Pronunciamento de Inácio Arruda em 19/11/2009
Discurso durante a 215ª Sessão Especial, no Senado Federal
Comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra e o Dia de Zumbi dos Palmares.
- Autor
- Inácio Arruda (PC DO B - Partido Comunista do Brasil/CE)
- Nome completo: Inácio Francisco de Assis Nunes Arruda
- Casa
- Senado Federal
- Tipo
- Discurso
- Resumo por assunto
-
HOMENAGEM.
DISCRIMINAÇÃO RACIAL.:
- Comemoração do Dia Nacional da Consciência Negra e o Dia de Zumbi dos Palmares.
- Publicação
- Publicação no DSF de 20/11/2009 - Página 60386
- Assunto
- Outros > HOMENAGEM. DISCRIMINAÇÃO RACIAL.
- Indexação
-
- HOMENAGEM, COMEMORAÇÃO, DIA NACIONAL, CONSCIENTIZAÇÃO, NEGRO, LUTA, QUILOMBOS, ESTADO DE ALAGOAS (AL), REGISTRO, IMPORTANCIA, INDIO, FORMAÇÃO, POPULAÇÃO, BRASIL, REPUDIO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, DESIGUALDADE SOCIAL.
- HOMENAGEM, INTELECTUAL, SENADOR, ESCRITOR, ENGAJAMENTO, LUTA, MELHORIA, SITUAÇÃO, NEGRO, COMENTARIO, HISTORIA, LIBERDADE, ESCRAVO, MUNICIPIO, REDENÇÃO (CE), ESTADO DO CEARA (CE).
- ANALISE, IMPORTANCIA, ATUAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, COMBATE, DESIGUALDADE SOCIAL, ELOGIO, INICIATIVA, EXPANSÃO, ESCOLA TECNICA, UNIVERSIDADE FEDERAL, PROJETO, CRIAÇÃO, UNIVERSIDADE, ESTADO DO CEARA (CE), DESTINAÇÃO, VAGA, NEGRO, BRASIL, CONTINENTE, AFRICA, OBJETIVO, MELHORIA, QUALIDADE DE VIDA, GRUPO ETNICO, CRITICA, AUSENCIA, ENGAJAMENTO, CAMARA DOS DEPUTADOS, APROVAÇÃO, PROPOSTA.
- REPUDIO, DISCRIMINAÇÃO RACIAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, EDUCAÇÃO, ESTATUTO, IGUALDADE, RAÇA, EXTINÇÃO, DESIGUALDADE SOCIAL, ANUNCIO, ASSINATURA, ORADOR, PROJETO DE LEI, AUTORIA, CRISTOVAM BUARQUE, SENADOR, EXPECTATIVA, APROVAÇÃO, CRIAÇÃO, UNIVERSIDADE FEDERAL, MUNICIPIO, REDENÇÃO (CE), ESTADO DO CEARA (CE).
SENADO FEDERAL SF -
SECRETARIA-GERAL DA MESA SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA |
O SR. INÁCIO ARRUDA (Bloco/PcdoB - CE. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente; Srª e Srs. Senadores; ilustres convidados que nos honram com sua presença em nosso plenário; nossos amigos que compõem a Mesa, e até os que já estiveram à Mesa, como o Ministro Edson Santos, Ministro Chefe da Secretaria Especial de Política de Promoção da Igualdade Racial; nosso amigo José Augusto da Silva Filho, Coordenador Nacional do Fórum Sindical dos Trabalhadores, 1º Vice-Presidente do Diap e Secretário-Geral da CNTC; nosso amigo, convidado à Mesa, Joel Zito, cineasta, que trabalha com a consciência negra, digamos assim; e, especialmente, nosso Presidente, Senador Mão Santa e o nosso colega que tem uma trajetória marcada pela luta, no nosso País, contra desigualdades, seja de que tipo for, especialmente a discriminação contra os negros no nosso País, que é o nosso Senador Paulo Paim, que nos brinda com essa solenidade do dia de hoje:
Senador Paulo Paim, quero começar exatamente com as razões dessa homenagem, que V. Exª já abordou de forma sincera, franca para o povo brasileiro, que é o processo de luta da formação do Brasil, de como ele se deu. Negro e índio não tinham alma. Alguém, partindo de Roma, disse que negro e índio não tinham alma. Não tendo alma, o Caramuru, meu caro Mão Santa, Domingos Jorge Velho, foi contratado pelo Governador de Pernambuco, à época, uma capitania em franco desenvolvimento da Coroa portuguesa, para perseguir os negros que formaram um quilombo extraordinário porque foi montado num forte, num forte construído com inteligência, num local escolhido de forma estratégica e que era muito difícil, sem inteligência e sem brutalidade, vencê-lo. Era impossível vencê-lo. Só a brutalidade, a crueldade, a perseguição e o fanatismo com que foram perseguidos os negros do Quilombo dos Palmares fizeram com que o quilombo fosse ao final destruído.
Caramuru chegava a tirar as crianças dos seios das mães negras, que estavam sendo amamentadas, colocando-as na fogueira e afirmando que, como não tinham alma não tinha problema nenhum colocá-las na fogueira; era o mesmo que colocar um porco, um frango para assar e depois comer. Praticava um canibalismo na sua brutalidade, na sua crueldade. E esse tipo de crueldade é o mesmo de Guantanamo, é o mesmo das bases e das cadeias que existem por aí afora hoje e que sempre prega muito o uso dessa brutalidade para conseguir confissões, para montar esquemas no sentido de colocar uma pecha num povo, num país inteiro. Hoje se faz isso contra o Irã, contra a Síria, contra o povo iraquiano. Faz-se isso no Afeganistão, no Paquistão e ainda se faz muito na África.
E é preciso homenagear, meu caro Senador Paulo Paim, Senador Cristovam Buarque e Presidente Mão Santa; é preciso dizer por quê; de onde veio? Por que esse homem é um herói do povo brasileiro? É porque ele resistiu a essa brutalidade, no tempo em que era necessário resistir à brutalidade. E ele o fez. E nós vamos distingui-lo com essa honraria.
E nos disse o Darcy Ribeiro, Senador e estudioso da formação do Brasil, que hoje existe um povo brasileiro no mundo. E o povo brasileiro tem a marca dos negros, tem a marca dos índios e tem a marca dos brancos.
Não se esconde e jamais se poderá esconder a discriminação que ainda existe hoje na sociedade brasileira. O preconceito que ainda existe contra os negros, verdadeiro. E os negros não são só discriminados; não são só fruto do preconceito. É que a maioria esmagadora dos negros é pobre. E pobre é discriminado. Contra os pobres há farto preconceito. E ser pobre e negro é duplo preconceito na sociedade brasileira.
Poderíamos ir mais longe para homenagear o Zumbi, o Dia Nacional da Consciência Negra. Lembrar os grandes estudiosos do nosso País, como Clóvis Moura, grande figura do nosso povo negro. Um brasilianista, americano, Skidmore quando tratou de estudar a formação do Brasil, tratou da presença dos negros. O Darcy, que já citei e a sua obra fabulosa O Povo Brasileiro; o Celso Furtado, porque nordestino não precisa ser negro para ser discriminado, qualquer um é discriminado.
Então, esse era Celso Furtado, gigantesco na sua obra, “A formação Econômica do Brasil”, fácil de ser lida. Fácil! Vai lá e olha e entende o que é o Brasil.
Não era um intelectual que escrevia para não ser entendido; ele escrevia para ser compreendido pelo povo brasileiro.
Um amigo irmão do Paulo Paim, Abdias do Nascimento, (palmas.) aqui Senador da República, negro, pensador, estudioso. E lá atrás, porque outro que não compreendia bem a batalha, digamos assim, da abolição, que era José de Alencar. Foi ele que levou pelas suas mãos um garoto baiano de 18 ou 19 anos e o entregou a um mulato, um mulato que era o maior da língua portuguesa. Esse mulato chama-se Machado de Assis. Não é outro, não meu companheiro; é Machado de Assis. (Palmas.) Machado de Assis era mais difícil de ser compreendido do que Celso Furtado, porque tinha uma formação extraordinária, espetacular. E foi ele que recebeu das mãos de José de Alencar um outro jovem garoto chamado Castro Alves, que escrevia para libertar os escravos.
Então, vê-se como é a formação do povo brasileiro, com todos esses homens e mulheres que se uniram a essa luta.
Eu volto ao Ceará, por onde começou o nosso amigo Mão Santa. Lá, no Ceará, também se uniram negros e alguns brancos para lutar pela libertação, assim como Castro Alves e tantos outros, no nosso País. Eu quero juntar dois: o Dragão do Mar e a Maria Tomásia. O Dragão do Mar impedia a entrada dos negros e a Maria Tomásia ia pelo interior do Ceará pregar a libertação dos negros. É por isso que se libertaram os negros primeiramente numa cidadezinha junto ao rio Acarape. A cidade tinha o mesmo nome, a cidade de Acarape, no interior do Ceará, onde havia uma barragem que abastecia a cidade de Fortaleza. É ali que Maria Tomásia para, numa região de canaviais, em uns brejos nas margens do rio Acarape. A região produzia muita cana e, então, tinha muito açúcar e muitos negros, havendo também muita perseguição aos negros daquela região. É ali que ela para, junto ao Maciço do Baturité, no interior do Estado do Ceará. Realizaram ali também um feito heróico que é a libertação dos escravos em um Município, que é a cidade de Redenção, no Estado do Ceará. Foi a primeira a libertar os negros no Brasil.
O outro é um Presidente do nosso País que podemos dizer que é um Presidente negro, porque esse Presidente que aí está não é branco, não. Nem é azul,nem furta-cor, não. É um Presidente preto lá do Nordeste brasileiro. É por isso que ele reconhece, mesmo com as dificuldades gigantescas que tem esse território brasileiro, a necessidade de formar o povo, de ter mais escolas profissionais, de ter de educar e profissionalizar, porque o nosso tempo ainda exige isso. Vai ter um tempo em que a palavra escravidão, que é o trabalho, que vem do grego... Por isso, prendiam-se os outros na guerra e vendiam como escravos, porque era para trabalhar. Então, a palavra trabalho, de origem grega, significa escravo. Então, vai ter o tempo em que acabará toda escravidão, mas, no nosso tempo, ainda temos de trabalhar. Então, precisa-se formar, educar, profissionalizar.
E o Presidente Lula é o que mais criou escolas técnicas no Brasil inteiro. (Palmas.) É o que mais tem expandido a universidade pública federal. É o que compreendeu a necessidade unir o povo latino. Na Bolívia, mais da metade da população é nativa. São os quechuas, que eram a camada superior dos Incas, e os aymaras, que é uma grande civilização, um grande povo. Eles formam 70% da população e não conseguiam dirigir a sua nação. Que estupidez! Agora, quechuas e aymaras estão unidos em torno de um presidente, que é um nativo, que é um aymara. Então, isso é muito significativo.
Aqui, na vizinhança, o Paraguai tem grande população guarani, que é também o idioma oficial daquele País. Por que o povo não poder ser dirigido por um guarani no Paraguai? Qual a razão? E é por isso que o Lula criou uma universidade, que é uma universidade brasileira, fica no Brasil, mas é latino-americana, metade das vagas para os sul-americanos, para quechuas, para aymaras e para os povos dessa região.
E lá em Redenção, meu caro Presidente, o Presidente da República propôs, e está aqui na Câmara Federal... Parece que está tendo um enganchamento, meu caro Paim, parece que pelas razões de estar destinada à população africana e à brasileira está tendo uma dificuldade, um enganchamento. Vamos ver se a gente desengancha isso lá na Câmara. Refiro-me à criação da universidade luso-afro-brasileira. Metade das vagas vão ser destinadas a africanos, africanos negros e a outra metade para os brasileiros, especialmente os negros do Brasil para que a gente possa garantir ascendência social.
Por qual razão, Sr. Presidente? Porque existe, sim, a discriminação, existe, sim, o preconceito, mas há uma razão básica para a discriminação e o preconceito - alguns querem passar a borracha por cima, escondê-la, -, que é uma brutal luta de classes no nosso tempo. E essa brutal luta de classes tem razões profundas do ponto de vista social. E é preciso combatê-la pelos vários meios, uns fazem uma revolta popular e assumem o governo no seu país e é justo, é correto, do ponto de vista da luta dos povos no mundo em todos os tempos. Outros encontram meios para driblar essa batalha que nós travamos cotidianamente no nosso País. E uma delas, digamos que o Presidente Lula busca nos ajudar a resolver, e acho que a conquista da Unilab é muito importante para o nosso País. Então, eu quero dizer, Sr. Presidente, que já vou assinar o projeto do Senador Cristovam, juntamente com todos que estão à Mesa e os que chegarem depois, e sobretudo vamos trabalhar para que a gente resolva uma pendência inaceitável.
Está aqui o Senador Paim, mestre do Estatuto, para combater essas desigualdades brutais do Brasil, que falamos lá, ele já tratou disso sobejamente, mas nós apenas, digamos assim, sublinhamos todas as questões, que nós criamos caminhos, pequenas veredas para dar soluções a esses graves problemas de discriminação, de perseguições que ainda existem na sociedade brasileira, de preconceitos. O fundo de tudo isso é, na verdade, ainda uma luta de classes encarniçada que se trava no mundo inteiro e que se reflete no nosso País.
Por isso eu peço, Sr. Presidente, que nós demos a maior força para aprovarmos, de uma vez por todas, o nosso Estatuto e também aprovarmos a criação da universidade, da Unilab no Estado do Ceará, no Município de Redenção.
Saúdo, uma vez mais, o nosso companheiro Paulo Paim e todos que compreenderam a necessidade de ter no Brasil o Dia da Consciência Negra, que é o nosso 20 de novembro.
Muito obrigado, Sr. Presidente.
Modelo1 12/18/241:15