Discurso durante a 248ª Sessão Deliberativa Ordinária, no Senado Federal

Repúdio à decisão do Supremo Tribunal Federal, que manteve a censura imposta ao jornal O Estado de S.Paulo.

Autor
Jarbas Vasconcelos (PMDB - Movimento Democrático Brasileiro/PE)
Nome completo: Jarbas de Andrade Vasconcelos
Casa
Senado Federal
Tipo
Discurso
Resumo por assunto
JUDICIARIO. IMPRENSA. TELECOMUNICAÇÃO.:
  • Repúdio à decisão do Supremo Tribunal Federal, que manteve a censura imposta ao jornal O Estado de S.Paulo.
Aparteantes
Alvaro Dias, Augusto Botelho, Eduardo Azeredo, Marisa Serrano.
Publicação
Publicação no DSF de 17/12/2009 - Página 72061
Assunto
Outros > JUDICIARIO. IMPRENSA. TELECOMUNICAÇÃO.
Indexação
  • QUESTIONAMENTO, SENTENÇA JUDICIAL, SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL (STF), CRITICA, MANUTENÇÃO, CENSURA, JORNAL, ESTADO DE S.PAULO, ESTADO DE SÃO PAULO (SP), REFERENCIA, PUBLICAÇÃO, INFORMAÇÃO, OPERAÇÃO, POLICIA FEDERAL, INVESTIGAÇÃO, PARENTE, JOSE SARNEY, PRESIDENTE, SENADO, OPINIÃO, DESRESPEITO, LIBERDADE DE EXPRESSÃO, DIREITO A INFORMAÇÃO, CONTRADIÇÃO, ANTERIORIDADE, DECISÃO, REVOGAÇÃO, LEI DE IMPRENSA, APREENSÃO, FALTA, MOBILIZAÇÃO, SOCIEDADE CIVIL, RISCOS, JURISPRUDENCIA, EFEITO, IMPUNIDADE, CORRUPÇÃO, PERDA, DEMOCRACIA.
  • ANALISE, REALIZAÇÃO, GOVERNO FEDERAL, CONFERENCIA NACIONAL, COMUNICAÇÕES, PARTICIPAÇÃO, EMPRESARIO, REPRESENTANTE, SOCIEDADE CIVIL, APREENSÃO, RENOVAÇÃO, TENTATIVA, AUTORITARISMO, CONTROLE, OPORTUNIDADE, DEBATE, LEI DE IMPRENSA.
  • ANALISE, POLITICA NACIONAL, CONDUTA, AUTORITARISMO, MANIPULAÇÃO, PRESIDENTE DA REPUBLICA.
  • AVALIAÇÃO, PREJUIZO, DEMOCRACIA, CONTROLE, IMPRENSA, GOVERNO ESTRANGEIRO, AMERICA LATINA, CRITICA, NIVEL, DEBATE, SENADO, INGRESSO, MERCADO COMUM DO SUL (MERCOSUL), PAIS ESTRANGEIRO, VENEZUELA.

                          SENADO FEDERAL SF -

            SECRETARIA-GERAL DA MESA

            SUBSECRETARIA DE TAQUIGRAFIA 


            O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE. Pronuncia o seguinte discurso. Com revisão do orador.) - Sr. Presidente, Mão Santa, Srªs Senadoras, Srs. Senadores, não poderia encerrar esta Legislatura sem vir à tribuna do Senado da República para repudiar a decisão extremamente drástica tomada na quinta-feira passada pelo Supremo Tribunal Federal, que manteve a censura imposta ao jornal “O Estado de S.Paulo”, que continuará impedido de publicar informações sobre a Operação Boi Barrica, da Polícia Federal, cujo principal investigado é o Sr. Fernando Sarney.

            Discordo da posição do Presidente desta Casa de que a decisão do Supremo não deve ser discutida. Deve e pode! O que não se deve é desrespeitar decisões da Justiça. Na democracia, diferente de regimes totalitários, qualquer decisão pode e deve ser questionada. Os Poderes são autônomos e independentes, e, como Senador da República, me sinto na obrigação de criticar veementemente a decisão do Supremo.

            Para mim, uma decisão que envolve conceitos da magnitude dos que foram tratados na última quinta-feira não pode se ater a questões menores, meros detalhes da processualística jurídica. O que estava em jogo, Sr. Presidente, Mão Santa, era a liberdade que os veículos de comunicação possuem de, em posse de informações de interesse da sociedade, poder ou não divulgá-las. O Supremo, ao restringir o debate, se apequenou perante a Nação.

            Não existe ninguém e nenhuma instituição acima do bem e do mal, pois são compostas por homens e mulheres - e por isso mesmo passíveis de erros e distorções. Foi o que aconteceu, em minha opinião, com a maioria dos Ministros do Supremo. A jurisprudência firmada expõe ao risco a liberdade de expressão e o direito à informação. Ao acatar a possibilidade de censura prévia, o Tribunal foi inteiramente incoerente com sua decisão anterior de revogar a Lei de Imprensa, uma decisão tomada bem recentemente.

            Mais sério ainda, Srªs e Srs. Senadores, é o incômodo silêncio com o qual a decisão foi recebida. Com exceção das entidades ligadas à imprensa e alguns poucos intelectuais, articulistas e colunistas, o posicionamento equivocado do Supremo Tribunal passou em branco.

            Aqui mesmo nesta tribuna, em 18 de agosto passado, quando condenei a censura ao “Estadão”, alertei para a apatia da sociedade civil, para esse silêncio comprometedor e preocupante.

            Não se pronunciaram os chamados “movimentos sociais”, que hoje estão sob o patrocínio político e financeiro do Governo Lula e só se mobilizam quando é em benefício das forças que integram a “corporação governista” liderada pelo Partido dos Trabalhadores. Elas estão sempre à disposição dos malfeitos e das ilicitudes que acontecem dentro da Petrobras, por exemplo, a maior estatal do País.

            Também se calaram aqueles intelectuais que acreditam que a chegada de Luiz Inácio Lula da Silva no Palácio do Planalto é um fim em si mesmo, que o Brasil atingiu o nirvana e nada mais importa, a não ser eleger a Ministra Dilma Roussef.

            Infelizmente, Presidente, o Brasil está se acostumando a essa quadra de nossa história, em que reina a mediocridade. O Presidente Lula, para não se comprometer com os sucessivos escândalos do seu Governo, procura se colocar acima de todos, tratando com permissividade os corruptos, passando a mão na cabeça dos mensaleiros e dos aloprados, e falando tolices em discurso pelo Brasil afora.

            A história não acabou com a vitória de Lula nas eleições presidenciais de 2002. Também espero que a história não se repita agora como uma farsa, obscurecida pela alta aprovação popular do Presidente da República. Em todo esse quadro, Sr. Presidente, prefiro ser uma voz dissonante.

         Os efeitos dessa decisão do Supremo podem ser extremamente perniciosos. Por toda a América Latina se tornam evidentes os ataques e as restrições à liberdade de imprensa e ao direito à informação livre e independente. O Brasil não deve copiar essa prática retrógrada, autoritária, que é uma negação de tudo aquilo que os brasileiros lutaram nos anos de chumbo.

            Como alertou o Jornalista Fernando Rodrigues da “Folha de S.Paulo”: a partir de agora, abre aspas, “milhares de políticos e filhos de político se sentirão à vontade para entrar na justiça requerendo a suspensão prévia e publicação de reportagens. Juízes de 1ª Instância poderão, confortavelmente, decidir a favor desse tipo de censura”. Fecha aspas.

            Recentemente, o Tribunal Regional Eleitoral de Pernambuco, meu Estado, censurou o PMDB e o DEM por levarem ao ar vídeos em que apresentavam críticas ao atual Governo do Estado. Decisões semelhantes surgem por todo o Brasil, abrindo espaço para uma democracia mitigada, sob o controle dos atuais detentores do Poder.

            Só vi coisa parecida, Sr. Presidente desta Casa, durante o período da ditadura militar, quando a chantagem, a manipulação e o abuso do poder eram as regras vigentes. Mesmo assim, várias instituições se mobilizaram contra a censura, com coragem e determinação.

            Realiza-se, durante esta semana em Brasília, a Conferência de Comunicação, fórum convocado pelo Governo Federal, com a participação de empresários do setor e representantes da sociedade civil. Estão em discussão 6.101 propostas sobre a produção e distribuição de informações jornalísticas e culturais no País. Entre os principais temas, existem propostas de controle social da mídia por meio de conselhos de comunicação e a elaboração de uma nova lei de imprensa.

            O objetivo do Governo é claro: vencido na primeira investida para instituir um controle da imprensa por meio do Conselho Federal de Jornalismo, volta agora com este fórum multilateral tentando dar um aspecto democrático à sua real intenção autoritária de impor controle à mídia através de conselhos de comunicação.

            Em boa hora, a Associação Nacional de Jornais e a Associação Brasileira de Emissora de Rádio e Televisão - entre outras entidades que representam a emissora de rádios e televisão - recusaram-se a participar de uma conferência cujo os objetivos são inconfessáveis.

            O Presidente Lula na abertura do evento defendeu a liberdade de imprensa, mas em “ato falho” falou o que realmente pensa. Abre aspas: “Há jornais ou noticiários de rádios e televisão que se inserem, que desprezem os fatos, que embargam em campanhas, que divulgam inverdades ou mesmo que disseminam calúnias e infâmias.” Fecha aspas.

            É esta, Senador Eduardo Azeredo, a visão que o Presidente tem da grande imprensa e como ele não consegue conviver com críticas quem ousa defender sua unanimidade é imediatamente rotulado como inimigo.

            A imprensa não é perfeita. Ela erra, comete equívocos e injustiças. Qualquer um que tenha exercido uma função pública com certeza teve algum conflito com a imprensa. Mas eu prefiro que seja assim.

            Fico com a posição expressada por Voltaire séculos atrás. Abre aspas: “Desaprovo o que você diz, mas defenderei até a morte seu direito de dizê-lo.” Fecha aspas.

            Sr. Presidente, é inconcebível ver que após quase quatro meses de censura a que está subordinado o grande O Estado de São Paulo, o Supremo Tribunal Federal, como Corte Maior do Brasil, sua última instância, na quinta-feira toma uma decisão por maioria, graças a Deus que não foi unânime, de manter a censura.

            Há de convir V. Exª e os demais Senadores de que isso é um grave precedente para um Presidente da República que se sente acima da lei, acima do bem e acima do mal, que não respeita pessoas e instituições. Uma decisão como esta agrava mais ainda a situação do País, visto que estamos diante de um Presidente da República que diz que quer tirar o povo da “merda”, um Presidente que diz que não deve satisfações, um Presidente que diz que quer reduzir o Tribunal de Conta da União a um tamanho insignificativo. A gente não pode calar a boca em um final do período legislativo permitindo que mais uma vez a palavra de um Presidente, com formação altamente autoritária, se junte a um equívoco cometido pela mais alta corte do País de manter uma censura a um jornal, imposto por um juiz a quo, juiz de primeira instância.

            Ouço V. Exª Senador.

            O Sr. Augusto Botelho (Bloco/PT - RR) - Senador, eu gostaria de me solidarizar com V. Exª no grito que V. Exª está dando em relação à liberdade de imprensa. Nós não podemos mais admitir que haja censura de imprensa na democracia. Todos nós passamos por aquele período de exceção em que a censura prejudicou muito as pessoas; até vidas foram tomadas por conta de suas opiniões. V. Exª cita Voltaire e dá um exemplo de que temos que ser assim mesmo: aprender a conviver com as divergências. Meus parabéns pelo discurso de V. Exª, focando essa medida que o Supremo tomou e que realmente não foi a melhor medida em relação à liberdade de pensamentos, à liberdade de idéias, à liberdade de informação.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Muito agradeço a V. Exª e fico muito feliz com a participação em meu pronunciamento, de coração.

            Senador Alvaro Dias.

            O Sr. Alvaro Dias (PSDB - PR) - Mais uma vez, os cumprimentos a V. Exª pela coragem com que enfrenta essas situações que trazem resquícios do autoritarismo. A censura à imprensa é abominável e faz escola, porque da censura ao jornal O Estado de S. Paulo decorreu a censura, por exemplo, do blog da economista Adriana Vandoni, do Mato Grosso, imposta por um juiz local. A outra consequência foi a censura a um blog do jornalista Fábio Pannunzio, imposta por um juiz do Paraná, o meu Estado. Portanto, fazem escola os censores da modernidade. Os censores, lamentavelmente, estão presentes no momento em que gostaríamos de ver a censura sepultada definitivamente. Não imaginávamos que ela pudesse retornar como retorna nos dias de hoje. A liberdade de imprensa é essencial para a garantia das demais liberdades; se a liberdade da imprensa está comprometida, as demais falecem. E, obviamente, se não nos arvorarmos em defensores da liberdade de imprensa, vamos perder o direito de exigir liberdade para as nossas ações. Portanto, Senador Jarbas Vasconcelos, os nossos cumprimentos a V. Exª. Nós estamos vendo o Presidente da República compactuando com ditadores, festejando ditadores, recebendo-os com pompa e circunstância no nosso País, e nós não podemos admitir que o exemplo que vem de cima possa prosperar e semear tanto dano à democracia do Brasil.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Agradeço a V. Exª, Senador Álvaro Dias, que tem sido aqui uma voz permanente contra todos esses atos de arbitrariedade. Isso tudo que V. Exª enumerou como irregularidades, como atos fora da lei, fora da prática democrática, com certeza, teve aqui no Plenário, a voz discordante de V. Exª,

            Ouço a Senadora Marisa Serrano.

            A Srª Marisa Serrano (PSDB - MS) - Obrigada, Senador Jarbas. V. Exª está tratando de um tema que ontem foi objeto também de várias falas, não em relação ao nosso País, mas em relação à Venezuela. E a gente percebe que perpassa pela América Latina uma ideia de que o caudilhismo, a ditadura de Governo na imprensa é coisa que está comum e que é natural. No nosso País, nós estamos vendo e ouvindo progressivamente os nossos governantes acharem que a imprensa fala demais. Mesma coisa que o Chávez está fazendo na Venezuela e que estamos vendo em outros países, como Cuba, Equador, e assim por diante.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Aqui junto na Argentina.

            A Srª Marisa Serrano (PSDB - MS) - Aqui mesmo na Argentina. Então, isto que está perpassando pela América Latina me preocupa muito: a ideia de que os nossos governantes estão se achando acima da lei e de que podem tudo. Isso é muito perigoso quando falamos em democracia. Este País, que lutou tanto para chegar aonde chegou, ou seja, numa democracia aparentemente sólida, o que não quer é retroceder. Tudo que é retrocesso começa principalmente calando-se as pessoas - primeiramente a imprensa, mais um, mais outro. Se não falarmos aqui, se não brigarmos, se nossa voz não for ouvida, realmente, vamos começar a fazer com que o nosso País entre na era das trevas. Essa é uma função nossa. Quero parabenizar V. Exª, porque está dando esse brado e fazendo com que todos nós acordemos para questões como essa que parecem tão pequenas. É um jornal só, é uma questão só, mas esse é o fio da meada que vai puxando muitas outras. Obrigada.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PB) - Muito obrigado, Senadora Marisa Serrano. É importante, inclusive, que V. Exª cite o episódio de ontem da Venezuela. Nunca vi coisa tão medíocre, embora o país esteja mergulhado em mediocridade, do que aquela discussão de ontem, de que o problema é comercial, não se deve levar em conta a figura de Hugo Chávez. O que se deve levar em conta é se, na Venezuela, tem ou não democracia, se seu Presidente respeita a imprensa, se respeita a oposição, se seu Presidente respeita os empresários.

            Então, um país que não respeita a opinião pública, que persegue a oposição, que tem presos políticos, pode ser considerado como defensor da democracia? É pressuposto básico para ingresso no Mercosul que o país seja democrático -, a discussão de ontem foi boba, tola, porque a coisa se deu exatamente entre a prática ou não da democracia, que não é exercida pelo Coronel Hugo Chávez na Venezuela.

            Se o Senador Mão Santa permitir, vou encerrar ouvindo o Senador Eduardo Azeredo.

            O Sr. Eduardo Azeredo (PSDB - MG) - Senador Jarbas Vasconcelos, o encerramento do seu discurso foi perfeito com as palavras de Voltaire. É exatamente isso. V. Exª foi Governador, assim como Mão Santa, Alvaro Dias e eu, e Marisa e Augusto têm grandes lideranças. Todos nós sabemos que existem realmente momentos em que a imprensa pode extrapolar, mas, sem liberdade de imprensa, não dá. A liberdade é fundamental. Não foi à toa que falamos muito sobre isso na questão do Mercosul, mas quero abordar outro ponto do seu discurso, que é a questão da incontinência verbal do Presidente Lula. Nós todos respeitamos o Presidente Lula, a sua história de vida, e agora vai haver uma propaganda grande com o filme sobre a vida dele. Porém, isso não dá a ele o direito de ficar falando palavrão a toda hora, de ficar zombando, ironizando. Não tem sentido. Ele realmente fica achando que está acima do bem e do mal e, com isso, erra muito, exagera, comete equívocos muito fortes. Vou falar daqui a pouco sobre a política externa, que é outra área; não é só o Mercosul, não. Há várias outras questões que mostram como o Governo está se atrapalhando na questão internacional.

            O SR. JARBAS VASCONCELOS (PMDB - PE) - Obrigado, Senador Eduardo Azeredo. V. Exª é um expert em política externa e, com certeza, fará um brilhante pronunciamento nesta tarde.

            Quero agradecer, mais uma vez, Senador Mão Santa, a sua benevolência, a sua generosidade, e dizer que esta Legislatura está terminando amanhã e, para mim, seria incômodo deixar de vir à tribuna para condenar, primeiro, esses abusos do Governo e, segundo, esse equívoco da mais alta Corte do País, do Supremo, mantendo a censura a um grande jornal do Brasil, do País, que é “O Estado de S. Paulo”.

            Muito obrigado.


Modelo1 4/27/245:31



Este texto não substitui o publicado no DSF de 17/12/2009 - Página 72061