Discurso durante a 182ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro da matéria intitulada "Petróleo na urna", publicada no jornal Folha de S.Paulo, edição de 2 de setembro último.

Autor
Alvaro Dias (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/PR)
Nome completo: Alvaro Fernandes Dias
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.:
  • Registro da matéria intitulada "Petróleo na urna", publicada no jornal Folha de S.Paulo, edição de 2 de setembro último.
Publicação
Publicação no DSF de 16/10/2009 - Página 52331
Assunto
Outros > PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, TRANSCRIÇÃO, ANAIS DO SENADO, ARTIGO DE IMPRENSA, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), CRITICA, CONDUTA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, DESRESPEITO, CONGRESSO NACIONAL, INTERESSE PUBLICO, PROPOSIÇÃO, REGIME DE URGENCIA, APRECIAÇÃO, PROGRAMA, EXPLORAÇÃO, PETROLEO, RESERVATORIO, SAL, VIABILIDADE, CANDIDATURA, MINISTRO DE ESTADO, CASA CIVIL, PRESIDENCIA DA REPUBLICA.

O SR. ALVARO DIAS (PSDB - PR. Sem apanhamento

taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs. e Srs.

Senadores,

Petróleo na urna

Governo tenta atropelar Congresso com proposta

inconvincente de marco regulatório, repleta de armadilhas

estatistas

CONSUMOU-SE, na explicitação dos projetos do

Planalto para o pré-sal, a revanche contra a abertura

do mercado e contra a quebra do monopólio da Petrobras,

efetivadas na década passada. A antecipação do

calendário eleitoral, motivada pela iniciativa do presidente

Lula de viabilizar a candidatura Dilma Rousseff,

atropelou o interesse público.

Propor a tramitação em 90 dias, no regime de

urgência constitucional, de um programa que subverte

todo o modelo de exploração, tributação, concorrência

e partilha de recursos fiscais em curso -e que, além

disso, exige emissão de mais R$ 100 bilhões em dívida

pública, o equivalente a dois meses de arrecadação

federal- é um acinte.

O governo federal e a Petrobras, que passaram

14 meses confabulando para chegar à sua proposta,

não são os únicos interessados na discussão. A mudança

afeta toda a sociedade, detentora das riquezas

do subsolo. A tramitação dos quatro projetos de lei

pelo Congresso é a oportunidade de dar a Estados,

municípios, trabalhadores, consumidores, empresários,

ambientalistas e técnicos o tempo que for necessário

para que se façam ouvir.

A precipitação de Lula chega a ser ridícula diante

do fato de que não se sabe, com o mínimo de segurança,

qual a dimensão da renda petrolífera que se

quer, desde já, dividir. A que ponto a província do pré-sal

vai elevar as reservas recuperáveis de petróleo do

Brasil, hoje em 14 bilhões de barris? A que custo de

extração?

Na falta de mapeamento da região de 149 mil

km2 (equivalente à área do Ceará), campeia uma incrível

dispersão de palpites. De 30 bilhões de barris

a 300 bilhões de barris, vai uma diferença oceânica.

No primeiro caso, o Brasil apenas administraria pelas

próximas décadas a autossuficiência energética já

obtida; no outro, seria alçado à condição de potência

exportadora.

Em vez de mapear as riquezas antes - até para

convencer o público de que seria preciso mudar o modelo-,

o governo passou diretamente à fase seguinte.

A urgência eleitoral prevaleceu e deu passagem a

propostas estatistas de fazer inveja aos “desenvolvimentistas”

da ditadura militar.

Na partilha de produção, o governo divide o lucro

da empreitada, na forma de óleo, com o consórcio

empresarial contratado para explorar os campos. Mas,

para chegar ao lucro, é preciso definir antes os custos

de cada empreendimento específico, o que não é

trivial numa atividade complexa e intensiva em capital

como a petrolífera.

O governo cria, então, a Petro-Sal para controlar

os custos de cada campo, entre outras funções -como

cuidar dos trâmites de comercialização do óleo estatal-

que deveriam ser eminentemente técnicas. Capaz

de influir em decisões empresariais básicas, caso da

contratação de fornecedores, e sujeita a controle político

do governo de turno e de sua sempre notória “base

aliada”, a Petro-Sal seria uma porta escancarada para

corrupção, negociatas e privilégios.

Outro ponto vulnerável à politização e à má alocação

de recursos, bem como à acomodação típica

dos monopólios, é a regra que torna a Petrobras parceira

obrigatória da União em todos os campos do

pré-sal, com participação mínima de 30%. Dispensada

da concorrência, terá no entanto de participar mesmo

das empreitadas as quais o cálculo frio recomendaria

recusar.

O poder discricionário do Executivo amplia-se

também por outros meios. Mesmo fora do pré-sal, onde

continuam valendo as regras da concessão - empresas

disputam livremente o direito de exploração num

processo licitatório, e vence a que oferecer o maior

lance, o governo poderá intervir. Basta que considere,

num simples decreto, a região como de “interesse

para o desenvolvimento nacional” e ela será retirada

da competição.

Além disso, o privilégio já oferecido à Petrobras

poderá ser ampliado. A fim de preservar o “interesse

nacional”, sem definir bem o que isso significa, o governo

poderá contratar apenas a Petrobras, sem licitação,

para operar determinados campos.

Até aqui o governo Lula não demonstrou que a

sua proposta será capaz de assegurar os investimentos

necessários para a exploração das novas jazidas

petrolíferas. Tomando-se os “chutes” mais conservadores

acerca do potencial do pré-sal, não é difícil

que essa cifra ultrapasse meio trilhão de dólares - ou

30% do PIB-, diluído ao longo dos anos. O modelo de

concessões oferece uma resposta satisfatória a esse

problema, pois amplia as fontes de investimento, por

meio de uma competição de escala global, e propicia

antecipação de receitas ao governo.

A experiência mundial, decerto, mostra que modelos

não são decisivos para o sucesso de um país na

exploração do petróleo; por vários caminhos e ajustes

se chega a um bom arranjo. O fundamental é o governo

ampliar, por meio de tributação ou dispositivos análogos,

a sua participação na renda gerada pela atividade - e

ser proibido, por lei, de torrar os recursos em despesas

de custeio. Dadas a rarefação de parâmetros técnicos

e a falta de definições que prevalecem na proposta do

Planalto sobre o pré-sal, nem isso está garantido.

Por ora, o “passaporte para o futuro” anunciado

pelo presidente Lula pouco se distingue de um panfleto

eleitoral que já chega embolorado - tal o grau de dirigismo,

privilégios e distorções nele estampados.


Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/10/2009 - Página 52331