Discurso durante a 216ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Comentários à entrevista concedida pelo Vice-Presidente da República, José de Alencar, ao jornal Folha de S.Paulo, na qual o vice-presidente fala do tratamento para combater o câncer e das questões que envolvem a economia do Brasil, o combate à corrupção, a defesa do Tribunal de Contas da União, como órgão fiscalizador.

Autor
Pedro Simon (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/RS)
Nome completo: Pedro Jorge Simon
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.:
  • Comentários à entrevista concedida pelo Vice-Presidente da República, José de Alencar, ao jornal Folha de S.Paulo, na qual o vice-presidente fala do tratamento para combater o câncer e das questões que envolvem a economia do Brasil, o combate à corrupção, a defesa do Tribunal de Contas da União, como órgão fiscalizador.
Aparteantes
Cristovam Buarque.
Publicação
Publicação no DSF de 20/11/2009 - Página 60548
Assunto
Outros > GOVERNO FEDERAL, ATUAÇÃO.
Indexação
  • COMENTARIO, ENTREVISTA, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, PUBLICAÇÃO, JORNAL, FOLHA DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), IMPORTANCIA, MELHORIA, TRATAMENTO, CANCER, ANALISE, ECONOMIA, BRASIL, NECESSIDADE, CRESCIMENTO, CONSUMO, MERCADO INTERNO, REDUÇÃO, JUROS, OBJETIVO, AUMENTO, PRODUÇÃO, DEFESA, INGRESSO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA, REPUDIO, CORRUPÇÃO, IMPUNIDADE.
  • ADVERTENCIA, ORADOR, NECESSIDADE, COMBATE, CORRUPÇÃO, FOME, ANALFABETISMO, MELHORIA, SAUDE, GARANTIA, DIREITOS SOCIAIS, REGISTRO, APOIO, OPINIÃO, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA, DEFESA, TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO (TCU), REPUDIO, TENTATIVA, REDUÇÃO, PODER, ORGÃO FISCALIZADOR, CRITICA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, INTERFERENCIA, PODERES CONSTITUCIONAIS, COMENTARIO, FUNÇÃO, ORGÃO PUBLICO, AUXILIO, LEGISLATIVO, FUNDAMENTAÇÃO, CONSTITUIÇÃO FEDERAL.
  • REGISTRO, RELEVANCIA, PROGRAMA, BOLSA FAMILIA, POLITICA EXTERNA, GOVERNO FEDERAL, COMENTARIO, IMPORTANCIA, INICIATIVA, PRESIDENTE DA REPUBLICA, LUTA, MELHORIA, MEIO AMBIENTE, CRITICA, GOVERNO, PAIS ESTRANGEIRO, CHINA, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), AUSENCIA, PROPOSTA, REDUÇÃO, EMISSÃO, GAS CARBONICO, ELOGIO, ATUAÇÃO, VIDA PUBLICA, VICE-PRESIDENTE DA REPUBLICA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente Mão Santa, Srs. Parlamentares, uma das melhores notícias destes últimos dias está nas páginas da Folha de S.Paulo do dia 9 de novembro: a evolução positiva do tratamento do Vice-Presidente José Alencar contra o câncer.

            Depois de um sem-número de cirurgias, depois de um tratamento experiência que não deu certo nos Estados Unidos, os cânceres do Presidente vêm diminuindo consideravelmente, e os seus médicos veem isso com grande euforia.

            Ele próprio diz ali: “O câncer de José Alencar não interessa a ninguém a não ser a ele, à família e aos amigos. Mas a doença do Vice-Presidente, essa sim, interessa, é publica”. Ele diz também que tem recebido milhares de manifestações do Brasil inteiro, através de cartas, mensagens, remédios, ervas, rezas e tudo mais.

            Eu tenho certeza, meu caro José Alencar, de que, além da ciência que lhe assiste, isso é fruto também das orações, das mensagens que lhe chegam à alma e que lhe dão força para enfrentar esse mal e lhe reproduzem a fé.

            Eu me incluo nessa corrente de orações. Sei que é petulância minha, mas eu tenho tentado convencer Deus da importância da permanência de José Alencar entre nós por muitos anos mais, como ser humano e como homem público.

            Como ser humano, principalmente nestes tempos em que estamos perdendo o verdadeiro sentido de humanidade, entendida como natureza humana, como gênero humano e, principalmente, como benevolência, clemência e compaixão. Como bondade, como solidariedade. Como valor. Como homem público, principalmente nestes tempos de descaminhos na política, de apropriação indébita do que é, essencialmente, coletivo.

            Então, meu caro amigo e irmão José Alencar, você continua sendo para o Brasil uma referência, um espelho para as novas gerações. Não mais para o país do futuro, mas para o Brasil de hoje, porque o Brasil de hoje é que precisa da sua presença. Presença essa marcante em todos os homens públicos que têm personalidade firme. Como ser humano e como homem de dignidade e de fé.

            Você manifesta, Zé, o desejo de voltar ao Senado. Bem-vindo desde já! Que bom tê-lo aqui quando largar a Vice-Presidência! Sem dúvida, eleito será pelo povo de Minas Gerais. Nem preciso dizer o quanto o Senado destes nossos tempos precisa de homens com a sua rigidez de caráter e de bons princípios.

            A leitura dessa sua entrevista à Folha de S.Paulo deveria ser obrigatória, querido Mão Santa, para todos nós. Uma lição de vida e de política. Uma lição a ser aprendida. Uma lição que já vai sendo cobrada, desde muito tempo, pelo povo brasileiro.

            Nessa entrevista, você toca em questões essenciais para o nosso País. Em primeiro lugar, repito, a sua força de vontade para continuar trabalhando pelo povo brasileiro. Pelo coletivo, e não pelo individual.

            Bela a sua citação de Santo Agostinho: "O homem deve viver preparado para morrer a qualquer instante e proceder como se não fosse morrer nunca". Bela referência essa de José de Alencar na reportagem de página inteira, onde ele se retrata e diz o que sente. Para mim, é uma das afirmativas mais positivas de Santo Agostinho, exatamente na análise de reflexão que ele faz: "O homem deve viver preparado para morrer a qualquer instante e proceder como se não fosse morrer nunca".

            Outra questão que o Zé aborda é o mercado interno. O Brasil é uma síntese de tudo o que acontece no mundo. Aliás, aqui, no Brasil, temos todos os mundos: o mundo da opulência e o mundo da miséria. O mundo da mais alta tecnologia do século XXI e o mundo que mais se aproxima da realidade do século XIX. O mundo dos incluídos e o mundo dos excluídos.

            Então, podemos ser verdadeiramente um espelho para todo o Universo. Assim como, em escala global, temos que incluir todos aqueles que se encontram à margem dos bens, que poderíamos chamar bens básicos. Também no Brasil, temos um imenso mercado ainda a ser saciado. São brasileiros trabalhadores que querem produzir, são brasileiros consumidores que querem adquirir; consumidores que, como trabalhadores, serão cidadãos.

            Acontece que não haverá produção, consequentemente, nem emprego, nem consumo, com, ainda, as maiores taxas de juros do planeta, onde a ciranda financeira ganha de goleada da produção.

            Como bem disse o nosso Vice-Presidente:

O Brasil está crescendo, saiu da crise, está forte. E, isso, apesar da política monetária. Essa política monetária é... que adjetivo eu uso... um despropósito. É uma política equivocada, não a econômica, mas a monetária. Mais de 8% ao mês, em algumas áreas mais de 10%, enquanto o setor produtivo ganha muito menos. Controlar os juros serve para conter a demanda, coisa que o Brasil não precisa fazer. O Brasil precisa estimular o consumo. Mas o Brasil está crescendo, apesar disso. Mostra como o Brasil é grande, é um colosso.

            Diz José de Alencar.

            Eu só posso entender, meu querido Vice-Presidente, que quiseste dizer que o Brasil é forte, apesar dos descaminhos da nossa política monetária; dos interesses que comandam a ciranda financeira, em detrimento da produção. Que o produtor brasileiro é persistente porque, apesar dos melhores estimulantes estarem sendo direcionados para a especulação, ainda assim ele deita a semente, investe na produção, apesar do esforço despendido e de todos os riscos.

            Sobre o Mercosul, temos a mesma opinião. A Venezuela é um país, e é natural que o Brasil defenda a ampliação do Mercosul. Como bem disseste, “presidentes passam”, o País fica.

            Mas tão ou mais importante de tudo o que o Vice-Presidente falou na sua entrevista à Folha de S.Paulo foi a afirmação de que “o Brasil é o país da impunidade”. Como eu tenho repetido esta frase nesta tribuna: o Brasil é o país da impunidade. “Isso é sério...”, disse o Sr. José de Alencar. “Isso é sério e precisa mudar. Não se pune a corrupção. Eu não vejo que isso está mudando”, disse José Alencar.

            Eu também não, meu caro amigo. Aliás, eu acho pior: a impunidade, no Brasil, está se transformando no maior de todos os nossos problemas. Pelo mal em si e pelo que ela irradia, multiplicando a corrupção.

            Eu não tenho mais a pretensão de dizer que possamos acabar, de vez, com a corrupção. Existem alguns, inclusive, que já incluem a propina como parte do custo do seu produto. Incluem a propina como custo do seu serviço. Na mesma coluna do salário do trabalhador, do consumo de energia ou do pagamento de impostos está a propina, como custo da produção.

            Eu fico imaginando, entretanto, o que seria este País se pelo menos pudéssemos diminuir a nossa corrupção pela metade. Na Previdência, na sonegação, nas propinas para os diversos escalões, nas licitações, nos financiamentos de campanha, nos mensalões, nas emendas orçamentárias.

            Cada um tem um quantitativo, até porque a corrupção nem sempre deixa rastros numéricos, mas seria, com certeza, um número de dois, quem sabe três dígitos, muito mal acompanhado de nove zeros à direita. Isso, ainda admitindo que pudéssemos conviver com metade da corrupção de hoje. Metade. A metade da corrupção debelada, quem sabe daria para dizimar, total e absolutamente, a fome, o analfabetismo e as filas da corrupção. Se roubassem pela metade, se a corrupção fosse pela metade, só com isso, provavelmente resolveríamos os problemas da fome, do analfabetismo e das filas dos hospitais.

            Para reduzir a fome, teríamos que produzir mais. Produzindo mais, geraríamos mais empregos. Gerando mais empregos, teríamos mais renda. Sem fome, com emprego e renda, mais cidadania.

            Erradicando o analfabetismo, estaríamos construindo o País do presente e do futuro. É inconcebível que ainda tenhamos tantos milhões de brasileiros verdadeiros autistas de sua realidade. Muitos nem existem oficialmente. Nascem, vivem e morrem sem nunca terem existido oficialmente. Nunca tiveram certidão de nascimento, carteira de identidade e atestado de óbito. Quem sabe, então, autistas sejamos todos nós.

            Erradicar as filas dos hospitais significa acabar com a dor, a dor física e a dor da alma. A realidade dos hospitais brasileiros mais se parece com os cenários de guerra. A falta de tudo, do médico ao remédio, faz da doença uma loteria, uma espécie de roleta que define quem pode viver e quem deve morrer.

            A metade da corrupção também poderia propiciar maior incentivo aos produtores brasileiros, no campo e na cidade. Não como uma dádiva nem como um instrumento novo e alternativo para a corrupção. Recursos, mais uma vez, para produzir, gerar empregos e gerar renda. Para construir a verdadeira cidadania.

            O Vice-Presidente José Alencar disse que o Presidente Lula sabe das suas opiniões, porque ele “fala isso nas reuniões internas”. Ainda bem, porque o Presidente sempre diz que, nessa matéria, “não sabe nada”. Mas o Presidente sabe, e tanto sabe que, ao invés de apoiar instituições que coíbem a corrupção, quer inibir as suas atuações. Se quer inibir é porque, pelo menos, tem notícia dos fatos.

            Triste ironia! Na mesma edição do jornal em que o Vice-Presidente diz que o Brasil é o País da impunidade, há a notícia de que um projeto do Executivo prevê menos poder para uma instituição que combate a impunidade e a corrupção.

            O Vice-Presidente, na página 16. O Presidente, na página 2. Do mesmo caderno! O Caderno “Brasil”!

            Mas a coerência do Vice-Presidente José Alencar também está na página 2. Está escrito: “Na última semana, o Vice-Presidente José Alencar saiu em defesa do TCU e criticou as tentativas de enfraquecer o órgão. ‘A trajetória centenária dessa Casa comprova que ela sempre esteve vinculada ao conceito de transparência’, disse José Alencar”.

            Ora, pelo menos dessa vez, o Presidente Lula sabe. Mais: sabe através do seu Vice-Presidente. Sabe da ciranda financeira. Sabe da corrupção. Sabe que somos um País da impunidade. Sabe, mas marcha na contramão.

            Agora, quer que o Tribunal de Contas da União atue apenas depois da obra acabada! É fantástico!

            O Tribunal de Contas da União vai atuar, vai fiscalizar, vai ver o que acontece depois da obra acabada! Como se o País não fosse um paraíso da impunidade! Como se os que se locupletam com o dinheiro público devolvessem o que surrupiaram da Nação. Como se existisse caso de alguém que roubou, aplicou e devolveu depois.

            Pela Constituição brasileira, o Tribunal de Contas da União é um órgão auxiliar do Legislativo.

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União.

            Entre outras atribuições constitucionais do Tribunal de Contas estão a apreciação das contas do Presidente da República e

Art. 71 (...)

(...)

II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo poder público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público.”

            Ora, além de marchar na contramão das investigações sobre a corrupção com o dinheiro público e o combate à impunidade, o Presidente Lula tenta solapar a nossa função constitucional de legislar. É triste, mas é verdade.

            Por isso que eu peço, encarecidamente, ao meu irmão, companheiro Vice-Presidente José Alencar: continue falando; fale com o Presidente; continue falando.

            E é por isso que peço, fervorosamente, a Deus Todo-Poderoso longa vida a José de Alencar. Que isso que os médicos estão anunciando, que, surpreendentemente estão dando certo a nova característica técnica lá nos Estados Unidos, aqui mesmo, nos nossos hospitais, os tumores estão regredindo no seu tamanho; e José de Alencar fala, fala até em voltar para esta Casa, meu querido amigo e meu querido Senador Cristovam; disse ele que gostaria de voltar para esta Casa.

            Agora, uma questão que não abordei, quando lhe perguntaram, querendo saber o que ele fez mais para ajudar o Presidente Lula: Qual é a missão do Vice-Presidente? A resposta foi essa:

            “A missão do Vice-Presidente é não atrapalhar o Presidente”. E é verdade, e é o que ele tem feito. Ele esteve na Presidência da República quase que o dobro de tempo que o Jânio Quadros esteve, quase o dobro do tempo, e com a maior dignidade, com a maior respeitabilidade, com a maior credibilidade, vem agindo.

            Essa reportagem de página inteira vou afixar na entrada do meu Gabinete no Senado e vou distribuí-la aos meus amigos pelo Brasil inteiro. É emocionante! Um homem de 77 anos, milionário, um homem que nasceu do nada, nasceu pobre, pobre, pobre, foi para Belo Horizonte trabalhar como comerciário numa instituição e, do nada, cresceu e chegou à potência. Hoje, na Vice-Presidência da República, um ano Presidente, tem essa grandeza de espírito.

            Não sei, Sr. Presidente, sou um homem muito fraco para dor. Ter os cânceres que ele teve, ter os retrocessos que ele teve esses anos todos e ter a grandeza que ele tem: grandeza de espírito, grandeza de bondade, e a lucidez de olhar o seu País. Ele tem razão quando fala que a impunidade é muito triste e que tem que acabar. Ele tem razão quando diz que o valor está no trabalho que produz riqueza.

            Que bom seria que o Presidente Lula ouvisse mais o seu Vice-Presidente! Tanta gente importante... Está ali o Cristovam, grande Ministro da Educação! Está lá o Frei Betto: para mim, os seus artigos eu os leio com emoção, leio, releio, sublinho e mando para vários lugares, porque ele tem uma lição de vida.

            E olha que eu falo, e falo assim com o Lula porque, com toda sinceridade, no meu balanço pessoal, ele é altamente favorável ao lado positivo do Presidente Lula para o nosso País. Eu não posso fugir dessa realidade. Seria ridículo da minha parte se não visse o que é o Brasil hoje com o Lula, a diferença do Brasil de hoje com o Lula e de oito anos atrás com o Presidente anterior; a sua preocupação com o Bolsa Família, a sua preocupação com o crescimento, a sua visão internacional de mundo. Está ele agora como a grande vedete quando a China e os Estados Unidos lançam o bloco dos dois - dois sujos. Os dois não aceitam uma melhoria nas condições da natureza.

            Ele desafia os dois, e os dois que lançaram uma nota em Pequim dizendo que nada sairia na reunião do fim do ano sobre a questão mundial do meio ambiente voltaram atrás. Disseram que não é bem assim, que alguma coisa poderá sair.

            E Lula atacou de novo, com muita dureza e com muita correção. Se nós, Brasil - e viva a Marina! -, estamos apresentando uma proposta concreta sobre a Amazônia, de diminuição enorme de desmatamento da Amazônia, posição positiva, correta, os mais ricos e os que mais poluem podem tomar uma posição.

            Eu acho que o Lula tem muita coisa positiva. Não sou daqueles, por amor de Deus, que vêem apenas o lado negativo. Não! Acho que essa de o Lula não aceitar o terceiro mandato... Um Deputado do seu Partido entrou com a emenda e já tinha um bolo de Governadores e de Prefeitos correndo atrás, ele mandou dizer que não aceitava, quando no mundo aí, por tudo o que é canto, gente falando em reeleição. Então, é positivo. Ele tem coisas boas, muitas coisas boas.

            Mas eu não consigo entender é nesta questão, na questão da dignidade, da seriedade, da ética, da maneira de ver as coisas, de ver o lado social e humano da sociedade. Parece que ele tem uma orientação completamente diferente. Ele tem um “o fim justifica os meios”, que não se acaba mais. Como aconteceu aqui quando o Congresso podia ter tomado providências para reformar, para modificar as coisas profundamente erradas que estavam e estão, essa não foi a sua preocupação.

            Quando ele disse que, se Jesus estivesse aqui e fosse organizar o governo, tinha de botar Judas no Governo. Esse é um conceito que ele, na sua pureza, na sua ingenuidade e, perdoe-me, no seu primitivismo. Embora Presidente da República, com grandes qualidades, ele expressou o que pensa.

            É isso que ele acha. Ele é o Presidente da República, ele quer fazer um bom governo, ele tem que acertar. Vale a pena fazer um acordo com Judas e botar Judas no Governo.

            Esse é o seu pensamento. Custa-me crer, mas essa é uma realidade. Se pararmos para refletir, é um conceito que precisa ser analisado.

            Professor Cristovam, ontem fui para casa e, depois, vi novamente o aparte de V. Exª, e fiquei emocionado de novo.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Muito obrigado, Senador.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - V. Exª falando, conversando, usando o telefone... Eu até estava pensando: “O Cristovam não está ouvindo o que eu estou falando”. De repente, ele dá um aparte e põe ali, “pá”, exatamente o conceito de tudo o que eu queria dizer.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Eu quero agradecer ao senhor a possibilidade de estar aqui esse debate. Em primeiro lugar, quero tocar no caso do Tribunal de Contas. É óbvio que me preocupa muito o Presidente começar a querer mudar o Tribunal de Contas, sobretudo com essa coisa esquisita de avaliar depois de as obras estarem prontas. Mas há uma coisa, Senador Pedro Simon, que me preocupa mais. Quando se toca em um tribunal, não se para só nesse tribunal. Quando um poder, dos três - Legislativo, Executivo -, começa a perceber o poder de mexer no tribunal que o fiscaliza, não tenha dúvida: depois virão outros tribunais. O segundo, provavelmente, seria o tribunal eleitoral; depois, os tribunais de Justiça e, depois, o Supremo Tribunal, com o STJ no meio. Esta é uma preocupação: não se toca impunemente em um só tribunal. É o primeiro passo de um longo caminho em direção ao autoritarismo do Poder Executivo. Segundo, eu gostaria de falar sobre a sua homenagem, não apenas a uma entrevista, mas a essa figura exemplar que é o nosso Vice-Presidente. Tenho a impressão de que, nessa geração nossa, poucos vão ter uma biografia igual à do José Alencar. Ele não é apenas uma figura ímpar na maneira de fazer política - na discrição, quando é preciso, e na firmeza, quando é preciso -, mas ele é uma figura ímpar na força pessoal, na força de dentro, naquilo que a gente tem de mais difícil, que é a força física, quando a saúde está abalada. Eu nunca vi uma pessoa com a resistência, com a firmeza e com a tranquilidade com que enfrenta uma doença grave. Eu não me lembro de qualquer outro exemplo. Nós tivemos aqui o nosso querido amigo Darcy Ribeiro. Ele enfrentava bem a doença, mas ele enfrentava no Poder Legislativo; não era no dia a dia e não chegou a ter essa duração, com todos esses momentos em que as pessoas acham que estava terminando seus dias. E ele sai do hospital otimista, corajoso, dando graças a Deus, dizendo que vai continuar o seu trabalho, que tudo depende de Deus, mas que ele vai continuar na luta, e sem perder o humor. E o terceiro ponto do seu discurso: eu acho que a gente deveria fazer um debate aqui, entre nós, só sobre a figura Lula, porque eu creio que tanto o senhor como eu temos uma característica: temos um profundo respeito pelo Presidente - eu tenho, e o senhor tem -, sua história e sua competência, mas, ao mesmo tempo, não somos balança-cabeça para ele, de ficar apenas bajulando-o, como muitos. Nós fazemos as críticas, de que, aparentemente, ele não gosta. É a sensação que eu tenho. Pode ser que seja um defeito ou seja mais uma qualidade dele, mas nós temos em comum que respeitamos o Presidente. Mais: admiramos o Presidente, mas não nos curvamos para tratá-lo como Deus, como rei. Reconhecemos suas falhas. E, aí, acho que hoje dá para a gente perceber que ele virou, sem dúvida alguma, um grande estadista internacional, mas, no Brasil, não passa de um político nacional. Ele não conseguiu dar o salto para o estadismo dentro do Brasil. Dentro do Brasil, ele é um imenso, grande, maravilhoso político, mas não estadista. Estadista é o que olha 10, 15, 20 anos na frente.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - Repare que o mais difícil foi ser o internacional que ele fez. Era mais fácil fazer aqui do que lá fora. Lá fora, que era quase impossível...

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Que é quase impossível, ele faz.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - ...ele está fazendo.

            O Sr. Cristovam Buarque (PDT - DF) - Mas tem uma diferença: é que, lá fora, ele pode falar pensando o longo prazo; aqui, ele pensa a próxima eleição. Talvez isso seja o limitador... São duas coisas vinculadas. Duas coisas limitam o Presidente Lula de ser o grande estadista do século, além de ser o maior político, talvez, do século no Brasil. São duas coisas: eleição e popularidade. O estadista em alguns momentos tem de pensar menos na popularidade e mais no enfrentamento de uma proposta de longo prazo. Se, em 1940, Winston Churchill tivesse seguido as pesquisas de opinião na Inglaterra, ele teria feito as pazes com Hitler. A opinião pública queria a paz: “Deixa a França, deixa a Polônia lá para os alemães, e vamos ficar com a nossa ilha protegida aqui em vez de fazer uma guerra”. Ele pensou e disse: “se a gente fizer a paz agora, depois ele invade a gente”. E vendeu aquele famoso discurso do “sangue, suor e lágrimas”, que alguns dizem que tinha também a palavra trabalho. Vendeu o que nenhum político faz. Político não propõe suor, político não propõe lágrimas; o político propõe benesses. É o estadista que é capaz de propor o suor e a lágrima e dizer ao seu povo: “Nós vamos ter que passar anos e anos de luta. Muitos vão morrer, mas o país está acima de cada um de nós”. Isso está faltando ao nosso Presidente. Mas felizmente, pelo menos, ele pode fazer isso lá fora. E aí eu queria sugerir que ele não fosse para Copenhague como simples Presidente do Brasil, mas, sim, como um grande estadista do mundo. Não vou dizer o estadista. Não, aí seria uma arrogância de brasileiro, seria uma bajulação, mas um dos líderes, sim, dá para dizer. E mais: um dos líderes importantes do mundo, não apenas um dos líderes - nem o líder, nem apenas um. Ele pode ir lá e falar, não pensando em nós aqui, em 200 milhões; não pensando no que vai acontecer com a produção de soja nem se a produção de automóveis vai ter de diminuir ou não para manter o meio ambiente, mas pensando numa alternativa, num socialismo novo - ou num outro nome, eu chamo de educacionismo -, mas falar pensando nos seis bilhões de seres humanos que hoje estão em busca de uma alternativa, que sabem que esse crescimento econômico leva ao desastre. É preciso um outro tipo de riqueza; não é nem mesmo outro tipo de crescimento, mas outro tipo de riqueza. Não é mais a riqueza do automóvel privado, mas a do transporte público. Não é nem mais a riqueza do consumo material, mas a do consumo intelectual, cultural, espiritual. Trata-se de redefinir o conceito de riqueza. Ele, indicado pelos brasileiros, tem de levar esse projeto para Copenhague, mas tem de falar para o mundo inteiro. Estamos precisando disso. Ele tem as condições, e o Brasil tem condições também para dar a ele. O Presidente de qualquer país poderia falar isso, mas não teria a mesma repercussão. Se fosse o Presidente de um país grande, poderia ter repercussão, mas não teria o mesmo respeito. O Brasil está no meio, tem todos os recursos, tem todos os problemas. Nós temos condições de sermos respeitados porque não somos dos grandes, que estão provocando os maiores desastres, mas, ao mesmo tempo, somos admirados porque fazemos parte dos que já provocam o desastre por sermos uma potência econômica. Seria bom que o Presidente tivesse acesso a essas nossas conversas de fim de tarde, porque não somos bajuladores, mas somos admiradores dele. Ele perceberia que a gente está dizendo que, às vezes, ele é maior do que parece; mas, quando não usa isso, ele parece menor do que realmente é, quando fica com essa idéia de se juntar a Judas, como ele diz. E ele esqueceu, naquela fala dele, de dizer que Judas sempre ganha no Brasil. Na Abolição da Escravatura, nós juntamos os escravocratas com os abolicionistas, mas ganharam os escravocratas, porque não deram terra e não deram escola, só disseram que os poucos, que estavam morrendo, iam ser libertados porque já tinha havido a Lei do Ventre Livre, e a escravatura iria acabar de qualquer jeito. Na República, fizemos aliança e, na Independência, ainda mais: fizemos uma aliança tão grande na Independência que os independentistas escolheram o filho do Rei da metrópole para ser o nosso Imperador. Os outros países todos escolheram Presidentes da República; nenhum deles fez acordo com a Espanha, fizeram guerra com a Espanha. O Brasil não faz guerra e se orgulha disso, mas é o preço que a gente paga para ficar sempre conciliando. Então, o Presidente Lula poderia radicalizar essa ideia de ser um estadista internacional e dizer: “Eu já estou terminando o meu mandato, eu já tenho popularidade no Brasil, não vou mais ficar preocupado se a produção de automóveis vai aumentar ou diminuir, não vou me preocupar se a produção de soja vai aumentar ou diminuir. Eu vou falar que é preciso um novo modelo de desenvolvimento para o mundo inteiro”. Aí sim, ele ganharia as páginas da história. Eu espero que ele faça isso, até porque ele tem sensibilidade para isso, como demonstrou ao enfrentar o Obama e o Primeiro Ministro Hu. Ele demonstrou que tem essa sensibilidade. Vai ver que ele fará isso e, aí, nós dois devemos vir aqui aplaudi-lo, mas, se ele não o fizer, viremos nós dois para criticá-lo.

            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS) - O aparte de V. Exª honra o meu pronunciamento. Eu praticamente encerro com seu aparte, porque só atrapalharia se falasse mais.

            A fala de V. Exª sobre Darcy Ribeiro será o post scriptum do meu pronunciamento.

            Realmente, V. Exª lembrou bem. Darcy Ribeiro foi uma criatura emocionante. Esteve aqui com a gente. Quando nós fomos visitá-lo, a imprensa publicou que ele fugiu da UTI. Fugiu da UTI! Morre, não morre, combinou com o motorista e fugiu da UTI. Foi para uma casa que ele tinha numa beira de praia lá no fim do mundo, botou uma rede e levou não sei quantos meses escrevendo o livro mais fantástico dele, O Povo Brasileiro. Escreveu depois fugir da UTI, morrendo aos poucos na beira da praia. Quando lhe perguntaram: “Mas o que é isso? Você fugir da UTI? Um homem inteligente, competente como você fazer uma coisa dessa? Mas como é que você fugiu da UTI?” Disse ele: “Mas como é que eu não vou fugir? Aquele médico não entendia nada. Há dez anos, eu tive um câncer no pulmão e retirei um pulmão, e ele me diz que eu tenho pneumonia dupla? Ele não entende nada.” Fugiu e durou tempo suficiente para fazer um livro espetacular, O Povo Brasileiro.

            Muito obrigado pelo aparte.

 

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SEGUE, NA ÍNTEGRA, PRONUNCIAMENTO DO SR. SENADOR PEDRO SIMON.

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            O SR. PEDRO SIMON (PMDB - RS. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores,


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