Discurso durante a 237ª Sessão Deliberativa Extraordinária, no Senado Federal

Apelo ao Governador Arruda para que se afaste do cargo voluntariamente para evitar constrangimentos permitindo à cidade recuperar a credibilidade no cenário nacional. (como Líder)

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).:
  • Apelo ao Governador Arruda para que se afaste do cargo voluntariamente para evitar constrangimentos permitindo à cidade recuperar a credibilidade no cenário nacional. (como Líder)
Publicação
Publicação no DSF de 03/12/2009 - Página 64882
Assunto
Outros > GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF).
Indexação
  • GRAVIDADE, CORRUPÇÃO, DISTRITO FEDERAL (DF), REGISTRO, MANIFESTAÇÃO COLETIVA, ESTUDANTE, CAMARA LEGISLATIVA DO DISTRITO FEDERAL (CLDF), RESIDENCIA OFICIAL, GOVERNADOR, DECISÃO, PARTIDO POLITICO, ABANDONO, COLIGAÇÃO, GOVERNO, PEDIDO, DEMISSÃO, SECRETARIO DE GOVERNO, AREA, EDUCAÇÃO, SAUDE, OBRAS, CASA CIVIL, APREENSÃO, RISCOS, ADMINISTRAÇÃO, CIDADE, PREVISÃO, DIFICULDADE, TRAMITAÇÃO, PROCESSO, IMPEACHMENT, OPOSIÇÃO, ORADOR, INTERVENÇÃO FEDERAL.
  • SOLICITAÇÃO, DECISÃO, GOVERNADOR, VOLUNTARIO, AFASTAMENTO, GOVERNO DO DISTRITO FEDERAL (GDF), PERIODO, INVESTIGAÇÃO, DENUNCIA, BENEFICIO, ADMINISTRAÇÃO PUBLICA, COMBATE, FRUSTRAÇÃO, POPULAÇÃO, BUSCA, RECUPERAÇÃO, CONFIANÇA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Obrigado, Senador Mão Santa. E é sobre o Distrito Federal que eu quero falar.

            Sr. Presidente, de repente a corrupção, aparentemente, se transformou em um fenômeno do Distrito Federal. Todos nós sabemos que a corrupção tem sido, como se diz muito por aí - e não é bom ficar repetindo essas imagens muito comuns -, tem sido uma espécie de câncer do sistema político brasileiro. Não é uma característica de Brasília. Agora, o que aconteceu nesta última semana, o que apareceu nesta última semana em função do que acontecia ao longo de um tempo, de fato, é uma característica que a gente está vendo e cujo palco é o Distrito Federal.

            No começo da semana, eu vim aqui e, como brasiliense e como Senador pelo Distrito Federal, pedi desculpas ao Brasil pelo espetáculo que o Distrito Federal está apresentando. Um espetáculo que não podemos sequer dizer que é tragicômico, porque a parte cômica não existe. De fato, é um espetáculo trágico da política: pessoas recebendo dinheiro, rezando depois de terem recebido o dinheiro. Algo como se contaminasse toda a máquina de uma administração. Até porque passa do primeiro para o segundo, para o terceiro, para o quarto em linha de sucessão, deixando uma perplexidade geral e uma impotência muito grande de nós, que somos líderes deste Distrito Federal e ficamos sem saber exatamente o que fazer.

            Hoje, a gente tem a Assembleia Legislativa daqui, que a gente chama Câmara Distrital, ocupada por estudantes; a frente da residência oficial do Governador ocupada por manifestantes. Organizam-se manifestações por todos os lados, pequenas, às vezes, maiores um pouco. Mais grave que isso: dos muitos partidos que o Governo tinha, hoje, ficaram dois partidos; seis partidos saíram do Governo, abandonaram o Governo. Esse número mostra a engenharia política anterior, que juntou tantos partidos, e a debandada geral dos partidos. Seis ou sete Secretários de Governo abandonaram essa administração. De tal forma que a sensação que temos é a de um Governador na sua solidão gerencial, na sua solidão política, e isso traz alguns riscos muito grandes para o futuro da cidade. A sensação que se tem é de que esse processo pode levar a uma acefalia completa da administração no Distrito Federal.

            Trata-se de um Governo que, não podemos negar, vinha administrando, do ponto de vista de obras, do ponto de vista de projetos, do ponto de vista de inovações, de uma forma até positiva. E seria um equívoco querermos, ao assistirmos aquele espetáculo - generalizar como se nada prestasse no Governo; seria, de fato, um equívoco. Um Governo que vinha acertando no processo gerencial, de repente, cai numa aparente acefalia.

            E, aí, o que é que pode acontecer? Estamos sem Secretários de Saúde e Educação. É claro que isso gera uma perturbação nos dois sistemas. Além de um Governador cuja cabeça está toda voltada para a sua crise pessoal, sem tempo nem ao menos de escolher o novo Secretário por falta de uma base de apoio político, ficamos sem Secretários de Educação e Saúde. O Secretário de Obras saiu, o Secretário da Casa Civil saiu. Ou seja: a gente vê os Secretários abandonando seus cargos sem serem substituídos por pessoas com força política, com experiência administrativa, capazes de manter o funcionamento da máquina.

            O que se pode imaginar é que a continuação disso levará a uma paralisação de obras, a uma paralisação dos sistemas, mais dia, menos dia, ao não pagamento dos serviços, com o consequente desemprego. Quem sabe até pode acontecer atraso no pagamento de salários por falta de a máquina estar funcionando corretamente. Nós vemos, portanto, uma situação de gravidade, que não é mais do Governador, não é mais do Governo; é de toda a sociedade no Distrito Federal.

            Some-se a isso a tragédia de psicologia social, do conjunto da população brasiliense incomodada, angustiada, eu dirá até, de certa forma, envergonhada com aquilo que está acontecendo aqui.

            Eu antevejo algumas semanas extremamente difíceis. Somem-se ainda mais as dificuldades jurídicas. Ninguém tira um Governador se ele não quer sair, a não ser através de um processo de impeachment. É claro que já há cinco ou seis pedidos de impeachment. É claro que, no quadro atual, apesar do controle que o Governador tem sobre a Câmara Legislativa, não é impossível que um desses pedidos de impeachment, ou dois, ou três, sejam adotados pela Casa. E, nesse sentido, o seu afastamento torna-se obrigatório. Mas e quem vai substituí-lo? A gente não tem certeza do que vai aparecer, das críticas que serão feitas aos que devem substituí-lo.

            Nós vivemos um período de profunda perplexidade, de falta de um rumo claro, de falta até de aplicação das leis para encontrar a saída que se espera. Aí, de vez em quando, fala-se nessa coisa esdrúxula de intervenção, que não conta com o meu apoio em nenhuma hipótese, porque a intervenção de algo externo, pelo Poder Federal, no Governo do Distrito Federal significaria, claro, uma perda completa da autonomia e, portanto, a perda da justificação de um governo autônomo, eleito pela população do Distrito Federal. Não podemos aceitar essa ideia de intervenção.

            Ao mesmo tempo, como nós daqui de dentro vamos encontrar uma saída? Com as manifestações dos estudantes tomando a Câmara Legislativa? Com a sociedade civil na frente do Palácio? Não! A saída vai ser o Governador entender a necessidade do afastamento dele, a grandeza de perceber que por forças... Ele pode, inclusive, jogar a culpa em governos do passado; ele pode jogar a culpa em policiais que, segundo ele, o traíam. Seja como for, o que apareceu gerou uma crise de tais proporções que a melhor saída seria o seu afastamento. Ainda que fosse para que tudo se apurasse com tranquilidade, mas sem sacrificar o processo administrativo, gerencial, político do Distrito Federal, enquanto encontramos uma saída jurídica, enquanto encontramos a justificação ou não das medidas a serem tomadas, enquanto apuramos com clareza tudo o que de fato aconteceu. Que ele seja afastado do cargo por vontade própria, para impedir o longo processo, que será angustiante, que atravessará as férias que todos terminam tirando de dezembro a janeiro, que vai até o Carnaval muitas vezes, que chega até a Semana Santa às vezes.

            A cidade não pode aguentar um período como esse. Pessoas tiram férias; cidades não. E a cidade não pode dar-se um tempo a si própria, não tem como. Tem que pagar os professores, tem que haver as aulas funcionando, os hospitais têm que funcionar, as obras têm que continuar, e isso fica cada vez mais difícil ser feito nas condições atuais, pelo mesmo Governo que nós temos.

            É nesse sentido que, até em respeito ao que vinha sendo feito do ponto de vista administrativo até aqui, até em respeito aos projetos inovativos que vinham sendo implantados, creio que o Governador faria um gesto correto se dissesse que se afasta do cargo da mesma maneira que determinou a outros Secretários, que aparecem nas cenas - e nem disse a palavra “envolvidos” -, fossem afastados. Seria, pois, natural que ele também se afastasse e que a gente tentasse fazer a máquina funcionar, para que a cidade não parasse, para que houvesse um alívio, inclusive, nesse sentimento angustiante que nós, dois milhões de brasilienses, sentimos. E, nesse processo das próximas semanas e meses, nós encontrássemos o caminho correto e permanente para que isso fosse superado e encontrássemos o caminho para que coisas como essa não possam se repetir.

            E não é só o Distrito Federal que vai ter que encontrar o seu caminho. Aí, é uma postura nova para o Brasil inteiro. Que decidamos, de uma vez por todas, erradicar o câncer da corrupção, o câncer dessa promiscuidade entre empresas e Governos, dessa promiscuidade entre campanhas e empresários, dessa promiscuidade do financiamento privado de campanhas eleitorais. Que acabemos com essa promiscuidade que leva a coisas como essa que nós estamos vendo.

            Eu deixo aqui esse apelo para que o Governador Arruda entenda que, neste momento, o seu afastamento voluntário - não falei nem em renúncia - pode dar um tempo não só para que ele se defenda mais facilmente, não só para que ele tenha mais tempo para se preocupar com a sua defesa e com as explicações que a sociedade quer ouvir, mas para que a máquina funcione e não se paralisem, inclusive, os projetos que ele iniciou, os projetos que ele vinha levando. E que, funcionando sob o ponto de vista de satisfazer o dia-a-dia da cidade, nós possamos, com mais tempo, encontrar o caminho definitivo para resolver essa tragédia, que não é mais política, mas sim de ordem moral. Nem só moral; ela é de ordem de psicologia de toda a sociedade da nossa cidade.

            Fica aqui esse meu apelo, essa minha manifestação, dizendo: nós precisamos de algum tempo, nós vamos precisar de algum tempo para saber exatamente como recuperar a credibilidade da nossa cidade no cenário nacional e o que fazer, a partir da experiência que nós estamos sofrendo neste momento, a fim de que aprendamos, o Brasil inteiro, que coisas como essa não possam se repetir.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Professor Cristovam Buarque, em Rei Lear, Shakespeare escreveu: “Há algo de podre no reino da Dinamarca; é melhor ser um mendigo em Nápoles do que rei na Dinamarca”. As coisas foram mudando, e, hoje, a Dinamarca está chamando a atenção do mundo para a melhoria do meio ambiente. O mundo todo está se voltando para a Dinamarca, para Copenhague. Então, vamos querer que essa podridão acabe aqui. E sou testemunha de que, desde o início, V. Exª teve uma posição muito firme e não podia perder a esperança - e não a perdeu - de melhores dias. Está escrito também por Francisco, o Santo: “Onde houver desespero, que eu leve a esperança”. E V. Exª é uma das esperanças neste momento.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Sr. Presidente.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 03/12/2009 - Página 64882