Discurso durante a 247ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Condenação à violência contra a mulher. Importância da aprovação da Lei Maria da Penha.

Autor
Papaléo Paes (PSDB - Partido da Social Democracia Brasileira/AP)
Nome completo: João Bosco Papaléo Paes
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
FEMINISMO. SEGURANÇA PUBLICA.:
  • Condenação à violência contra a mulher. Importância da aprovação da Lei Maria da Penha.
Publicação
Publicação no DSF de 16/12/2009 - Página 71118
Assunto
Outros > FEMINISMO. SEGURANÇA PUBLICA.
Indexação
  • GRAVIDADE, PERDA, DEMOCRACIA, VIOLAÇÃO, DIREITOS HUMANOS, CONTINUAÇÃO, EXISTENCIA, VIOLENCIA, VITIMA, MULHER, ESPECIFICAÇÃO, RESIDENCIA, APRESENTAÇÃO, DADOS, PESQUISA, FUNDAÇÃO, SENADO, SECRETARIA DE ESTADO, ESTADO DO AMAPA (AP), REFERENCIA, AGRESSÃO, CRESCIMENTO, DENUNCIA, CONJUGE, UTILIZAÇÃO, BEBIDA ALCOOLICA, DROGA, AMEAÇA, MORTE, ESTATISTICA, DELEGACIA, ESPECIALIZAÇÃO, ATENDIMENTO.
  • ELOGIO, REFORÇO, GOVERNO ESTADUAL, ESTADO DO AMAPA (AP), ATENDIMENTO, MULHER, CRIAÇÃO, JUDICIARIO, ORGÃO PUBLICO, AGILIZAÇÃO, PROCESSO, AVALIAÇÃO, EFICACIA, LEGISLAÇÃO, AUMENTO, PUNIÇÃO, VIOLENCIA, ORIGEM, RESIDENCIA, ANUNCIO, ATUAÇÃO, DELEGACIA, REVEZAMENTO, MUNICIPIOS, SAUDAÇÃO, INICIATIVA, PROGRAMA, PREVENÇÃO, UTILIZAÇÃO, INTERNET, DIVULGAÇÃO, ATIVIDADE, CONSELHO, GARANTIA, DIREITOS, CONSCIENTIZAÇÃO, CIDADANIA.

  SENADO FEDERAL SF -

SECRETARIA-GERAL DA MESA

SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. PAPALÉO PAES (PSDB - AP. Sem apanhamento taquigráfico.) - Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, se todas as formas de violência são condenáveis, aquela que é exercida contra a mulher, no seio do lar, é especialmente abjeta e repugnante.

            Ocorrendo em um espaço que é historicamente interpretado como restrito e privado, naturalizada por milênios de cultura machista, a violência doméstica constitui um covarde abuso contra a dignidade da mulher, violando seus direitos humanos.

            Embora afronte essa exigência básica da democracia que é o princípio da igualdade, a violência contra a mulher teima em continuar existindo, em pleno século XXI, mesmo nas sociedades que se pretendem mais modernas e civilizadas. Nada obstante as notáveis conquistas que vêm obtendo no Brasil e em muitos outros países, nos mais diversos campos - com especial destaque para a educação e o trabalho -, as mulheres são, ainda hoje, vítimas de maus tratos físicos, psicológicos, sexuais, morais e patrimoniais.

            E essa triste mazela de nosso quadro social não apenas teima em não desaparecer, mas, pior ainda, continua a apresentar dimensões aterradoras. No Brasil e em todo o mundo.

            Em 2001, a Fundação Perseu Abramo, em pesquisa realizada por meio do Núcleo de Opinião Pública, obteve dados indicando que cerca de 7 milhões entre as brasileiras vivas já foram espancadas ao menos uma vez. Projeta-se em 2 milhões e 100 mil o número de mulheres espancadas a cada ano no País, o que representa uma a cada 15 segundos. Até pouco antes da entrada em vigência da Lei Maria da Penha, que modificou a competência para essa matéria, 70% dos casos processados perante os Juizados Especiais Criminais eram de violência doméstica.

            A Pesquisa sobre Violência Doméstica contra a Mulher, realizada pelo Serviço de Pesquisa de Opinião Pública desta Casa (DataSenado), em 2007, mostra que, para 35% das mulheres agredidas no Brasil, a violência doméstica começa por volta dos 19 anos; que, ao menos para 28% delas, os atos de agressão se repetem; e que as causas da violência doméstica normalmente estão associadas a ciúme e embriaguez do parceiro.

            Das mais de 20 mil denúncias feitas à Central de Atendimento à Mulher em julho de 2007, 73% se referiam à violência praticada pelo marido; 59% das denunciantes alegaram sofrer agressões diárias; 70% sentiam correr risco de espancamento ou morte; e 57% afirmaram que os agressores faziam uso de entorpecentes.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o triste quadro de violência disseminada contra as mulheres pode ser também observado no meu Estado do Amapá.

            Estatísticas disponibilizadas pela Secretaria Extraordinária de Políticas para as Mulheres (SEPM) do Governo do Amapá mostram o progressivo agravamento da situação. É de se considerar, contudo, que isso pode resultar da maior disposição das mulheres em denunciar a violência a que são submetidas, por terem maior conhecimento dos órgãos aptos a receber essas denúncias, por confiarem mais na proteção estatal e na eficácia da repressão. Teria havido, portanto, um crescimento no número de denúncias, a partir da criação e do fortalecimento da rede de atendimento, fazendo com que as mulheres se sintam mais seguras em denunciar as agressões.

            De qualquer forma, as estatísticas daquela Secretaria de Estado apontam que, em 2004, a cada 24 minutos uma amapaense era vítima de violência; em 2005, isso passou a ocorrer a cada 17 minutos; em 2006, a cada 15 minutos; e, no corrente ano, a cada 10 minutos. Os dados que permitiram o cálculo dessas estatísticas foram coletados junto a dez instituições que atuam no Estado.

            Também os registros de ocorrência da Delegacia Especializada de Crimes contra a Mulher (DCCM) crescem ano a ano: de 2003 para 2004, houve aumento de 10,3%; de 2004 para 2005, aumento de 20,6%; e, de 2005 para 2006, crescimento de 1,85%. Em relação a esse crescimento muito menor em 2006, a titular da Secretaria de Políticas para as Mulheres acredita que possa ser consequência da greve da Polícia Civil do Estado, que teria feito com que muitas mulheres vítimas de violência no Amapá deixassem de ser atendidas pelo sistema de defesa social do Estado naquele ano.

            Outra fonte valiosa para avaliar a situação da violência contra a mulher no meu Estado são os dados fornecidos pelo Núcleo de Atendimento à Mulher (NAM), órgão criado pioneiramente pelo Judiciário amapaense apenas um mês após a aprovação da Lei Maria da Penha. Instituído com o objetivo de dar mais agilidade aos processos, realizando, também, investigações mais detalhadas, o NAM julga e executa todas as causas cíveis e criminais relativas a violência contra a mulher. A maioria dos processos que lá chegam são encaminhados pela Delegacia Especializada de Crimes contra a Mulher (DCCM).

            Segundo os dados do NAM, nos dois anos subseqüentes à entrada em vigor da Lei Maria da Penha - até agosto do ano passado, portanto -, 333 homens foram presos em flagrante, 30 desses foram condenados, 974 inquéritos foram abertos, 887 audiências foram realizadas, 124 processos foram sentenciados e duas prisões preventivas foram decretadas.

            Diante desse quadro, Srªs e Srs. Senadores, o Governo do Estado do Amapá vem reforçando sua rede de atendimento e proteção à mulher vítima de violência. Recentemente, foi apresentado o projeto para a criação da Delegacia Itinerante, que vai atender todos os Municípios do Estado. Pretende-se, com isso, oferecer mais um órgão especializado, de modo a facilitar a apresentação de denúncias pelas vítimas de agressões domésticas. A Delegacia Itinerante atuará com diversos profissionais especializados, como, por exemplo, peritos em exames de corpo de delito.

            O fortalecimento da rede de atendimento vem fazendo com que não apenas as vítimas de violência doméstica, mas também aquelas que sofrem estupro e violência sexual passem a procurar órgãos especializados, como a Delegacia da Mulher e o próprio Centro de Referência em Atendimento à Mulher (CRAM).

            Com pouco mais de um ano de implantação - resultado de um esforço conjunto da Secretaria Extraordinária de Políticas para as Mulheres (SEPM) e da Secretaria Especial de Desenvolvimento da Defesa Social (SEDDS) -, o Centro já realizou mais de cinco mil atendimentos. No Cram Bem-Me-Quer, os serviços de atendimento jurídico, psicológico e social, com profissionais capacitados a orientá-las, são oferecidos a mulheres vítimas de violência doméstica e vulnerabilidade social. O local é bem estruturado, com ambiente climatizado e salas propícias para atender a mulher de acordo com cada situação.

            O Centro Bem-Me-Quer é estrutura essencial do Programa de Prevenção e Enfrentamento à Violência contra a Mulher, uma vez que visa a promover a ruptura da situação de violência e a construção da cidadania por meio de ações globais de atendimento interdisciplinar. Com o trabalho realizado pelo Centro de Referência e Atendimento à Mulher (CRAM), o Governo do Amapá assegura a qualidade do serviço de prevenção e erradicação da violência contra a mulher no Estado.

            Outra iniciativa importante foi o lançamento, no último mês de setembro, do blog do Conselho Estadual dos Direitos da Mulher (CEDIMAP), ferramenta da Internet mediante a qual serão divulgadas as ações do Conselho e as parcerias que têm ajudado no seu desempenho. O blog também servirá para que as pessoas façam denúncias, contribuições e conheçam melhor a estrutura do Cedimap. O Conselho foi criado pelo Governo do Estado em 2004 para exercer o papel de órgão deliberativo e fiscalizador com relação às questões de gênero, desenvolvendo o acompanhamento, o controle e a avaliação das políticas nessa área.

            Com o blog, o Conselho Estadual dos Direitos da Mulher poderá chegar aos diversos Municípios do Estado, alimentando-os com informações do seu trabalho. E as reclamações feitas por intermédio do blog permitirão que o Cedimap faça o monitoramento dos Conselhos dos Municípios e cobre o funcionamento das políticas públicas voltadas para a população feminina.

            Também o Município de Macapá, sob a liderança do dinâmico Prefeito Roberto Góes, conta com a sua Rede de Atendimento à Mulher (RAM), composta pela Coordenadoria Municipal de Políticas para as Mulheres (CMM), pela Secretaria Municipal de Saúde (Semsa), pela Secretaria Municipal de Assistência Social e Trabalho (Semast) e pela Guarda Municipal de Macapá (GMM). A Ram foi criada para enfrentar todos os tipos de violência contra a mulher, entre elas a violência doméstica, a sexual, a patrimonial, a física e a psicológica.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, o advento, em agosto de 2006, da Lei nº 11.340, mais conhecida como Lei Maria da Penha, representou um extraordinário avanço no sentido de tornar mais efetivas a prevenção e a repressão da violência doméstica e familiar contra a mulher. Foi a primeira lei a ser incorporada a nosso ordenamento jurídico tendo por finalidade específica coibir esse gravíssimo problema social. Ela significa, outrossim, uma notável conquista no rumo de uma efetiva igualdade entre homens e mulheres na nossa sociedade.

            Ao declarar o direito de toda mulher de viver sem violência e de ter preservada sua integridade física e mental, bem como de exercer efetivamente todos os direitos inerentes à pessoa humana, a Lei Maria da Penha esforça-se por conscientizar todas as brasileiras de seus direitos fundamentais previstos na Constituição Federal, estimulando-as ao pleno exercício da cidadania.

            A partir de sua vigência, a violência praticada contra a mulher deixou de ser considerada apenas um crime de menor potencial ofensivo e passou a ser uma violação dos direitos humanos. Ela autoriza que os agressores de mulheres sejam presos em flagrante ou tenham a prisão preventiva decretada. Os processos por violência doméstica não podem mais ser encerrados por conciliação e acordo, e não cabe a transação penal, com a condenação ao pagamento de cestas básicas. Ela acabou com as penas pecuniárias para esse tipo de delito, ou seja, a mera imposição de multas.

            Mediante alteração no Código Penal, a violência contra a mulher foi incluída no rol das “circunstâncias que sempre agravam a pena”. O tipo especial de lesão corporal denominado “violência doméstica” - §9º do art. 129 do Código Penal - teve sua pena máxima aumentada de um ano para três anos. Foi modificada, também, a Lei de Execuções Penais, permitindo que o Juiz determine o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação. Sob todos os aspectos, foi estabelecido um tratamento muito mais rigoroso para a violência doméstica e familiar contra a mulher.

            A lei também traz uma série de medidas para proteger a mulher agredida, que está em situação de agressão ou cuja vida corre risco. Entre essas medidas, está prevista a saída do agressor da moradia, a proteção dos filhos e o direito de a mulher reaver seus bens e cancelar procurações feitas em nome do agressor. Se necessário, a vítima será encaminhada a programas assistenciais do governo e terá acesso a benefícios assistencialistas previstos em lei.

            Sr. Presidente, Srªs e Srs. Senadores, a desigualdade que tem marcado a relação entre os gêneros ao longo de milênios constitui uma violação aos direitos humanos das mulheres. E essa desigualdade assume sua dimensão mais estúpida e cruel quando toma a forma da violência doméstica e familiar, a qual continua a fazer milhões de vítimas entre as mulheres de todo o mundo, inclusive no Brasil e no Estado do Amapá.

            Essa é uma situação com a qual não podemos mais conviver; que não podemos mais tolerar. É inadmissível que continuem a ser violados os direitos que cada mulher tem à vida, à saúde e à incolumidade física e psicológica. É preciso dar enfrentamento eficaz ao terrível flagelo da violência doméstica. Precisamos garantir proteção e dignidade a todas as brasileiras.

            Com a aprovação da Lei Maria da Penha, o Brasil ganhou uma importante arma em defesa da mulher, um poderoso instrumento para garantir o respeito à sua dignidade. Nos seus três anos de vigência, o novo Diploma Legal já mostrou sua eficácia, viabilizando a punição mais segura, mais rápida e mais rigorosa dos agressores de mulheres, bem como a proteção mais adequada das vítimas. Na medida em que avançarmos na plena implementação de todos os seus dispositivos, na medida em que garantirmos sua integral aplicação, teremos uma melhor percepção do vasto potencial da Lei Maria da Penha na defesa das mulheres.

            Com a aprovação da Lei Maria da Penha, demos um largo passo à frente. Trata-se, agora, de continuar avançando com firmeza rumo à completa erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher.

            Era o que eu tinha a dizer.

            Muito obrigado.


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Este texto não substitui o publicado no DSF de 16/12/2009 - Página 71118