Discurso durante a 216ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Crítica à abordagem do problema das mudanças climáticas focada apenas em redução na emissão de dióxido de carbono, sendo importante que o Presidente Lula, na conferência sobre mudanças climáticas que será realizada, em dezembro próximo, em Copenhague, adote postura de ideólogo, e proponha um modelo novo para a civilização, onde o transporte público prevaleça sobre o privado e o consumo seja limitado, de acordo com as restrições ecológicas.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA DO MEIO AMBIENTE.:
  • Crítica à abordagem do problema das mudanças climáticas focada apenas em redução na emissão de dióxido de carbono, sendo importante que o Presidente Lula, na conferência sobre mudanças climáticas que será realizada, em dezembro próximo, em Copenhague, adote postura de ideólogo, e proponha um modelo novo para a civilização, onde o transporte público prevaleça sobre o privado e o consumo seja limitado, de acordo com as restrições ecológicas.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2009 - Página 60511
Assunto
Outros > POLITICA DO MEIO AMBIENTE.
Indexação
  • ADVERTENCIA, GRAVIDADE, ALTERAÇÃO, CLIMA, CRITICA, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), AUSENCIA, PROPOSTA, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS CARBONICO, FALTA, INICIATIVA, COMBATE, DESTRUIÇÃO, PLANETA TERRA.
  • CRITICA, EXCESSO, CONSUMO, POLUIÇÃO, NATUREZA, AUMENTO, TEMPERATURA, MUNDO, DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, COMPORTAMENTO, CONSCIENTIZAÇÃO, SOCIEDADE, CHEFE DE ESTADO, IMPORTANCIA, PROTEÇÃO, PLANETA TERRA, POSTERIORIDADE, GLOBALIZAÇÃO, ECONOMIA, CRESCIMENTO, DESIGUALDADE REGIONAL, DESIGUALDADE SOCIAL.
  • SOLICITAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA, ATUAÇÃO, LIDER, MUNDO, CONFERENCIA INTERNACIONAL, CLIMA, APRESENTAÇÃO, ALTERNATIVA, MODELO, CIVILIZAÇÃO, GARANTIA, BEM ESTAR SOCIAL, PROMOÇÃO, DESENVOLVIMENTO SUSTENTAVEL, PRESERVAÇÃO, MEIO AMBIENTE, REGISTRO, IMPORTANCIA, VALORIZAÇÃO, BENS CULTURAIS.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Agradeço, Presidente.

            Eu queria pedir que marcasse o tempo porque, mesmo com a Casa sem grandes expressões, não é bom ficarmos falando sem a marcação do tempo.

            Sr. Presidente, em primeiro lugar, eu fico feliz por termos tido um debate anterior em que ficou esclarecida a sua posição - que eu já sabia -, mas eu quis exatamente que ela ficasse explicitada.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Ajudou muito.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Não se trata de aumentar sempre os mesmos salários em função do salário-mínimo, mas apenas garantir os mesmos reajustes para aqueles que têm até três salários-mínimos. Isso é mais que justo.

            Mas, Sr. Presidente, todos costumam dizer que, se durante o regime nazista houvesse televisão, como hoje temos ligando o mundo inteiro, não teriam acontecido aquelas tragédias brutais que o movimento nazista, que o governo hitlerista provocou. Não seria possível que o campo de concentração continuasse se o mundo tomasse conhecimento daquilo no momento em que acontecia. Não seria possível ver crematórios queimando pessoas depois de passarem por uma câmara de gás, uma sala de gás, se todos vissem pela televisão. Isso virou um consenso. Mas é um consenso que mostra uma certa cegueira porque hoje as televisões nos mostram campos de concentração, nos mostram crematórios e nós não estamos fazendo nada. Eu não falo das tragédias sociais como Darfur; eu não falo da fome crescente em grandes partes do mundo; eu falo de algo transmitido todos os dias, todas as noites por todas as televisões, mas nós não agimos da maneira necessária para parar a tragédia. Eu falo dos noticiários, das imagens relacionadas com o aquecimento global.

            Até pouco tempo atrás o aquecimento global era uma especulação de cientistas. Era uma invenção para muitos daqueles chamados do movimento verde, que inclusive eram ridicularizados; eram chamados de bicho grilo os que insistiam na necessidade do meio ambiente. Eu mesmo, como Professor, tive artigo recusado 25 anos atrás por uma revista de esquerda assinada por um marxista em que ele dizia que esse assunto do meio ambiente é uma invenção do imperialismo para impedir o desenvolvimento do Terceiro Mundo. Há vinte e cinco anos apenas.

            A gente está vendo hoje a realidade, não é mais uma especulação. Não é mais uma coisa de cientistas, é o que a gente vê. Ursos flutuando em cima de um pedaço de gelo, sem ter o que comer, flutuando para a morte, porque há um descongelamento da camada polar norte. Nós vemos as tempestades como nunca antes. Nós estamos vendo regiões ficando desérticas, inclusive no Brasil. Nós estamos vendo toda esta tragédia resultante do aquecimento global, inclusive da temperatura nas nossas cidades. O clima, que antes tinha uma regularidade, agora oscila entre tempestades brutais e secas fantásticas; entre temperaturas muito baixas e logo depois uma temperatura extremamente alta. Nós enlouquecemos a Terra. O planeta Terra hoje é uma entidade enlouquecida do ponto de vista climático. E nós assistimos a isso sem fazer os gestos necessários para parar.

            Agora, em Copenhague, pelo que estamos vendo, mais uma vez, não se vão fazer os gestos necessários para evitar esses crematórios do século XXI, esse imenso crematório planetário do século XXI. Não vamos fazer. Os dois maiores poluidores do mundo, Estados Unidos e China, já decidiram que não é hora de parar as emissões de dióxido de carbono. Isso paralisaria a indústria. Então que continuemos destruindo o planeta para aumentar a produção industrial. E os outros países, o mais que vão fazer, pelo visto, como o próprio Governo brasileiro, é levar algumas metas de redução das emissões.

            Nenhum, nenhum dos dirigentes mundiais, pelo que a gente lê na imprensa mundial nos diversos idiomas a que podemos ter acesso, nenhum deles está trazendo a real dimensão do problema e tratando-o como algo maior do que um problema de química. O problema não é químico. O problema nem é mesmo só político. O problema é de uma mentalidade que prevalece no mundo de hoje em que a felicidade e o bem-estar estão em consumir coisas que poluirão a natureza e aquecerão o planeta. É como se fôssemos todos como aqueles malucos que tocam fogo por uma necessidade maníaca, mesmo morando dentro do quarto que pega fogo. Viramos criminosos do clima pelo vício de consumir ou, então, somos mais ou menos como aqueles viciados em cocaína que são capazes de matar e roubar para consumir o produto químico que atende ao seu vício, só que, em vez de viciados na cocaína, somos viciados no consumo perdulário, depredador, destruidor.

            O problema não está na emissão de dióxido de carbono que sai dos canos de automóvel. O problema está na nossa mania de achar que o transporte tem que ser baseado no automóvel privado; cada pessoa no seu carro consumindo o combustível necessário e sofrendo todos os engarrafamentos que a gente vive.

            Por isso, vamos passar por Copenhague sem trazer nenhuma proposta clara, e há uma lógica política por trás disso, Senador Paim. Os nossos presidentes, reis, sheiks, primeiros-ministros pensam com a cabeça do seu país e não com a cabeça do planeta inteiro. Eles falam pensando nos seus eleitores, e não na humanidade. Esse é o problema! A nossa crise é da humanidade e do planeta, e cada dirigente político é do seu país e da sua população de eleitores. E mais ainda, a nossa crise planetária vai levar décadas para fazer com que a tragédia chegue ao ponto em que a gente perceba que não tem mais jeito, enquanto que cada um de nós políticos só pensamos na próxima eleição e não na próxima geração ou até nas próximas duas ou três gerações. Esta é a tragédia em que a gente vive, a tragédia de uma mentalidade de consumidores, como cidadãos que somos, e a tragédia dos políticos prisioneiros, todos nós - não me excluo -, do curto prazo e dos nossos eleitores.

            Fiz um apelo ao Presidente Lula, daqui desta tribuna, e comuniquei a assessores dele, que gostaria de vê-lo em Copenhague não como meu Presidente apenas, mas como um dos líderes do mundo que ele é, como o é qualquer outro presidente, até do menor país, embora o Presidente do Brasil tenha uma característica diferente. Primeiro, porque é um país grande que tem todos os recursos, mas que, ao mesmo tempo, é um país grande que tem todos os problemas. Somos um dos grandes poluidores, não do tamanho dos dois maiores, mas somos dos maiores poluidores. E temos recursos. Temos como usar etanol. Temos os problemas e os recursos. E temos um presidente que se destacou no cenário internacional cujo discurso é ouvido. Mas o que a gente percebe, Senador Paim, Senador Suplicy, é que, depois da queda do Muro de Berlim, depois da globalização, os presidentes ficaram pequenininhos, todos eles. Não existem mais os presidentes líderes mundiais.

            Às vezes, o presidente de um pequeno país africano, durante os anos 60, quando falava, falava para o mundo inteiro, defendendo a liberdade, o fim do colonialismo. Quando os presidentes de esquerda falavam, faziam-no em nome do socialismo e para todos os trabalhadores do mundo e não só os do seu país. Quando os presidentes do capitalismo falavam, eles falavam para todo o mundo, defendendo a liberdade que propunham como caminho. Acabou esse tempo, não há mais ninguém falando para o mundo inteiro, cada um fala para dentro do seu país e para dentro do horizonte de sua próxima eleição. Os presidentes se apequenaram no momento em que o mundo ficou global.

            O próprio Presidente Fernando Henrique Cardoso, em uma entrevista ontem ou antes de ontem, no jornal El País, de Madri, dizia algo parecido. “Nós globalizamos a economia e não globalizamos a política”. A economia é global e a política é nacional. Mas a política nacional vai levar a uma tragédia global por conta do aquecimento global e do aumento da desigualdade entre países, entre as populações pobres, mesmo que dentro do mesmo país. 

            Volto a insistir aqui e a fazer um apelo ao meu Presidente, do meu País, para que ele não se apequene, para que ele não se apequene em Copenhague falando apenas para nós, brasileiros. Que ele fale para todos os seis bilhões de seres humanos hoje preocupados com o destino dos próximos anos de suas vidas e a certeza da tragédia da vida dos seus filhos, dos seus netos e de toda a humanidade que vem depois. Que ele leve para Copenhague não apenas metas de redução da emissão de dióxido de carbono, que não vá lá como um químico, falando em emissões de dióxido de carbono. Que vá lá como ideólogo, propondo um modelo novo para a civilização, onde o transporte público prevalecerá sobre o transporte privado; onde o consumo será limitado, de acordo com as restrições ecológicas. Que ele assuma essa liderança. Até porque, quem está no fim de um mandato, tem mais liberdade de falar sem se preocupar com a próxima eleição. Deixe a sua candidata falar apenas para o Brasil, procurando votos. Mas que ele fale como estadista mundial, como um estadista capaz de dar um recado ao mundo inteiro e não preocupado apenas com a próxima eleição desta geração, mas com o bem-estar das gerações futuras.

            Eu não gosto de vir aqui repetir o mesmo discurso, embora seja acusado de um político de uma nota só, que é a educação. Mas cada vez é um tema diferente na educação.

            Hoje, eu inverti, estou repetindo, basicamente, um discurso muito parecido do começo da semana, ou da semana passada, tentando trazer uma dimensão nova, que é a dimensão da crise ecológica que transformou o mundo em um imenso crematório, um crematório como aqueles que existiam no tempo nazista, e que a gente diz que, se fosse transmitido pela televisão, ninguém deixava que acontecesse. Hoje, o que o crematório do meio ambiente afetado, do aquecimento global, da depredação ecológica, da extinção de espécies animais, tudo isso que é mostrado, a gente assiste, pode até chorar, mas sai dali e vai para o shopping center comprar mais coisas que poluem mais. Vai saber como é que financia mais a compra de um automóvel para continuar poluindo mais.

            O Presidente Lula e os demais Presidentes do mundo deveriam se comportar como líderes mundiais e ideológicos e não como líderes nacionais e eleitoreiros e trazerem uma proposta nova para a humanidade, um rumo alternativo, onde os bens culturais poderiam ter mais valia que os bens materiais, porque os bens culturais não poluem, onde o longo prazo deve ser considerado tanto quanto o curto prazo, onde a Terra, o Planeta deve ser levado em conta tanto quanto o nosso País, onde a humanidade deve valer tanto quanto a população de cada país, onde o longo prazo é fundamental. Presidentes, dirijam seus países do ponto de vista administrativo, mas, ideologicamente, sejam líderes para o mundo inteiro, porque, se não tivermos líderes para o mundo inteiro, nós não vamos ter presidentes para cada país nosso daqui a algumas décadas.

            É isso, Sr. Presidente da Mesa, que trago hoje aqui, mais uma vez, como uma mensagem ao Presidente Lula. E gostaria de levar a todos os outros presidentes, mas aqui é o Senado do Brasil e ele, sim, que tem condições de ser um dos líderes do mundo. E o mais que nós podemos fazer é um apelo para que ele encarne algo maior do que o Presidente do Brasil, que ele encarne ser um dos líderes do mundo inteiro.

            O SR. PRESIDENTE (Paulo Paim. Bloco/PT - RS) - Muito bem, Senador Cristovam Buarque. Só me permita, para que não fique dúvida, porque eu já recebi dois telefonemas, sobre qual o cálculo que existe. O teto é R$3.200. Se você aplica o fator que reduz 40%, o salário do trabalhador vai para R$2 mil. R$2 mil, 465 vezes 4 dá 1.860. Aí, no máximo, o pessoal ganha até quatro salários- mínimos. Daí você tira daqui - e os dados são oficiais - 96%, não é nem 95%, 96% ficam com três salários-mínimos. Esse é o dado para tranquilizar para que ninguém fique com dúvida sobre a nossa conversa.

            Obrigado, Senador Cristovam Buarque.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Para que não pareça que a gente quer que o salário de Senador e de Deputado seja medido em salários- mínimos. Isso a gente não pode deixar que aconteça.


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