupado e encerra a carta, Sr. Presidente, dizendo:

“Por isto, sinceramente, peço a V. Exª para encontrar os meios adequados a fim de que este diálogo sereno e transparente entre a Funai e os representantes dos moradores e proprietários aconteça o quanto antes. Da minha parte, como Bispo Diocesano, prometo-lhe oferecer todo tipo de ajuda e auxílio que forem necessários.

Por fim, penso que V. Exª [dirige-se a mim], como homem de bem e justo, há de concordar comigo no que segue: que tal proposta ao ser encaminhada, se não for bem conduzida segundo os parâmetros da justiça e do respeito, possa deflagrar uma situação de conflito social nessa nossa área. E isso seria lamentável para ambos os lados e para toda a sociedade. Que o Bom Deus e o amor à humanidade nos libertem de um flagelo como este [é o Bispo que está dizendo isso]!

Contando com o vosso pronto atendimento, agradecemos atenciosamente, Dom Vicente Costa, Bispo Diocesano.”

            Sr. Presidente, a coisa não está para brincadeira. Dom Vicente Costa, Bispo Diocesano de Umuarama, está alertando que lá pode ocorrer um grande conflito, e a Funai já está querendo demarcar a área e entregá-la aos índios, sem ouvir os direitos dos proprietários. Sei que os proprietários, se ingressarem na Justiça, vão ganhar. Mas isso vai levar quantos anos? Três, cinco, dez, vinte anos! E eles vão ficar inseguros.

            Então, pelo amor de Deus, vamos ouvir a voz do bom-senso, vamos ouvir a voz da experiência de Dom Vicente, que está alertando que vai ocorrer um conflito! E estou repetindo o que ele está dizendo: acontecerá um conflito se quiserem tirar de lá os proprietários, que suaram a camisa, que calejaram as mãos para construir aquelas propriedades. Ali, eles formaram suas famílias. Seus filhos dependem daquelas propriedades, bem como os mil trabalhadores que estão lá naquelas propriedades. Não se pode, a troco de uma questão pura e simplesmente ideológica, para atender a uma tese de mestrado feita por uma antropóloga, que talvez tenha passado por lá rapidamente e não saiba a dureza que foi para construir aquela região, admitir que isso aconteça.

            Quero, sim, uma reunião com a Funai. Mas, se isso não for suficiente, quero uma reunião com o Presidente Lula, porque essa é uma questão de interesse e de segurança nacional. Quem está alertando é o Bispo Diocesano de Umuarama: vai ocorrer um conflito na área. Se esse aviso já foi dado, é preciso que as autoridades tomem pé da situação.

            De minha parte, vou fazer o que for possível. Quero uma reunião entre a Funai e os moradores da região, os proprietários legítimos daquela área. Se essa reunião não resolver o problema, vou ao Presidente da República. Esse caso não pode ficar entregue à boa vontade de uma antropóloga que passou por lá e da Funai, que não está vendo a gravidade do conflito que pode ocorrer naquela região.

            Sr. Presidente, é lamentável que um órgão público esteja agindo com tamanha irresponsabilidade e com falta de bom-senso em um caso tão grave, que envolve tantas famílias assim!

            O Sr. Osvaldo Sobrinho (PTB - MT) - V. Exª me concede um aparte?

            O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Pois não, Senador.

            O Sr. Osvaldo Sobrinho (PTB - MT) - Senador, na verdade, V. Exª traz um tema aqui que trata de coisas que não têm acontecido só em sua região, mas que, praticamente, têm acontecido em grande parte do Brasil. Esses cidadãos, na arte de querer fazer teses de mestrado e de doutorado, ao se acharem intelectuais nessa área, fazem algo mostrando que, na verdade, desconhecem o Brasil real, o Brasil concreto, o Brasil que existe. Se formos pensar onde existiram índios no território brasileiro, vamos ver que, em todo lugar, já passaram índios, até porque esta terra foi habitada a vida toda por eles. Portanto, esquecem-se de que, na verdade, depois, houve a colonização, um processo de ocupação, e que, consequentemente, há pessoas que, há 30, 40, 50, 100 anos, estão trabalhando e produzindo ali e que ali construíram suas vidas. Temos, logicamente, de respeitar essas coisas. Não somos contra, ninguém é contra estudos antropológicos que detectem irregularidades, que deem direitos aos índios, a essa população, aos homens da floresta, que a eles deem o direito que eles têm. Mas é necessário também respeitar os direitos adquiridos, respeitar a forma como foi feita a ocupação e respeitar também a convivência humana que existe nessas áreas. Em Mato Grosso, há problemas sérios desse tipo que V. Exª menciona. Essa situação tem nos causado problemas enormes no sentido de resolvermos essa situação. Sempre encontramos barreiras nos órgãos oficiais, que não conhecem a realidade, que não conhecem o que está acontecendo. Simplesmente leem livros e vêm atrapalhar a vida das pessoas que lutaram, que deram o sangue e a vida, que geraram filhos naquela região. De repente, essas pessoas se veem isoladas, sem poder regulamentar o que é seu. É uma situação muito triste, que precisa ser vista com olhos como os de V. Exª. Caso contrário, essa terra virará terra de ninguém. De repente, daqui a pouco, não se sabe qual é a norma que vale. Então, acredito que é preciso, realmente, tomar medidas sérias, ir aonde for preciso, mas que se estabeleça uma norma, um caminho, para que um simples estudo, ou um estudo qualquer, por mais aperfeiçoado que seja, não venha atrapalhar o ritmo de vida de um povo que escolheu a região para morar, que ali trabalhou, que ali fez sua riqueza, que ali viveu com sua família, que ali sedimentou sua vida e que, de repente, se vê ultrajado por um parecer de alguém que não conhece a realidade. Compartilho com V. Exª a preocupação. Acredito que, na verdade, quanto a essas coisas, é preciso tomar medidas urgentes, porque, caso contrário, grandes partes do Brasil vão sofrer por causa desse tipo de motivação. Muito obrigado.

            O SR. OSMAR DIAS (PDT - PR) - Obrigado, Senador Osvaldo Sobrinho.

            Vou encerrar, Sr. Presidente, apenas dizendo o seguinte: o Estado vendeu a área para os proprietários, que, portanto, pagaram por aquela área, têm escritura, têm o direito de propriedade garantido pela Constituição. Se o Estado quer dar terra aos sete índios, que o Estado compre uma área e a dê aos sete índios, mas não tire o direito de propriedade daqueles que a compraram do próprio Estado. Esse é um problema que o Estado tem de resolver. O Estado que o resolva! Não deixe os proprietários na mão, não coloque essas famílias na insegurança jurídica e pessoal! Hoje, as famílias que vivem ali estão, Sr. Presidente, desanimadas. Não dormem à noite, não podem dormir à noite, porque estão preocupadas com o futuro dos seus filhos, das futuras gerações que seriam legítimas proprietárias daquela área.

            Repito: também defendo a causa indígena, também defendo as nações indígenas. Os indígenas têm seus direitos, mas não é tirando o direito de famílias que compraram a terra do Estado que vamos atender ao direito deles. Se o Estado quer realmente dar a terra aos índios que compre uma área e a dê, mas não tire a terra dos proprietários legítimos que lá estão instalados.

            Era o que eu tinha a dizer. (Palmas.)


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 18/11/2009 - Página 59609