Discurso durante a 244ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Registro do recebimento, pelo Presidente Obama, do Prêmio Nobel da Paz. Considerações sobre a designação de S.Exa. para participar do Encontro da União Internacional Pan-Americana, na próxima semana, onde deverá apresentar tese de como deve ser o político do século XXI.

Autor
Cristovam Buarque (PDT - Partido Democrático Trabalhista/DF)
Nome completo: Cristovam Ricardo Cavalcanti Buarque
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA PARTIDARIA.:
  • Registro do recebimento, pelo Presidente Obama, do Prêmio Nobel da Paz. Considerações sobre a designação de S.Exa. para participar do Encontro da União Internacional Pan-Americana, na próxima semana, onde deverá apresentar tese de como deve ser o político do século XXI.
Aparteantes
Mozarildo Cavalcanti, Patrícia Saboya.
Publicação
Publicação no DSF de 11/12/2009 - Página 66523
Assunto
Outros > POLITICA INTERNACIONAL. POLITICA PARTIDARIA.
Indexação
  • COMENTARIO, RECEBIMENTO, PRESIDENTE DE REPUBLICA ESTRANGEIRA, PAIS ESTRANGEIRO, ESTADOS UNIDOS DA AMERICA (EUA), PREMIO, AMBITO INTERNACIONAL, PAZ, ANALISE, DADOS, DIFICULDADE, POLITICA INTERNACIONAL, COBRANÇA, ATUAÇÃO, CHEFE DE ESTADO, DEFESA, MEIO AMBIENTE, POLITICA SOCIAL, DIVERSIDADE, CULTURA, RENUNCIA, GUERRA.
  • ANUNCIO, PARTICIPAÇÃO, ENCONTRO, AMERICA, DEBATE, FORMAÇÃO, POLITICA, ADAPTAÇÃO, ATUALIDADE, DETALHAMENTO, OPINIÃO, NECESSIDADE, EXPANSÃO, REGIÃO, TEMPO, DIRETRIZ, ATUAÇÃO, UTILIZAÇÃO, RECURSOS, INTERNET, COMUNICAÇÃO SOCIAL.
  • QUESTIONAMENTO, DIRETRIZ, DEFESA, NECESSIDADE, ALTERAÇÃO, PARTIDO POLITICO, ADAPTAÇÃO, DEBATE, IDEOLOGIA, INCLUSÃO, PERMANENCIA, MEIO AMBIENTE, IMPORTANCIA, POLITICO, CONSCIENTIZAÇÃO, PRIORIDADE, EDUCAÇÃO, TRANSFORMAÇÃO, MUNDO, CONCEITO, PRODUTO INTERNO BRUTO (PIB), BEM ESTAR SOCIAL, GLOBALIZAÇÃO.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF. Pronuncia o seguinte discurso. Sem revisão do orador.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, esta manhã, quem teve oportunidade de conectar-se a alguns canais de televisão pôde ver uma cena extremamente... eu diria: uma cena histórica, que foi a do Presidente Obama recebendo o Prêmio Nobel da Paz.

            Creio que aquela cena merece algumas reflexões nossas, porque raras vezes se viu um Presidente em exercício recebendo um Prêmio Nobel da Paz. E um Presidente em um momento em que as guerras não são mais apenas aquelas tradicionais, nucleares ou não; as guerras são guerras contra a pobreza, guerras contra o terrorismo, guerras contra a depredação ambiental.

            Eu me lembrei, ao assistir a uma parte, de um artigo que publiquei no jornal El Pais, de Madrid pouco antes da posse do Presidente Obama, em que eu dizia que ele já tinha conseguido ser o primeiro presidente negro da história dos Estados Unidos, e isso já fazia dele um grande personagem histórico, mas ele ainda não tinha comprovado as outras cores dele. Ele não tinha comprovado, por exemplo, que era um presidente verde, capaz de defender um equilíbrio ecológico, capaz de reorientar o modelo de desenvolvimento norte-americano para levar em conta os limites que nós temos, provocados pela natureza; ele ainda não era um presidente branco do ponto de vista da paz, ele não tinha provado; ele não tinha provado que era um presidente colorido, do ponto de vista da diversidade, do respeito às culturas que existem no mundo.

            Nesse quase um ano já da presidência do Sr. Obama, creio que ele já deu alguns saltos para provar que não é apenas o primeiro presidente negro. Certamente, ele tomou medidas interessantes do ponto de vista da defesa da diversidade cultural no mundo, com discursos que mostram respeito especialmente a aspectos do mundo islâmico. Creio que ele já provou, embora titubeando, a necessidade de se proteger o meio ambiente com a redução do dióxido de carbono, mas ainda de maneira muito débil. No que se refere à paz, ele enviou umas tropas para o Afeganistão, surpreendendo muitos que esperavam que ele começasse a retirar as tropas norte-americanas de fora dos Estados Unidos. Aqui mesmo, na América Latina, fez um acordo para instalar uma base militar na Colômbia. Então, é um presidente que traz e mantém ainda a esperança de todos nós, mas nos traz já algumas preocupações nesse um ano.

            Eu não tive chance de escutar o seu discurso para ver o que ele disse hoje, Senadora Patrícia, ao receber o Prêmio Nobel da Paz, mas eu sou daqueles que ainda têm esperança de podemos ter não apenas o primeiro presidente negro, mas o presidente verde, o presidente branco e também o presidente vermelho, da preocupação social - esse, sim, um aspecto a que ele tem dado importância no que se refere ao seu programa revolucionário de saúde para todos nos Estados Unidos.

            Digo isso porque, na próxima semana, alguns de nós aqui estarão viajando para Copenhague, e eu fui indicado para participar como um dos representantes brasileiros no encontro da União Internacional Pan-Americana. E eu estou levando para lá a defesa, digamos, com a pretensão de professor, de certa tese de como deve ser o político do século XXI. E creio que nenhum de nós ainda está preparado para isso.

            Coloquei a ideia de que, daqui para frente, os políticos terão de romper, Senadora Patrícia, cinco fronteiras, e eu não sei se vamos conseguir.

            Primeiro, a fronteira espacial. Não dá mais para ser político apenas da sua província, do seu país. Não dá mais. A partir de agora, o político tem que ser da província, senão ele não tem votos, mas do planeta, senão ele não tem futuro. Como fazer esse salto? É um salto quase impossível, porque quem fizer discursos pensando no planeta, no equilíbrio ecológico, não ganha eleição, e quem ganhar eleição propondo apenas resolver o seu problema imediato não é um bom político para o futuro.

            Tomemos aqui o nosso caso do pré-sal. O político que disser que o pré-sal não é importante, que deve ser explorado na velocidade mais rápida possível é um mau político. Os eleitores não vão gostar disso. Mas o político que disser que temos que explorar esse petróleo o mais rápido possível está fazendo um desfavor à comunidade da humanidade inteira, porque para cada barril queimado maior o impacto ambiental que vamos ter. Esta é uma fronteira difícil de vencermos: não ser apenas nacional, mas ser planetário.

            E o pior é que, antes da globalização, os políticos eram mais internacionais do que são hoje. Nos anos 50, 60, os políticos falavam para o mundo inteiro: os socialistas defendendo a revolução, os capitalistas defendendo o aumento da produção. Aqueles pequenos países africanos tinham os seus líderes falando para o mundo inteiro contra o colonialismo. Houve um apequenamento dos líderes. Os líderes deixaram de ter preocupação mundial e passaram à preocupação local. É interessante. A globalização, em vez de globalizar os líderes, aprisionou os líderes nos seus países. E pior ainda: aprisionou os líderes na economia. Quando vemos, hoje, as falas dos Presidentes da República, a sensação é a de que estamos ouvindo falas de Ministros da Economia, Ministros do Comércio. A gente não está ouvindo a fala de estadistas dos seus países, ainda menos dos estadistas pensando no planeta inteiro.

            Esta é a primeira fronteira: como sair, Senador Adelmir, da preocupação unicamente com os seus eleitores, com a sua comunidade, e pensar na comunidade internacional? Esse é o problema do Presidente Obama. Para ele ganhar eleições daqui a três anos, ele vai ter de aumentar a venda de automóveis; mas, para ficar na história como o presidente que recuperou o planeta, ele vai ter de lutar para que a gente tenha transporte público de qualidade.

            A segunda fronteira é a do tempo. Nós vivemos soluçando, a cada quatro anos, para as nossas eleições. No máximo, Senador, a cada oito anos. Mesmo assim, no meio das eleições dele, ele faz eleições para os outros. Aqui mesmo não tinha eleição e, há pouco tempo, fui fazer eleição para a prefeita Patrícia, lá em Fortaleza.

            Vivemos pensando no espaço de quatro anos - às vezes de dois, apenas, pelas eleições municipais - e os problemas do mundo, hoje, aparecem ao longo de décadas. Eles exigem décadas para serem resolvidos. Como é que a gente vai ganhar voto propondo resolver um problema que vai surgir daqui a 20, 30 anos, e exigindo que se pague o preço hoje? Quem vai votar na gente? Quem vai votar num projeto que diga: é preciso parar a emissão de dióxido de carbono, por isso, é preciso reduzir a frota de automóveis? Hoje, quem é que vai querer reduzir a frota de automóveis para beneficiar um menino que não nasceu ainda? Quem vai votar no candidato das próximas gerações se as próximas gerações não votam? Esse é um desafio.

            Por isso sou pessimista em relação à solução do problema ambiental, porque há uma incompatibilidade completa entre o papel político e o papel cosmopolita planetário da civilização.

            A terceira fronteira é a fronteira da comunicação. Como a gente vai exercer a nossa profissão, a nossa atividade, a nossa função, com a comunicação instantânea e imediata do Twitter, do blog, do site, da Internet? Até aqui, bastava a gente preocupar-se com a comunicação via mídia formal. Se a gente saísse bem nas colunas dos jornais, se a gente aparecesse bem na televisão, nós não teríamos problemas políticos nem eleitorais.

            Agora, você pode ficar dois dias na televisão. No outro dia, sai uma notícia no Twitter e se espalha, replicadamente, em todo o País - sua imagem está destruída. Você, antigamente, votava um assunto e ele ficava escondido, se fosse contra interesses de grupos. Não fica mais escondido. Não só essa televisão espalha, mas os blogs espalham, o Twitter espalha. A comunicação com o eleitor é direta, é constante. Isso vai exigir um novo tipo de político. E mais, vai não só exigir um novo tipo de partido, talvez faça ser impossível a continuação dos partidos como eles são hoje.

            Eu imagino que, talvez, a gente caminhe para um tempo em que cada um de nós será eleito individualmente, sem partido, e fará o partido aqui dentro, juntando aqueles que pensem parecidamente. Serão partidos móveis. A Senadora Patrícia formaria um partido em defesa das crianças; em defesa do meio ambiente, a Senadora Marina; em defesa da Amazônia, os Senadores da Amazônia.

            Nós talvez não tenhamos, no futuro, os blocos de partidos que sirvam para eleger e que funcionem, aqui dentro, com essa disciplina que a gente deseja ainda ter. Vai haver uma mudança radical na maneira como nós, políticos, nos relacionamos entre nós e nos relacionamos com os eleitores.

            A quarta fronteira, Sr. Presidente, não vou demorar, é a fronteira do debate ideológico. Até aqui, a gente falava em esquerda e direita, em socialismo e capitalismo. Agora, é mais grave, é entre a atual civilização e uma outra que a gente não sabe, ainda, como é. E, aí, como a gente não sabe como ela é, a gente foge desse debate ideológico e fica prisioneiro do dia a dia. Por que a gente não tem mais debates aqui? Porque acabou o debate entre socialistas e capitalistas. Ficamos todos iguais, sob esse ponto de vista. E a gente não inventou, ainda, um outro tipo de debate.

            O debate sobre o meio ambiente começa a surgir agora, mas a gente não está pronto para o debate do meio ambiente. Qual é a prova? Quem traz o debate do meio ambiente debate conservar como está aí, e a gente sabe, sobretudo os de lá - e, aqui, eu vejo dois da Amazônia -, que o debate de defender como está não satisfaz, o debate conservacionista. E não há uma proposta para um debate posterior de uma civilização onde as pessoas se beneficiem da floresta e não, apenas, sejam guardiãs da floresta. Não está claro como vai ser isso. Este é um debate que o político do próximo século, aliás, deste século, daqui para a frente, vai ter de entender: o debate ideológico não mais entre socialismo e capitalismo, não mais ignorando que as ideologias morreram, e inventando uma nova.

            O pior é que as ideologias não são feitas pelos políticos, são feitas pelos filósofos - a gente apenas utiliza as filosofias -, e os filósofos não estão pensando nisso também.

            Finalmente, até para não dizerem que eu não falei de educação, a quinta fronteira é sair dessa prisão da economia e ingressar na prisão, se for o caso, ou caminhar na liberdade de que a grande mudança, a grande reforma está na cabeça das pessoas, na mentalidade das pessoas. E isso é um produto da educação. Nem vou dizer da escola, porque não é só a escola; é a escola, a mídia, é a família, são as religiões, são as amizades. Mas é a educação que vai mudar a mentalidade.

            Outra coisa que me faz pessimista na solução dos problemas ambientais: a gente vê uma comemoração porque estamos chegando à definição de metas de dióxido de carbono, como se nós fôssemos químicos e não estadistas. O problema não está na emissão de gás. O problema está na emissão de desejos de comprar os produtos que emitem o gás. Esse é o problema! Está na cabeça da gente, querendo comprar coisas que emitem gases que elevam a temperatura do planeta. E como vamos mudar essas emissões de desejos, incompatíveis com a realidade do mundo natural? Através do processo educacional.

            Aí, tem esta quinta fronteira: começarmos a ser mais políticos preocupados com a mentalidade e, portanto, com a educação, do que preocupados com o Produto Interno Bruto, porque ele é, em si, e merece esse nome, bruto. O Produto Interno não é bruto apenas porque se diz que é diferente do líquido, que é aquele de que a gente desconta a poupança. Não. Ele é bruto porque ele é bruto intelectualmente, do ponto de vista do conceito dele. É uma brutalidade achar que o Produto Interno de um país traz a felicidade, traz o bem-estar. Ele é bruto porque ele é destruidor. O Produto Interno é destruidor na maneira como ele é hoje. Ele tem uma brutalidade dentro dele. Uma árvore em pé não entra no PIB, a não ser depois de derrubada. Então, é um produto realmente bruto do ponto de vista da relação com a natureza.

            Eu não sei que repercussão vai ter, não sei nem se vão ouvir, não sei nem se vão ler, porque eu vou levar por escrito, mas eu vou levar esse documento sobre as cinco fronteiras que os políticos do século XXI - nós - vamos precisar romper para existirmos ainda no final do século, porque se nós não fizermos essa ruptura nós não vamos existir. Vai surgir uma coisa completamente diferente, que a gente nem está imaginando. Talvez não se precise mais disso. Talvez sejam os tecnocratas que vão gerenciar o planeta e os países. Talvez a relação não seja através de parlamentares. Talvez seja o voto direto, através da eletrônica, fazendo a votação no final do dia, se queremos ou não que a Venezuela entre no Mercosul. Não precisava de tantos discursos. Ou a gente rompe as fronteiras - eu digo essas e podem ser outras -, ou nós vamos deixar de existir daqui a mais algumas décadas.

            Era isto, Sr. Presidente, que eu tinha para falar, mas há dois pedidos de apartes.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - V. Exª tem o tempo que quiser, porque tem um aparte da Patrícia e, depois, do Mozarildo.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - A minha experiência como professor é a de que o melhor da aula são as perguntas.

            O SR. PRESIDENTE (Mão Santa. PSC - PI) - Eu não ia deixar de dar.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - E o melhor da política são os apartes. Por isso, o primeiro aparte é para a Senadora Patrícia Saboya.

            A Srª Patrícia Saboya (PDT - CE) - Senador Cristovam, eu sou sempre muito fã de escutá-lo. Eu gosto muito de escutá-lo, porque V. Exª consegue trazer para esta Casa assuntos que desafiam a nossa inteligência, assuntos que nos fazem refletir, pensar. Podemos concordar ou discordar de V. Exª, mas o importante é trazer o debate para cá. Sou uma das que testemunha a sua vontade de sempre trazer esse debate, de arejar as nossas cabeças e de fazer com que cada vez mais a democracia seja fortalecida através das divergências, através do debate, das discordâncias, enfim, sempre nos colocando muito à frente para que possamos pensar. V. Exª, hoje, traz algo em que venho também pensando há muito tempo. Daqui a um ano, por exemplo, acaba o meu mandato de Senadora. Muitas vezes fico a me perguntar o que eu poderia fazer para continuar ajudando. Gosto muito de política. A minha vida inteira convivi, na minha família, com política. Sempre gostei. Fui liderança estudantil e sempre pensei que a política devia ser uma ferramenta na mão da gente, das pessoas que gostam da política, que querem fazer dela e que fazem dela uma vocação, uma vontade de poder mudar a realidade, de transformar as coisas, para que a gente esteja sempre em um lugar em que possa alterar a situação ou possa ajudar a transformar uma determinada situação em que as pessoas não se sentem bem. Fico sempre pensando - depois de haver sido Vereadora, Deputada Estadual e de ter tido a honra de ter sido a primeira Senadora mulher eleita no meu Estado - no próximo desafio. Para mim, que gosto da política, como muitos que nos assistem e muitas vezes também se decepcionam, muitas vezes também têm vontade de parar por aqui, mas que muitas vezes também pensam que são poucos ainda aqueles que têm a vocação, que têm o gosto de poder não estar aqui, mas estar nas Câmaras Municipais, estar no Poder Executivo, estar nas Assembléias Legislativas, na Câmara Federal ou aqui mesmo, no Senado, fazendo alguma coisa, não se conformando, portanto, acredito que, com a política sendo uma ferramenta de transformação, eu deva estar em algum lugar em que eu possa acrescentar alguma coisa para as pessoas que me elegeram. Essa sua reflexão de nos apontar as fronteiras, de que precisamos ainda nos debruçar e pensar muito em como conciliar o desenvolvimento, a economia dos nossos países com a defesa do nosso planeta e das futuras gerações... Eu já estava sentindo falta quando V. Exª chegou no quarto desafio, porque a cara de V. Exª, o coração de V. Exª, a alma de V. Exª é a educação. Certamente, o discurso, o pronunciamento e a defesa mais certeira que um ser humano poderia fazer, que aposte realmente no futuro do nosso País, que acredite na nossa população e que acredite, de verdade, na futura geração, que ela só vai poder ter um sentido de vida, que só vai poder desabrochar se formos capazes, hoje, de acolher e de oferecer-lhe a possibilidade de uma vida melhor. V. Exª tocou num item muito importante, que é a emissão dos sonhos, dos desejos. Conversava agora há pouco, no almoço, sobre isto: como esse consumismo exagerado, como esse desejo que temos de consumir pode, como consequência, gerar uma violência muito grande - e a gente já está colhendo esses frutos aqui, no nosso País -, de uma mídia que nos bombardeia pela globalização, que nos bombardeia com o consumismo. Hoje, as pessoas valem muito mais por aquilo que têm do que por aquilo que são, pelo que elas carregam, pelo que elas trazem dentro da sua alma, do seu coração. Vivemos, hoje, colhendo os frutos de uma violência, de uma sociedade ainda muito desigual, em que esse fosso cada vez se acentua mais e mais, separando-nos, como se vivêssemos num País dividido: de um lado, os pobres, miseráveis; e, do outro, aqueles que podem tocar sua vida adiante. Então, V. Exª trouxe hoje aqui algo em que eu tenho pensado muito. Semana passada, falei sobre essa droga que é o crack e o tanto que ela tem conseguido devastar milhares de famílias brasileiras. Hoje, se tiver oportunidade, quero falar um pouco sobre essa relação da juventude com a violência, e talvez pensar um pouco por que essa juventude está agindo assim. Qual é a nossa responsabilidade? Qual é a nossa culpa? Como podemos pagar pelos nossos erros, ainda buscando recuperar o que nos resta? Portanto, Senador Cristovam, quero, mais uma vez, parabenizar V. Exª. V. Exª disse-me hoje: “Vou fazer um pronunciamento daqueles que eu nem sei se vão me ouvir ou se vai ter repercussão”. Mas saiba que tudo o que V. Exª traz para esta Casa é muito significativo, muito expressivo, muito importante e faz bem para a democracia, faz bem para esta Casa a gente dedicar parte do nosso tempo para pensar no futuro, para pensar como vai ser este mundo, este planeta. Cada vez as relações estão ficando mais individuais. V. Exª fala dos chefes de Estado, e eu digo que parece que, com a globalização, as relações cada vez ficam mais virtuais. A gente se fala mais pela Internet; a gente não se fala mais pessoalmente. Às vezes, a gente vê, mesmo no próprio gabinete - eu vejo isto no meu gabinete -, alguém da sala ao lado mandar um e-mail para o colega da sala próxima, porque isso facilita. A gente corre contra o tempo no nosso dia a dia. As relações estão virando relações virtuais. Os namoros, muitas vezes, são virtuais. Então, acho que a gente está precisando mesmo refletir sobre isso, pensar sobre isso e pensar o que a gente espera deste planeta, qual é a nossa parte, o que cada um de nós vai fazer. E nós, como políticos, quais são os nossos desafios para que a gente possa se atualizar, para que a gente possa estar cada vez mais perto daqueles que acreditaram e que acreditam no nosso trabalho, no nosso empenho e na nossa responsabilidade. Parabéns, Senador Cristovam!

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Obrigado, Senadora.

           Vou pegar um pedacinho da sua fala, quando diz que a gente está aqui para querer fazer o melhor para os nossos eleitores. É verdade! É o nosso papel. Só que, hoje, no mundo global, a gente faz tudo o que o nosso eleitor precisa. Aí vem um maluco e faz quebrar a Bolsa de Nova Iorque, e a gente paga um preço altíssimo aqui; outro maluco solta uma bomba em um aeroporto, para todo o tráfego de aviões no mundo e prejudica o turismo lá de Fortaleza. Vivemos num mundo integrado, que nos obriga a cuidar dos nossos eleitores e a cuidar de toda a humanidade. Esse é o desafio.

           Eu sugeri daqui que o Presidente Lula fosse para a Copenhague não como líder do Brasil, mas como um dos líderes do mundo inteiro. Ele é o líder do Brasil até o final de 2010, depois teremos outro líder. Mas ele, além disso, tem de pensar como um dos líderes do mundo. E o menor dos países do mundo tem de mandar o seu presidente pensar também como um dos líderes do mundo. Não dá mais para falar apenas representando a sua comunidade, tem de falar para o conjunto da humanidade inteira. É a isso que quero fazer referência em seu discurso.

           Concedo o aparte ao Senador Mozarildo.

            O Sr. Mozarildo Cavalcanti (PTB - RR) - Senador Cristovam, estou no começo da leitura de um livro intitulado A Breve História do Século XX, e já nesse começo a questionar-me o que nós, no século XXI, estamos pensando para este século. Realmente, em qualquer que seja o campo, parece que o que predomina mesmo é o meio ambiente. Mas V. Exª não nos deixa esquecer que, sem educação, sequer se pode pensar em preservar o meio ambiente. Então, é verdade que há muitas teses e poucos encontros. Até mesmo esse encontro de Copenhague já se prenuncia como algo que não vai dar em nada. Preocupa-me muito essa falta de horizontes definidos, ou pelo menos discutidos, como diz V. Exª, sobre essa questão. Quando um País como o nosso, em que as cédulas do nosso dinheiro, o real, de R$1,00 a R$100,00, em todas elas só tem animal, não tem um vulto histórico, não tem um momento histórico, começo a me perguntar: este País não tem ser humano? Este País não tem história? E aí vem a questão do debate, como V. Exª colocou. Na Amazônia, a prioridade é a árvore em pé. Sim, e os 25 milhões de habitantes que estão sob essas árvores vão viver como? Se não há sustentabilidade para o ser humano, como pretender ter uma sustentabilidade para as árvores? Então, realmente, há certos paradoxos postos nesse início do século XXI e precisamos nos perguntar: a quem interessam?. Estive vendo recentemente um dado interessante: a mesma revista, a revista Time, em 1945, logo após a 2ª Guerra Mundial, depois em 1976, e ultimamente. Veja como a mesma revista aborda, por exemplo, a questão do aquecimento global de forma tão díspar. Então, é preciso que realmente a gente pense até onde as coisas estão sendo discutida com sinceridade e com o objetivo de colocar o ser humano em primeiro lugar, porque senão vamos fazer aqui políticas apenas emergenciais, políticas conjunturais, nunca políticas que realmente pensem, por exemplo, o Brasil de todo o século XXI, ou, pelo menos, das próximas décadas. Já estamos terminando a primeira década do século XXI, e não vejo efetivamente um projeto vislumbrado, sequer rabiscado, para a próxima década do Brasil.

            O SR. CRISTOVAM BUARQUE (PDT - DF) - Senador Mozarildo - e aí eu concluo -, acho que o problema é que estamos divididos entre os depredadores e os conservacionistas, quando na verdade a saída é a transformação harmônica, como fazer a transformação harmônica da natureza a serviço dos seres humanos. Esse é um desafio. Nós, políticos, que quisermos sobreviver ao século XXI vamos ter que levar adiante este debate: como fazer a transformação harmônica. Nem a transformação depredadora desses últimos dois séculos, nem essa idéia ilusória, inclusive, do protecionismo da natureza como ela está, como ela é.

            Agradeço o tempo que me permitiu, Senador Mão Santa, para os apartes.

            Era isso o que eu tinha para falar nesta quinta-feira, lembrando o que disse a Senadora Patrícia, que às vezes a gente fala, como eu disse para ela quando vinha para cá, destoando da temática desses tempos. Aliás, desses tempos não, desses minutos, porque desses tempos eu acho que a temática vai ser essa.


Modelo1 5/18/241:14



Este texto não substitui o publicado no DSF de 11/12/2009 - Página 66523